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CAPÍTULO 3: O REGIME LEGISLATIVO DO SETOR SIDERÚRGICO: UMA ABORDAGEM NORMATIVO-TEÓRICA

3.2. Competência legislativa em matéria ambiental

Competência é o poder de ação e de atuação, envolvendo, por conseguinte, a atribuição de determinadas tarefas, bem como os meios de ação necessários para a sua efetivação. Dentro de um Estado soberano, a distribuição de competência pode ocorrer de forma centralizada, ou mediante modelos que contemplem a descentralização política, como no sistema federativo, no qual ocorre a divisão de atribuições entre os entes no espaço territorial.

3.2.1. Competências constitucionais na Federação brasileira

De acordo com a doutrina clássica, Estado Federal é aquele que tem seus alicerces calcados na premissa de descentralização política, caracterizando-se pela existência de dois níveis de poder, o central, representado pela União, e o poder federado, pelos Estados- membros. Para Mouskheli (1981, p. 149) o que caracteriza o Estado Federal é a existência, no mesmo território, de dois grupos de governantes: os centrais e os locais, correspondendo os primeiros ao Estado Federal, e os segundos, aos Estados-membros. Define-os do seguinte modo:

O Estado federal é um Estado que se caracteriza por uma descentralização de forma especial e de grau elevado que se compõe de coletividades-membros dominadas por ele, mas que possuem autonomia constitucional bem como

participam da formação da vontade federal, distinguindo-se desta maneira de todas as demais coletividades públicas inferiores.

O Estado Federal brasileiro, desprezando a técnica pura do federalismo, está constitucionalmente cunhado como a união indissolúvel dos Estados, Municípios e Distrito Federal (art. 1º). Como se infere do texto constitucional, restou estabelecido um terceiro nível de poder representado pelos municípios. Para Silva (2002, p. 106), no entanto, o Município é um componente da federação, mas não entidade federativa.

O quadro de competência desenhado pela Constituição da República define as atribuições conferidas a cada ente federado, com ênfase no que se convencionou chamar de federalismo cooperativo. Observada tal premissa, a Carta Magna distinguiu as competências dos entes federativos.

No tema meio ambiente, foram distribuídas competências administrativas comuns à União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 23, CF/88) e competências legislativas concorrentes à União, aos Estados e Distrito Federal (art. 24, CF/88). Deve ser observado, no entanto, que a previsão do art. 30 da Constituição da República, que atribui competência legislativa aos Municípios para disciplinar os assuntos de interesse local, termina por criar uma hipótese de competência concorrente ou residual, conforme o caso. Recorde-se ainda que os Municípios podem suplementar a legislação federal e estadual (art. 30, II, CF/88).

Nessa ordem de idéias, a Constituição da República atribui competência legislativa concorrente à União, aos Estados e ao Distrito Federal para questões relativas ao meio ambiente natural e cultural (art. 24, VI e VII, CF/88). Assim é que, no âmbito da legislação concorrente, cabe à União traçar as normas gerais (art. 24, § 1º, CF/88), enquanto os Estados e o Distrito Federal cuidarão de suplementar essas normas gerais. Não havendo lei federal sobre normas gerais, os Estados poderão exercer competência legislativa plena, para atender suas peculiaridades (art. 24, § 3º, CF/88).

Como lembra Figueiredo (2003, p. 12), “[...] quanto à competência concorrente da União para legislar sobre certas matérias, discriminadas no art. 24, dúvidas podem assaltar no tocante à expressa disposição de legislar sobre normas gerais (§ 1º do art. 24)”. Para a mesma autora, a solução é que União discipline somente normas gerais, estritamente

dentro do campo do interesse nacional. É evidente a dificuldade de se delimitar o alcance das normas gerais. Não sendo objetivo deste trabalho a análise mais acurada das controvérsias sobre este tema específico, será suficiente transcrever as considerações da mesma autora:

As normas gerais, para nós, possuem características diferenciadas das normas, com hierarquia normativa inibitória ao legislador ordinário, se estadual ou municipal, de disporem de forma diferente. E as matérias, que devam ser objeto de normas gerais, não podem ser legisladas por outros entes políticos, a não ser, nas hipóteses constitucionais de suplementação (art. 24, § 2º, da Constituição).

