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Fracasso escolar em matemática no ensino superior: um estudo exploratório à luz da psicologia histórico-cultural

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Academic year: 2021

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

Aléxia Thamy Gomes de Oliveira

FRACASSO ESCOLAR EM MATEMÁTICA NO

ENSINO SUPERIOR: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO À

LUZ DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL

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Aléxia Thamy Gomes de Oliveira

FRACASSO ESCOLAR EM MATEMÁTICA NO ENSINO

SUPERIOR: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO À LUZ DA

PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos para obtenção do grau de Mestre em Psicologia

Área de concentração: Psicologia Escolar e Educacional Orientador: Profº Herculano Ricardo Campos

Co-orientadora: Profª Maria da Apresentação Barreto

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes – CCHLA

Oliveira, Aléxia Thamy Gomes de.

Fracasso escolar em matemática no ensino superior: um estudo exploratório à luz da psicologia histórico-cultural / Alexia Thamy Gomes de Oliveira. - Natal, 2020.

148f.: il. color.

Dissertação (mestrado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2020.

Orientador: Prof. Dr. Herculano Ricardo Campos.

Coorientadora: Profa. Dra. Maria da Apresentação Barreto.

1. Psicologia Histórico-Cultural - Dissertação. 2. Mediação Pedagógica - Dissertação. 3. Fracasso Escolar - Dissertação. 4. Ensino Superior - Dissertação. 5. Matemática - Dissertação. I. Campos, Herculano Ricardo. II. Barreto, Maria da Apresentação. III. Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 159.9:378

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Agradecimentos

Agradeço à minha mãe, Necy, por toda história de lutas para ter uma filha no Ensino Superior, que me fizeram chegar até aqui; e toda a inspiração que me deu para continuar, mesmo nos momentos mais difíceis;

Ao meu querido companheiro Ted Leandro, por todas as conversas sobre a vida; sobre conhecimento científico; por toda nossa construção e evolução cotidiana e por todos os dias me mostrar o quanto a vida pode ser linda. Obrigada por ser você e por todo apoio à pesquisa;

À minha parceira da vida, Flávia, por todas as noites de karaokê por vídeo-conferência que tanto me fizeram (e fazem) sorrir;

À Amsterdam, por todo o apoio e carinho de sempre e por todos os momentos de confidências desde o Ensino Médio;

À Cleiton Belmiro, símbolo de fortaleza, que mesmo distante, me apoiou tanto durante mais um percurso;

À Pollyanna, por todas as tardes de ricas discussões sobre Vygotsky, Bakhtin e o Mulherismo;

À Carol, presente que a universidade me deu e com quem tanto eu compartilhei dos doces aperreios acadêmicos;

À Gleenda, minha maninha, que tanto me apoiou e que tanto contribuiu para este trabalho, por todos os rápidos encontros e abraços no ―meio do caminho‖;

À George, pelas noites de muitas conversas que um dia se tornarão um podcast; À Lúcia, Martin e Milena por todos os momentos de alegria;

À minha amiga Joyce, pelas ótimas tardes de conversas filosóficas sobre vida e finitude;

Aos meus queridos amigos Francisco, Débora, Layon, Renato, Aline, Aline 2, Breno e Kleyton pelos momentos de alegria;

Ao meu querido orientador, Prof. Dr. Herculano Campos, pelo contínuo apoio, cuidado e ensinamentos durante minha jornada acadêmica e por me mostrar sempre a coerência entre conhecimentos científicos e transformação social;

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À maravilhosa Profª Drª Maria da Apresentação Barreto, minha co-orientadora, pelo carinho e pelos aconselhamentos (acadêmicos e não-acadêmicos) que sempre me ajudaram (e ajudam) enormemente;

À querida Profª Drª Cláudia Kranz, pela leitura cuidadosa de meus textos; pelas indicações maravilhosas, essenciais para o desenvolvimento desta pesquisa e pelos valiosos ensinamentos durante o estágio à docência;

À Profª Drª Halana Borowsky, pelos inúmeros momentos de conversa pré e pós aulas, durante o estágio à docência; pela amizade e acolhimento na disciplina e pelas inúmeras referências maravilhosas;

À Profª Drª Adriane Cenci, pelos inúmeros conselhos sobre a vida acadêmica e pela torcida de sempre;

À Profº Drª Vânia Calado, pela tantas conversas sobre os desafios acadêmicos e a necessária persistência;

Á amiga Élida Furtado, pela parceria de sempre na escrita e pelas tantas conversas sobre a vida;

