2 REFERENCIAL TEÓRICO
I: ] olha a minha história foi pra mim tinha/ eh acabou o mundo naquele dia eu estava no colégio era da quinta série na/nesse colégio mesmo escola
Mafalda... aí eu estava no colégio... era... aula de ciências... eu acho/ é... isso mesmo... aí depois veio uma inspetora... pediu pra mim descer... aí eu fui... desci [...]
Fonte: Relato de Experiência/Corpus Discurso e Gramática/RJ.
Os MON A história começa assim e Com nossos antepassados aconteceu assim aparecem apenas no padrão discursivo Lenda, no Corpus Lendas do Amazonas, e tem como função discursiva anunciar o fato que vai ser narrado.
No caso do MON A história começa assim, é interessante notar que, ao final da narrativa, esse MON vai ser retomado pela instanciação E assim é até hoje, o qual, como veremos adiante, tem a função discursiva de evidenciador.
(4) [...]O SAPO ENCANTADO
Tua Yuxibu é o sapo, o canoeiro, o que mais tem. Ele sempre canta no verão. Vai desovar na praia. E as pessoas comem este sapo.
A história começa assim: tinha um homem que ficou encantado de Tua Yuxibu. O nome
desse homem era Ixã.
Ixã caçava no mato e nunca encontrava a caça. Não matava nada! Os filhos começavam a chorar muito. Queriam comer caça. Ixã via as pessoas pegando aquele sapo e foi pegar também para poder comer. Ele fez isso umas cinco vezes. Um dos sapos se encantou numa pessoa e foi falar com ele:
[...]
Nessa hora, o marido virou uma mutuca bem azulzinha. Quando a mulher quis pegar o marido encantado, a mutuca escapuliu da mão dela. E assim é até hoje... [...]
O MON Com nossos antepassados aconteceu assim também aparece algumas vezes repetido na Coda, como se para reforçar a evidencialidade, conforme aconteceu na Lenda, transcrita parcialmente, a seguir:
(5) [...] História de um Homem muito Sovina
Com nossos antepassados aconteceu assim:
Era um homem chamado Yawa Xiku Nawa. Era só ele e a mulher dele. Não tinha nenhum filho. Yawa Xiku Nawa vivia só com sua mulher.
Os outros parentes não faziam mais roçado, não plantavam mais. Só comiam o que esse casal tinha.
[...]
Toda vez que sentava num pau, o galho quebrava com ele. Então, os outros pássaros pediram para ele se separar. O beija-flor saiu voando e cantando com o paneiro de algodão de Yawa. E conseguiu se sentar nos galhinhos bem fininhos. Os outros se enxugaram e se separaram também. Por isso, até hoje, os pássaros são separados.
Com nossos antepassados aconteceu assim. [...]
Fonte: Lenda/Corpus Lendas do Amazonas.
O tipo Uma vez ( a veis) aparece apenas nos Relatos de experiência do Corpus dos Remanescentes Quilombolas e seguindo o evidenciador Diz que. Note-se que a narrativa é feita em situação de diálogo com o entrevistador, entrecortada por longos trechos descritivos e por comentários. A função discursiva de Uma vez é chamar a atenção do interlocutor para o fato que vai ser narrado, no caso, a história encantada da menina que viu uma moça na janela e da pedra que virou uma casa. O tom lendário da narrativa é reforçado pelo uso dos MON evidenciadores diz que e uma vez, que eximem o narrador de assumir qualquer responsabilidade sobre o fato narrado e de fornecer dados temporais precisos.
(6) [...]Tẽi... agora peda incantada é no Arro/ é na/ na Canôa e tẽi essa peda incantada ... tẽi mermo/ teve ũa vêis que uns ameiricano viero aqui pa i nessa peda incantada ... mais o véio Ozéa de Freita quera o fie mais véi que morava aqui... agora que a peda é grande... o caba chega lá e de longe vê a peda... vai lá arrebolá ũa peda im riba puique lá é chei de peda... na Canôa... o sĩô sabe onde é a Canôa?
[...] Diz que ũa veis ũa minina de Raimundo de/ de Chico Raimundo de Freita viu ũa moça na janela... [...]
Fonte: Relato de Experiência/Corpus Remanescentes Quilombolas.
Na seção seguinte, veremos os MON que aparecem no Resumo (bom, olha, vou
contar/a história começa assim, uma vez, diz que), relacionando-os com realizações
diferentes do padrão discursivo narrativo e os corpora em que ocorrem.
3.3.2 Os MON típicos do Resumo nos diferentes PDN
Os MON que ocorrem no Resumo parecem especializar-se em diferentes realizações do padrão discursivo narrativo e, portanto, predominam em alguns corpora e em certas modalidades do discurso.
Gráfico 3: Padrões Discursivos e Marcadores do Resumo
Assim, as instanciações Diz que e Uma vez mostraram ser produtivas em Relatos de experiência oral e predominaram no Corpus dos Remanescentes Quilombolas. A
história começa assim e Com nossos antepassados aconteceu assim só foram
A construção Bom aparece no padrão discursivo Relato de experiência do
Corpus Discurso e Gramática de Niterói, tal como ocorre com a instanciação Olha, que
aparece no padrão discursivo Relato de experiência no Corpus Discurso e Gramática do Rio de Janeiro.
Nos dados examinados, constatamos que o MON Vou contar é bastante produtivo, aparecendo em mais de um padrão discursivo, ou seja, nos Relatos de experiência e nas Lendas, nos corpora: no Discurso e Gramática de Natal, de Niterói e nas Lendas do Amazonas.
No caso dos Relatos de experiência do Corpus Discurso e Gramática, isso se explica pela situação de produção da narrativa, ou seja, uma entrevista em que o entrevistador pede que o entrevistado (denominado informante) que conte uma história, o que poderia induzir, de certa forma, ao uso do MON vou contar pelo narrador (entrevistado), para anunciar a ação de narrar, com base na Orientação recebida. Eis algumas ocorrências:
(7) [...] E: está aqui comigo Aydano... informante de curso superior... morador de Niterói... e da Universidade Federal Fluminense... neste momento... Aydano... eu... gostaria que você narrasse para mim... uma história... que aconteceu com você... pode ser... qualquer história... triste... alegre... ou divertida ...
I: bom... vou contar uma história que aconteceu... nesse fim de semana... (né) é? que