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CONCEITUALIZAÇÃO DAS CRENÇAS E DOS COMPORTAMENTOS DESADAPTATIVOS DO PACIENTE

No documento BECK TCC dos Transtornos da Personalidade DSM5 (páginas 188-192)

PERSONALIDADE Denise D Davis

CONCEITUALIZAÇÃO DAS CRENÇAS E DOS COMPORTAMENTOS DESADAPTATIVOS DO PACIENTE

Quando surgem problemas, é importante evitar descrições generalizadas do paciente (p. ex., o paciente é resistente, preguiçoso, desmotivado) e, em vez disso, especificar seu comportamento (p. ex., o cliente criticou duramente o profissional, insistiu que a terapia não pode ajudar, recusou-se a responder às perguntas, mentiu para o terapeuta ou exigiu direitos). Então, é importante conceitualizar como as crenças centrais e pressupostos dos pacientes estão relacionadas ao comportamento problemático.

Clientes que repetidamente dizem “não sei” quando seu terapeuta tenta aplicar uma resolução colaborativa de problemas, por exemplo, podem acreditar que “Se eu tentar encontrar soluções para meus problemas no tratamento, falharei (porque sou incompetente), mas se eu contar com meu terapeuta para resolver meus problemas, ficarei bem”. Essa crença costuma ser um subconjunto da suposição mais ampla de que “Se eu contar comigo mesmo, vou fracassar, mas se eu contar com os outros, ficarei bem”.

O paciente pode deixar de revelar informações importantes em virtude de sua crença de que “Se meu terapeuta souber de algo negativo sobre mim, ele me julgará duramente (porque vai descobrir que tenho defeitos), mas se eu mantiver o silêncio sobre isso, ele me aceitará”. Sua suposição geral é de que “Se as pessoas conhecerem o meu verdadeiro eu, irão me ferir ou rejeitar, mas

se esconder meu verdadeiro eu, elas me aceitarão, pelo menos por algum tempo”.

Quando critica seu terapeuta ou descarta suas ideias peremptoriamente, o paciente pode manter a crença de que “Se eu denegrir meu terapeuta, serei superior (ao menos por enquanto), mas se ouvi-lo e demonstrar que valorizo suas ideias, isso significará que sou inferior”. Sua suposição geral é de que “Se eu agir de uma maneira superior e subordinar os outros, serei superior, mas se não fizer isso, eles serão superiores, e eu, inferior”. Uma lista de crenças e comportamentos que interferem na terapia para cada transtorno da personalidade pode ser encontrada em J. Beck (2005).

Assim, muitos desafios colaborativos são compatíveis com os perfis cognitivos específicos dos clientes. Quando um indivíduo inicia um tratamento, seus esquemas centrais negativos muitas vezes já foram ativados, e ele tende a se ver de maneiras previsíveis, além de perceber seu terapeuta pelas lentes de sua característica visão dos outros. A Tabela 6.1 resume uma lista de cognições e pressupostos específicos dos perfis que podem ter impacto no relacionamento terapêutico e na interação em diferentes momentos do tratamento.

Como se pode ver na Tabela 6.1, as crenças características dos pacientes com transtornos da personalidade evitativa, paranoide, esquizoide e esquizotípica sugerem um potencial para dificuldade no engajamento inicial e uma tendência ao término prematuro. Esses indivíduos são muito sensíveis a ameaças e podem ver o tratamento como muito ameaçador por diversas razões, tais como “Serei julgado, humilhado, manipulado, explorado, homogeneizado, feito de bobo, considerado estranho ou encarcerado”.

TABELA 6.1

Perfis cognitivos e o relacionamento terapêutico

Transtorno da personalidade Visão temerosa dos outros/terapeuta

Estratégia superdesenvolvida Postura sugerida ao terapeuta

Paranoide “Seu plano é tirar dinheiro de mim”; “eles querem me usar em seus experimentos.” Protege-se terminando prematuramente a psioterapia; questiona motivos; não confia em ninguém

Oferecer programa de curto prazo; discutir finalidade, metas e custos abertamente; enfatizar a transparência em suas

recomendações; usar cautela com a palavra “experimentos”

Esquizoide “Eles querem me incluir contra minha vontade e

Demonstra desinteresse

passivo; deixa de marcar hora, Definir agenda juntos; enfatizar a eficiência;comentar sobre o respeito à autonomia; aumentar o intervalo entre as consultas;

desperdiçarão

meu tempo.” retornar telefonemas; falta àssessões estabelecer acompanhamento suave comtelefonemas Esquizotípica “Eles são hostis

com meus talentos especiais”; “eles querem fazer eu me encaixar”; “eles podem me encarcerar por ser maluco.”

