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complementaridade das relações de gênero faz parte da divisão sexual do trabalho no que se

refere ao papel de provedor. As relações de

igualdade apareceram na flexibilização da

função de sustento da família, que passou a ser

dividida entre o homem e a mulher. Porém,

quanto ao trabalho da casa, marca presença a

oposição dos homens diante da mudança de

rumo a uma divisão mais igualitária das tarefas

domésticas." Costa Cunha (1988:209)

No entanto, o mesmo autor assinala que se uma das características básicas da agricultura familiar é a complementaridade do trabalho, em que cada membro tem imia função em decorrência de fatores socioculturais, sexo e idade, então a mulher está sendo de múltiplas formas explorada. Primeiro, porque o lugar dela seria a casa, e no entanto, ela vai também para a roça (que é trabalho para homem). Segundo, porque trabalhando na roça, ela não está sendo liberada do trabalho da casa e da família.

O trabalho doméstico é obrigação da mulher, mãe de família, que deve ir educando suas filhas para assumirem também esse papel para quando se casarem. O processo de educação e socialização direciona-se para que as filhas interiorizem estas obrigações como naturais ao seu sexo. Em troca, os homens, não compartilham as tarefas domésticas e descansam depois do trabalho. As mulheres não descansam.

Um outro aspecto assinalado neste trabalho por Costa Cunha (1998) é o fato de que mesmo que as mulheres sejam mão de obra e produzam tanto quanto os homens, seu trabalho é considerado sempre "ajuda" e não recebem remimeração, ou seja continua desvalorizado, e por outro lado elas são normalmente afastadas da tomada de decisões da comercialização dos produtos (com exceções).

Este estilo de vida dominada pelo princípio patriarcal de consciência masculina, determinou, nas mulheres entrevistadas, a intemahzação de seu papel de gênero (onde o feminino aparece abnegado ao masculino) colocando sua vida ao serviço do desenvolvimento de seu projeto de família onde ela será esposa e mãe. Porém, quando casam, também acordam ao princípio de consciência masculina como força de individuação, porque saem da família de origem e procuram realizar suas aspirações e desejos com respeito a construir sua própria família. Trabalham ao lado do marido, compartilham a vida com eles, tem seus filhos, lutam para sair da pobreza, educam aos fílhos e mantém a casa fiéis a seu sonho de família. São dóceis, subaltemas e submissas ao marido segundo o padrão que aprendeu.

Mas, há diferença de suas mães, pois estas mulheres apresentam mudanças: existem situações que colocam um limite para essa docilidade e subalternidade ao homem, e marcam a passada para imi outro nível de desenvolvimento, que misturam dimensões da

consciência masculina (nas suas características de determinação, luta por conseguir

independência e autonomia na conquista de metas pessoais) e da consciência do feminino que emerge. Estas situações são: o marido bebendo em excesso (fora com amigos, gastando 0 dinheiro da família), a violência verbal e física e maus tratos com ela e os fílhos.

Esta consciência de limitar a exposição à opressão e subordinação nestas mulheres, as faz mobilizar-se perante uma outra consciência do masculino e do feminino emergente. Isto se realiza porque a crise desperta um mal-estar ô^ente a sua situação o que permite discernir o que fazer para conseguir enfirentar e superar sua situação. Porém, tem que ter muita coragem, porque ela não tem modelos a seguir de transgressão da regra paterna, (suas mães se mantiveram submissas à opressão dos maridos). Portanto, é vmi caminho muito sohtário, muito doloroso, e se tem filhos que sustentar. Mas a nova

consciência do masculino, no seu arquétipo do "heroi" acorda os meios de

desenvolvimento de si mesma que permitiram enfi-entar concretamente a situação, como é obter um trabalho remimerado. O trabalho lhe vai permitir reconstruir sua auto valorização pessoal e com isto uma identidade mais definida baseada na consciência de competência para auto-sustentar-se e sustentar aos filhos. A segurança em si mesma, permite reconhecer seus desejos, como pode ser, desejar ser conscientemente tratada como uma pessoa, ser

respeitada, e decidir com quem ela deseja compartilhar sua vida. A partir deste momento, ela pode separar-se e abrir-se a novas maneiras de viver onde também cabe procurar outro companheiro para estabelecer uma relação prazerosa de troca e parceria.

As experiências no processo de enfrentamento e superação das crise, desenvolvem uma dimensão importante que aparece na evolução da consciência de gênero nestas mulheres, é que Colegrave (1994) chama de intimidade com as dinâmicas dos processos de

transformação pessoal, com o processo de se tomar, e as mudanças próprias do desenvolvimento. Esta nova consciência se reflete, também, na sensibilidade e valorização

que estas mulheres fazem dos processos de mudanças dos membros de sua família: a gravidez nos filhos, a superação das limitações nos filhos aleijados e mudanças de emprego. As conquistas pessoais, dos filhos e o desenvolvimento dos netos, são acompanhados com prazer e saboreados no grupo.

Outra característica do feminino que emerge conscientemente nestas mulheres é a

consciência das mudanças e transformações corporais^^ vivenciadas seja por doenças ou

por estar no climatério e menopausa. Segundo Woodmann (1994), esta intimidade com as transformações corporais, leva a uma abertura emocional e sensorial que permite seguir a própria experiência corpórea, em lugar de ouvir apenas ao pensamento. Ainda quando às vezes o corpo molestava, doia, e se sentia como uma carga, também ele proporcionava experiências gostosas como as de intimidade sexual.

Escutar as experiências de vida destas mulheres, levou-me a perceber como elas acreditam em valorizar a vida em si, não como um projeto, vun sonho feito de aspirações idealizadas de desejos que querem realizar-se, porém..., algum dia... Mas a vida quanto oferecimento de oportunidades que são possibilidades de desenvolvimento, no acontecimento real das relações no dia a dia. A vida encarnada nas pessoas que se ama e com quem se compartilha o dia a dia; a vida situada e projetada nos projetos de trabalho que se reahzam com os outros; a vida que está contida nas mudanças reais de estilo de vida

Todas as mulheres estavam vivenciando mudanças climatéricas e algumas tinham experiências