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A tabela 4.3 apresenta as condições políticas e estratégicas (variáveis independentes) dos Estados, os quais são agrupados segundo suas opções em termos de combinações estraté- gicas navais (variáveis dependentes). Além disso, como os submarinos – o foco deste estudo – tanto nucleares como convencionais, têm empregos típicos se o Estado for atacante ou ataca- do no paradigma da Guerra de Litoral, ou se ele se prepara para estratégias da Guerra Naval tradicional, eles são vinculados a essas opções em termos de tipos e quantitativos, também expostos.

174 Os Estados foram agrupados por opções estratégicas navais a fim de orientar a análise que se segue, cujo propósito consiste em fornecer dados para a seleção dos casos comparáveis com o do Brasil, como preconizado por Lijphart (1971, p. 687 item (3); p.684§2).

Os quantitativos de submarinos apresentados na tabela 4.3 são os existentes atualmen- te (2011), como exposto nos subtópicos do tópico 4.2.

A principal informação da tabela 4.3 é a proporcionada pelo Método Direto de Con- cordância de Stuart Mill em relação às variáveis “B” – a prática sistemática do intervencio- nismo, e “D” – a existência de inimigo potencial muito poderoso, evidenciando uma dicoto- mia perfeita entre os conjuntos AOTR, ATDO e TRAD e os conjuntos AETR e ATTE. (STUART MILL, 2011)

Os primeiros são os “não-atacantes” – que não são intervencionistas e têm inimigo po- tencial poderoso (B=0 e D=1); e os outros são os que possuem a opção “atacante” como estra- tégia componente ou exclusiva – que são intervencionistas e não possuem inimigo potencial poderoso (B=1 e D=0). Os últimos, cabe destacar, são todos membros da OTAN e da U.E, com a única exceção do Canadá, que só é membro da primeira organização.

Estados Condições Políticas e Estratégicas Opções Estratégicas Submarinos A B C D E F G H I TOTAL SLMB SNA SC China 1 0 0 1 1 0 0 1 1 AOTR 60 2 5 53 Japão 0 0 1 1 1 0 1 1 1 AOTR 18 0 0 18 Austrália 0 0 1 1 1 1 1 1 0 AOTR 6 0 0 6 Rússia 1 0 0 1 0 1 1 1 1 ATDO 61 15 25 21 Índia 1 0 0 1 1 0 1 1 1 TRAD 18 1 1 16 Coreia 0 0 1 1 1 0 0 1 1 TRAD 13 0 0 13 Alemanha 0 1 1 0 1 0 0 1 0 AETR 16 0 0 16 França 1 1 1 0 1 0 1 1 1 AETR 10 4 6 0 R.Unido 1 1 1 0 0 0 1 0 1 AETR 11 4 7 0 Espanha 0 1 1 0 1 0 0 1 1 AETR 4 0 0 4 Itália 0 1 1 0 1 0 0 1 0 ATTE 7 0 0 7 Canadá 0 1 1 0 0 0 1 0 1 ATTE 4 0 0 4

Tabela 4.3 – Condições políticas e estratégicas e opções estratégicas

Essa dicotomia também destaca a flagrante superioridade do primeiro grupo no núme- ro de submarinos, principalmente convencionais, assinalando a prioridade do emprego desses meios em estratégias defensivas sobre as ofensivas. O fato é natural, pois ainda que a moderna tecnologia os tenha brindado com poderosas armas de projeção de poder, principalmente os nucleares, eles continuam sendo os meios preferenciais nas ações de negação do uso do mar

defensivas, cujas táticas exigem considerável número de unidades, principalmente os SC, e constam principalmente de patrulhas estáticas nas proximidades das áreas de passagem de forças inimigas. A Austrália, com seus seis grandes SC, é a exceção que confirma a regra, pois planeja dobrar esse número.

Observa-se, também, entre os que incluem a postura do atacante na opção, que os que dispõem de SNA não dispõem de SC, o que não acontece no conjunto restante (os AOTR, ATDO e TRAD), em que todos, mesmo os que possuem SNA, dispõem também daqueles meios. Nestes últimos, o fato indica a consagração de dispositivos defensivos que empregam os dois tipos de submarinos.

Nos primeiros, o pequeno número de SNA/SC indica a ênfase nas operações multilate- rais – como se deveria esperar de países da OTAN/U.E. – onde cada um pode contribuir com poucas unidades para a formação das forças, e essas contribuições podem ser escolhidas, normalmente segundo o status político do país na organização – aspecto em que a disponibili- dade de SNA traduz clara estratificação em favor do Reino Unido e da França70. Reflete tam- bém o baixo ou nulo número de perdas esperadas, em face de as operações típicas – interven- ções – serem sempre projetadas com forte dissimetria favorável, onde se destacam os SNA e SC modernos dos vários membros da coalizão, capazes de projetar poder ocultamente e com grande profundidade no território inimigo; e sua fraca ou nula oposição, normalmente forças de um único país em desenvolvimento.

