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Coniglio e Carnielli (2002) introduziram os conceitos de transfer, transfer

elementar, transfer conservativo, tradução e tradução conservativa entre lógicas abstratas

sobre linguagens bi-sortidas de primeira ordem, que podemos considerar como uma dimensão modelo-teorética para os conceitos de tradução e tradução conservativa de da Silva, D’Ottaviano e Sette (1999) e Feitosa (1997), respectivamente.

Lógicas são vistas como estruturas de primeira ordem especiais e podemos comparar o conceito de tradução segundo a abordagem desses autores com a noção de isomorfismo. Colocaremos, a seguir, de forma sucinta, as principais definições a este respeito.

Os transfers entre lógicas abstratas são definidos tendo como teoria subjacente a Teoria de Modelos. Seguem as definições de linguagem de primeira ordem bi-sortida e estrutura bi-sortida para uma tal linguagem.

Definição 2.3.1. Uma linguagem de primeira ordem bi-sortida é um conjunto L = {A1,

A2} ∪𝒫 ∪ ℱ ∪ 𝒞 , em que {A1, A2} é o conjunto básico de tipos de L ; 𝒫 é um conjunto

de símbolos para predicados; ℱ é um conjunto de símbolos para funções; e 𝒞 é um conjunto de constantes. Consideramos que o tipo de cada símbolo de predicado é da forma

A1m × A2n, m, n ≥ 0, e que o tipo de cada símbolo de função é da forma A1m × A2n

−→ A1 ou da forma A1p × A2q −→ A2, m, n, p, q ≥ 0.

Definição 2.3.2. Uma estrutura de primeira ordem bi-sortida para uma linguagem L é

uma quíntupla 𝒜 = ⟨𝐴1, 𝐴2, 𝒫𝒜, ℱ𝒜, 𝒞𝒜⟩ em que 𝐴1 e 𝐴2 são conjuntos não-vazios;

𝒫𝒜 contém, para todo P ∈ 𝒫 de tipo A1m × A2n, m, n ≥ 0, um conjunto 𝑃𝒜 ⊆ 𝐴1m × 𝐴2n; ℱ𝒜 contém, para todo f : A1m × A2n −→ A1, m, n ≥ 0, emℱ , uma função 𝑓𝒜 : 𝐴1m × 𝐴2n −→ 𝐴1 e, para todo g : A1p × A2q −→ A2, p, q ≥ 0, em ℱ , uma função 𝑔𝒜

: 𝐴1p × 𝐴2q −→ 𝐴2; 𝒞𝒜 contém, para toda c ∈ 𝒞 de tipo A1, um elemento 𝑐𝒜 ∈ 𝐴1 e,

para toda d ∈ 𝒞 de tipo A2, um elemento 𝑑𝒜 ∈ 𝐴2.

Definição 2.3.3. Sejam 𝒜 = ⟨𝐴1, 𝐴2, 𝒫𝒜, ℱ𝒜, 𝒞𝒜⟩ e ℬ = ⟨𝐵1, 𝐵2, 𝒫ℬ, ℱℬ, 𝒞ℬ⟩

estruturas para a linguagem de primeira ordem bi-sortida L. Um morfismo de estruturas é um par h = ⟨𝐹1, 𝐹2⟩, denotado por h : 𝒜 −→ ℬ, tal que:

(i) 𝐹1 : 𝐴1 −→ 𝐵1, 𝐹2 : 𝐴2 −→ 𝐵2

(ii) Se P ∈ 𝒫 é de tipo A1m × A2n, m, n ≥ 0, então (𝑎1, . . . , 𝑎𝑚 ; 𝑏1, . . . , 𝑏𝑛)

∈ 𝑃𝒜 implica que (𝐹1(𝑎1), . . . , 𝐹1(𝑎𝑚) ; 𝐹2(𝑏1), . . . , 𝐹2(𝑏𝑛)) ∈ 𝑃

(iii) Se f : A1m × A2n −→ A1, m, n ≥ 0, está emℱ , então 𝐹1(𝑓𝒜(𝑎1, . . . , 𝑎𝑚 ;

𝑏1, . . . , 𝑏𝑛)) = 𝑓(𝐹1(𝑎1), . . . , 𝐹1(𝑎𝑚) ; 𝐹2(𝑏1), . . . , 𝐹2(𝑏𝑛)). Da mesma forma, se g : A1p

× A2q −→ A2, p, q ≥ 0, está em ℱ , então 𝐹2(𝑓𝒜(𝑎1, . . . , 𝑎𝑝 ; 𝑏1, . . . , 𝑏𝑞)) = 𝑓(𝐹1(𝑎1), . . . , 𝐹1(𝑎𝑝) ; 𝐹2(𝑏1), . . . , 𝐹2(𝑏𝑞))

(iv) Se c de tipo A1 e d de tipo A2 são constantes, então 𝐹1(𝑐𝒜) = 𝑐e 𝐹2(𝑑𝒜)

= 𝑑.