Á Sarah Ruth; Letícia Andrade; Joana Raquel e Renata Kívia pelos momentos de trocas e apoio mútuo durante a realização da pesquisa;

Ao Núcleo de Estudos em Psicologia Histórico-Cultural (NEPHC), cujas discussões tanto enriqueceram essa pesquisa;

Ao Grupo de Estudos Marxismo e Educação (GPM&E), lugar onde dei meus primeiros passos para uma produção de ciência crítica e transformadora;

Ao Centro de Educação, pelo acolhimento de sempre;

À turma de Ensino da Matemática II (2019.2) do curso de Pedagogia, pelo carinho, respeito e pelas trocas durante o meu estágio à docência;

Á todos os participantes da pesquisa, pela disponibilidade e abertura em compartilhar suas ricas vivências;

À Escola de Ciência e Tecnologia, pela abertura e pelos inúmeros ensinamentos; Ao Instituto Metrópole Digital (IMD), lugar onde tudo começou e carinhosamente à equipe do setor pedagógico, que tanto me apoiou durante os últimos momentos da graduação;

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A Superintendência de Informática e à Pró-Reitoria de Graduação, órgãos que tanto me ajudaram durante os momentos iniciais da coleta de dados;

À turma Marielle Franco, pela alegria de sempre e por mostrar as possibilidades de um fazer científico saudável;

Ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia, carinhosamente à equipe da secretaria, que sempre nos salva dos trâmites burocráticos;

A CAPES, pelo suporte financeiro;

A todas e todos que apoiaram essa jornada e que, mesmo distantes, estiveram ao meu lado.

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A História está repleta de pessoas que, como resultado do medo, ou por ignorância, ou por cobiça de poder, destruíram conhecimentos de imensurável valor que, em verdade, pertenciam a todos nós.

Nós não devemos deixar isso acontecer de novo.

Carl Sagan

Se a aparência e a essência das coisas coincidissem, a ciência seria desnecessária.

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Resumo

As relações de ensino e aprendizagem estão inseridas direta ou indiretamente em contextos internacionais de uma nova economia globalizada, de maneira que estas relações são permeadas por decisões político-econômicas internacionais; investimentos de países com forte economia e abdicações dos países de economia mais frágil. Quando nos referimos a cursos da área tecnológica, área esta muito visualizada pelo mercado internacional, não podemos deixar de lado o contexto em que foram criados, para qual fim e as questões que envolvem o ensino da matemática. Quando é visualizada a área de criação de tecnologias como potencial de crescimento econômico dos países, são pensadas, principalmente, estratégias de formação de mão de obra qualificada, e são deixados em segundo plano, os processos educacionais ali envolvidos, necessários para o pleno desenvolvimento de seus alunos, o que se expressa no fenômeno do fracasso escolar nesses cursos. Esse estudo teve por objetivo analisar determinantes do fracasso escolar em matemática no Ensino Superior tecnológico, na disciplina de Pré-Cálculo do Bacharelado em Ciência e Tecnologia em Natal/RN, a partir do olhar da Psicologia Histórico-Cultural. Na sessão dos capítulos teóricos discutimos, primeiramente, a constituição das políticas educacionais no Ensino Superior e o contexto de criação dos Bacharelados Interdisciplinares, para que seja possível a visualização do contexto político internacional em que estão inseridos esses cursos. Em seguida, articulamos a discussão acerca do histórico da matemática enquanto área de conhecimento historicamente permeada de divergências e como esse histórico contribui para o fenômeno do fracasso escolar em matemática no contexto Ensino Superior; e, por fim, discutimos a função social da escola (nessa pesquisa, da universidade), sua importância na apropriação dos conceitos científicos pelos alunos para os Processos Psicológicos Superiores e os danos ocasionados quando dessa não apropriação. A segunda parte será composta pelos dados da pesquisa realizada na disciplina de Pré-Cálculo do curso de Bacharelado em Ciência e Tecnologia, disciplina essa que é composta de conteúdos básicos de matemática; é introdutória ao curso e apresenta os maiores índices de insucesso entre os alunos da ECT. Essa pesquisa lança um olhar para o fenômeno do fracasso escolar em matemática no Ensino Superior, a partir do olhar teórico da Psicologia Histórico-Cultural, pensando o modelo de formação desses estudantes e o seu desenvolvimento. Os resultados apontam principalmente para processos de mediação pedagógica pouco qualificados; distanciamento das relações entre

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docentes, discentes e outros colaboradores e uma urgente necessidade de investimento em ações colaborativas que envolvam os diversos atores da instituição.

