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Etapa 8 Conclusão do estudo.

2 PARTICIPAÇÃO POLÍTICA E COMUNICAÇÃO PÚBLICA: CONCEITOS E INTERFACES

2.1 TEORIA DEMOCRÁTICA E PARTICIPAÇÃO POLÍTICA

2.1.1 Concepções Hegemônicas

Contrapondo-se aos teóricos do século XVIII, o elitismo democrático do início do século XX procurou demonstrar que, nas sociedades modernas, mais populosas e bem mais complexas, a democracia direta era inviável. Weber foi o primeiro a chamar a atenção para as contradições entre o conceito de soberania popular e a prática da democracia na vida moderna, tanto no que se refere à sua relação com a participação política dos cidadãos quanto a seu entendimento como exercício da vontade geral (HELD, 1987; AVRITZER, 1994; AVRITZER; SANTOS, 2003).

Para Weber, a democracia representava um antídoto contra o avanço totalitário da burocracia, mas se restringia a ser um meio de escolher pessoas encarregadas de tomar decisões e de impor limites a seus excessos. Ele entendia a democracia como um campo de testes para líderes em potencial ou como um mecanismo institucional para eliminar os fracos e colocar no poder os competentes na luta por votos e pelo poder. Nesse sentido, segundo ele, a democracia direta seria uma inadequação à política moderna e à mediação de lutas entre facções, porque ou se aceitaria a democracia com lideranças e se admitiria a existência de partidos políticos ou aceitava-se a democracia sem liderança e admitia-se o governo de políticos sem vocação (HELD, 1987).

A crítica à doutrina democrática prosseguiu no período entre guerras. Segundo Schmitt (1926), de Rousseau a Marx, a ideia de racionalidade na esfera política, que implicaria na rejeição de um soberano ilegítimo e na autorização das massas, através de um processo público de luta de classes e de formação da vontade geral expressa pela maioria, não levava em consideração a particularização do debate público. Denominando o processo de “emergência dos interesses particulares”, Schmitt observou que “os partidos não enfrentam uns aos outros discutindo opiniões, mas enquanto grupos de poder econômico-sociais, calculando os seus interesses mútuos e oportunidades de poder” (SCHIMITT, 1926, p. 6).

A formatação de uma teoria crítica da democracia, que passou a ser chamada de elitismo democrático, porém, surge na segunda metade do século XX, com Shumpeter, a partir de suas experiências na Europa, durante o período entre guerras, e, posteriormente, nos Estados Unidos, onde se radicou. Adotando o conceito de soberania popular como ponto de partida, o teórico concluiu ser impossível a formação e a determinação de um conteúdo que reflita a vontade geral. Para manter os fundamentos do conceito de soberania popular, seria necessário retirar do seu conteúdo a ideia de bem-comum, transformando o conceito em um método de escolha de governantes. A democracia, segundo ele, se constituiria, portanto, em um método político, um arranjo institucional para se adotar decisões legislativas e administrativas (SHUMPETER, 1961).

Segundo Schumpeter (1961), as elites políticas em competição garantem a possibilidade de acesso dos mais qualificados a posições de liderança política. Para sustentar suas ideias, o teórico mesclou elementos da teoria democrática e da teoria da sociedade de massas. Na medida em que o exercício da soberania pelas massas é reduzido a um processo de seleção das elites em competição, tal processo torna-se isento dos riscos de irracionalidade própria das massas.

Considerada uma teoria restrita, o elitismo democrático de Schumpeter concentrou-se em dois elementos centrais: a elite como ponto central da teoria democrática e a elite como via de compatibilização entre sociedade de massas e democracia. Com isso, o espectro democrático deixaria de ser formado por um conjunto de indivíduos como suposto nos séculos XVIII e XIX e passaria a lidar com indivíduos autointeressados que almejam a partilha a seu favor da maior quantidade de bens públicos (AVRITZER, 1994).

Apesar de situar-se ainda dentro da concepção hegemônica de democracia, o pluralismo introduziu uma nova preocupação ao debate. Aceitando parte da fundamentação de Schumpeter, Dahl (1997) concluiu que a democracia seria um sistema político em que a oportunidade de participar das decisões é compartilhada amplamente por todos os cidadãos adultos. O termo democracia, no entanto, referia-se a um ideal não alcançado. Por isso, ele propunha o termo poliarquia (governo de muitos) para definir os sistemas políticos com sufrágio amplo e garantia das liberdades e oportunidades individuais.

O debate sobre democracia passa então do elitismo democrático, que desconsidera o conceito de soberania popular e privilegia seu caráter procedimental,

para o pluralismo proposto por Dahl, que estende a ideia de cidadania para além do direito ao voto, mas não ultrapassa os limites da cidadania política6, ou seja, defende a ampliação da participação popular nas decisões políticas, mas mantém as restrições ao direito de ser votado (HELD, 1987). Ainda assim, o debate manteve-se na seara do procedimentalismo. Para Bobbio (1987), por exemplo, o avanço se daria na transformação dos procedimentos em regras para a formação de um governo representativo. Na sua ótica, para ser democrático, o sistema deveria estabelecer um conjunto de regras que garantissem a representação de minorias, entre as quais valeria a pena destacar o peso igual do voto e a ausência de distinções econômicas, sociais, religiosas e étnicas na constituição do eleitorado.

A concepção hegemônica de democracia, portanto, nasce numa via que leva do elitismo ao pluralismo e, em seguida, a uma discussão ampla sobre as regras do jogo democrático ou à sua identificação como regras do processo eleitoral, ou seja, em todas as correntes de pensamento a participação popular esgota-se nos procedimentos de autorização dos cidadãos.