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2 REFERENCIAL TEÓRICO

3.3.9 Os MON da Coda

No lócus Coda, foi identificada, em todas as realizações do padrão discursivo narrativo, uma grande variedade de MON, conforme o Gráfico 10.

Os MON E assim foi/E assim é até hoje predominam em frequência de ocorrência (22%), seguido pelo MON Conclusão (16%) e pelos MON Essa é minha

experiência/Essa foi uma das minhas experiências de estudante e E é o que sempre acontece, que empatam em frequência (11%). O MON Moral da História (7%) é o

próximo na ordem decrescente, seguido pelos MON Diz que, Então finda assim e Assim

aconteceu, cada um com 6% de frequência. Em último lugar, foram identificados os

MON Dizem que foi assim, Com nossos antepassados aconteceu assim e Assim acaba a

história, todos com 5%.

Gráfico 10: Os MON da Coda

No padrão discursivo Lendas, os MON identificados na Coda foram: Então

finda assim, Assim aconteceu, Dizem que foi assim, E assim é até hoje, conforme os

exemplos a seguir:

(64) [..] Quando chegou de volta, não agüentou e foi deitar na rede. No outro dia, sofrendo com muita dor, morreu. Os dois rapazes então viveram com a mulher desse homem que matou a mãe deles.

Daí para cá, eu nem sei contar mais essa história. Então, finda assim.

Fonte: Lenda/Corpus Lendas do Amazonas.

(65) [..] Foi atrás de remédio da mata. Trouxe e esfregou no olho do pai, espremeu na coroa da cabeça e em todas as juntas dos ossos dele. Mandou o pai voltar rapidamente na carreira, porque o caminho já estava cerrando.

O pai começou a voltar, mas o caminho já estava cerrado. A mata já tinha crescido e ele nem sabia mais o caminho por onde era. Seguiu na direção contrária de onde tinha vindo.

Assim aconteceu a história da arara misteriosa de nosso povo antepassado [...]

Fonte: Lenda/Corpus Lendas do Amazonas.

(66) [..] A velha Yushã Kuru animou-se. Aceitou o convite do seu genro e voltou para casa. Quando estava chegando em casa, bem na chegada, o pessoal, que já estava esperando, matou velha Fêmea Roxa. Dizem que foi assim.

Fonte: Lenda/Corpus Lendas do Amazonas.

(67) [..] Quando no outro dia deu uma base de oito horas, a mulher de Ixã olhou no caminho. De lá vinha um monte de gente, toda qualidade de peixes encantados de gente. Ela mandou eles subirem. E quando chegaram numa sala bem grande, que era a casa de antigamente, a mulher perguntou:

─ Quantas pessoas têm? Quem mais ainda vai aparecer?

Aquele monte de gente encantada que veio ajudar o filho dela no roçado desconfiou da mulher e saiu correndo. No que correram, a mulher agarrou o marido dela, que era encantado de sapo. Pedia para ele não ir junto.

Nessa hora, o marido virou uma mutuca bem azulzinha. Quando a mulher quis pegar o marido encantado, a mutuca escapuliu da mão dela. E assim é até hoje...

Fonte: Lenda/Corpus Lendas do Amazonas.

O MON Com nossos antepassados aconteceu assim sempre aparece na Coda das Lendas, quando já tem sido mencionado no Resumo, como se para reforçar a evidencialidade, conforme já demonstrado no fragmento (5). Repetimos o trecho da Coda no trecho abaixo:

(68) [..] O beija-flor saiu voando e cantando com o paneiro de algodão de Yawa. E conseguiu se sentar nos galhinhos bem fininhos. Os outros se enxugaram e se separaram também. Por isso, até hoje, os pássaros são separados. Com nossos

antepassados aconteceu assim.

Fonte: Lenda/Corpus Lendas do Amazonas.

Em todos os exemplos referentes ao lócus Coda, no padrão discursivo Lendas, observamos que há um pressuposto de que o interlocutor deve aceitar o fato narrado como algo que realmente aconteceu e da maneira como foi narrado. Essa é uma característica da evidencialidade relatada (AIKHENVALD, 2003, 2004), carregada de valores culturais e situacionais, da qual esses MON fazem parte. Em todos os MON, inclusive, encontramos presente o vocábulo assim, para reforçar que o fato relatado aconteceu tal como se contou. Vale destacar a posição no discurso desses MON, que ocorrem quase sempre no final da narração.

Nos Relatos de experiência, os MON identificados na Coda foram: Diz que,

Conclusão, Moral da História, Essa foi mais uma das minhas experiências de estudante/Essa é minha experiência.

No caso de excerto (69), o MON Diz que aparece como informação secundária (de fundo) no Relato de experiência oral que acontece em situação de diálogo.

(69) [...] aí munto... munto... alẽi de matare a pobizĩa ainda interraro... diz que no canto dela onde ficô interrada é PELADO PELADO.

Fonte: Relato de Experiência/Corpus Remanescentes Quilombolas.

Nas ocorrências (70) e (71), os MON Conclusão e Moral da História, que aparecem ambos em Relatos de experiência oral do Corpus Discurso e Gramática, cuja produção foi induzida a partir de uma entrevista oral, cumprem, além da função de

retornar ao presente para situar as decorrências do fato narrado, típica do lócus Coda, a de avaliadores da ação narrada, no caso, revelando a postura do narrador em relação ao fato relatado.

(70) [...]conclusão... moral da história... o som estava alto... eu botei uma música que não tinha nada a ver... e todo mundo parou de desfilar... e ficou olhando pra minha cara... [...]

Fonte: Relato de Experiência/Corpus Discurso e Gramática/RJ.

(71) [..] ... conclusão... a música já estava acabando... e eu tive que... que... sei lá... tive que... ver sozinho como é que fazia as coisas... [...]