Palavras-Chave: Psicologia Histórico-Cultural; Mediação Pedagógica; Fracasso Escolar; Ensino Superior; Matemática.

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Abstract

Teaching and learning relationships are inserted directly or indirectly in international contexts of a new globalized economy, so that these relationships are permeated by international political-economic decisions; investments from countries with a strong economy and abdications from countries with a weaker economy. When we refer to courses in the technological area, an area that is very much viewed by the international market, we cannot ignore the context in which they were created, for what purpose and the issues involving the teaching of mathematics. technologies as a potential for economic growth in the countries, strategies for training qualified labor are thought of, and the educational processes involved, necessary for the full development of their students, are left in second place, which is expressed in the phenomenon of school failure in these courses. This research aimed to analyze determinants of school failure in mathematics in technological higher education, in the discipline of Pre-Calculation of Bachelor of Science and Technology in Natal / RN, from the perspective of Historical-Cultural Psychology. In the section on theoretical chapters, we first discussed the constitution of educational policies in Higher Education and the context for the creation of Interdisciplinary Bachelor's degrees, so that it is possible to visualize the international political context in which these courses are inserted. Then, we articulate the discussion about the history of mathematics as an area of knowledge historically permeated with divergences and how this history contributes to the phenomenon of school failure in mathematics in the context of Higher Education; and, finally, we discuss the social function of the school (in this research, of the university), its importance in the appropriation of scientific concepts by students for Higher Psychological Processes and the damages caused when this non-appropriation. The second part will consist of data from the research carried out in the Pre-Calculation discipline of the Bachelor of Science and Technology course, which is composed of basic mathematical content; it is introductory to the course and has the highest failure rates among students. This research takes a look at the phenomenon of school failure in mathematics in Higher Education, from the theoretical point of view of Historical-Cultural Psychology, thinking about the training model of these students and their development. The results point mainly to poorly qualified pedagogical mediation processes; distancing relations between teachers, students and other collaborators and an urgent need for investment in collaborative actions involving the various actors of the institution.

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Lista de Figuras

Figura 1: Gráfico referente aos dados de aprovações (barras verdes), trancamentos (barras marrons) e reprovações (barras vermelhas) nos semestres de 2013.2 à 2017.1. Pesquisa desenvolvida em uma IES do RN... 20 Figura 2: Dados oficiais. Fonte: Organização para a Cooperação e Desenvolvimento

Econômico (http://www.oecd.org/pisa/) ... 48 Figura 3: referente aos semestres de 2015.1 a 2018.2 da disciplina de pré-cálculo do

curso de bacharelado em Ciência e Tecnologia, disciplina esta introdutória ao curso em seu primeiro ciclo... 70

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Lista de Abreviações

BI - Bacharelado Interdisciplinar ECT - Escola de Ciência e Tecnologia

FMC I - Fundamentos Matemáticos da Computação I FMI - Fundo Monetário Internacional

BM - Banco Mundial

UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte ES - Ensino Superior

MHD - Materialismo Histórico-Dialético PROGRAD - Pró-reitoria de Graduação SINFO - Superintendência de Informática

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

REUNI - Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais

PPC - Projeto Pedagógico do Curso

PISA - Programa Internacional de Avaliação de Estudantes TCLE -Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

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Sumário

Agradecimentos ... 6 Resumo ... 10 Abstract ... 12 Lista de Figuras ... 13 Lista de Abreviações ... 14 Sumário ... 15 Apresentação ... 17 Introdução ... 18

Capítulo I – As políticas educacionais no Ensino Superior ... 24

1.1 O Ensino Superior no Movimento do Capital Mundial ... 24

1.2 O Fracasso Escolar – Uma contextualização histórica ... 32

1.3 Fracasso Escolar no Ensino Superior ... 36

Capítulo 2– Educação Matemática e o Fracasso Escolar ... 40

2.1 O Ensino da Matemática e seus desafios ... 40

2.2 Concepções sobre matemática: de que matemática estamos falando? ... 43

2.3 Fracasso Escolar em Matemática ... 47

2.4 E a educação matemática no Ensino Superior? ... 52

Capítulo 3– O Olhar da Psicologia Histórico-Cultural ... 54

3.1 Mediação, Função Social da Escola e o Ensino Superior ... 54

3.2 Apropriação dos Conceitos Científicos: Função Social da Escola e a Mediação Pedagógica 56 3.3 A Mediação Pedagógica e o Ensino Superior ... 59

O Método e a Metodologia a partir da perspectiva Histórico-Cultural ... 64

4.1 Apresentando os dados da Escola de Ciência e Tecnologia - ECT ... 68

4.2 Equipe ECT – Atores Envolvidos ... 76

4.3 Pré-Cálculo – A disciplina ... 91

4.4 Concepções sobre Docência ... 96

4.5 Desafios na disciplina de Pré-Cálculo ... 98

4.6 Categorias ... 122

Considerações Finais ... 137

Referencias Bibliográficas ... 140

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Parte I

Na primeira parte do estudo serão discutidos os principais conceitos da teoria que foram trabalhados na pesquisa.

