• Nenhum resultado encontrado

2 OS FUNDAMENTOS DA TESE: LUZES PARA PODER VER MAIS LONGE

2.4 A PESSOA DO PROFESSOR

2.4.2 Competências dos professores

“Para educar não existe receita, mas sim comprometimento, paixão e busca pelo eterno aprender.” (OLBRZYMEK, 2001, p. 20).

A escola de hoje passa por inúmeras dificuldades relativas ao seu papel na sociedade. Nesse contexto, o conceito de competências vem se firmando como uma nova possibilidade de reflexão sobre os caminhos que os gestores e professores precisam trilhar para contribuir com a construção de uma sociedade mais ética e humana. A partir do que descreve Lech (2007), as principais competências dos professores diante da tarefa de educar podem ser categorizadas em afeto, bom senso, reflexão, experiência e pesquisa.

O termo competências designa não somente os conhecimentos, mas os comportamentos de alguém em face de estímulos, sentimentos e necessidades. Botomé (1994, p. 48) esclarece que “comportamento é uma complexa relação entre aquilo que o homem faz, a situação em que o faz e as condições que decorrem desse fazer em uma situação definida.” Nesse sentido, para avaliar se as atitudes tomadas estão sendo as mais adequadas, é necessário reconhecer o que precedeu e o que sucedeu àquela ação. Considerando-se essa colocação, em alguns casos, os fins justificam os meios.

Assim elucida o autor:

[...] de uma quase mágica noção de capacidade, o conhecimento evolui para a de habilidades, daí para a de competência [...] a noção de comportamento, não como sinônimo do que “um organismo faz”, mas significando uma complexa relação entre o que o organismo faz e as situações que envolvem esse “fazer” (o que acontece antes e depois da ação compõe o “fazer”). (BOTOMÉ, 1994, p. 19).

Para que essa relação ocorra, em primeiro lugar, é necessário haver a aceitação da responsabilidade, que, cedo ou tarde, decorre naturalmente, oriunda da capacidade humana de amar e educar. Em seguida, surge a necessidade de adquirir-se novas aprendizagens, seja pela busca de conhecimentos, seja pela reflexão individual ou coletiva sobre a experiência.

Para desenvolver as competências necessárias à tarefa de educar na escola, não existem receitas prontas ou caminhos predefinidos. Deve haver uma tomada de consciência sobre as diferentes situações e contextos, tendo em vista que cada uma delas exige diferentes encaminhamentos.

Dentre todas as matrizes da conduta, as que estão ancoradas nos sentimentos internos de cada professor são as que mais os tornam competentes. Conforme está proposto por Lech (2007), o afeto é a base dos comportamentos que constroem as relações humanas, pois abre os caminhos para a comunicação e permite o estabelecimento de vínculos, formando a confiança

necessária para que o desenvolvimento de uma personalidade saudável se estabeleça em seus estudantes. Bowlby (1988) dá base para essa ideia ao afirmar que não há nenhum tipo de relacionamento no qual um ser humano se coloque de maneira tão irrestrita e contínua à disposição de outro quanto aquele que é embasado no verdadeiro amor.

Somada à busca de conhecimentos científicos, à reflexão e ao bom senso, a capacidade afetiva conduz a possibilidade de revelar competência nas tarefas a serem desempenhadas no processo educacional. Além disso, não devemos buscar somente conhecimentos prontos, mas também construir conhecimentos próprios a cada caso, seja dialogando com especialistas, pesquisando em livros, revistas ou artigos de internet, seja compartilhando relatos de experiências com outras pessoas que vivem situações semelhantes. Esse envolvimento é fundamental, pois instrumentaliza o pensamento a partir do qual decorrem as ações.

Conforme Maturana (1998), os saberes são essenciais para iluminar os caminhos, mas é a emoção que permite que os usemos diante das situações imprevistas. O autor afirma, ainda, que cada vez que temos dificuldade no fazer, essa pode encobrir uma dificuldade no querer fazer, que fica oculta pela argumentação sobre o não saber fazer. Os saberes se manifestam através de nossas ações, tornando-se válidos, uma vez que eles só têm valor à medida que são usados.

