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1.6 O conceito de tradução por da Silva, D’Ottaviano e Sette

1.6.2 O conceito de tradução

O conceito de tradução definido nesta subseção foi introduzido por da Silva, D’Ottaviano e Sette (1999). Este conceito é bem geral, pois trata de capturar a intuição inerente à “noção” de tradução.

Definição 1.6.23. Tradução de uma lógica L1 = (𝐿1, C1) em uma lógica L2 = (𝐿2, C2)

é uma função t : 𝐿1 −→ 𝐿2 tal que, para todo X∪{𝑥} ⊆ 𝐿1, se 𝑥 ∈ C1(X), então t(𝑥)

∈ C2(t(X)), em que t(X) = {t(𝑦) : 𝑦 ∈ X}.

Particularmente, quando as lógicas da definição anterior são sistemas lógicos, temos que uma tradução de um sistema lógicoℒ1 em um sistema lógicoℒ2 é uma função t

: For(𝐿1) −→ For(𝐿2) tal que, para todo Γ∪{𝐴} ⊆ For(𝐿1), se Γ ⊢C1 𝐴, então t(Γ) ⊢C2

t(𝐴). Quando Γ = ∅, como t(∅) = ∅, podemos concluir que uma tradução leva teoremas de ℒ1 em teoremas de ℒ2.

Uma tradução t : 𝐿1 −→ 𝐿2 também é denotada por t : L1 −→ L2.

Como podemos perceber, a definição pretende preservar a derivabilidade. Isto se deve ao fato que lógicas são caracterizadas como pares formados por um conjunto (ignorando que em geral uma lógica lida com fórmulas de uma linguagem) e um operador de consequência e as traduções entre lógicas são definidas como funções que preservam relações de consequência.

Proposição 1.6.9. A função t : L1 −→ L2 é uma tradução se, e somente se, t(C1(X))

Proposição 1.6.10. Sejam L = (L, C), Y um conjunto qualquer, f : L −→ Y uma

função e C𝑌 o operador de consequência co-induzido por f e L sobre Y. Então C𝑌 é o

mais fraco operador de consequência que faz f uma tradução. 

Proposição 1.6.11. Sejam L = (L, C) e ∼ uma relação em L dada por 𝑥 ∼ 𝑦 se, e

somente se, C(𝑥) = C(𝑦). A relação 𝑥 ∼ 𝑦 é uma relação de equivalência, a função quociente Q definida por Q(𝑥) = [𝑥] = {𝑦 : 𝑥 ∼ 𝑦} é uma tradução e L∼ = (L/∼, C∼) é a lógica co-induzida por Q e L. 

Definição 1.6.24. Sejam X e Y conjuntos. Uma função f : X −→ Y é compatível com a

relação de equivalência ∼ sobre X se 𝑥1 ∼ 𝑥2 implica que f(𝑥1) = f(𝑥2).

Proposição 1.6.12. Sejam L1 = (𝐿1, C1), L2 = (𝐿2, C2) duas lógicas e t : L1 −→ L2 uma tradução que é compatível com a relação de equivalência ∼ em 𝐿1. Então existe uma única função t* : L1∼ −→ L2 tal que t*∘Q = t, em que Q é a função quociente. A função t* é uma tradução. 

Proposição 1.6.13. Sejam {L𝑖 = (𝐿𝑖, C𝑖)}i ∈ I uma família de lógicas e 𝐹𝑖 : E −→ L𝑖

uma família de funções, para cada i ∈ I, em que E é um conjunto não vazio. O operador induzido por {𝐹𝑖}i ∈ I e {L𝑖}i ∈ I em E, ou seja, o operador induzido por cada um dos 𝐹𝑖 e

cada uma das L𝑖, C𝐸, é o mais forte operador de consequência que torna todas as funções

𝐹𝑖 traduções. 

Definição 1.6.25. Seja {L𝑖 = (𝐿𝑖, C𝑖)}i∈I uma família de lógicas. A lógica produto P

das L𝑖 é dado por P = (P, C𝑃), em que:

(i) P = Πi∈I𝐿𝑖 é o produto direto dos 𝐿𝑖

(ii) C𝑃 é o operador de consequência mais forte sobre P que torna todas as

projeções traduções.

Proposição 1.6.14. Sejam L uma lógica, X um conjunto, f : L −→ X uma função e C𝑋 o operador de consequência co-induzido por f e L em X. Então, C𝑋 é o operador de

Definição 1.6.26. Seja {L𝑖 = (𝐿𝑖, C𝑖)}i∈I uma família de lógicas. A lógica soma, ou co-produto, de {L𝑖}i∈I é dada por S = (S, C𝑆), em que:

(i) Os conjuntos 𝐿𝑖 são dois a dois disjuntos

(ii) S = ∐︀

i∈I𝐿𝑖 é a soma direta dos 𝐿𝑖

(iii) C𝑆 é operador de consequência mais fraco que faz todas as inclusões 𝑞𝑖 :

L𝑖 −→ S traduções.

Proposição 1.6.15. Sejam L1 = (𝐿1, C1), L2 = (𝐿2, C2) duas lógicas e t : L1 −→ L2 uma função, então t é uma tradução se, e somente se, a imagem inversa de cada conjunto fechado é um conjunto fechado. 

Definição 1.6.27. Função fechada é uma função tal que a imagem de todo conjunto

fechado é um conjunto fechado.

Proposição 1.6.16. Uma função t : L1 −→ L2 é uma tradução fechada se, e somente

se, vale t(C1(X)) = C2(t(X)), para todo X ⊆ 𝐿1. 