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Apresentação

Antes de iniciarmos a discussão especificamente do tema da pesquisa, é importante explicitar as relações de ensino e aprendizagem como inseridas direta ou indiretamente em contextos internacionais de uma nova economia globalizada. Quando nos referimos a cursos de nível superior das áreas tecnológicas, não podemos deixar de lado o contexto em que foram criados, e para qual fim. Para este estudo, vale ressaltar que, com as transformações econômicas internacionais, são geradas novas necessidades do mercado mundial (formação de mão de obra qualificada, por exemplo), fazendo com que novas configurações de ensino sejam criadas para responder a tais demandas. Dessa forma, o modelo de Ensino Superior brasileiro também sofre essas transformações, modificando seus currículos; criando novos formatos nos cursos de graduação; investindo em áreas específicas, e visando, para além da formação da sociedade, corresponder às expectativas internacionais de desenvolvimento econômico de um país. Essas transformações são explicitadas no documento intitulado ―Políticas Públicas para a Educação Profissional e Tecnológica‖ segundo o qual

[...] A escola tende progressivamente a se transformar, propiciando a aquisição de: princípios científicos gerais que impactam sobre o processo produtivo; habilidades instrumentais básicas que incluem formas diferenciadas de linguagens próprias, envolvendo diversas atividades sociais e produtivas; categorias de análise que facilitam a compreensão histórico-crítica da sociedade e das formas de atuação do ser humano, como cidadão e trabalhador; capacidade instrumental de exercitar o pensar, o estudar, o criar e o dirigir, estabelecendo os devidos controles. Brasil (2004, p. 08)

Entendemos que o sistema educacional de um país, seja no Ensino Básico ou no Ensino Superior, torna-se compatível com as decisões internacionais à medida que dependem das relações econômicas, e que as decisões políticas impactam diretamente nos rumos do sistema de ensino. Além disso, compreender essas relações sociais, econômicas e políticas faz-se necessário para uma leitura global do fenômeno do fracasso escolar, pois compreendemos que tal fenômeno não está isolado das relações que o cercam. A partir dessas considerações, podemos iniciar a discussão central da pesquisa que é o Ensino Superior e o fracasso escolar em matemática.

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Introdução

O interesse pela temática do fracasso escolar no Ensino Superior se deu a partir do desenvolvimento do projeto de estágio de último ano do curso de Psicologia, desenvolvido em uma Instituição de Ensino Superior Tecnológico no ano de 2017, que versava sobre os altos índices de reprovação e retenção em disciplinas do Bacharelado Interdisciplinar em Tecnologia da Informação. Nos atendimentos realizados com alunos e professores foi possível notar demandas comuns a respeito dos altos índices de reprovação em algumas disciplinas e as dificuldades para cursá-las. As questões demandaram uma maior investigação acerca dos processos de ensino e aprendizagem e foi possível perceber que, na maioria das vezes, tais questões envolviam o ensino da matemática.

O fracasso escolar aqui é apresentado não somente na reprovação, mas nos diversos processos envolvidos nos contextos de ensino e aprendizagem, entendendo que o fracasso não se expressa somente através de uma nota baixa ou na reprovação, como também no cotidiano das mediações existentes nas instituições escolares. Professores, alunos e instituições buscam através de diversas estratégias, modificar os índices preocupantes, visando promover real aprendizado de seus alunos, aumentando o número de formados. Por isso, para além dos dados apresentados em formato de índices institucionais onde o estágio foi realizado, buscou-se investigar junto aos (as) professores (as) e estudantes quais os principais determinantes dessa realidade, e o que eles propunham para combater tal fenômeno.

