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3.2 BAIRROS DOS GRUPOS PESQUISADOS

3.2.5 Ilha de Caratateua ou a popular Ilha do Outeiro

3.2.5.1 Comunidade do Fama

A comunidade do Fama fica na estrada de mesmo nome tendo seu processo de povoamento iniciado há aproximadamente quarenta anos atrás por famílias de pescadores locais e provenientes do interior que se instalaram em busca de melhores condições de vida. O Fama, como é conhecido popularmente é considerada uma área rural do Outeiro ainda hoje, não possuindo o status de bairro, mas que tem adquirido benfeitorias providenciadas pela gestão municipal. Atualmente, a comunidade conta com a pavimentação de sua via principal que é a Estrada do Fama, uma unidade de saúde da família e uma unidade pedagógica municipal de ensino fundamental e no futuro, a possibilidade do transporte coletivo circular

pelo bairro, facilitando o acesso das pessoas99. Estas obras foram conquistadas a partir das reivindicações de moradoras e moradores mobilizada/os pela Associação dos Moradores da Comunidade do Fama. Esta fundada pelo senhor Ismaelino Carvalho, pai de Ângela Carvalho, uma das Mestras contempladas nesta pesquisa.

Quando eu fui visitar Mestra Ângela para entrevistá-la eu pude vivenciar as dificuldades de locomoção das pessoas dali, pois não há transporte público e quem mora no fim da comunidade tem que percorrer cerca de 6 km de distância como foi o meu caso para chegar até a casa da Mestra100. No início da estrada tem um ponto de mototáxis que fazem o transporte da população, chamei um mototaxista que a conhecia e sabia me levar até a sua casa. No caminho vi que a obra de pavimentação estava em andamento, mas a estrada ainda estava em terra batida. Eu pude perceber no caminho que estava adentrando um ambiente mais rural, com uma feição interiorana, as casas simples de alvenaria com terrenos amplos com árvores frutíferas, criação de aves e jardins com cercas de madeira. Observando esta paisagem bucólica enquanto percorria o caminho eu pude também perceber alguns problemas ali, como casas de madeira construídas de forma improvisada, alguns terrenos que pareciam invadidos, enfim algumas informações que eu pude perceber na paisagem e que indicavam a condição socioeconômica de parte daquela população, confirmada nesta fala da própria Ângela.

A gente ... tem muita gente na beira do rio. Muita gente assim ... hoje trabalhar aqui na nossa comunidade é um desafio muito grande.[...].No ensaio você tem que tá com alimento pras crianças né? ... porque tem muitos que vem vêm se nada. E aqui é uma comunidade ... embaixo (respira fundo e dá um sorriso sem graça) embaixo da pobreza.

Apesar de terem como fonte de renda o açaí e a pesca, esta última não tem gerado recursos suficientes para os pescadores manterem suas famílias devido à pesca predatória realizada pelos novos moradores que utilizam redes de arrastão e impedem o crescimento e a reprodução de peixes e camarões. Com o crescimento da população na comunidade as pessoas têm explorado mais os recursos naturais que já não tem sido suficiente. E diante desta conjuntura a qualidade de vida desta população tem piorado, pois já nem têm disponível na natureza os recursos nem para sua própria alimentação. E quem mais sofre com esta situação são as crianças que ficam sem acesso a uma alimentação adequada, tem sua saúde

99 Para conhecer e visualizar as obras de melhoria ocorrida no bairro ver:

http://www.agenciabelem.com.br/Noticia/134824/moradores-da-estrada-do-fama-em-outeiro-comemoram- chegada-do-asfalto Acessado em 10 nov. 2016.

prejudicada, e ainda falta acesso à educação e variadas formas de lazer. Como moradora do Fama desde que nasceu a mestra Ângela tem forte envolvimento com a comunidade e tem acompanhado as mudanças com objetivo de valorizar a vida comunitária e as pessoas que lá vivem.

Neste sentido, ela é reconhecida na comunidade pelo trabalho que vêm realizando desde que foi presidente do Centro Comunitário do Fama promovendo ações e atividades culturais para as crianças a exemplo da comemoração de datas festivas como Páscoa, Dia das Crianças e Natal. Entre outras atividades como festividade de São Pedro e o festival do Açaí que já ocorre há oito anos. Estas atividades estão ligadas a outras ações que ela realiza junto à comunidade por meio também de projetos sociais sendo impelidas pela melhoria de vida da vizinhança que tem apoiado e reconhecido a pessoa de Mestra Ângela, como a própria me confirmou neste relato.

Eu dou valor na minha comunidade, não dou valor a governo não! Pra mim o governo tá aí olha! (fazendo gesto de desprezo com as mãos). Tanto faz eu quero valorizar a minha comunidade porque essa sim me reconhece. Aqui não tem um muleque desse que seja malcriado comigo. O moleque me chama até de vó. É... tem uns que me chamam de vó sabe? “Ei vovó, ei vovó!” (imitando a fala das crianças). Ei menino, pára com isso que não tenho idade pra ser neto, ter neto! Sabe? O moleque me reconhece não tem um muleque aqui que me manda eu.. ir pra longe, não tem sabe? Por causa dessa vivência né? Da gente tá e tal... E o governo não reconhece o nosso próprio grupo.

Lendo o relato acima, você percebe a estima que a Mestra tem pela sua comunidade e a recíproca é verdadeira, no sentindo que as pessoas se unem em prol das melhorias para seu local de moradia, já que é uma comunidade que apresenta muitos obstáculos e que apesar de alguns avanços ainda há muita dificuldade no acesso aos equipamentos públicos. Uma comunidade rural que tem que lidar com problemas provenientes de ocupações desordenadas, problemas ambientais, desemprego, falta de renda, violência do tráfico e todas as consequências advindas da situação de pobreza desta população. Desta maneira, o papel de liderança de Mestra Ângela dá coesão e fortalece esta comunidade no sentido de estimular seus saberes culturais por meio das atividades do seu grupo além de fomentar outras atividades de lazer e integração da mesma.