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O BRINCAR COMO TRANSFORMADOR DO AMBIENTE 2.1 O papel do ambiente na hospitalização da criança

2.2. O brincar e a hospitalização 1 Por que as crianças brincam?

2.2.2. Como o brincar pode ajudar na hospitalização?

Oliveira (1997) observou a importância no brincar na fala das crianças hospitalizadas, que reclamam do hospital como um lugar em que não podem ser crianças. A interdição do brincar causa grande infelicidade, além de ser o meio pelo qual elas compreendem o que está a sua volta e expressam suas idéias e sentimentos. Pelo brincar elas expressam o medo da desintegração física, da morte, da dor relacionada a diferentes procedimentos; assim como a saudade que sentem de seu ambiente, amigos e familiares queridos. Para a criança, o hospital, os médicos e outros profissionais que dela se ocupam são legais, considerados amigos, quando conseguem brincar com ela. Junqueira (2003) comenta que, questionadas sobre o que gostariam de fazer no hospital, 78% delas apontaram o brincar em suas respostas.

De acordo com autores como Oliveira (1997), Junqueira (2003) e Mitre (2004), além de permitido e valorizado, o brincar no hospital deveria ser mesmo estimulado, como fator de saúde na vida da criança. Junqueira (2003) aponta que o brincar humaniza o espaço hospitalar, por permitir momentos de descontração e diversão em meio a uma realidade de dor e sofrimento, tranqüilizando a criança e aumentando seu sentimento de segurança.

Os momentos de bem estar são fundamentais para a qualidade de vida das crianças hospitalizadas, o que também aparece no pensamento de Barros (2004), que considera que os momentos bons, de riso e alegria, permitem que a criança não perca os sentimentos de esperança e autoconfiança que vem construindo desde o nascimento, e que continue a acumular dados positivos à respeito da vida. Na experiência da autora, um dos problemas da hospitalização na infância é a banalização do sofrimento: a criança vive o presente, e quando não vivencia boas experiências, perde a esperança e passa a acreditar que não há mais nada na vida, aumentando a depressividade reativa à situação.

Nesse sentido o brincar, por ser uma experiência natural e cotidiana, é uma possibilidade para a criança de recuperar parte de sua vida pré-hospitalização, além de favorecer a interação com os outros e com o novo ambiente (Junqueira, 2003).

O brincar possibilita a expressão de sentimentos por parte da criança e também a relaxa para a realização dos procedimentos, facilitando a atuação de médicos e enfermeiras: ao experimentar ativamente através da brincadeira, ela adquire um certo grau de controle sobre as situações a que será submetida. Isso pode acontecer por que, através de jogos simbólicos, o que é vivenciado em relação à realidade externa pode ser assimilado à realidade interna da criança, que se apropria da situação de adoecimento e hospitalização, podendo ser mais ativa em relação ao tratamento (Junqueira, 2003).

Em relação à atividade simbólica, a autora comenta ainda que, ao ser facilitada pelo brincar, possibilita a elaboração do que a criança vivencia no hospital, transformando sua relação com o ambiente e melhorando suas condições psicológicas (Junqueira, 2003). Em seu trabalho sobre a recreação no hospital, Sikileno, Morselli e Duarte (1997) trazem também a questão do brinquedo como recurso de educação e saúde, pelo qual a criança pode elaborar as angústias nela mobilizadas pela situação de hospitalização, que causa desconforto e estranheza.

O brincar no hospital traz também benefícios para o vínculo da mãe com a criança, o que é fundamental, uma vez que esta representa uma base, um ponto de apoio para o filho no enfrentamento da situação. As mães, que também se angustiam com a situação, sentem-se fortalecidas ao perceberem aspectos saudáveis no filho, uma vez que o brincar é significado por elas como sinal de saúde, e podem então funcionar melhor como continente das angústias do mesmo (Junqueira, 2003).

As angústias infantis sobre o adoecimento e a hospitalização são bastante acentuadas por suas fantasias. Quando a criança se expressa livremente pelo brinquedo, por desenhos ou com o material de artes, é mais fácil perceber quais são as áreas em que ela apresenta maiores preocupações ou conflitos, o que a está mobilizando mais na situação que está vivendo, quais as idéias mal compreendidas ou distorcidas pela fantasia que estão intensificando sua angústia (Plank, 1976).

Podendo compreender os conteúdos que angustiam a criança, é mais fácil para que o profissional de saúde possa tranqüilizá-la, conversar com ela sobre seus medos, esclarecer suas dúvidas, o que também se mostra mais fácil através do recurso do brinquedo. Ela se sente mais livre para falar de seus sentimentos através da brincadeira, e compreende melhor o que está acontecendo se o adulto também é capaz de brincar, explicando o que está acontecendo com ela através de bonecas, outros brinquedos ou desenhos (Plank, 1976).

Além disso, pelo brincar, a criança atua suas angústias, medos, fantasias, podendo elaborá-las. Inclusive, ela chegará a algum grau de elaboração, dando uma solução às suas dificuldades, mesmo sem a ajuda do adulto. O jogo atua de forma profilática, e se à criança é permitido jogar livremente, “falando” pelo brincar de seus sentimentos em relação à experiência de adoecimento e hospitalização, menos traumatizada ela ficará por essas experiências (Plank, 1976).

As crianças que mais intensamente vão precisar da intervenção do adulto a fim de elaborar suas dificuldades emocionais vão ser aquelas que têm dificuldade de brincar

livremente: são as que se encontram muito inibidas, paralisadas pelo medo da situação, as que reagem tornando-se hiperativas, de forma que não conseguem “entrar na brincadeira”, as que se mostram muito agressivas, que recusam o brinquedo e a comunicação, entre outras. O primeiro passo, com essas crianças, é restabelecer sua capacidade lúdica (Plank, 1976).

Sobre isso, Winnicott (1975) já dizia, a respeito da criança em terapia, que “onde o brincar não é possível, o trabalho efetuado pelo terapeuta é dirigido então no sentido de trazer o paciente de um estado em que não é capaz de brincar para um estado em que o é” (p.59). A opinião do autor é compartilhada por Aberastury (1992), que também acredita que a inibição do brincar, o brincar repetitivo ou estereotipado é indicativa de questões psicopatológicas na infância. Para que possa se expressar e elaborar suas angústias, medos e sentimentos conflituosos a criança precisa ser capaz de brincar criativamente, mesmo estando no hospital.

CAPÍTULO III

NATUREZA DO PROBLEMA E MÉTODO