• Nenhum resultado encontrado

O FENÔMENO EM ESTUDO

1.2 JUSTIFICATIVAS DA PESQUISA

Considerando a apresentação de pesquisas acerca da variação entre subjuntivo e indicativo e a caracterização do objeto de estudo, as justificativas para a proposta de investigação desta tese são as seguintes:

12

Camara Jr. (1974, p. 123) menciona a fusão dos modos ‘subjuntivo’ e ‘optativo’ em um único modo: “o sânscrito e o grego os conservaram a princípio – é certo – mórfica e nocionalmente distintos; mas numa fase mais tardia o sânscrito clássico perdeu o subjuntivo e o grego pós-ático perdeu o optativo”.

(a) Ampliação do córpus: para a dissertação de mestrado (PIMPÃO, 1999c), foram coletados e analisados dados de fala da cidade de Florianópolis, distribuídos em três níveis de escolaridade (primário, ginasial e colegial). Para a pesquisa desenvolvida nesta tese, agrega-se à coleta inicial a seleção e a análise de dados:

(a1) de entrevistas de universitários naturais de Florianópolis. A inclusão de informantes com nível superior pode ratificar resultados da pesquisa anterior (PIMPÃO, 1999c) que apontam que o nível de escolaridade desempenha um papel importante na retenção do presente do subjuntivo;

(a2) da cidade serrana de Lages, também localizada no estado de Santa Catarina, cujas entrevistas igualmente estão armazenadas no banco do Projeto VARSUL13, com vistas a fazer uma análise comparativa entre duas comunidades catarinenses, ampliando a descrição do uso variável entre o presente do subjuntivo e o presente do indicativo em Santa Catarina. Lages, diferentemente das demais cidades do Banco, não sofreu influência da língua de imigrantes. Além disso, sua configuração geográfica difere da de Florianópolis, e as duas cidades separadas pela Serra Geral, ficaram, por muito tempo, sem comunicação entre si;

(a3) do córpus diacrônico, composto de cartas ao redator publicadas em jornais de Florianópolis e de Lages, a partir das duas últimas décadas do século XIX e de todo o século XX, buscando captar, na escrita catarinense, contextos de emergência e/ou expansão de uso do indicativo em contextos previstos como de subjuntivo.

Essa ampliação do córpus de análise é importante por alguns aspectos, dentre os quais se destacam os seguintes: primeiramente, contribui com a descrição do português falado na Região Sul, especialmente em Santa Catarina, agregando à investigação já realizada com amostra de Florianópolis (PIMPÃO, 1999c) novos dados da capital e também entrevistas de mais uma cidade catarinense pertencente ao Banco de Dados do Projeto VARSUL; em segundo, contempla uma abordagem pancrônica, fundamental para o estudo da trajetória da variação e eventual mudança, testando a validade do princípio do

uniformitarismo (LABOV, 1972b, 1994), e mapeando o funcionamento

do modo subjuntivo/indicativo ao longo dos anos.

13

Diferentemente de Florianópolis, não há entrevistas com informantes universitários na cidade de Lages. O capítulo referente aos Procedimentos Metodológicos retoma essa questão.

(b) Sistematização de trabalhos sobre o português do Brasil: esta tese descreve grande parte das pesquisas que abordam o uso variável do modo subjuntivo em amostras do português do Brasil. Esses estudos agregam conhecimento acerca do fenômeno, seja quanto à abordagem teórica escolhida, ao tratamento das variáveis, ou, ainda, quanto à análise interpretativa dos dados. A apresentação conjunta desses trabalhos, da forma como é conduzida nesta tese, permite obter uma visão panorâmica do uso do subjuntivo em variação com o indicativo em várias comunidades brasileiras.

