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Charles William Mcnaughton: elisão-rmit e elisão benefício fiscal; elisão-meio e

3.6 A DENOMINADA INTERPRETAÇÃO ECONÔMICA DO DIREITO

4.2.16 Charles William Mcnaughton: elisão-rmit e elisão benefício fiscal; elisão-meio e

Charles William Mcnaughton, em obra de relevância sobre a elisão tributária, vista sob o enfoque da completabilidade sintática, semântica e pragmática do sistema normativo, propõe que a elisão se concretiza a partir da interação de um sujeito de direito com a norma jurídica tributária em sentido estrito (regra-matriz de incidência tributária) ou com uma norma jurídica tributária de “benefício fiscal”.

A partir do exame da doutrina nacional, o autor compreende que há uma diversidade de concepções na maneira de visualizar a elisão. Há uma corrente, influenciada por Antonio Roberto Sampaio Dória, Rubens Gomes de Sousa e Gilberto de Ulhôa Canto, que visualiza a elisão como uma conduta que busca evitar, minimizar, ou retardar o “fato gerador”. Utilizam o critério dos meios utilizados, se lícitos ou ilícitos, e o critério cronológico (momento da ocorrência do “fato gerador”), para diferenciar a elisão da evasão, na qual há um enfoque sintático da elisão relacionado à análise do ato e a hipótese normativa.540 Existem outros autores, como Diva Prestes Marcondes Malerbi e Paulo Ayres Barreto, que compreendem a elisão como um direito subjetivo dos cidadãos.541 Há, ainda, outros autores, como Marco Aurélio Greco e Ricardo Lobo Torres, que compreendem que há uma elisão tutelada pelo ordenamento e outra abusiva que é repelida, que se aproxima do conceito de elusão, e que divide a elisão em duas modalidades: uma elisão legítima e uma elisão ilegítima.542 Esse último enfoque adentra para uma visão deôntica do fenômeno ou para um campo valorado.

Nesse sentido, há a posição de Heleno Taveira Tôrres, que compreende o fenômeno a

540 Podemos incluir nessa análise Alfredo Augusto Becker. Em que pese utilizar terminologia diferente, o autor foi muito influenciado pelas ideias construídas por Rubens Gomes de Sousa, sobretudo, acerca da utilização do critério cronológico para diferenciação da elisão e evasão.

541 Como visto, Alberto Xavier também cogita a elisão como um direito subjetivo dos cidadãos à liberdade, podendo ser incluído também nessa corrente.

542 Adicionamos a essa análise Hermes Marcelo Huck, que também compreende que a liberdade dos particulares não pode ser absoluta, no sentido de que é possível a configuração de elisão ilícita pela conduta abusiva dos particulares, que utilizando formas jurídicas anormais ou inadequadas evitam a aplicação da norma jurídica tributária.

partir de três figuras que não se confundem (elisão, elusão e evasão), em que há uma conduta intermediária que não é tão legítima quanto a elisão, pois há dolo, a utilização de estratagemas e artificialismos que a torna ilegítima, mas que também não configura a prática de evasão, com a utilização de atos ilícitos quando o tributo já é devido.543

Quanto a esse último posicionamento, Charles William Macnaughton compreende que o conceito de elusão é útil quando se utiliza como critério de diferenciação a legitimidade dos meios. Nesse sentido, haveria um campo de valoração e gradação de condutas do mais legítimo ao menos legítimo, nessa ordem: a opção fiscal, a elisão, a elusão e a evasão. O autor parte para um outro enfoque, então, no qual busca uma visão sintática a partir da adequação da norma jurídica individual e concreta em relação à regra-matriz de incidência tributária ou a norma de benefício fiscal que ela interage. Associa-se a elisão ao aspecto de certo sujeito de direito constituir norma individual e concreta em conformidade com a regra-matriz de incidência tributária ou com norma de benefício fiscal, do que propriamente com o fato do sujeito ter utilizado meios mais ou menos legítimos para obter o seu fim desejado. Na sua visão, há um enfoque binário: ou o sujeito passivo aplicou de modo adequado a norma jurídica tributária e obteve economia fiscal legítima, ou não aplicou corretamente e a vantagem fiscal foi indevida.544

Assim, a licitude relevante, para fins de qualificação da elisão, não decorre propriamente dos atos lícitos praticados para alcançar uma economia tributária, mas da construção da norma individual e concreta em conformidade com a regra-matriz de incidência ou com a norma de benefício fiscal. Para isso, é importante a qualificação jurídica que se atribui ao ato de acordo com o ramo autônomo do Direito que lhe disciplina. Nessa linha, para o autor, a adequada qualificação jurídica dos atos regidos por outros ramos jurídicos é apenas um pressuposto para a prática do ato elisivo, mas não o seu fator determinante.

