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O uso variável do presente do modo subjuntivo é sensível a condicionadores extralinguísticos?

O FENÔMENO EM ESTUDO

1.3 DELIMITAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO

1.4.2 O uso variável do presente do modo subjuntivo é sensível a condicionadores extralinguísticos?

A hipótese acerca da relevância de condicionamentos externos no uso variável do presente do subjuntivo deve levar em conta as condições de emprego desse modo verbal apresentadas nas gramáticas tradicionais. Conforme descrito na seção 1.3 deste capítulo, intitulada ‘Delimitação do objeto de estudo’, as gramáticas (normativas e histórica) apresentam contextos de uso obrigatório do subjuntivo e alguns contextos em que, mesmo sendo de uso obrigatório, o indicativo é previsto, ainda que haja diferenciação, segundo as gramáticas, em termos da atitude: se subjuntivo, então incerteza; se indicativo, então certeza.

Esse é o caso, por exemplo, das orações independentes em que há expressão de dúvida, geralmente codificada pelo talvez (BECHARA, 2006). Sob o escopo desse item, o uso do subjuntivo é obrigatório; ainda assim, as gramáticas não descartam a possibilidade do emprego do indicativo. A mesma relação se estabelece nas orações dependentes: nas substantivas, os verbos acreditar e crer podem apresentar subjuntivo ou indicativo na subordinada; nas adverbiais, exemplos de autores da literatura mostram o uso de ambos os modos verbais com o conector

embora. Em todos esses casos, contudo, o subjuntivo é atrelado ao valor

de incerteza e o indicativo ao valor de certeza.

Considerando essas ressalvas, a previsão quanto aos dados analisados na tese é de que:

(i) os contextos de uso obrigatório do subjuntivo, mas em que já é prevista nas gramáticas a possibilidade de uso do indicativo (embora, segundo os autores, com modificação no grau de certeza), constituem ambiente de maior variação entre presente do subjuntivo e presente do indicativo, sem relevância de fatores extralinguísticos;

(ii) os contextos de uso efetivamente obrigatório do subjuntivo, sem previsão nas gramáticas de alternância de modo, devem mostrar-se sensíveis a condicionamentos extralinguísticos, como faixa etária e nível de escolaridade. Dessa forma, os informantes mais jovens e com menor nível de escolaridade tenderiam a usar mais o presente do indicativo nesses contextos.

Outro fator a ser contemplado é o de ordem geográfica. Nas considerações de Perini (2010), o uso variável do modo subjuntivo, em

especial do presente, parece mostrar um comportamento distinto a depender das regiões do país. Para o autor (2010), uma observação informal parece sugerir a preservação do presente do subjuntivo na Região Nordeste, e o uso mais frequente do presente do indicativo nas Regiões Sul e Sudeste. Como ele (2010, p. 207) mesmo menciona que o mapeamento desse fenômeno “ainda está por ser feito”, esta pesquisa comparativa entre Florianópolis e Lages pode contribuir com resultados que reforcem ou relativizem essa percepção do autor somada aos resultados de trabalhos já realizados na Região Nordeste.

Por outro lado, o trabalho desenvolvido por Scherre (2007), que reúne resultados de pesquisas sobre o uso do imperativo no Brasil, revela um panorama um pouco distinto da observação de Perini (2010). No eixo geográfico por ela apresentado, o imperativo associado a formas do indicativo ocorre em Florianópolis e cidades das regiões Sudeste (Rio de Janeiro) e Centro-Oeste (Brasília, Goianésia e Campo Grande); já o imperativo com formas associadas ao subjuntivo ocorre em Lages e em cidades da região Nordeste (Fortaleza, João Pessoa, Recife e Salvador). Nessa comparação, Florianópolis e Lages situam-se em grupos diferentes. Seria a mesma situação para o uso variável do presente do subjuntivo?

A descrição apresentada por Scherre (2007) fornece um argumento em favor da previsão de maior uso do presente do subjuntivo na cidade de Lages se comparado ao uso em Florianópolis. Outro argumento pode estar nas informações de Knies e Costa (1996) acerca da população de ambas as cidades. Segundo as autoras, Florianópolis teve uma ocupação vicentista e açoriana e Lages apresentou uma população inicial formada por vicentistas. Com relação aos açorianos, afirma Furlan (1989) terem sido, em sua maioria, analfabetos. Acreditamos que esses indícios possam motivar a hipótese de que os resultados referentes à cidade de Lages apresentem um percentual mais elevado para o uso do presente do subjuntivo.

1.5 OBJETIVOS

Os seguintes objetivos direcionam a investigação acerca da variação entre presente do subjuntivo e presente do indicativo:

1. identificar variáveis independentes − linguísticas e extralinguísticas − responsáveis pelo condicionamento do fenômeno variável em estudo;

2. distribuir as variantes em análise em um continuum de modalidade;

3. buscar motivações diacrônicas para a variação e/ou mudança entre presente do subjuntivo e presente do indicativo nas cidades de Florianópolis e Lages, a partir da consulta a gramáticas históricas e da interpretação dos dados escritos dessas comunidades referentes às duas últimas décadas do século XIX e ao século XX;

4. captar, com base nos resultados da amostra diacrônica, o(s) contexto(s) de emergência e/ou expansão de uso do modo indicativo em construções normativamente previstas para o emprego do modo subjuntivo;

5. traçar o perfil do presente do subjuntivo (como definir o presente do modo subjuntivo e como explicar seu uso variável), a partir dos seus contextos de uso, tanto na amostra sincrônica quanto na amostra diacrônica de Santa Catarina; 6. realizar um mapeamento considerando o comportamento

variável entre presente do subjuntivo e presente do indicativo no português do Brasil, a partir da comparação dos resultados obtidos na tese com resultados de pesquisas com amostras de outras regiões brasileiras.

Esses seis objetivos seguem uma ordem em termos de abrangência. A identificação de algumas das variáveis independentes linguísticas responsáveis pelo condicionamento do presente do subjuntivo e do indicativo vai permitir distribuir ambas as variantes no

continuum de modalidade. Paralelamente, a verificação do

comportamento das variáveis extralinguísticas vai mostrar em que medida o fenômeno é sensível a condicionamentos externos. A forte associação entre o modo subjuntivo e a modalidade deôntica, submodo da modalidade irrealis, pode ser observada nas gramáticas históricas, que mostram como a morfologia de presente do subjuntivo e de presente do indicativo se encontra na história da língua portuguesa (cf. PIMPÃO, 2009); espera-se, no exame dos dados diacrônicos, perceber o movimento de emergência/expansão do modo indicativo no terreno do subjuntivo. Todo esse quadro vai oferecer elementos para traçar o perfil de uso do presente do subjuntivo em duas comunidades catarinenses, resultado que vai se somar aos de outras pesquisas realizadas no português do Brasil, contribuindo para uma descrição mais abrangente do comportamento desse fenômeno variável no português brasileiro.

1.6 FECHANDO O CAPÍTULO

Neste capítulo 1, cumprimos a primeira etapa desta tese: contextualizamos o objeto de estudo a ser investigado, destacamos as justificativas que motivaram o desenvolvimento desta pesquisa, delimitamos o objetivo de análise, descrevemos as duas hipóteses gerais e apresentamos os objetivos. O capítulo 2 trata dos referenciais de análise que norteiam a investigação do uso variável do presente do subjuntivo.

CAPÍTULO 2