A dicotomia ilustra também a estrutura de defesa da União Europeia, recém- desenvolvida em conjunto com a OTAN, que implementa um conceito de segurança e defesa intervencionista – preparando as forças dos países membros para intervenções (FRANÇA, 2008, p. 32 item 5. “Intervention”) – baseado em elevados princípios, como o cumprimento a resoluções da ONU, o combate ao terrorismo, a estabilização de regiões desestabilizadas por Estados falidos e a “responsabilidade de proteger”, como se depreende da leitura dos docu- mentos estratégicos de seus principais membros (França e Reino Unido). (FRANÇA, 2008, p. 6§3, p.18§2 a 5, p.20 item1; UNITED KINGDOM, 2008, itens 4.10, 4.30, 4.37 a 4.40; UNITED KINGDOM, 2010, p.12 item 6, p.17 itens 2.10, 2.12 e 2.15)

O conceito é voltado principalmente para os países em desenvolvimento da África (ex- colônias) e Oriente Médio, considerados ameaçadores por poderem perturbar a estabilidade e dispor de mísseis e armas de destruição em massa no futuro próximo, parecendo mais um em-

70

A disponibilidade de SNA capazes de lançar mísseis de cruzeiro de longo alcance (“Tomahawk”) impõe certa superioridade política do Reino Unido sobre a França, o que durará até o “missile de croisière naval” (MDCN - míssil de cruzeiro naval), francês e em final de desenvolvimento, se tornar operacional.

176 prego da Ética a serviço da Política como aplicação da Doutrina da Harmonia de Interesses de Carr (1981, p.52§2), ou uma simples reedição do Colonialismo, como servem de exemplo a intervenção do Reino Unido em Serra Leoa em 1999, a da França na Costa do Marfim em 2011, e da OTAN na Líbia em 2011. (ROBERSON, 2007, p.17-20; WILLIS, 2011; BHADRAKUMAR, 2011; WESTERVELT, 2011)

Aplicando-se o método da concordância direta de Stuart Mill (2011) no primeiro gru- po (AOTR), verifica-se que essa opção estratégica tem relação com a ausência do interven- cionismo (B=0); com a existência de um inimigo potencial muito poderoso (D=1), com a grande dependência de petróleo importado (E=1); e com a preparação do Poder Naval para a operação em teatros restritos (H=1).

Observa-se também nesse grupo a relação lógica entre o fato de a Austrália não se preparar para operar em teatros amplos (I=0), com o menor número de submarinos (6) que possui, sensivelmente menor que os da China e do Japão, que se preparam para tais teatros (I=1).

Passando ao segundo grupo, integrado unicamente pela Rússia, verifica-se que a única diferença para o primeiro, quanto às quatro variáveis acima citadas, é a sua não-dependência em relação ao petróleo importado (E=0). Assim, aplicando-se ao caso o Método da Diferença de Stuart Mill, verifica-se a relação dessa circunstância com a ausência da componente tradi- cional na opção estratégica russa, que é voltada exclusivamente para as estratégias de atacado (ATDO). A relação é lógica porque a dependência de energia importada produz motivação para a proteção das linhas de comunicações marítimas (LCM).

Cabe observar, entretanto, que essa é uma situação transitória, motivada pela disponi- bilidade doméstica de energia e pela baixa capacidade em meios de superfície oceânicos, pois os poucos existentes são antigos, e as prioridades consideradas no atual programa de recons- trução do Poder Naval não contemplam sua renovação por hora, esperando-se que, quando os meios necessários ao adequado cumprimento das estratégias do atacado atingirem níveis satis- fatórios, a Rússia volte suas atenções para a renovação daqueles meios, com vistas à recupe- ração de seu status como potência naval mundial, defendendo seus interesses não só nas águas litorâneas como nas oceânicas, passando então a integrar o conjunto AOTR. (KRUPNOV, 2006, p. 50§2 a 51§3; p. 63§3)

Na atual fase de reconstrução de seu sistema de defesa, a Rússia concentra esforços na recomposição do “núcleo duro” de SNA e SC, com prioridade apenas inferior à da dissuasão nuclear. A importância desses aspectos é evidenciada pelo elevado número de SLMB, SNA e SC, cabendo acrescentar que mesmo para esses meios o país está enfrentando dificuldades na

renovação, o que é demonstrado pelo pequeno número de unidades novas atualmente (dezem- bro de 2011) construídas – dois SC, um SLMB e um SNA, dos quais apenas os SC foram co- missionados. Todos os demais foram projetados, e na maioria comissionados, ainda durante a Guerra Fria, deduzindo-se que a presente fase ainda vai se prolongar consideravelmente.

