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2 UMA INTERPRETAÇÃO PARA OS PARQUES TECNOLÓGICOS

2.3 COMO A LITERATURA TRATA DOS PARQUES TECNOLÓGICOS

Como mencionado, os parques tecnológicos são um objeto estranho à economia, pois ele não se encaixa as suas categorias padrão, e não possui um resultado objetivo, o que o impede de ser quantificado em uma análise de custo-benefício padrão. Provavelmente por isso, muito da discussão sobre parques tecnológicos não se dê dentro da disciplina de economia, mas sim nas áreas administrativas – historicamente mais preocupadas com questões que a economia ignora. Nesse sentido, o tratamento dado à discussão dos parques tecnológicos parte de diferentes pressupostos com diferentes abordagens ao longo dos anos.

Henriques e outros (2018) fizeram uma revisão bibliográfica sobre o tema, analisando 56 artigos científicos, em que a maioria aplicou estudos empíricos (76%), metade deles em economias maduras (46%) da Europa e da Ásia (aproximadamente 90%). Esse estudo motivou uma reflexão acerca dos diferentes olhares utilizados para analisar os parques. Por exemplo, muitos dos estudos discutidos até aqui tratavam de questões mais abertas e se dedicavam a narrar a experiência, em especial dos parques pioneiros. Isso porque se tratava de uma experiência sem paralelo e que precisava ser compreendida. Os estudos de Saxenian (1983) e Dorfman (1983) são bastante característicos nesse sentido. Tal metodologia também foi aplicada em Kenney e Von Burg (1999), Park (2001), Link e Scott (2003a), Liu (2006) e Fukugawa (2006), entre outros. Ela traz consigo esse esforço de compreensão do objeto e reforça seu caráter diverso e um esforço de identificar padrões passíveis de análise.

As narrativas são usadas para organizar elementos dessa experiência diversa, identificando-a como elemento capaz de transportar as qualidades identificadas nos modelos de referência de crescimento. Assim, elas identificam o espírito empreendedor de alguns atores (e.g. SAXENIAN, 1983), personificando um símbolo do capitalismo americano, ou o

82 Importante mencionar que os dois tipos de redes podem possuir (e provavelmente possuam) hubs. O detalhe é a atuação do parque como um elemento de interação entre diferentes agrupamentos (clusters), diminuindo as distâncias da rede como um todo. Para mais detalhes sobre análise de redes ver Barabási (2019).

planejamento e organização identificado como aspecto cultural por de trás do sucesso japonês (NELSON, 1993). Contudo, a metodologia também abre a possibilidade para que o mesmo exercício seja feito no sentido contrário. Por exemplo, Macdonald e Deng (2004) apontam que os parques tecnológicos teriam reforçado um mito em torno da proximidade, sugerindo que os únicos beneficiados por essa política foram os proprietários imobiliários, as instituições receptoras e os fazedores de política. A respeito desses últimos, os autores ressaltam que políticos teriam um instrumento de fácil entendimento para lidar com um objeto complexo como a inovação, mas ainda preso a uma visão linear dela. De fato, várias críticas começam a surgir, depois dos anos 1990, refletindo muito das frustrações das políticas industriais anteriores.

A política passa a ser cobrada sobre quais resultados ela é capaz de entregar – já que nenhum parque planejado se tornou o Silicon Valley. Amirahmadi e Saff (1993) apontam que muitas expectativas foram depositadas nos parques além das condições objetivas desse instrumento; Gower e Harris (1994) falam que os parques só sobrevivem por causa do ambiente artificial criado em torno deles, incapazes de criar capacidade endógena de reprodução e evolução. Felsenstein (1994) não identificou nenhum comportamento inovador diferenciado em firmas localizadas nos parques, embora tenha encontrado alguma interação com as universidades. Westhead (1997) não identificou diferenças em P&D, ou mesmo maiores níveis de difusão tecnológica, entre empresas internas e empresas externas ao ambiente do parque. Um desenho dominante nas metodologias mais recentes é de identificar diferenças entre as firmas localizadas dentro e fora de parques tecnológicos.

Os artigos a partir dos anos 2000 buscam diferentes métricas e justificativas para identificar se os parques são capazes induzir o surgimento de super-firmas de alta-tecnologia. Siegel e outros (2003) apontam que os resultados obtidos são muitas vezes negligenciáveis e que isso seria devido a estimativas imprecisas dada a variabilidade dos parques. Chan e outros (2009) argumentam que isso também pode ser consequência dos diferentes níveis e tipos de trocas de conhecimento que pode embaralhar os resultados. Já Henriques e outros (2018) reforçam o argumento de Amirahmadi e Saff (1993) de que foram criadas muitas expectativas em torno dessa política.