Definição 2.3.4. Um isomorfismo h = ⟨𝐹1, 𝐹2⟩ é um morfismo tal que 𝐹1 e 𝐹2 são funções

bijetivas e na condição (ii) da definição de morfismo o “implica que” é substituído por “se, e somente se”.

Definição 2.3.5. Sejam 𝒜 = ⟨𝐴1, 𝐴2, 𝒫𝒜, ℱ𝒜, 𝒞𝒜⟩ e ℬ = ⟨𝐵1, 𝐵2, 𝒫ℬ, ℱℬ, 𝒞ℬ⟩

estruturas para a linguagem de primeira ordem bi-sortida L. Um mergulho de 𝒜 em ℬ é um morfismo h = ⟨𝐹1, 𝐹2⟩ : 𝒜 −→ ℬ tal que h é um isomorfismo de 𝒜 na restrição

de ℬ a ⟨𝐹1[𝐴1], 𝐹2[𝐴2]⟩, ℬ|⟨𝐹1[𝐴1], 𝐹2[𝐴2]⟩, em que 𝐹1[𝐴1] = {𝐹1(𝑎) : 𝑎 ∈ 𝐴1} e 𝐹2[𝐴2] =

{𝐹2(𝑏) : 𝑏 ∈ 𝐴2}.

Definição 2.3.6. Sejam 𝒜 = ⟨𝐴1, 𝐴2, 𝒫𝒜, ℱ𝒜, 𝒞𝒜⟩ e ℬ = ⟨𝐵1, 𝐵2, 𝒫ℬ, ℱℬ, 𝒞ℬ⟩

estruturas para a linguagem de primeira ordem bi-sortida L. Um mergulho elementar de 𝒜 em ℬ é um morfismo ⟨𝐹1, 𝐹2⟩ : 𝒜 −→ ℬ tal que para qualquer fórmula 𝜙(𝑥1, . . . , 𝑥𝑚 ; 𝑦1, . . . , 𝑦𝑛) e para quaisquer ⃗𝑎 = (𝑎1, . . . , 𝑎𝑚) ∈ 𝐴1m, ⃗𝑏 = (𝑏1, . . . , 𝑏𝑛) ∈ 𝐴2n, segue

𝒜  𝜙[⃗𝑎 ; ⃗𝑏] se, e somente se, ℬ  𝜙[𝐹1(𝑎1), . . . , 𝐹1(𝑎𝑚) ; 𝐹2(𝑏1), . . . , 𝐹2(𝑏𝑛)].

Seguem, agora, definições específicas dadas por Coniglio e Carnielli (2002).

Definição 2.3.7. Uma linguagem de primeira ordem bi-sortida L é uma linguagem básica

de lógicas abstratas se ela é formada por {form, Sform} ∪ {𝜀, ⊢} ∪ {d, s} ∪ {0}, tal que

{form, Sform} é o conjunto de tipos básicos de L; 𝜀 e ⊢ são símbolos para predicados de tipos form × Sform e Sform × form, respectivamente; d : Sform × Sform −→ Sform e s : form −→ Sform são símbolos para funções; e 0 é uma constante de tipo Sform.

Definição 2.3.8. Uma lógica abstrata ℒ é uma estrutura bi-sortida para a linguagem

básica L da forma ℒ = ⟨A, P, 𝜀ℒ, ⊢ℒ, dℒ, 𝑠ℒ, 0ℒ⟩ que satisfaz os seguintes axiomas

em L:

(𝐴1) (∀X)(∀Y)(X = Y ↔ (∀𝑥)(𝑥 𝜀 X ↔ 𝑥 𝜀 Y))

(𝐴2) (∀𝑥)(∀𝑦)(𝑦 𝜀 s(𝑥) ↔ 𝑦 = 𝑥)

(𝐴3) (∀X)(∀Y)(∀𝑥)(𝑥 𝜀 XdY ↔ ((𝑥 𝜀 X) ∨ (𝑥 𝜀 Y)))

(𝐴4) (∀𝑥)¬(𝑥 𝜀 0)

(𝐴5) (∀X)(∃Y)(∀𝑥)(𝑥 𝜀 Y ↔ ¬(𝑥 𝜀 X))

(𝐴6) (∀X)(∃Y)(∀𝑥)(𝑥 𝜀 Y ↔ X ⊢ 𝑥).

Definição 2.3.9. Sejam L’ uma extensão de L e ℒ uma estrutura para L’, então ℒ é

Definição 2.3.10. Seja L’ uma extensão de L. Então, uma lógica abstrata standard para

L’ é uma lógica abstrata ℒ para L’ tal que P ⊆ ℘(A) = {Γ : Γ ⊆ A}; 𝜀ℒ ⊆ A×P é a

relação de pertinência; dℒ : P×P −→ P é a operação de união; 𝑠ℒ : A −→ P é dada por 𝑠(𝑎) = {𝑎} para todo 𝑎 ∈ A; e 0 é o conjunto vazio.

