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4 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS

4.1 BASES CONCEITUAIS DOS GESTORES E PROFESSORES

4.1.1 Significados de educar

A amplitude do verbo educar e a diversidade de conceitos e significados atribuídos a ele é uma das maneiras que nos leva a perceber sua importância. Isso porque os gestores e professores, sujeitos deste estudo, trouxeram ideias claras e congruentes para descrever o que pensam sobre esse que é o principal objetivo da tarefa docente. As ideias colocadas por eles sobre o que significa educar foram múltiplas, ricas e complementares.

Das cinco gestoras entrevistadas, três abordaram a importância da integralidade nesse processo; uma delas disse que as “possibilidades de educar tornam-se até mesmo infinitas

quando integradas nas dimensões afetivas e cognitivas” (G1). Outro gestor completa essa

ideia colocando que educar significa “aperfeiçoar e desenvolver as faculdades físicas,

intelectuais e morais” (G5). Tal como propõe Yus (1998), é necessário que,

independentemente do aspecto que se pretende educar, os professores busquem enfatizar as aprendizagens significativas, a fim de que os novos conhecimentos possam provocar mobilizações apropriadas nas atitudes dos estudantes. Para esse autor, uma educação com um enfoque excessivo nos conhecimentos teóricos já demonstrou ser ineficaz para se alcançar os objetivos atitudinais esperados.

Uma visão da Educação pela perspectiva do desenvolvimento social e atitudinal dos estudantes foi colocada por dois gestores. De acordo com eles, considero que aí está uma das novas funções da educação: educar para a consciência, a formação de boas atitudes e bons relacionamentos. Sobre isso, o gestor G3 descreve que a educação é uma “experiência

relacional que envolve a integralidade humana, que transcende o currículo formal e inclui as teias informais das relações cotidianas.” O gestor G4 coloca, ainda, que se faz necessário que “a construção das capacidades de convivência social, pautadas no respeito, na ética e na solidariedade sejam mais estimuladas”.

Diante dessas colocações, percebemos que os gestores reconhecem que os objetivos descritos no planejamento escolar deveriam se voltar mais para os aspectos das atitudes humanas e o enfrentamento dos desafios diante dos problemas sociais. Nesse sentido, Yus (1998, p. 190), ao propor uma educação com base nos temas transversais8 como a ética, saúde, meio ambiente, pluralidade cultural e orientação sexual, defende que a educação “deve assegurar que a construção de atitudes se vincule a aprendizagens significativas de informações relevantes. Essas aprendizagens garantirão atitudes adequadas para a tomada de decisões.”

Educar pode ser considerado mais amplo do que ensinar. Palmer (2012, p. 22) diferencia o conceito de ensinar do de educar defendendo a ideia de que ensinar significa exercer um ato intencional de criar condições. Para que isso seja bem realizado, devemos identificar as fontes interiores, tanto da intenção quanto do ato em si. Por outro lado, ele

8 “Conjunto de conteúdos educativos e eixos condutores da atividade escolar que, não estando ligados a nenhuma

matéria em particular, pode-se considerar que são comuns a todas, de forma que, mais do que criar disciplinas novas, acha-se conveniente que seu tratamento seja transversal num currículo global da escola.” (YUS, 1998, p. 190).

descreve que “educar é guiar os estudantes em uma jornada interior em direção a um modo mais sincero de ver e estar no mundo.”

Tal como descreve o gestor G1, “a Educação é um processo continuado onde o

educador e o educando constroem e reconstroem seus saberes de forma permanente”. Com o

que salienta o gestor G3, essa ideia fica mais completa. Diz ele: “A educação ocorre a partir

de uma relação entre os indivíduos, com os conhecimentos, com as informações e o contexto”.

Nesse sentido, a gestora G5 descreve a sua opinião sobre o porquê que essa conceituação é um desafio. Para ela, “o conceito de educar pertence ao âmbito da ética, a qual deve ser

estimulada e desenvolvida em todas as pessoas que ainda não possuem essa ‘habilidade’”.

Considerando que a ética é a uma condição criada culturalmente, ela precisa ser educada. Alves (1995) esclarece que o homem tem condição e não natureza predeterminada. Assim, por intermédio de uma Educação baseada em princípios e valores éticos, temos as condições necessárias para que os sujeitos manifestem suas potencialidades a favor do bem, a partir da ampliação de sua Consciência Humana, tão necessária para o estabelecimento de melhores relações consigo, com o outro e com o mundo. Enfim, sintetiza ele, que educar é humanizar.

Dos seis professores que responderam ao questionário, cinco deles atribuíram o significado à palavra educar como um meio para preparar o estudante para a vida, tornando-o um cidadão do bem. Nas palavras da professora P3, esse conceito fica claro: “Ao educar, o

professor auxilia o aluno na sua construção, enquanto cidadão atuante no mundo do qual faz parte.”

A professora P5 destaca que Educar é, em sua concepção, "aperfeiçoar e desenvolver

as faculdades físicas, intelectuais e morais dos educandos". Essa ideia vem ao encontro do

que está apresentado em recente publicação da Unesco (2015, p. 9), que, em sua proposta para a Educação, discorre sobre a importância dessa para o desenvolvimento de uma cidadania global, com vistas a ampliar conhecimentos, habilidades, valores e atitudes, dos quais os estudantes necessitam para compreender e intervir sobre o mundo, tornando-o mais justo, pacífico, tolerante, inclusivo, seguro e sustentável.

