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Capítulo I – As políticas educacionais no Ensino Superior

4.4 Concepções sobre Docência

De acordo com a perspectiva teórica da psicologia histórico-cultural

O homem não se relaciona diretamente com o mundo, sua relação é mediada pelo conhecimento objetivado pelas gerações precedentes, pelos instrumentos físicos ou simbólicos que se interpõem entre o homem e os objetos e fenômenos. (Sforni, 2008)

Compreendemos que o ser humano acessa as ferramentas culturais e o conhecimento construído através dos processos de mediação. Quando nos referimos especificamente aos processos de aprendizagem de conceitos escolares, essa mediação possui um caráter pedagógico que se dá através de planejamento de ações elaboradas que visam propiciar a aprendizagem. Dessa forma, aceitamos que as concepções que os docentes carregam sobre o seu papel nesse processo também afetam a forma como ensinam e, por conseguinte, como os discentes aprendem.

As Concepções sobre Docência e ser docente também contribuem enormemente para a compreensão do fenômeno como um todo, por isso, aqui essas concepções aparecem como categorias de análise. O questionário possuía uma questão que visava investigar as concepções sobre docência e ser docente, para que fosse possível analisar como os professores compreendem seu papel na instituição. A maioria das respostas foi semelhante, relacionadas em sua maioria a um mediador do aprendizado; estimular pessoas a aprenderem; indicar caminhos e ferramentas, entre outras, como apresentadas nos trechos a seguir:

Docente (1)

para mim é uma missão. [...] o ato de ensinar, na verdade. Contribuir para o aprendizado de uma pessoa é fundamental. [...] o que eu sempre falo para os alunos é que eu acho que a gente não...não é que a gente ensine algo a alguém, na verdade a gente [...] conduz. O professor é meio que um

mediador do processo de ensino e aprendizagem. Mas o ato de ensinar é você facilitar. Eu diria isso.

A gente é um facilitador do processo de aprendizado dos alunos. Docente (2)

[...] ser docente ou ser professor é você poder garantir que outras pessoas aprendam o que você já sabe e que possam aprender mais do que você já sabe. Então a gente não tem que ensinar, colocar na cabeça da pessoa o que a gente sabe. Tem que indicar o caminho e as ferramentas para que eles

possam aprender sozinhos e que possam sempre ultrapassar a gente. Afinal de contas, só faz ciência

se a geração nova faz mais do que a anterior fez. Não há reprodução do conhecimento. [...] É uma obrigação da gente mostrar esse caminho para que ele possa entender o que a gente já sabe;

construir um pouco mais no futuro.

Docente (3)

momento. [...]você pega os alunos com dificuldades e tenta tirar aquelas dificuldades estimulá-los,

motivá-los, fazer com que eles gostem da sua aula independente de qualquer coisa. Fazer com que os

alunos vençam as dificuldades, gostem da matéria e aprendam. No final você consegue fazer um resultado quantitativo, que as provas são provas. Mas aquelas provas refletem o andamento do curso e ser professor para mim é isso. É transformar a realidade dos alunos e encarar os alunos de acordo com as necessidades deles e fazer o possível para eles ficarem motivados e aprenderem.

Docente (5)

[...] docente tem que ser uma pessoa muito paciente[...]. É querer ensinar [...] o que é ser docente [...] essa pergunta difícil. Eu acho assim, você tem que se mirar nos seus professores, tem que gostar de [...] eu acho assim, a pessoa tem que acreditar que aprender vai fazer bem para aquela pessoa. Docente (6)

[...] para mim é o que eu sei fazer. Acho que eu não saberia fazer outra coisa. [...] Quero morrer aqui dando aula e enquanto eu tiver forças eu vou prosseguir. E é muito gratificante você, às vezes, encontra com um ex-aluno que já esta com um emprego bom [...] Você formar esse pessoal que entra novo. Daqui uns anos eles vão tudo estar casados, as vezes passam pela rua, falam com você, então tem esse lado. Às vezes eu me sinto como se eles fossem meus filhos. Então, docência para mim é o

que eu faço há mais de 20 anos, e espero fazer mais. Não sei se eles gostam, mas eu adoro dar aula.

Não se eles gostam da minha aula, mas que eu adoro, adoro. Gosto muito de fazer o que eu faço. Docente (4)

Você faz uma espécie de guia. [...] Então o que... o papel do docente? Ele organiza essa informação de tal maneira que com a experiência dele, ele sabe que as primeiras que ele coloca é a que ele julga que é mais simples e sistemática. [...] então é uma espécie de [...] fazendo uma analogia com aquele tambor lá no barco. [...] O cara que está tocando o tambor, ele não faz o barco andar. Ele só marca o ritmo. Ele, digamos [...] uniformiza para que você tenha aquele ritmo e tenha como se fosse uma base, um norte. [...] E tem um outro papel também que é dar como se fosse uma interpretação da coisa, uma interpretação, uma conexão[...]. O docente ele tem [...] a possibilidade de responder aos seus

estímulos e fazer conexões com coisas que você sabe mais ou sabe menos, ou mudar a explicação

quando necessário for. Tem gente que entende de um jeito, tem gente que entende de outro jeito e então [...] ele fornece diferentes interpretações para a mesma coisa, na tentativa de que alguma interpretação daquelas encaixe com o que você já sabia antes. E ao fazer isso, você dá uma espécie de

estimulo. Você estimula a pessoa a estudar aquilo por que é muito bom aprender. Quando você

entende uma coisa, isso é estímulo suficiente.

Entretanto, apesar da maioria das falas terem trazido aspectos de mediação e de relação de afeto com a função, outras apresentaram concepções diferentes sobre docência.Em uma das entrevistas, o relato traz que, apesar de compreender o papel do professor como sendo de mediador, aprender o conteúdo é muito mais função do aluno, e irá depender do esforço dele tal apreensão, como apresentado no seguinte trecho:

Docente (4)

[...] não é uma questão de ensinar. Acho mesmo que não dá para ensinar nada para ninguém. Por exemplo, eu diria que meu pai me ensinou a andar de bicicleta, mas não foi bem isso. Não tem nada que ele me disse que eu aprendi a andar de bicicleta baseado em alguma informação que ele me deu. É diferente quando eu digo para você que país é a capital da França, essa informação fui eu que lhe dei. Você não chegou nela. Quando você ensina uma pessoa a andar de bicicleta, você não diz nada para a pessoa. Você diz uma espécie de passo a passo ‗olha, primeiro tenta isso [...] por que essa parte é mais complicada [...] e é muito parecido assim com a matemática.

Essa função do esforço particular fica evidente quando analisamos algumas falas dos professores e de outros atores da instituição relativas às dificuldades enfrentadas pelos alunos, inclusive presente nos discursos dos próprios alunos, de maneira que passamos a compreender

que a filosofia do esforço individual perpassa pelas práticas pedagógicas institucionais. A partir de uma visão sobre uma instituição ‗afastada‘ dos processos educativos, coloca-se no aluno a responsabilidade do aprender e, como afirma Cenci & Costas (2011) ―sendo a escola a detentora do ‗saber matemático‘, os alunos que não seguem as normas acabam por enfrentar dificuldades em sala de aula‖. Por esse motivo, devemos apostar nas relações de mediação pedagógica de qualidade, relações estas que promovem mudanças qualitativas nos processos psicológicos superiores, que, segundo Vygotsky (1993) são imprescindíveis para o desenvolvimento sociocultural e cognitivo do homem.