Fonte: Relato de Experiência/Corpus Discurso e Gramática/RJ.

Os MON Essa foi mais uma das minhas experiências de estudante/Essa é

minha experiência, nas ocorrências (72) e (73), parecem ter uma motivação pragmática

decorrente da geração de dados no Corpus Discurso e Gramática, a saber: ao serem instados a produzir seus Relatos de experiência, os narradores são convidados a contar alguma experiência, boa ou ruim, que tenha acontecido e que tenha marcado a sua vida. É compreensível, portanto, que, ao atender ao convite, os narradores reforcem de alguma maneira que fizeram o que foi pedido pelo entrevistador. Assim, esses MON da Coda assumem uma função pragmática, motivada pelo processo interativo na produção do discurso, predominando na posição final da narração.

(72) [..] terminamos quebrando a porta pra poder o professor sair ... essa foi mais

uma das minhas experiências de estudante ...

Fonte: Relato de Experiência/Corpus Discurso e Gramática/Natal.

(73) [...] e nessa viagem eu aprendi que o bom mesmo ... o bom mesmo da vida é você realizar o que:: o que a sua alma ... o que o seu espírito ... o que você realmente quer ... sair ... deixar liberar ... aí a partir daí eu comecei né ... e eu agradeci a todo mundo sem vergonha de dizer que eu agradecia por eles existirem ... agradeci porque Deus permitiu que eles vivessem e que eles trouxeram uma experiência boa pra mim ... depois disso a gente veio pra casa ... depois a gente veio pra casa né e eu passei um:: um bom tempo sentindo a mesma alegria ... foi assim uma experiência ... assim ... extraordinária

e até hoje eu:: num esqueci e guardo pra mim essa experiência e espero que se repita mais vezes ... melhores do que essa e que todo mundo aprenda também a mesma coisa e que botem isso em prática ... essa é minha experiência [...]

Fonte: Relato de Experiência/Corpus Discurso e Gramática/Natal.

Nos Contos, os MON que apareceram na Coda foram: E é o que sempre

acontece e Assim acaba a história.

O primeiro MON, como mostra o fragmento (74) assume claramente também uma função avaliativa sobre o fato narrado, mostrando que o desfecho não é nenhuma novidade para esse tipo de fato, conforme o conhecimento de mundo do narrador. A repetição pode inclusive ter sido motivada por uma intenção de reforçar essa postura avaliativa. Vale notar que, nesse caso, o lócus de ocorrência da Coda difere do lócus proposto por Labov, havendo uma antecipação desses trechos da Coda em relação à Resolução, embora seja mantido o comentário final de que “E ainda hoje, mesmo colocada em caixa de vidro, a abelha tapa tudo com cera e não deixa ver fazer o mel...”.

(74) [...] Uma tarde, chegou um mensageiro avisando as três irmãs que sua mãe, muito doente, as mandava chamar, para abençoá-las antes de morrer. E a aranha falou assim:

— Diga à minha mãe que estou fazendo uns pontos difíceis; assim que terminar, lá chegarei.

E a cigarra falou assim:

— Diga à minha mãe que estou dando o terceiro psiu; assim que terminar, lá chegarei. E a abelha, no meio da grande faina, no trabalho da colméia falou assim:

— Filhos meus, parai e deixai tudo aí, até que eu volte; pois vou já ver minha mãe. E lá no seu leito, a moribunda sentenciou:

— Aranha, filha ingrata, nunca poderás terminar teu trabalho. Será ele sempre desfeito por alguém, principalmente pelas empregadas arrumadeiras.

E é o que sempre acontece.

— Cigarra, filha ingrata, cantarás, cantarás, até rebentar pelas costas.

E é o que sempre acontece.

— Abelha, filha boa, que tudo deixou por mim, os homens nunca saberão o segredo do fabrico do mel...

E ainda hoje, mesmo colocada em caixa de vidro, a abelha tapa tudo com cera e não deixa ver fazer o mel...

Fonte: Conto/Corpus Contos Brasileiros.

O segundo MON, no fragmento (75) limita-se simplesmente a reforçar o término da narração, sem qualquer comentário avaliativo. O uso do advérbio assim destaca a veracidade da narração em relação ao modo como tudo aconteceu.

(75) [...] todos se dirigiram a ele como o marido da mulher do piolho. Repetindo o que ele pensava ter sepultado. Assim acaba a história.

Fonte: Conto/Corpus Contos Brasileiros.

Da mesma maneira, os MON E assim foi/E assim é até hoje (76 e 77) não apenas reforçam o término da narração, como também destacam o modo como o fato aconteceu.

(76) [...] Yushã Kuru, a Fêmea Roxa, deu muitos conselhos e surgiram os remédios. Uns eram venenos para matar: olho forte, Beru Paepa . Mijo amargo, Isü Muka. Outro para coceira, Nui. A velha Fêmea Roxa observava bem as folhas e os pés das árvores:

─ Esse mato não é remédio forte.

E assim foi. Surgiram muitos remédios, todos os remédios que têm na mata.

Remédio bom que cura as pessoas. Bom para picada de cobra, picada de escorpião, aranha, reumatismo e fígado. [...]

Fonte: Lenda/Corpus Lendas do Amazonas.

(77) [...] Aquele monte de gente encantada que veio ajudar o filho dela no roçado desconfiou da mulher e saiu correndo. No que correram, a mulher agarrou o marido dela, que era encantado de sapo. Pedia para ele não ir junto.

Nessa hora, o marido virou uma mutuca bem azulzinha. Quando a mulher quis pegar o marido encantado, a mutuca escapuliu da mão dela. E assim é até hoje... [...]

Fonte: Lenda/Corpus Lendas do Amazonas