(c) Refinamento das variáveis independentes: tendo como base os resultados encontrados na dissertação (PIMPÃO, 1999c), é necessário reanalisar as variáveis já testadas – considerando tanto a revisão bibliográfica de pesquisas que tratam do modo subjuntivo, levadas a cabo no Brasil e em outros países de línguas românicas, como novas reflexões teóricas desenvolvidas na área na última década –, com vistas a (a) definir as variáveis que devem ser mantidas; (b) refinar fatores já controlados; e (c) compor novos grupos de fatores, de modo a descrever e explicar com mais propriedade o fenômeno em estudo.

(d) Tratamento mais detalhado das ocorrências: a percepção da necessidade de um exame mais fino de certos itens já surgiu durante a elaboração da dissertação (PIMPÃO, 1999c), quando se notou que as locuções conjuntivas apesar de que e se bem que, ao contrário das demais, ocorriam somente com o indicativo, ainda que o conector não tenha constituído uma variável independente. A importância do controle de itens também foi, de certa maneira, aventada por Wherritt (1977) que, ao analisar dados de cláusulas adverbiais concessivas, verificou que: com as conjunções/locuções conjuntivas apesar de que e se bem que, a presença do indicativo é categórica; com embora e mesmo que, a variação desponta, ainda que haja uma preferência pelo indicativo; e a locução conjuntiva nem que mostra-se sempre seguida por subjuntivo. Ademais, Poplack (1992, 1994, 2001), a partir da análise da fala de 120 informantes, mostra a importância de fatorar o item lexical sob pena de distorção de resultados quantitativos. Nesse sentido, uma análise micro, atenta às conjunções e também a outros itens lexicais (como o verbo da oração matriz no contexto de orações substantivas), pode evidenciar um comportamento distinto daquele mostrado por uma análise mais macro, centrada no tipo de oração adverbial ou no tipo semântico do verbo, por exemplo. Da mesma forma, é necessária a realização de cruzamentos de

grupos de fatores, tratamento estatístico não aplicado aos dados de Pimpão (1999c).

(e) A reanálise da força atribuída ao fator ‘futuridade’: em Pimpão (1999c), postulou-se o traço temporal de futuridade como o fator mais importante no condicionamento do presente do subjuntivo, e não a modalidade assentada no traço de incerteza, conforme determinam os gramáticos normativos. Para esta tese, aposta-se, ainda, no traço de projeção futura como um fator relevante para a preservação do presente do subjuntivo, porém sem excluir a importância de outros valores, tais como a manipulação, a volição, a incerteza. Nesse sentido, ocorre uma conjugação entre um valor mais temporal (projeção futura, por exemplo) e um valor mais modal (modalidade deôntica ou epistêmica).

(f) A modalidade revisitada: Givón (notadamente 1995, 2001, 2005) considera as modalidades epistêmica (eixo da crença) e deôntica (eixo da manipulação, obrigação, e também do desejo, intenção) como dois submodos distintos da modalidade irrealis (cf. capítulo 2). Em Pimpão (1999c), o submodo deôntico foi controlado apenas a partir da natureza dos verbos matrizes no contexto sintático das orações substantivas. Isso significa que a modalidade deôntica não foi captada na sequenciação discursiva, no contexto multiproposicional, como o foi a modalidade epistêmica. Da modalidade deôntica foi captado apenas o traço de projeção futura. Dessa forma, em Pimpão (1999c) todas as ocorrências foram codificadas a partir de correlações entre traços de mais ou menos projeção futura e de mais ou menos incerteza.

Nesse sentido, da mesma forma que as dimensões epistêmicas são controladas na sequenciação discursiva, as dimensões deônticas também devem ser assim consideradas. A modalidade, portanto, deve ser revisitada e reanalisada. Isso será feito a partir de um continuum, tendo em uma extremidade o submodo deôntico de volição, em que a projeção futura se aproxima dos valores de desejo e vontade, por exemplo. Na outra extremidade, está o submodo de maior certeza epistêmica e, na parte intermediária desse continuum, localizam-se o submodo deôntico manipulativo e o submodo epistêmico de baixa incerteza (com ausência do traço de projeção futura), conforme será detalhado adiante.