• Nenhum resultado encontrado

COMPORTAMENTAL: UTILIDADE ATUAL E DIREÇÕES FUTURAS

No documento BECK TCC dos Transtornos da Personalidade DSM5 (páginas 141-147)

MECANISMOS NEURAIS DOS ESQUEMAS E MODOS

COMPORTAMENTAL: UTILIDADE ATUAL E DIREÇÕES FUTURAS

Embora tenha feito grandes avanços, a neurociência clínica ainda está engatinhando. Na verdade, à medida que oferecem uma capacidade cada vez maior de estudar o cérebro, as técnicas novas e poderosas geralmente revelam uma complexidade ainda maior do que havíamos imaginado (Koch, 2012). Essa realidade deve moderar as expectativas de uma revolução liderada pela neurociência na prática clínica, mas tal comedimento nem sempre está presente em grande parte da mídia popular (Satel & Lilienfeld, 2013). A seguir, são apresentadas várias maneiras pelas quais os fundamentos da neurociência atualmente confirmam a tecnologia emergente e bem testada nas aplicações clínicas da terapia cognitivo-comportamental para as psicopatologias da personalidade.

Cultivando a imparcialidade

Muitos indivíduos com transtornos da personalidade sofrem de um profundo senso de inferioridade, de falta de valor e de ser indigno de amor. De fato, alguns sintomas específicos dos diferentes transtornos da personalidade podem ser vistos como uma tentativa de evitar o contato com essas crenças centrais de baixa autoestima. Quando o processo de terapia volta sua atenção para essas crenças, a evitação defensiva pode dificultar a abordagem direta de certas cognições e impedir seu avanço. Discutir os sintomas em termos de neurobiologia pode ajudar a difundir esse processo ao encorajar uma postura de “observador” das experiências emocionais pessoais. Isso traz novas informações que podem enfraquecer o esquema de pensamentos de autorrecriminação e vergonha. Nesse sentido, um ponto de vista neurocientífico pode ajudar a ampliar os exercícios de “observar e descrever” inicialmente testados na aplicação da terapia comportamental dialética (Linehan, 1993).

Desenvolvendo narrativas e explicações

Existem evidências substanciais de que a com​preensão narrativa dos sintomas psicológicos pode ajudar a aliviá-los. Com frequência, experiências dolorosas são menos penosas quando são previsíveis e entendidas, mesmo que a dor continue igualmente intensa. Explicações mecanicistas de sintomas específicos muitas vezes podem ser poderosas nesse contexto – mesmo os mecanismos

relativamente simples, como a reatividade da amígdala. Evidentemente, tais explicações podem ser oferecidas sem referência à neurobiologia, pois estão presentes nos contextos da terapia cognitivo-comportamental há décadas. Entretanto, a neurobiologia pode ajudar a dar sustentação a essas explicações para certos pacientes. Além disso, pode ajudar os familiares a adotar uma perspectiva empática, pois fornece uma alternativa interpretativa que é menos nociva do que as motivações caracterológicas.

Intervenções comportamentais e neurológicas combinadas

Por fim, um dos modos mais amplamente discutidos pelos quais a neurociência pode ter impacto no tratamento é por meio do desenvolvimento de novos medicamentos e equipamentos médicos. Um dos maiores sucessos nessa área tem sido o uso de estimuladores elétricos implantados no cérebro para aliviar sintomas depressivos (Mayberg et al., 2005). Mais recentemente, começou a surgir a possibilidade de usar intervenções biológicas específicas de curta ação para intensificar os efeitos da terapia comportamental. Por exemplo, a D- cicloserina (DCS), um fármaco originalmente desenvolvido para o tratamento da tuberculose, mostrou-se capaz de aumentar a plasticidade sináptica ao atuar sobre os receptores do N-metil-D-aspartato (NMDA) no cérebro. Esses receptores desempenham um papel fundamental no desenvolvimento de novas memórias, especialmente durante o aprendizado da extinção de medo condicionado (Davis, Ressler, Rothbaum, & Richard​son, 2006). Considerando que o aprendizado da extinção desempenha um papel fundamental na terapia de exposição para diversos tipos de ansiedade, os pesquisadores descobriram que a administração de DCS antes das sessões de terapia de exposição pode aumentar a eficácia de tais sessões (Hofmann, Meuret et al., 2006; Hofmann, Pollack, & Otto, 2006). É importante salientar que esse tipo de tratamento é diferente das formas mais tradicionais de terapia medicamentosa e comportamental combinadas, pois o agente farmacológico foi especificamente projetado para enfocar e aumentar os efeitos biológicos da intervenção comportamental (Hofmann, 2007).

Por último, vale ressaltar que, ao contrário do que foi ensinado sobre neurociência nas aulas de biologia no ensino médio durante muitos anos, as redes neurais do cérebro adulto não são fixas. Ao contrário, elas estão sempre se rearranjando de acordo com as experiências. O termo técnico para isso é “neuroplasticidade” e denota uma variedade de mecanismos epigenéticos, sinápticos e no nível da rede que permitem aos conjuntos de neurônios adaptarem suas entradas e saídas de modo a aprender novas ideias, fortalecer representações prévias ou enfraquecer os padrões habituais de resposta. Em termos mais simples, é o processo pelo qual o cérebro resolve o difícil problema de decidir quanto de suas ideias anteriores sobre si mesmo, o mundo e o futuro deve ser retido e quanto deve ser atualizado diante de novas informações. Não é difícil perceber de que forma isso se aplica às estratégias de mediação cognitiva para a mudança; o simples fato de considerar uma interpretação alternativa de um pensamento automático negativo desgastado pode, ao longo do tempo, ajudar a reduzir seu poder ao diminuir a força de sua representação nas redes neurais cognitivas (DeRubeis, Siegle, & Hollon, 2008; Disner, Beevers, Haigh, & Beck, 2011). Estudos em modelos tanto humanos como animais sugerem que os mecanismos neuroplásticos podem estar comprometidos em transtornos como a depressão maior, bem como que as intervenções que visam ou intensificam a neuroplasticidade podem melhorar o tratamento (Duman & Aghajanian, 2012; Player et al., 2013). Futuros trabalhos ajudarão a esclarecer melhor a aplicabilidade da neuroplasticidade ao tratamento dos transtornos da personalidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em suma, as abordagens de neuroimagem ao estudo dos transtornos da personalidade começaram a lançar luz sobre alguns dos mecanismos biológicos básicos que podem estar por trás das perturbações específicas nos domínios comportamentais e cognitivos. Os modos de autoexpansão e proteção podem ser mais bem compreendidos por meio das conexões com as diferenças funcionais nas regiões da amígdala e da ínsula relacionadas ao afeto, bem como na sensibilidade e na síntese da dopamina. Essa conceituação dos sintomas de transtornos da personalidade em termos de substratos biológicos pode ser terapêutica para alguns pacientes, uma vez que proporciona uma maneira de descrever os sintomas que pode evitar o estímulo

de cognições de autoculpa. Como o campo da neurociência psiquiátrica continua a amadurecer, espera-se que sejam descobertos tratamentos fundamentados na neurociência mais poderosos para os transtornos da personalidade.

PRINCÍPIOS GERAIS E TÉCNICAS

No documento BECK TCC dos Transtornos da Personalidade DSM5 (páginas 141-147)