• Nenhum resultado encontrado

No tocante ao fato de os Estados serem ou não potências nucleares, verifica-se que a China alega possuir um arsenal nuclear limitado, suficiente apenas para praticar sua política de dissuasão mínima e uso apenas em retaliação (“no first use”), focado atualmente na dissua- são da Índia e dos EUA, principalmente deste último. O país pode lançar essas armas por meio de aeronaves, foguetes baseados em terra e de submarinos lançadores de mísseis balísti- cos (SLMB), os quais constituem o principal trunfo contra a Superpotência, fazendo com que um possível conflito entre ambos dificilmente ultrapassasse o nível das armas convencionais, em que a China está se fortalecendo consideravelmente.

A Rússia é potência nuclear no nível dos EUA, dispondo de um grande arsenal, e não proclama, portanto, a dissuasão mínima, tampouco o uso apenas em retaliação. Em sua políti- ca nuclear alega dispor dessas armas para impedir pressões contra ela e seus aliados, bem co- mo para compensar deficiências da dissuasão convencional, podendo empregá-las se for leva- da a situações críticas, mesmo por ataques de armas não-nucleares, o que julga possível, por ser assumidamente inferior ao Ocidente nesse campo. A Rússia possui a capacidade de lançar armas nucleares por meio de aeronaves e mísseis, lançados de terra e de SLMB, tendo conse-

guido produzir mísseis capazes de penetrar o sistema de defesa dos EUA, o foco da dissuasão, atualmente.

A Índia já dispõe de armas nucleares desde 1998, com foco na dissuasão do Paquistão e da China, mas possui apenas vetores de lançamento terrestre e aéreo, o que considera séria desvantagem estratégica frente a Beijing, principalmente após a implantação da base chinesa de SLMB na ilha de Hainam, que, segundo os indianos, altera o equilíbrio estratégico no sul da Ásia. Assim, está envidando esforços para a obtenção de SLMB, o que fez com que o pri- meiro submarino de propulsão nuclear indiano, lançado ao mar em 2009 e ainda em testes, se- ja uma unidade desse tipo, e não um SNA.

O Japão não é potência nuclear por ser membro não-nuclear do TNP e por restrições (não-constitucionais) de seu Parlamento; mas já há discussões internas sobre a possibilidade de obtenção de tais armas para aumentar a capacidade dissuasória frente à Coreia do Norte, desde os testes nucleares desse país em 2006, considerando que a dissuasão dos EUA na área está diminuindo com a redução de seus meios navais, devido a restrições orçamentárias.

A Austrália e a Coréia do Sul não possuem armas nucleares, mas assim como o Japão, são protegidas pela dissuasão nuclear estendida pelos EUA contida nos acordos de aliança.

Constata-se, assim, que todos os países são protegidos por dissuasão nuclear, própria ou estendida.

Vê-se na tabela 4.5 que essa afirmação tem relação com o fato de todos os países te- rem inimigos poderosos (variável d), o que não inclui o Brasil, aspecto que certamente contri- buiu para sua situação única – não é potência nuclear e não possui qualquer proteção dissua- sória nuclear de outro Estado, como o Japão, a Coreia do Sul e a Austrália.

A indisponibilidade de armas nucleares é devida ao imperativo constitucional e à ade- são ao Tratado de Não-proliferação, em 1998, que os documentos da Defesa (PDN 2005, END e PAEMB) não podem reverter, ainda que a END afirme, tardiamente, que o País não aderirá a acréscimos ao tratado sem que as potências mundiais avancem no seu próprio de- sarmamento. (BRASIL, 2008, p. 25 item 5- d).

O caso pode ser enquadrado na leitura de Alsina, (2006, p.41§2 a 42§1) pela qual a a- brangência da atual arquitetura do sistema de segurança internacional combina multilateralis- mo e regionalismo, por meio das pressões dos EUA sobre os países relutantes em aderir aos regimes de não–proliferação de armas de destruição em massa e pela reformulação dos siste- mas regionais de segurança, impondo limitações à autonomia decisória dos Estados nesse campo e estreitando as margens de manobra para definições nacionais de políticas de defesa

192 por parte dos países em desenvolvimento, privando-os, principalmente, dos únicos instrumen- tos de equalização estratégica – as armas de destruição em massa.

Tal circunstância tende a consolidar o abismo por ele apontado, entre tais Estados e os desenvolvidos, cuja transposição, no caso do Brasil, é uma das metas da Estratégia Nacional de Defesa. (BRASIL, 2008, p.1§2)

Pelo processo acima exposto, o Brasil aderiu ao Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis (MTCR-1994), ao Tratado de Tlatelolco, que proscreve armas nucleares na América Latina (1994) e, como último passo na autolimitação da defesa, ao Tratado de não- Proliferação de Armas Nucleares (TNP - 1998). (CERVO, 2008, p.143§2 e 3)

A adesão do Brasil ao TNP foi classificada por Bernal-Meza como contradição políti- ca, por dificultar a pretendida ascensão ao nível de potência média. (BERNAL-MEZA, 2002, p.44§1 a 4). Acrescente-se também que essa situação pode acarretar posicionamento subalter- no na possível admissão, como membro permanente, a um Conselho de Segurança da ONU reformado, mas politicamente estratificado entre membros nucleares e não-nucleares. (PICARD, 2006, p.12§6 e 8; p.91§8)

Ao contrário do Brasil, a detonação de artefatos nucleares e a declaração de sua nova condição de potência nuclear feita na mesma ocasião, em 1998, foi a forma empregada pela Índia para dar o salto para o primeiro mundo no campo militar.

Militarmente, a situação brasileira implica uma desvantagem de partida, na compara- ção com os outros Estados. A não-disponibilidade de armamento nuclear significa a falta de uma capacidade de dissuasão punitiva forte, que possa manter eventuais conflitos no nível convencional e impedir pressões ou chantagens que envolvam ameaças nucleares. Sabe-se que, apesar das fortes restrições políticas ao emprego de tais armas que caracterizam para al- guns o “tabu nuclear” já comentado, elas constituem o mais temível instrumento disciplinador (FREEDMAN, 2005, p.121§1) e continuam sendo aperfeiçoadas, inclusive, no caso da Fran- ça, para emprego contra países em desenvolvimento (PICARD, 2006, p. 13§4).