543 Importante a inclusão da classificação de Cesar A. Guimarães Pereira, que não coincide propriamente com as ideias de Heleno Taveira Tôrres, mas compreende que é possível classificar a elisão em eficaz ou ineficaz. A elisão ineficaz seria a zona intermediária entre a elisão eficaz e a evasão tributária.

MCNAUGHTON, Charles William. Elisão e norma antielisiva: completabilidade e sistema tributário. São Paulo: Noeses, 2014. p. 229-230.

544 Critica o critério dos meios legítimos, pois compreende que é possível que ocorra a elisão com ilícito no campo cível, e, ao mesmo tempo é possível evasão sem nenhum ilícito na esfera privada. No primeiro caso, o autor dar o exemplo de um comerciante que adquire uma mercadoria e induz o vendedor a erro, de modo que o ato possui uma nulidade. Mesmo assim o crédito de ICMS da compra de mercadoria será aproveitado e o ilícito cível será irrelevante para o Direito Tributário. No segundo caso, uma pessoa jurídica apurada sobre o lucro real faz uma doação e escritura como despesa dedutível na apuração da base de cálculo do imposto. A doação é válida e lícita no campo cível, em que pese haver um desarranjo na norma individual e concreta que realizou o aproveitamento da despesa. Ibidem, p. 230-233.

Charles William Mcnaughton propõe uma definição mais formalizada de elisão tributária. Para facilitar a compreensão de sua definição é importante, primeiramente, a elucidação dos termos e símbolos utilizados pelo autor. A situação S consiste no contexto caracterizado pela realização de uma atividade ou ação isolada que revele capacidade contributiva de sujeito de direito determinado. O N diz respeito a uma norma jurídica tributária de potencial aplicação à situação S, que sem a realização do ato elisivo, acabaria por implicar no dever de recolhimento do quantum Q, que consiste na quantia que deveria ser paga, caso não houvesse a realização do ato elisivo. O Q’ é a quantia pecuniária que deve ser paga após a prática do ato elisivo, sendo, portanto, menor que Q. O A consiste no ato elisivo que tem como resultado a economia fiscal resultante da diferença entre Q e Q’. O ato elisivo A, que acarreta a economia fiscal, ou é previsto em uma norma de benefício fiscal ou faz com que a situação S não se subsuma ao antecedente da regra-matriz de incidência tributária. Por fim, elucidando os termos utilizados na definição, o autor a emprega a expressão benefício fiscal de forma ampla, abrangendo qualquer dispositivo constante no ordenamento jurídico que, conjugado à regra-matriz de incidência, acarrete uma redução na carga tributária suportada pelo sujeito passivo.545 Feitas essas explicações, o autor define elisão tributária:

(...) dada (i) a potencialidade de uma situação S, que importa o exercício de atividades ou de ações reveladoras de capacidade contributiva, submeter-se, em um instante T, ao alcance de uma norma tributária N, cuja aplicação implique um quantum projetado Q, como valor a ser recolhido a título de um tributo e (ii) dado um valor Q’ maior ou igual a zero e menor do Q, a elisão confugira-se pela prática de um ato A, em razão de sua vocação de possibilitar uma economia fiscal, decorrente da (a) incidência de um benefício fiscal, aplicável na situação S em razão de A, que determine, em T, o recolhimento de um quantum efetivo Q’, ou (b) da não subsunção de S a qualquer situação de fato prevista no antecedente de N que implique a obrigação de se pagar uma quantia superior a Q’, depois de subtraído qualquer valor proveniente de um benefício fiscal existente.546

Portanto, em um determinado contexto fático, em que há a possibilidade de realização de atos que revelem capacidade contributiva e que se enquadrem em norma jurídica tributária que implique uma quantia a ser paga, a elisão concretiza-se mediante um ato ou atividade que acarrete uma economia fiscal, recolhendo um valor menor em relação à quantia concebida originalmente, ou igual a zero, seja porque a essa conduta

545 MCNAUGHTON, Charles William. Elisão e norma antielisiva: completabilidade e sistema tributário. São Paulo: Noeses, 2014. p. 234-237.