Mesmo diante de propostas integradoras como a supracitada, o que vemos, em muitos casos, ainda é uma educação baseada na "transmissão de conteúdos". Basta ver os extensos projetos políticos e pedagógicos que definem cargas de conteúdos que precisam ser trabalhados em curtos espaços de tempo. Conforme salientam dois professores entrevistados, esse não deixa de ser um dos objetivos da escola, mas não pode ser o único. Conceituam eles que educar é "passar", "transmitir" e "mediar" o conhecimento (P3), mas também é "construir

significados, buscando os recursos necessários para melhores condições de aprendizagem."

(P2)

A partir do que colocam esses professores, educar seria, então, facilitar o processo da construção da aprendizagem, ampliando e dando significados aos conhecimentos prontos. Suas opiniões também convergem para a ideia de que educar significa desenvolver e orientar as aptidões dos estudantes. O professor P5 completa essa ideia, lembrando que essa orientação deve ser dada "de acordo com os ideais de determinada sociedade”, ou seja, respeitando a cultura de cada sujeito, de cada tempo e de cada lugar. Tendo em vista que, cada vez mais, buscamos educar para a autonomia, evitando padronizações e formatações dos conhecimentos e dos estudantes, cabe lembrar Freire (1996), que, a partir de uma concepção emancipatória, baseada no diálogo e na consciência crítica, propõe que os estudantes se libertem de preconceitos e construam novos modos de pensar e agir diante das necessidades de transformações sociais.

Habermas (2000) também defende a importância da consciência crítica para a emancipação dos estudantes. Defende ele que o trabalho docente baseado na abordagem crítico-emancipatória tem como princípio o exercício de autorreflexão, pois, só assim, o conhecimento poderia ser reelaborado evitando as distorções sofridas pelo processo histórico. Para tanto, é necessário que os professores priorizem o diálogo e proporcionem maior abertura no decurso das aulas, aumentando a participação dos estudantes no processo pedagógico e, assim, ampliando a sua consciência sobre o mundo, sobre as coisas e sobre si.

De acordo com Maturana (1998, p. 23), o professor P4 reconhece que Educar "é um processo em que os estudantes convivem e se transformam, nesse espaço de convivência, que é a escola". Nas palavras desse autor, assim está conceituado esse termo:

Educar é um processo em que a criança ou o adulto convive com o outro e, ao conviver com o outro, se transforma espontaneamente, de maneira que seu modo de viver se faz progressivamente mais congruente com o do outro no espaço da convivência. O educar ocorre, portanto, todo o tempo e de maneira recíproca. Seguindo a linha de pensamento de Maturana (1998), o professor supracitado defende, ainda, que

Educar está relacionado ao conviver, socializar, em todos os processos, institucionalizados ou não, mas que irão transmitir certos conhecimentos e padrões de comportamento, a fim de garantir a continuidade do saber e da cultura de uma sociedade.

A professora P1 complementa essa ideia ao dizer que "Educar é ajudar o estudante a

viver em sociedade". Essa afirmativa pode ser apoiada em Delors (2012), que, em sua proposta

de educação, defende a necessidade de os estudantes aprenderem a conviver. Contudo, lembra o autor, que saber conviver depende da capacidade de respeitar e, também, de certo nível de autoconhecimento por parte do estudante. Em suas palavras,

O respeito e a descoberta do outro passa, necessariamente, pela descoberta de si mesmo, e pelo fato de que deve dar à criança e ao adolescente uma visão ajustada do mundo, a educação, seja ela fornecida pela família, pela comunidade ou pela escola, deve, antes de mais nada, ajudá-los a descobrir-se a si mesmos. (DELORS, 2012, p. 80).

Diante dessa colocação, aprender a viver juntos desenvolvendo a compreensão de si e do outro e a percepção das interdependências é um dos grandes desafios que os profissionais da educação encontram, pois, preparar-se para esse tipo de função nem sempre faz parte dos currículos de formação acadêmica, mas sim de toda a sua história de vida, de formação pessoal e humana. Conforme descreve a professora P1, "o desafio aparece cada dia quando o

professor entra na sala de aula e consegue olhar e observar o seu estudante independentemente do conteúdo que tem a cumprir." Percebe, ainda, a necessidade de gerir

suas ações pautadas no respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz, tornando seus estudantes capazes de realizar projetos comuns e de prepararem-se para gerir conflitos (DELORS, 2012).

A pessoa do professor, que está em formação contínua desde antes de escolher a sua profissão até cada momento atual, é que vai dar a "possibilidade do profissional ser capaz de

transmitir valores para os alunos”, o que, conforme a professora P3, é o que significa educar.

O reconhecimento de cada um, do quanto influenciam na vida dos seus estudantes, o "saber

de que podem fazer a diferença na vida de cada um deles" (P1) e, ainda, de "se emocionar

por fazer parte desta linda jornada de partilhar saberes" (P4) é o que representa e significa verdadeiramente educar, na concepção dos sujeitos deste estudo.