Assim, as nossas ações, embora não dependam somente dos nossos desejos e emoções, são movidas por elas, à proporção que as repetimos, as transformamos em repertórios de ação, formando hábitos. Nesse caso, é importante que cada uma dessas ações seja encaminhada por um ato consciente para que possam, dessa forma, ser avaliadas e julgadas como possíveis de serem aproveitadas como experiência positiva, ajudando na construção de novos saberes. Isso não significa, contudo, que não surgem novas dúvidas sobre o que fazer diante do complexo processo de educar.

Educar é um ato criativo por excelência e precisamos estar preparados eticamente para lidar com os imprevistos que podem surgir. Podemos, na medida do possível, ser livres para criar e escolher nossas próprias ações, desde que respeitemos nossa realidade. No entanto, é necessário ter um norte, alguma orientação. A isso podemos chamar bom senso ou ética. Maturana (1998, p. 72) conceitua ética como “a flexibilização e a reflexão sobre a moral, adequando-a as diferentes situações, sempre se baseando na preocupação com as consequências que nossas ações têm sobre o outro. É um fenômeno que tem a ver com a aceitação do outro e que pertence ao domínio do amor.”

Portanto, ser competente para educar depende da capacidade de amar e de aceitar, da mesma forma que também depende do bom senso, ou seja, do senso do bem. Ter bom senso

significa que a inteligência está trabalhando a favor do coração e ambos a favor da vida. Assim, o fundamento do bom senso e da ética está enraizado mais no aspecto emocional do que no racional (MATURANA, 1998).

Nas palavras de Lucca (1998), todo comportamento que não tenha um sentimento pessoal e que não leve em conta as sensações do indivíduo que age, no caso o professor, corre o risco de ser inadequado. Portanto, toda ação deve ser precedida de uma reflexão. A sensatez é uma competência daqueles que têm cautela e prudência, mas que, acima de tudo, refletem. A reflexão conduz à compreensão e à tomada de decisões adequadas e deve ser baseada em sentimentos, conhecimentos e experiências vivenciadas. Além disso, a reflexão favorece a análise e a significação da experiência adquirida tanto pelos erros quanto pelos acertos, ajudando a estabelecer um consenso e a construir melhores caminhos.

Considerando que parte das ações educativas é composta pela necessidade de lidar com imprevistos, a experiência do professor, somada à reflexão, contribui de forma relevante, pois permite que o sujeito aja adequadamente por meio da intuição, ou seja, a partir de conhecimentos ocultos que ele aciona a partir de um esquema de ação construído em razão da experiência que ele ajusta à nova situação (PERRENOUD, 2001).

Como é possível perceber, o trabalho docente é marcado pela complexidade e somente por meio da reflexão, da crítica e da criatividade é que o professor se desenvolve, aperfeiçoa seu principal instrumento: ele mesmo. A partir daí pode revelar suas competências para enfrentar diferentes situações que surgem a cada instante no espaço escolar. A forma como realiza seu trabalho pode proporcionar ao estudante maior compreensão do universo, ou seja, as atitudes do professor podem ser a base da formação da cidadania do educando (PERRENOUD, 2000).

Por fim, esse embasamento teórico aponta para a necessidade de melhor compreender as interações estabelecidas na escola, em especial a partir da pessoa do professor. É nesse contexto que esta pesquisa adquire significado, pois precisamos ser capazes de superar nossos próprios níveis de incompetência, os quais estão subjacentes à nossa eterna necessidade de aprender. Tal força pode promover maior aceitação e compreensão sobre os diferentes modos de comportamentos, de ambos os lados – do sujeito que precisa ser educado e do educador –, adaptando-nos às situações peculiares, ancorando ações mais adequadas e competentes sempre baseadas na força que se chama amor.