A partir dessa orientação, pode-se afirmar que a hierarquia normativa inibitória das normas gerais incidirá precipuamente para impedir que o legislador estadual ou municipal, no exercício de sua competência legislativa suplementar, venha estabelecer normas menos protetivas ao bem ambiental, como destacado pelo entendimento autorizado de Fiorillo (2007, p. 62):

Dessa forma, podemos afirmar que à União caberá a fixação de pisos mínimos de proteção ao meio ambiente, enquanto aos Estados e Municípios, atendendo aos seus interesses regionais e locais, a de um teto de proteção. Com isso, oportuno frisar que os Estados e Municípios jamais poderão legislar, de modo a oferecer menos proteção ao meio ambiente do que a União, porquanto, como já ressaltado, a esta cumpre, tão-só, fixar regras gerais.

Compreende-se, portanto, que a competência legislativa em matéria ambiental sempre visará à maior e mais efetiva preservação do meio ambiente, independentemente do ente político que a execute, porquanto todos receberam da Carta Constitucional aludida competência (arts. 24, V, VI e VII, e 30, II). Logo, os Estados-Membros, ao suplementarem as normas gerais fixadas pela União, podem apenas editar normas mais severas. Não é o que se passa com a Lei Estadual nº 14.309/2002, nitidamente discordante e mais branda quando comparado às normas gerais que regulam a matéria pertinente. Assim forçoso torna-se concluir pela inconstitucionalidade do regramento estabelecido no art. 47 da Lei Estadual nº. 14.309/2002 a respeito do grande consumidor de produtos e subprodutos da flora. Com efeito, tal previsão legislativa representa violação ao regime constitucional de competência concorrente limitada, estabelecido pelo art. 24 da Constituição da República. A esse respeito, o Supremo Tribunal Federal já teve ocasião de manifestar, quando do julgamento da ADI 1.086-0-SC (BRASIL, STF, 2001).

AÇÃO DIRETA – LIMINAR – OBRA OU ATIVIDADE POTENCIALMENTE LESIVA AO MEIO AMBIENTE – ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL – Diante dos amplos termos do inc. IV do § 1º do art. 225 da Carta Federal, revela-se juridicamente relevante a tese de inconstitucionalidade da norma estadual que dispensa o estudo prévio de impacto ambiental no caso de áreas de florestamento ou reflorestamento para fins empresariais. Mesmo que se admitisse a possibilidade de tal restrição, a lei que poderia viabilizá-la estaria inserida na competência do legislador federal, já que a este cabe disciplinar, através de normas gerais, a conservação da natureza e a proteção do meio ambiente (art. 24, inc. VI, da CF), não sendo possível, ademais, cogitar-se da competência legislativa a que se refere o § 3º do art. 24 da Carta Federal, já que esta busca suprir lacunas normativas para atender a peculiaridades locais, ausentes na espécie. Medida liminar deferida.

Nesse sentido, também se manifestou o Tribunal de Justiça de Minas Gerais acerca da competência suplementar do Estado para edição de normas sobre meio ambiente em decisão quando do julgamento da ADI 1.0000.07.456706-6/000 (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS, 2008):

Ação Direta de Inconstitucionalidade. Artigo 17, incisos V, VI e VII e parágrafo 6º da Lei Estadual nº 14.710/2004. Política florestal e de proteção à biodiversidade no Estado. Artigo 19, incisos V e VII, e parágrafo 6º, do Decreto Estadual nº 43.710/04. Regulamento. Reserva legal. Inconstitucionalidade manifesta. Extrapolação de competência suplementar. Disciplina contrária à legislação federal de regência. Ofensa ao artigo 10, inciso V, e parágrafo 1º, I, da Constituição Estadual. Representação acolhida. Vício declarado. - A recomposição da reserva legal em imóveis rurais a ser implementada mediante compensação, consoante a legislação federal de regência, somente é possível se se der por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma microbacia.

Todos esses argumentos evidenciam que o art. 47 da Lei n° 14.309/2002, com a redação que lhe foi dada pela Lei Estadual n°. 18.365/2009, encontra-se incompatível com a Constituição de 1988.

3.3. Regulamentação do consumo de carvão vegetal de mata nativa pela

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