As pesquisas que fazem uma avaliação dos parques tecnológicos já contam com mais de trinta anos. Apesar da política ser bastante diversa e aplicada em diferentes países, com diferentes níveis de estrutura e capacidades, há vários resultados que podem ser agregados de forma a produzir um entendimento maior. Aqui, foi feito um esforço inicial de identificar alguns fatos estilizados sobre a política.

Esse esforço é sintetizado no Quadro 4 (a seguir), em que estão expostos alguns resultados pesquisados em diferentes trabalhos foi identificado (“+”), ou não (“- “) pelo estudo. Além da possibilidade do resultado ser inconsistente (“+- “). Para tanto, foram utilizados uma coletânea de estudos identificado em uma pesquisa do termo “Science Park” em plataformas de pesquisa 84. A coletânea de artigos não foi restrita a essa pesquisa,

adicionando artigos por meio de referências, ou retirando, quando considerado que os artigos não cumpriam requisitos de rigor, ou não tratavam de uma avaliação sobre os parques tecnológicos. Os estudos também não estão classificados por metodologia de análise, mas, sim, por uma categoria de visão sobre a política: mais positiva, negativa ou de (aparente) neutralidade. Esse entendimento foi extraído da leitura dos textos e contém arbitrariedade e não afeta as interpretações, servindo mais como uma maneira de melhorar a visualização do quadro.

Quadro 4 – Resultados identificados na literatura

Resultados Visões

Positiva Neutra Negativa

Interação Universiade- Empresa Henriques e outros (2018) + Ferguson e Olofsson (2004) + Dettwiler e outros(2006) + Bakouros e outros (2002) + Vedovello (1997) + Phillimore (1999) + Felsenstein (1994) + Van Dierdonck e outros(1991) + Quintas e outros (1992) - Interação Parque-Empresa Vedovello (1997) + Phillimore (1999) + Quintas e outros (1992) -

Proximidade não é tão relevante

Vedovello (1997) + - Van Dierdonck e

outros (1991) + Macdonald and Deng

(2004) + - Interação entre empresas

dentro do parque

Colombo and Delmastro (2002) + - Phillimore (1999) +- Van Dierdonck e outros (1991) + - Conexões Informais Vedovello (1997) + Dettwiler e outros(2006) + Bakouros e outros(2002) + Phillimore (1999) + Quintas e outros (1992) - Participação em pesquisa conjunta Fukugawa (2006) + Bakouros e outros (2002) - Aumento da taxa de crescimento das firmas

Colombo and Delmastro (2002) +

Ferguson e Olofsson (2004) + - Löfsten e Lindelöf (2001) + Empresas se tornam mais

inovadoras

Lamperti e outros (2017) + Squicciarini (2008) +

Felsenstein (1994) - Westhead (1997) + - Melhora P&D das firmas Lamperti e outros(2017) + Yang e outros(2009) + Westhead (1997) - Criação de empregos Löfsten e Lindelöf (2001) +

Ferguson e Olofsson (2004) - Significantes taxas de

sobrevivência

Ferguson e Olofsson (2004) + - Henriques e outros(2018) + Fonte: Elaboração própria (2020)

É possível identificar dois grandes grupos de análise, um centrado na interação, outro centrado no comportamento das firmas. O segundo, reflete esse entendimento de que os parques tecnológicos funcionam como “esteroides” para a firma localizada nele. Enquanto o primeiro está mais relacionado com a ideia de que o parque cumpre um papel de hub (ANNERSTEDT, 2006), ou de criar conexões entre os atores da sociedade.

O que fica claro no Quadro 4 é que os resultados são positivos em relação ao aumento de interações, mas não há clareza a respeito do tipo de interação. Em particular, a interação

universidade-empresa parece mais consensual. Os resultados do grupo que comparam firmas, apresentam resultados mais controversos, inclusive porque essas são métricas mais objetivas e firmas compreendem um universo mais diverso (vide discussão do primeiro capítulo). Apesar de haver poucos resultados indicando que o resultado não foi identificado (“-“) – a maioria dos casos é de resultados identificados (“+”), ou de ser inconsistente (“+-“) - essa catalogação aponta em favor das interações como elemento mais perceptível da política. Embora não esteja claro como essas interações se deem. Inclusive, há esse esforço de identificar se isso se dá pelos diferenciais das firmas. Algo que é mencionado por Sigel e outros (2003) é a possibilidade de que as interações não se deem de uma forma única, sendo não identificáveis de forma independente, mas, somente, no todo (no sistema).