Teorema 2.3.1 (Teorema de Representação para Lógicas Abstratas). Seja ℒ = ⟨A, P,

{𝜀, ⊢}∪𝒫, {dℒ, 𝑠}∪, {0}∪𝒞⟩ uma lógica abstrata sobre uma extensão L’ de L. Então existe uma lógica abstrata standard ℒ ’ sobre L’ que é isomorfa a ℒ . 

Com o teorema acima, temos que modelos standards caracterizam as meta- propriedades de lógicas abstratas dadas por fórmulas de L’.

Definição 2.3.11. Sejam L’ uma extensão de L e ℒ1, ℒ2 duas lógicas abstratas sobre L’

tais que form1 = 𝐴1, Sformℒ1 = 𝑃1, formℒ2 = 𝐴2 e Sformℒ2 = 𝑃2. Um transfer de ℒ1

em ℒ2 é um morfismo ⟨𝑇 , 𝑇*⟩ : ℒ1 −→ℒ2 tal que 𝑇*(Γ) = {𝑇 (𝑎) : 𝑎 ∈ Γ} = 𝑇 (Γ), para

todo Γ ∈ 𝑃1.

Definição 2.3.12. Um transfer conservativo é um transfer tal que a condição (ii) da

definição de morfismo é satisfeita trocando “implica que” por “se, e somente se”.

Uma definição mais estrita que a de transfer conservativo é introduzida pelo conceito de transfer elementar.

Definição 2.3.13. Um transfer elementar é um transfer que é um mergulho elementar.

Abaixo daremos as definições de tradução e tradução conservativa segundo Coniglio e Carnielli (2002), baseadas em sua definição de transfer.

Definição 2.3.14. Uma tradução é um transfer tal que L’ = L.

Definição 2.3.15. Uma tradução conservativa é um transfer conservativo tal que L’ = L.

Uma tradução, ou um transfer quando se trata da linguagem básica de lógicas abstratas, essencialmente transfere elementos das linguagens de lógicas abstratas. Esta

definição de tradução é geral, mas, como argumentado por Coniglio e Carnielli (2002), é muito exigente, segundo o nosso ponto de vista bastante restritiva para um conceito que pretende ser geral, visto que cada conectivo da lógica original deve ser traduzido em outro conectivo.

Uma tradução segundo da Silva, D’Ottaviano e Sette (1999) preserva a relação de consequência da lógica domínio na lógica alvo, ou a derivabilidade. Como o artigo (CONIGLIO; CARNIELLI, 2002) trabalha com lógica standard, o único símbolo de predicado é a relação de consequência, daí, uma tradução ⟨𝑇 , 𝑇*⟩ : ℒ1 −→ℒ2 é tal que

Γ ⊢1 𝑎 implica que 𝑇 [Γ] ⊢ℒ2 𝑇 (𝑎), recuperando a ideia de (da SILVA; D’OTTAVIANO;

SETTE, 1999). E, uma tradução conservativa, recupera a ideia de tradução conservativa de Feitosa (1997). Claro que o operador de consequência Tarskiano respeita as condições dadas na Definição 1.6.1, enquanto a relação de consequência definida numa lógica abstrata não precisa respeitar qualquer condição.

Coniglio e Carnielli (2002) defendem que uma boa definição de tradução entre lógicas é dada pelo conceito de transfer elementar, que é um conceito intermediário entre os conceitos de isomorfismo e de transfer conservativo. Se ⟨𝑇 , 𝑇*⟩ : ℒ1 −→ ℒ2 é um

transfer elementar, então, pelas definições de mergulho elementar e transfer, para qualquer fórmula 𝜙(⃗𝑥 ; ⃗𝑋) e para quaisquer ⃗𝑎 = (𝑎1, . . . , 𝑎𝑚) ∈ 𝐴1m e ⃗Γ = (Γ1, . . . , Γ𝑛) ∈ 𝑃1n,

segue

ℒ1  𝜙[⃗𝑎; ⃗Γ] se, e somente se, ℒ2  𝜙[𝑇 (𝑎1), . . . , 𝑇 (𝑎𝑚); 𝑇*(Γ1), . . . , 𝑇*(Γ𝑛)].

Este conceito preserva não apenas a derivabilidade, mas também as meta- propriedades das lógicas envolvidas. Neste sentido de preservar as meta-propriedades da lógica original na lógica alvo, surgiram os conceitos de meta-tradução, tradução contextual e hipertradução, introduzidas, respectivamente, por Coniglio (2005a), Carnielli, Coniglio e D’Ottaviano (2007) e Figallo (2013), que serão apresentados no próximo capítulo. Estes três últimos conceitos citados de meta-tradução, tradução contextual e hipertradução não são tão estritos quanto o de transfer, que leva cada conectivo da lógica domínio em um conectivo correspondente na lógica alvo. Antes de finalizar o presente capítulo, na próxima seção, vamos fazer algumas considerações a respeito dos conceitos aqui apresentados.

2.4

Considerações sobre as relações entre os conceitos de tradução