No caso da Rússia, o elevado número de SNA é relacionado não só com a extensa fronteira marítima (G=1), que provoca certa pulverização dos meios, e com as importantes á- reas jurisdicionais (F=1), mas também com a atenção à dissuasão nuclear (A=1), porque a se- gurança dos SLMB exige alguns SC e SNA para proteção, face à existência de inimigos po- tenciais poderosos (D=1), que incluem a Superpotência.

Passando ao terceiro grupo, cabe notar que as únicas diferenças entre a Rússia e a Ín- dia são os valores dicotômicos das variáveis E e F, onde o método conjunto de concordância e diferença de Stuart Mill evidencia as relações com as opções estratégicas desses países.

A Rússia, como já comentado, não é dependente de petróleo (E=0), fator que reduz a motivação para dedicar-se às estratégias tradicionais, e possui áreas jurisdicionais marítimas de grande importância (F=1), fator que aumenta a motivação para adotar estratégias do ataca- do. A Índia, ao contrário, é muito dependente de petróleo importado (E=1), o que aumenta a motivação para a adoção de estratégias tradicionais, e suas águas jurisdicionais não são de grande importância (F=0), o que reduz a motivação para a adoção de estratégias do atacado.

Assim, coerentemente, a Rússia implementa a reconstrução de seu poder naval dando grande prioridade às estratégias do atacado (ATDO) e a Índia pratica exclusivamente estraté- gias tradicionais (TRAD). Neste aspecto, estas observações também atingem a Coreia do Sul, o outro componente do terceiro grupo, ainda que esse país tenha mais duas diferenças para com a Rússia, irrelevantes para o caso – a pequena fronteira marítima (G=0) e o fato de ser a- liada dos EUA (C=1).

Cabe notar que a orientação das análises proporcionada pelas variáveis do presente modelo permite, por vezes, levantar aspectos subjetivos relevantes. Assim, vê-se que a dife- rença de opções entre a Índia e a Rússia, devida aos fatores acima expostos, também é, certa- mente, influenciada pelas dissimetrias desfavoráveis a que estão submetidas – um aspecto subjetivo relacionado à variável D – porque, apesar de ambos os Estados terem inimigos po- derosos (D=1), a dissimetria enfrentada pela Rússia, cujo inimigo poderoso são os EUA e a OTAN, é bem mais grave que a da Índia, cujo inimigo mais poderoso é a China.

Cabe observar que apenas a Rússia, a China e a Índia não possuem vínculos de aliança com os EUA (C=0), sendo que os dois primeiros são seus inimigos potenciais. A Índia, ao contrário, recebe algumas vantagens dos EUA pois, ainda que não tenha tais acordos, que os

178 envolveriam diretamente em sua defesa, tem a China como inimigo potencial, exercendo opo- sição a ela no Índico, o que é positivo para os norte-americanos.

Os países do quarto e do quinto grupos, cujas opções estratégicas incluem a de atacan- te, têm em comum, além da política intervencionista (B=1) e da ausência de inimigos potenci- ais poderosos (D=0), já citadas, as condições de aliados dos EUA (C=1) e a pequena impor- tância de suas águas jurisdicionais (F=0).

A Itália e o Canadá, componentes do quinto e último grupo, não assinalam dedicação de forças a estratégias tradicionais, dedicando-se exclusivamente à postura do atacante (ATTE). A Itália assim procede porque a proteção de suas linhas de comunicações marítimas no Mediterrâneo, como as de outros países, entram no contexto de sistemas de proteção da U.E., sendo um problema praticamente resolvido; além disso, considera o terrorismo como principal ameaça, o que não é incumbência só da Marinha, mas de outras agências do gover- no, e as forças navais europeias, incluindo a italiana, têm como foco o controle das “bordas”, ou seja, do Norte da África, empenhando, além disso, forças em operações de Paz no Oriente Médio. O Canadá, por sua vez, tem forças navais preparadas apenas para projeção de poder em coalizão com marinhas mais poderosas (basicamente a norte-americana), e a proteção de suas linhas de comunicações marítimas está incluída no NORAD, em que os EUA têm papel primordial e a ação de forças canadenses não é relevante, mas principalmente constabular.