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“Quando abandonei meu marido, peguei minha menina caçula e me mandei para Itajai, sempre

trabalhei muito e era muito boa, no meu

trabalho. Ai ele deixou de beber, porque sem

mim, ele não ia ser capaz de sobreviver Chegou

a conclusão que sua vida era de meu lado. Aí eu

fiz com que ele se humilhasse bastante, ali em

baixo... aí depois eu levantei ele de volta. Tive

meu marido de volta Graças a Deus! Agora ele

não bebe mais, não fuma, só vai do serviço para

casa. Não saí, se não vou junto. Com a neta

está muito feliz, está transparente... As vezes

até esquece de si próprio, não se importa... quer

mais atender aquela neta...” (Z)

“Depois da separação, não tinha nada, porém

como sempre lutei muito para ter minhas coisas,

ne? Então eu consegui! Graças a Deus, isso aí.

Não posso dizer Sempre lutei muito, e passei

por muitas dificuldades, mas sempre consegui...

conseguia. Isso é o que falo para meus filhos.

Tem que lutar! Agora tenho minha casa, com

todo conforto, minha casa então, estou fazendo

aos poucos. A minha irmã me fala: como é que

você consegue com essa pensão... como é que

você faz? Como é que você consegue ter tudo...

COMO? Eu não gasto nada supérfluo, eu guardo

dinheiro, só compro o necessário." (M de L)

Staude (1995), na sua revisão acerca das teorias do desenvolvimento adulto, assinala que Levingston, estudando pessoas adultas em crise, encontrou que a via para tomar a crise uma oportunidade de crescimento, é transformando os problemas e dificuldades em desafios; segimdo ele, a pessoa adulta gosta de enfrentar desafios porque estimulam sua força de viver e sua criatividade. Desta maneira, após ter superado uma grande dificuldade, a pessoa muda porque gerou novas forças de desenvolvimento.

Entretanto, nem todas as mulheres conseguem vencer as dificuldades da vida positivamente. Algumas delas estão submersas no presente na situação de crise, apresentando-se muito sofiidas, ansiosas, fi-ustradas, deprimidas, e sobretudo, dependentes e submissas, sob a dominação do marido. Numa situação trata-se de um esposo que bebe em excesso, a maltrata e até ameaça de morte, mantendo-a em condições de extrema violência. Outra mulher sofre porque o marido a malfrata por ciúmes. Elas sentem-se sem forças para enfrentá-los e não conseguem superar o medo das conseqüências que poderia advir caso elas se separassem.

Nestas situações, tem-se percebido ora uma intensa ambivalência, ora um conformismo com respeito a estas situações. Por uma parte, sentem medo por estar sendo violentadas dia a dia e sentem desejos de sair dessa situação mediante o afastamento da exposição à violência; mas, por outra parte, sentem sentimentos de compaixão pelo marido alcoólafra ou conformismo a respeito da conduta de ciúmes. Isto aparece vinculado aos anos de vida compartilhados, à lealdade e solidariedade, mas também à dependência econômica e afetiva. Elas parecem precisar sentir que o marido alcoólafra as necessita para não morrer, e acreditam que, se o abandonarem, o esposo beberá até matar-se. Porém, nesta situação, existe um fato que pode ser interpretado a partir da relação de super valorização do marido ou, então, desvalorização de si mesmas: acontece que o medo de serem assassinadas é menor que o medo de que ele morra bebendo,caso o abandonem e ele fique sozinho.

Esta confradição aparece freqüentemente em momentos da vida destas mulheres, e reflete até que ponto pode ser levado um padrão de gênero com respeito à lealdade matrimonial, aprendido provavelmente desde pequena, no ambiente sociocultural familiar. A crença indica que a mulher deve demonsfrar que pode suportar toda adversidade (como alcoolismo, maus fratos, violência, infidelidade, ciúmes) e manter-se como fiel companheira do marido em toda circunstância. Isto sustentado pelas crenças reUgiosas que estimulam o modelo de mulher sofiida, que apanha, é malfratada, mas que se mantém firme frente a adversidade e fiel aos princípios. Este tipo de situação é que justifica ainda a luta coletiva das mulheres para denimciar publicamente estas situações e elevar a consciência social sobre suas ocorrências.