Proposição 1.6.17. Sejam L1 = (𝐿1, C1), L2 = (𝐿2, C2), L3 = (𝐿3, C3) lógicas e 𝑡1 :

L1 −→ L2 e 𝑡2 : L2 −→ L3 funções. Se L2 é a lógica co-induzida por 𝑡1 e L1, então 𝑡2 é uma tradução se, e somente se, 𝑡2 ∘ 𝑡1 é uma tradução. 

Proposição 1.6.18. Sejam L1 = (𝐿1, C1), L2 = (𝐿2, C2), L3 = (𝐿3, C3) lógicas e 𝑡1 : L1 −→ L2 e 𝑡2 : L2 −→ L3 funções. Se L2 é a lógica induzida por 𝑡2 e L3, então 𝑡1 é uma tradução se, e somente se, 𝑡2 ∘ 𝑡1 é uma tradução. 

Definição 1.6.28. Sejamℒ1,ℒ2dois sistemas lógicos, f: ℒ1 −→ℒ2uma função qualquer

e T(ℒ1), T(ℒ2) os conjuntos de todas as teorias deℒ1 eℒ2, respectivamente. A função

f tem uma interpretação se existe uma função F: T(ℒ2) −→ T(ℒ1) tal que, para toda A

∈ For(ℒ1), A ∈ F(X) se, e somente se, f(A) ∈ X, em que X é uma teoria de T(ℒ2).

Proposição 1.6.19. Seja t: ℒ1 −→ℒ2 uma função qualquer. A função t é uma tradução

As demonstrações das proposições enunciadas acima, que nos possibilita definir tradução de outras maneiras, podem ser encontradas em (da SILVA; D’OTTAVIANO; SETTE, 1999) e em (FEITOSA, 1997). A partir daqui quando usarmos o termo tradu- ção sem nenhum complemento estaremos nos referindo a tradução segundo (da SILVA; D’OTTAVIANO; SETTE, 1999), quando acharmos necessário, a fim de não gerar dúvidas, faremos a citação.

Em da Silva, D’Ottaviano e Sette (1999), os autores introduziram a categoria Tr cujos morfimos são as traduções entre lógicas e os objetos são as lógicas. Estes morfismos e objetos claramente determinam uma categoria, pois a composição entre traduções é associativa e a função identidade é uma tradução que é a unidade para a composição de traduções.

Encontramos, ainda em (da SILVA; D’OTTAVIANO; SETTE, 1999), um tratamento inicial de uma teoria de traduções entre lógicas; estudo de algumas conexões entre traduções entre lógicas e funções uniformemente contínuas entre os espaços de suas teorias; e uma demonstração de que Tr é uma categoria bi-completa.

As traduções de Kolmogorov, Glivenko e Gentzen são traduções de acordo com a definição de (da SILVA; D’OTTAVIANO; SETTE, 1999). Mas, segundo (D’OTTAVIANO; FEITOSA, 2012), as de Godel não são tradução segundo (da SILVA; D’OTTAVIANO; SETTE, 1999). Pois, se a tradução G : CPC −→ CPI, dada na Seção 1.3.1, fosse uma tradução, como ¬¬𝑝 ⊢CPC 𝑝, então ∼∼ 𝑝 ⊢CPI 𝑝. Daí, pelo Teorema da Dedução do

CPI, teríamos ⊢CPI ∼∼ 𝑝 ⊃ 𝑝, mas sabemos que ∼∼ 𝑝 ⊃ 𝑝 não é um teorema do CPI.

Também, se considerarmos que a tradução G2 : CPI −→ S4 é uma tradução segundo (da SILVA; D’OTTAVIANO; SETTE, 1999), então, como 𝑝, 𝑝 ⊃ 𝑞 ⊢CPI 𝑞, teríamos 𝑝, 𝑝

⊃ 𝑞 ⊢S4 𝑞, mas 𝑝, 𝑝 ⊃ 𝑞 0S4 𝑞.

Pesquisas foram realizadas utilizando este conceito de tradução. Por exemplo, Carnielli (1990) propôs uma nova abordagem a semânticas formais para lógicas não- clássicas usando traduções, denominadas semânticas de traduções possíveis; as traduções também são essenciais para as semânticas algébricas de traduções possíveis introduzidas por Bueno-Soler (2004). Fernández (2005) utiliza traduções para investigar combinações de lógicas, mais especificamente decomposição de lógicas. Queiroz (1997) apresenta uma definição de dualidade entre lógicas a partir do conceito de traduções.

O entendimento de importantes conceitos de traduções entre lógicas, parti- cularizações da definição dada acima, é crucial para o desenvolvimento deste trabalho: as traduções conservativas e as traduções contextuais (abstratas). Nos dois próximos capítulos apresentaremos suas definições e principais resultados.

2 Traduções conservativas

O conceito de tradução conservativa entre lógicas foi introduzido por Feitosa (1997) em sua tese de doutorado. Pretendemos estudá-lo neste capítulo. Além da definição, exporemos resultados já existentes sobre traduções conservativas que são relevantes para a nossa tese.

Neste capítulo, também analisaremos o artigo de Russo (2013). O autor trata dos conceitos de interpretação (fraca) e representação (fraca) entre sistemas dedutivos proposicionais e tradução de linguagens. Os conceitos de interpretação (fraca) e represen- tação (fraca) são casos particulares dos conceitos de tradução de da Silva, D’Ottaviano e Sette (1999) e de tradução conservativa, respectivamente.

Ainda neste capítulo, apresentaremos o conceito de transfer introduzido por Coniglio e Carnielli (2002). Transfers são morfismos entre lógicas que são estruturas de pri- meira ordem bi-sortidas. As ideias dos conceitos de tradução (da SILVA; D’OTTAVIANO; SETTE, 1999) e tradução conservativa são recuperadas como casos particulares de transfers.