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Etapa 8 Conclusão do estudo.

2 PARTICIPAÇÃO POLÍTICA E COMUNICAÇÃO PÚBLICA: CONCEITOS E INTERFACES

2.4 TEORIA DEMOCRÁTICA E COMUNICAÇÃO

2.4.1 Comunicação no Setor Público

Inserida no âmbito da comunicação política, a comunicação desenvolvida no setor público brasileiro foi edificada a partir da base teórica dos estudos sobre comunicação organizacional, que, por sua vez, utiliza, como referência, conceitos produzidos na área de relações públicas. Tal modelo é descendente direto da atividade inventada pelo jornalista americano Ivy Lee que, em 1906, abandonou o jornalismo para abrir o primeiro escritório de relações públicas do mundo e prestar serviços ao magnata John Rockefeller, à época o mais impopular homem de negócios dos Estados Unidos (CHAPARRO, 2002, p.34).

Com a missão de transformar a imagem pública do empresário, Lee marcou o surgimento da nova atividade com uma declaração de princípios, em forma de carta, aos editores dos principais jornais norte-americanos:

Este não é um serviço de imprensa secreto. Todo nosso trabalho é feito às claras. Pretendemos fazer a divulgação de notícias. Isto não é agenciamento de anúncios. Se acharem que o nosso assunto ficaria melhor na seção comercial, não o usem. Nosso assunto é exato. Maiores detalhes, sobre qualquer questão, serão dadas prontamente. E qualquer diretor de jornal interessado será auxiliado com o maior prazer, na verificação direta de qualquer declaração de fato. Em resumo, nosso plano é divulgar, prontamente, para o bem das empresas e das instituições públicas, com absoluta franqueza, à imprensa e ao público dos Estados Unidos, informações relativas a assuntos de valor e de interesse para o público (LEE, 1906 apud CHAPARRO, 2002, p.34).

O documento estabeleceu um pequeno conjunto de regras ético-morais, que tinha por base a credibilidade. Lee comprometeu-se a fornecer notícias e se colocou à disposição dos meios de comunicação, para dar respostas honestas. Mas, foram as ações adotadas para mudar a imagem de Rockefeller que mais se aproximam da essência da atividade que passou a desenvolver: a criação de fatos noticiáveis que pudessem formar valores sobre os quais esculpiria a nova imagem do seu cliente junto à opinião pública.

A primeira providência foi dispensar os guarda-costas que faziam a segurança do empresário. Ato contínuo, levou Rockefeller a comparecer e colaborar com o Congresso norte-americano, que investigava o assassinato de operários grevistas numa das fábricas do magnata, a Colorado Fuel and Iron Co.

O pioneirismo e a perspicácia de Lee poderiam ter elevado a atividade a patamares mais edificantes, não fosse ele também o responsável pela introdução de práticas nefastas, como a corrupção de jornalistas, através de propinas, oferecimento de empregos duplos, viagens, almoços e outras formas vantajosas de convívio com o poder econômico (ANDRADE, 1983).

Inaugurada com esse amplo espectro de práticas, a comunicação praticada nas organizações, sejam elas privadas ou públicas, é ainda vista com ceticismo por muitos estudiosos, a exemplo de Herman; Chomsky (2003), que vêm na atividade uma forma de manipulação da opinião pública.

Na verdade, desde o século XVIII, a manipulação da opinião pública é tema controverso. Em contraposição ao privado, o público é uma categoria que tem sido usada para caracterizar o espaço de formação da opinião. Inicialmente, tinha funções críticas com relação ao poder. Mas tarde, foi refuncionalizada para canalizar a aceitação dos governantes (FREITAG, 1990). Sua evolução para o uso mais frequente, o de opinião pública, segundo Habermas (1984), ocorre paralelamente na trilha da troca de mercadorias e, posteriormente, de forma mais ampla, no desenvolvimento do sistema de circulação de informações.

Ou seja, primeiro as informações trocadas no espaço público referiam-se apenas ao interesse dos comerciantes. Com o surgimento da imprensa, no sentido estrito, é que a transmissão da informação torna-se pública para atender a uma demanda geral. Essa nova função dos jornais surge com a própria evolução da imprensa, que passa de mera circuladora de notícias comerciais a publicadora de opiniões, e, posteriormente, mais do que publicadora, formadora dessas opiniões, da opinião pública, como refere Habermas (1984).

No final do século XIX, o jornalismo já havia se tornado um espaço público de socialização dos discursos particulares. Com isso, as relações com a imprensa passaram a se constituir em preocupação para as interações das instituições empresariais com a sociedade (CHAPARRO, 2002). Com o crash da bolsa de Nova Iorque, em 1929, os industriais voltaram a ser hostilizados pela população norte-americana. Nesse contexto, a informação tornou-se uma necessidade estratégica. A sociedade americana, já com

nível avançado de organização democrática, exigia não apenas saber, mas compreender o que estava acontecendo. Essa pressão levou as instituições a se organizarem para atuar como fontes de informação. Tal demanda foi aproveitada pelas relações públicas que cresceram e se sofisticaram, a partir de modelo introduzido por Ivy Lee (CHAPARRO, 2002).

Desta vez, porém, quem roubou a cena não foi nenhum jornalista ou RP. Foi o então candidato à presidência dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt, que formatou um discurso de soerguimento nacional, misturando técnicas de psicologia e comunicação, tornando-se símbolo até para os profissionais de RP. Foi o primeiro político a usar o rádio como instrumento político (JAMBEIRO et al, 2004).

No Brasil, a atividade de relações públicas, baseada no modelo norte-americano, proliferou depois da Segunda Guerra Mundial, mais acentuadamente no governo de Juscelino Kubitschek. Entretanto, Getúlio Vargas, na década de 1930, já havia introduzido na política os conceitos e elementos de comunicação organizacional. Inspirado por Roosevelt e pela política de difusão ideológica dos ditadores nacionalistas da Europa, Getúlio utilizou largamente recursos e técnicas de comunicação para conquistar aprovação da opinião pública (JAMBEIRO et al, 2004).

Contudo, a comunicação no setor público somente se consolidou no Brasil depois do Golpe de 1964. Com a criação de setores de Relações Públicas, as RP’s, generalizou-se tanto no serviço público como na iniciativa privada a prática de assessoria de imprensa. Esse processo foi estimulado pela estratégia de propaganda dos governos militares, que culminou com a criação e fortalecimento da Assessoria Especial de Relações Públicas da Presidência da República (AERP), que tinha força de superministério e coordenava a rede governamental de divulgação. Tal modelo tornou- se referência para as estruturas governamentais dos estados e municípios e também para empresas de grande porte, particularmente as estatais (CHAPARRO, 2002).