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Partindo do pressuposto de que a variação correlaciona-se com aspectos da estrutura social, Weinreich, Labov e Herzog (1968) estabelecem cinco problemas com os quais o pesquisador sociolinguista se depara e, a depender dos seus objetivos, deve tentar responder:

a) o problema da restrição: Quais são os fatores responsáveis por favorecer ou restringir uma mudança? Que variáveis independentes, tanto de ordem social quanto de ordem linguística, devem ser controladas na análise de um determinado fenômeno?

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(LABOV, 2010, p. 4): “Social factors will designate the effects of linguistic interaction among members of specific social groups, […] Cultural factors will designate the association of linguistic change with broader social patterns that are partly, if not entirely, independent of face-to-face interaction.”

Tendo como ponto de partida as diferentes pesquisas sobre o uso variável do modo subjuntivo realizadas com dados do português do Brasil e de outras línguas românicas, selecionamos determinados grupos de fatores que julgamos pertinentes para a análise do objeto de estudo investigado nesta tese (cf. capítulo 1). O objetivo está na identificação dos grupos de fatores, linguísticos e/ou extralinguísticos, responsáveis por favorecer ou restringir o uso do presente do modo subjuntivo a despeito do curto espaço temporal a partir do qual investigamos o fenômeno: período que compreende as duas últimas décadas do século XIX e todo o século XX. Grupos de fatores estatisticamente relevantes na análise diacrônica (mudança em tempo real) e na análise sincrônica (mudança em tempo aparente) podem ser indicadores da direção da mudança, se houver.

b) o problema da transição: como os estágios intermediários de uma variável podem ser observados? Como a mudança acontece? E como é transmitida de uma geração a outra? Quais são os líderes da mudança? (LABOV, 1972b)

A transição caracteriza a gradualidade da mudança, que pode ser captada, através de resultados estatísticos, tanto na configuração social como no funcionamento linguístico. Do ponto de vista extralinguístico, a mudança pode se dar gradativamente de uma geração a outra, de uma comunidade a outra, a depender de fatores como valor social atribuído à forma, contato entre os falantes etc. Do ponto de vista linguístico, os resultados podem apontar a ‘porta de entrada’ do presente do indicativo em contextos previstos como de emprego obrigatório do presente do subjuntivo, conforme prescrição normativa. Resultados de diversas pesquisas acerca do uso variável do modo subjuntivo têm apontado a modalidade epistêmica como o contexto preferencial de emergência do modo indicativo (cf. capítulo 1). Com base em Pimpão (1999c), acreditamos que o modo subjuntivo, mais provável de aparecer em contexto de modalidade deôntica (GIVÓN, 1995, 2001), seja menos recorrente em contexto de modalidade epistêmica com traço de projeção futura e menos ainda em contexto de modalidade epistêmica com projeção temporal espraiada.

c) o problema do encaixamento: como a mudança está encaixada na matriz de outras mudanças linguísticas? E como está encaixada nas mudanças sociais?

A variação entre o presente do subjuntivo e o presente do indicativo, na medida em coloca em evidência a entrada do presente do indicativo em contextos de uso categórico do presente do subjuntivo (segundo as gramáticas normativas), contribuiu com resultados que apontam uma reorganização no paradigma modo-temporal à semelhança de outras pesquisas realizadas no âmbito do projeto Variação em

categorias verbais, coordenado pela Prof. Dra. Edair Görski: Coan

(1997) analisa a variação entre as formas verbais de pretérito mais-que- perfeito e pretérito perfeito do indicativo; Silva (1998) pesquisa a variação entre as formas verbais de futuro do pretérito, pretérito imperfeito e perífrase com ir (ia) –R, no indicativo; Gibbon (2000) investiga a variação entre as formas verbais de futuro do presente sintético, perífrase com ir (vou) –R e presente do indicativo; Tafner (2004) acrescenta às formas verbais analisadas por Gibbon também a variante formada por ir (vou) estar – NDO; Reis (2003) analisa a variação entre as formas verbais de presente do indicativo e presente do subjuntivo no domínio de atos de fala não declarativos de comando; Domingos (2004) investiga a variação entre as formas verbais de pretérito imperfeito do subjuntivo e pretérito imperfeito do indicativo; Freitag (2007) estuda a variação entre as formas verbais de pretérito imperfeito do indicativo e perífrase com estar –NDO. Somam- se a esses estudos, as pesquisas resenhadas neste capítulo e que, com base em resultados de amostras de fala e/ou de escrita, atestam o uso do indicativo nos domínios do subjuntivo, conforme caracterização das gramáticas normativas.

d) o problema da avaliação: quais são os correlatos subjetivos de fenômenos investigados? Os falantes avaliam positivamente uma variante (condição que permite acelerar o processo de mudança)? Ou os falantes manifestam avaliações negativas (condição para conter o curso da mudança)?

Tendo em vista que não foram aplicados testes de atitude a informantes de Florianópolis e de Lages, o ‘problema da avaliação’ não será discutido nesta tese. Teceremos apenas alguns comentários considerando a questão da escolaridade como um indicador indireto de avaliação. Pesquisas futuras devem contemplar essa análise como forma de somar evidências para uma maior compreensão acerca do comportamento variável do presente do modo subjuntivo.

e) o problema da implementação: quais fatores são responsáveis pela implementação da mudança? Por que uma mudança ocorre em determinada língua e em um dado momento, porém não ocorre em outra língua da mesma forma, ou na mesma língua, em outros momentos?

É provável que não tenhamos uma resposta imediata para essa questão. Labov (1972b) mesmo afirma haver pouco a se dizer sobre os fatores que fazem com que uma mudança linguística seja implementada. Sugere, em geral, eventos históricos que podem ter contribuído para uma determinada mudança em determinada época e lugar. Esse é o caso do /r/ em Nova Iorque, cuja presença passa a ser observada na fala dos informantes à época da 2ª Grande Guerra. A passagem do apagamento do /r/ para a sua presença na fala nos nova-iorquinos coincidiria com tal momento histórico.

Dos cinco problemas correlacionados ao processo de mudança, tencionamos apresentar respostas para os dois primeiros, a saber: o problema da restrição e o problema da transição (cf. capítulos 4 e 5).