Evita ansiosamente o contato direto; não se compromete e é muito evasivo; dissocia; demonstra hostilidade; busca a contracultura ou modos incomuns de enfrentamento

Demonstrar interesse sereno pelos temas incomuns do paciente; declarar apoio à individualidade; dar exemplos de autorrevelação para ajudar na confiança; tranquilizar quanto à natureza não intrusiva da terapia tanto quanto apropriado

Evitativa “Eles irão me julgar e criticar e pensar que não valho o esforço.”

Discute ansiosamente temas periféricos; demonstra autodepreciação; tenta esconder emoções negativas

Sinalizar a segurança com uma postura relaxada; usar agenda colaborativa para acrescentar temas mais centrais; pedir

feedback pessoal; indagar delicadamente

sobre emoções Dependente “Eles são mais

inteligentes do que eu e já entenderam”; “devo me apoiar neles e fazer o que eles dizem.”

Expressa sofrimento; age com deferência e demonstra carência; depende

passivamente do terapeuta

Moldar as habilidades de estabelecimento de agenda do paciente; pedir ideias ao cliente e encorajar a resolução ativa de problemas; fornecer apoio no estabelecimento de limites, especialmente se envolvido em

relacionamentos abusivos Obsessivo-

-compulsiva “Eles podem nãofazer as coisas da maneira certa”; “eles precisam de todas as informações para identificar a resposta certa.”

É extremamente minucioso; faz relatos excessivamente detalhados; resume os problemas e muda de tópico

Pedir informações sobre o estabelecimento de quantidade de tempo para os itens da agenda; fornecer a linha de raciocínio para limitar a descrição excessivamente detalhada dos problemas; fazer resumos; pedir feedback avaliativo

Passivo-

-agressiva “Eles estãotentando me controlar e despejar todo o trabalho em mim.” Concordância superficial e emoções suprimidas; indiferente a tarefas ou resultados; fala em círculos

Negociar empaticamente as metas do tratamento; fazer brainstorm ou criar em conjunto as tarefas de casa; perguntar sobre as emoções; designar uma tarefa para si mesmo na tarefa de casa

Narcisista “Eles podem não reconhecer o quanto sou especial e superior.”

Gaba-se e rebaixa o terapeuta; concentra-se no

autoenaltecimento; evita assumir responsabilidade pelos problemas interpessoais; pode ter “explosões” e concentrar-se em culpar os outros; pode encerrar a terapia precocemente

Permitir que o paciente se sinta superior, especialmente no início; demonstrar empatia pelas dificuldades interpessoais; ajudar o cliente a ver por que é bom para ele melhorar seus relacionamentos; fornecer

cuidadosamente a linha de raciocínio ao estabelecer limites; dar atenção elogiosa a comportamentos comuns pró-sociais Antissocial “Eles podem ficar

no meu caminho.” Projeta uma imagem paramanipular ou intimidar o terapeuta, seja para ganho ou divertimento; pode desaparecer e se não responsivo ao

acompanhamento

Resistir às tentativas de conspirar em um relacionamento “especial”; manter limites realistas e autoprotetores e confrontar o comportamento intimidante em níveis baixos; considerar o término se a manipulação aumentar

Histriônica “Eles podem

chato e enfadonho e não prestar atenção suficiente em mim ou não se importar com meus sentimentos.”

exigências caso se sinta negligenciado; possibilidade de fazer pirraça e/ou de término abrupto

afirmando seu compromisso de se importar sem que o cliente tenha de “capturar” a atenção; tentar métodos experienciais

Borderline “Eles irão me atrair e depois se voltar contra mim ou não me ajudar quando eu precisar.”

Emoção mascarada se alterna com crise emocional; incapaz de lidar com a tensão

Entrar em acordo sobre como lidar com os conflitos e acessar o apoio do terapeuta; usar consulta para autocuidado

Depressiva “Eles se revelarão idealistas, irrealisticamente otimistas e decepcionantes.”