546 Ibidem, p. 236-237.

aplica-se uma norma de benefício fiscal (aqui compreendida em sentido amplo), seja porque essa conduta não realiza a hipótese de incidência do tributo. Em muito se aproxima à definição de Antonio Roberto Sampaio Dória, principalmente no que diz respeito à conduta tendente a “evitar a ocorrência do fato gerador”.

O autor situa a elisão no campo da ação ao apontar que ela se reveste na prática de um ato. Ainda que precedida de um planejamento, entendido como a tomada de decisão sobre uma série de medidas a serem empregadas para fins de obtenção da economia fiscal, que se concretiza por meio de normas individuais que revestem os atos jurídicos, a elisão se efetiva por meio da execução do planejamento feito. A economia fiscal visada pelo agente elisivo não é involuntária e nem acidental, mas decorre propriamente, de um cálculo normativo. O que caracteriza o ato como “elisivo” é o nexo entre o querer/obter a economia e a prática do próprio ato.547

O resultado do ato elisivo é que, o quantum efetivo, ao final, é inferior ao quantum previsto. Logo, há uma comparação entre a situação jurídica que se realiza e a situação jurídica hipotética não juridicizada. Essa situação jurídica hipotética é uma possibilidade que não se concretiza. Há, portanto, dois meios para a obtenção da economia fiscal: quando o ato elisivo interage com os critérios da regra-matriz de incidência tributária, de modo que o quantum efetivo seja inferior que o quantum previsto (elisão- RMIT), no qual se dedica um tópico específico; quando o ato elisivo interage com norma de benefício fiscal (elisão-benefício fiscal), tomada aqui em sentido amplo pelo autor, isto é, normas gerais e abstratas que concedem isenção, que instituem imunidades, o aproveitamento de créditos, ou, ainda normas que instituem regimes jurídicos tributários mais benéficos.548

Quanto a essa última modalidade, o ato elisivo construído e manejado pelo contribuinte interage com norma jurídica geral e abstrata com vistas à obtenção de uma economia fiscal. Por exemplo, quando a elisão tributária interage com a norma de imunidade de modo a garantir que um certo acontecimento enquadre-se no seu âmbito de abrangência, impedindo, assim, que sejam alcançadas pela norma jurídica tributária em sentido estrito. Ademais, quando o ato elisivo é construído para enquadrar-se no âmbito de abrangência de norma isentiva, que subtrai parcela do campo de abrangência

547 MCNAUGHTON, Charles William. Elisão e norma antielisiva: completabilidade e sistema tributário. São Paulo: Noeses, 2014. p. 237-238.

548 Ibidem, p. 238-239.

do antecedente ou consequente da regra-matriz de incidência, mutilando um dos critérios da norma jurídica tributária em sentido estrito.549

Charles William Macnaughton ainda propõe outra classificação para elisão, quanto ao meio de obtenção da economia fiscal. O critério para essa classificação é o da utilidade do ato elisivo para o contribuinte. Assim, a elisão seria dividida em duas classes. A primeira classe é a elisão-meio, na qual o ato elisivo é realizado mediante a escolha, entre dois procedimentos possíveis, para se chegar a determinado resultado.

Nessa modalidade elisiva, o particular escolhe, dentre os procedimentos possíveis, um para se atingir determinado resultado que acarrete economia fiscal, entendida aqui, repise-se, como a diferença entre o quantum previsto e o quantum efetivo, decorrente do procedimento elisivo.550

A segunda modalidade elisiva, conforme, ainda, a classificação com base na utilidade do ato elisivo, é a que o autor denomina de elisão-fim. Nessa modalidade, o ato elisivo do particular não se caracteriza pela escolha de um procedimento, dentre o feixe de alternativas possíveis, para a obtenção da economia de tributos, mas por tomar a elisão como um fim em si mesmo. Não que o ato elisivo careça de propósito negocial, mas que é resultado de um procedimento prévio e tomado como valioso por si mesmo.

A economia fiscal é identificada pela comparação entre o ato elisivo e a ausência desse ato, e não a partir da eleição de um entre diversos procedimentos para que se atinja um mesmo fim.551

A operação será elisão-meio ou elisão-fim a depender das motivações que contextualizam o ato elisivo e os objetivos almejados pelos contribuintes. Na primeira, o procedimento escolhido para atingir um resultado visado, gera uma economia fiscal em comparação com outros procedimentos possíveis para se chegar ao mesmo resultado. Na segunda, a comparação para se verificar a obtenção de economia fiscal é entre o ato elisivo e a não realização do ato.552