Esta firmeza de caráter é justamente o que estas mulheres procuram cultivar: aguentar sempre as adversidades e lutar pelos filhos, os netos, a família. Porque na medida que mantém esta conduta de "mulher-sofredora-lutadora-firme", sente-se bem consigo mesma por estar fazendo exatamente o que aprendeu desde menina através da relação com sua mãe. Por outra parte, recebe como prêmio social o reconhecimento especial de sua valentia e fidelidade, através da compaixão dos filhos, vizinhos, patroas. “Coitada da mãe” é uma expressão que elas usaram para referir-se às suas próprias mães, ou quando falavam de suas filhas. Assim, elas ficam prisioneiras destas situações críticas e não conseguem tomar uma decisão para acabar com elas. Desta maneira, estão mais dispostas a dar sua vida por ele... ou de outra forma, a vida dele vale mais que a sua própria vida.

"No começo o casamento ia muito bem,

curtíamos bastante, fui tendo meus filhos, e

criando-os... tudo muito bem, seis filhos... até

que ele começou a beber, faz já uns sete anos

que bebe, bebe, bebe. Bate em mim, me trata

de vagabunda, me ameaça de morte, que vai me

matar.. Eu quero separar dele, não adianta

sofrer mais. Todos os meus filhos estão

casados, só tenho a caçula que estuda e ela

merece uma vida melhor Eu desejo abandoná-

lo mas no fundo, tenho pena dele, eu acho que

se saio de casa vai beber mais ainda até se

matar. Temos 30 anos juntos, criamos os filhos e

agora que a gente poderia curtir os netos e uma

vida já mais tranqüila, ele está pior cada dia. Me

dá pena porque sem a bebida ele é o melhor

marido do mundo, está em casa, lava a roupa, é

silencioso, respeitoso, mas se põe a beber,

parece outra pessoa, volta a incomodar., por

isto me dá pena deixar ele cair na bebida...

Todos me dizem que abandone ele, as vizinhas,

meus filhos... até tenho trabalho... minha filha

não merece ser tratada assim, mas me dá medo

de que me mate e pena de que ele se mate na

bebida...” (F)

“Bom, meu marido atual é meu segundo marido,

ele não é muito companheiro não! ele é muito

trabalhador, mas é muito ciumento... eu sou uma

mulher muito sofrida na minha vida, Ichü! Eu já

sofri muito na minha vida. Diz que ciúme é uma

doença, daí a gente não está bem assim, a

gente se incomoda e não é uma vida muito

boa... né? Me maltrata e me chama de

vagabunda... e não quero incomodar muito

agora... então não dou muita bola, deixo ele

brigando... Eu tenho meus filhos, ne? Por isto

deixo ele brigar sozinho, eu tenho meus fílhos,

sabe?” (!)

4.2.3.1 A experiência de ser mãe e avó:

Ser mãe é uma experiência “natural” para elas, o eixo de sua existência, mas não seguiram o exemplo de suas próprias mães, de extensas famílias de origem, e controlaram sua fertilidade. Este grupo tem entre um e seis filhos, sendo a média de três.

Os filhos representam parte importante de suas vidas. Eles definem as metas de vida destas mulheres. É pelos filhos que elas lutam e trabalham duro para obter um melhor nível de vida, é pelos filhos que elas têm forças para enfi-entar dificuldades e superar as crise, é pelos filhos que elas colocam um limite quando estão expostas a situações de maltrato e violência dos maridos; é pelos filhos que elas enfi-entam tudo. A guerreira que vai e sai à luta é a mãe essenciabnente.

Contudo, a gravidez parece ter diferentes significados para estas mulheres, alguns mais conscientes e outros mais inconscientes, e que podem ser identificados através de suas falas. Para as que não conseguiram ter os filhos por doenças, eles representam o melhor e mais precioso da vida; outras vezes engravidaram para modificar condutas do marido, por exemplo quando ele bebia.

“Só sobreviveu minha filha que tem 23 anos, os