Mantém-se emocionalmente desapegado e cético em relação a tudo; critica e deprecia a terapia ou o terapeuta; desiste quando o esforço é percebido como inútil

Projetar curiosidade e interesse em opções possíveis; usar autorrevelação terapêutica para exemplificar as habilidades de reparação do humor e de persistência

As personalidades obsessivo-compulsivas, passivo-agressivas, dependentes e evitativas podem tender a ver o terapeuta como figura soberana e apoiar-se excessivamente nele. Esses indivíduos também costumam ser supercontrolados e podem sentir-se facilmente ameaçados pela crítica ou decepção percebida, resultando em término prematuro depois do que parecia um começo promissor. Em contrapartida, quando o relacionamento é estabelecido com êxito, eles podem prolongar o tratamento, acreditando que a melhora se deve exclusivamente ao terapeuta. Eles podem catastrofizar, temendo que “Posso fracassar e arruinar minha vida”, “Ficarei sozinho e esmagado pelos sentimentos”, “O que farei se não puder contar com meu terapeuta?”. Para evitar o término, eles podem partir para a discussão de questões periféricas.

Clientes com perfis antissocial, borderline, narcisista e histriônico mantêm expectativas dos outros que levam a conflitos mais abertamente expressos no relacionamento terapêutico. Eles respondem à estimulação de seu autoesquema central de modo defensivo, tentando engajar o terapeuta em seu padrão superdesenvolvido. O paciente passivo-agressivo, por exemplo, pode acreditar que “Ainda serei manipulado e controlado” e, assim, resistir passivamente à colaboração. O cliente narcisista fica vigilante aos sinais (e muitas vezes os interpreta erroneamente) de que o profissional irá rebaixá-lo de alguma maneira; assim, pode tentar obter vantagem esperando ou mesmo

exigindo considerações especiais ou favores do clínico, bem como ficando zangado quando este estabelece limites sensatos.

O paciente com transtorno da personalidade depressiva pode fazer comentários cruéis para o terapeuta sobre a futilidade e a estupidez do tratamento e, então, retrair-se e calar-se, consumido por ruminações negativas. Rupturas na aliança podem resultar em um término indireto, no qual o indivíduo simplesmente deixa de retornar para o tratamento sem aviso, ou em um término complexo, no qual o paciente sai com raiva e depois retorna, ameaça o profissional ou continua em um estado muito ambivalente (Davis, 2008). Esses tipos de términos e rupturas da aliança são especialmente estressantes para o terapeuta e mais bem manejados por meio da atenção à reflexão, consulta e autocuidado (Davis, 2008; Davis & Younggren, 2009).

Podem surgir dificuldades na aliança na primeira sessão ou em qualquer outra na qual o paciente tenha cognições negativas sobre o terapeuta. A qualquer momento, o cliente pode empregar comportamentos que interferem na terapia. Ocasionalmente, indivíduos com transtornos da personalidade podem apresentar formas extremas de comportamentos problemáticos que cruzam a linha do assédio, abuso emocional ou possível abuso físico do profissional. Em tais casos, o clínico pode conceitualizar os pressupostos do paciente, perguntando a si mesmo: “Qual desfecho positivo pode haver ou qual significado positivo esse comportamento tem para o cliente?” Por exemplo, um paciente pode acreditar que “Se eu assediar meu terapeuta, ele não vai tentar me fazer mudar” ou “Se eu o irritar, isso mostrará que sou forte e que ele é fraco”. Ao mesmo tempo, o profissional deve rotular claramente o comportamento como um processo que interfere na terapia e não pode ser permitido (veja Newman, 1997), o qual pode indicar a necessidade de término do tratamento (veja Davis, 2008; Davis & Younggren, 2009). Em geral, é bom consultar-se com colegas em casos de comportamentos extremos do paciente para desenvolver a conceitualização do desafio da colaboração, gerando ideias para contingências eficazes que possam recolocar a terapia em uma direção produtiva e obtendo apoio emocional, autoproteção apropriada e planos para controle de riscos.

IDENTIFICAÇÃO E RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS DO

No documento BECK TCC dos Transtornos da Personalidade DSM5 (páginas 188-192)