É importante salientar que o processo de investigação na instituição foi realizado a partir do setor pedagógico, lugar onde as demandas de alunos e professores são recebidas e onde comumente são tratadas de maneira individual. O papel do psicólogo no contexto escolar, de maneira geral, é atrelado a processos individualizados e pontuais, onde o aluno que traz a demanda já espera atendimento para obter o aconselhamento da equipe. Porém, entendendo a demanda trazida como um ―sintoma" do fenômeno é importante que a atuação no contexto escolar ultrapasse as barreiras dos atendimentos pontuais, de maneira a perceber, não somente a importância dos atendimentos, como também a criação de estratégias para a compreensão da totalidade e complexidade dos processos de ensino e aprendizagem.

Compreender o contexto escolar como envolto em mediações e complexidades, é compreender que os processos de ensino e aprendizagem também o são, sendo importante

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refletir sobre uma atuação que vise, não somente o sujeito em si, como também as relações que o cercam. É necessário entender que os processos no contexto escolar se constituem de diversos determinantes e que é a partir da apreensão de tais determinantes que se pode compreender o todo, transformando-o.

Assim, foi desenvolvido, durante a experiência de estágio, um estudo com a disciplina de Fundamentos Matemáticos da Computação I (FMC I), introdutória no curso de Tecnologia da Informação na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Tal disciplina apresentava altos índices de reprovação por semestre e as queixas por parte de professores e alunos sobre suas dificuldades na disciplina eram inúmeras. O objetivo da pesquisa era investigar os motivos atribuídos ao fracasso na disciplina de FMC I, a partir de queixas apresentadas por alunos, e professores que a estavam lecionando ou já haviam lecionado, de maneira que fosse possível compreender as principais dificuldades por eles enfrentadas, visando à formulação de estratégias para seu enfrentamento.

Em levantamento de dados de reprovação e retenção na disciplina, realizado junto à coordenação pedagógica do curso, foi possível verificar índices próximos ou mesmo superiores a 50% em alguns semestres letivos do período entre 2013 e 2017, como resumidos na Figura 1. Ainda que se observe todo o intervalo de tempo do estudo, no qual é evidente a queda desses índices entre o primeiro e o último semestre pesquisados, ressalta que no último semestre o índice ainda é próximo dos 40% de retenção, podendo ser considerado preocupante. Também é possível perceber na figura que, nos semestres de 2015.1 e 2016.2, temos o índice de aprovação superior ao de reprovação, entretanto, se somarmos a taxa de reprovação com a taxa de trancamento, temos um índice de insucesso muito próximo ao de sucesso na disciplina.

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Figura 1: Gráfico referente aos dados de aprovações (barras verdes), trancamentos (barras marrons) e reprovações (barras vermelhas) nos semestres de 2013.2 à 2017.1. Pesquisa desenvolvida em uma IES do RN.

Para compreender como esses dados se expressavam na realidade de sala de aula, foram elaborados questionários abertos com o intuito de conhecer o público de alunos e de professores. Devido ao grande número de alunos, não foi possível realizar entrevista individual com cada um, sendo acordado que inicialmente seria respondido um questionário e posteriormente a pesquisadora retornaria à sala para uma conversa sobre os dados e confronto das respostas com a realidade vivenciada por eles.

Com os professores, foi possível realizar entrevistas semi-estruturadas, e sua estrutura teve como base o mesmo questionário aberto respondido pelos alunos, com as devidas adaptações para os docentes. Os questionários e entrevistas abordaram temas como: atribuição de motivos para a reprovação, por parte de discentes e docentes; melhores estratégias de estudo; forma de avaliação; auxilio e disponibilidade de professores; pontos positivos e negativos com relação às experiências de aprendizagem.

As respostas dos alunos nos questionários e na posterior conversa com a turma, assim como os depoimentos dos professores que participaram da pesquisa, apresentaram as principais dificuldades. Os discentes apontaram a disciplina FMC I como de ―muito conteúdo em pouco tempo‖; de terem ―dificuldade de assimilação do conteúdo‖ ou não sentirem ―abertura do docente para tirar dúvidas‖, assim como terem ―dificuldades com a base matemática‖. Em contraponto, os docentes afirmaram que, aos discentes, ―faltam as bases

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 2013.2 2014.1 2014.2 2015.1 2015.2 2016.1 2016.2 2017.1 Aprovados Trancamentos da disciplina Reprovações Linear (Aprovados) Linear (Trancamentos da disciplina) Linear (Reprovações)

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matemáticas‖; que eles ―não se esforçam suficientemente‖ e/ou ―não buscam auxílio dos professores‖, o que dificulta o processo de assimilação do conteúdo.

Os questionários possuíam um espaço em que se pedia que os discentes sugerissem possíveis mudanças institucionais para a redução dos índices de reprovação em tal disciplina. Em suas respostas, os alunos sugeriram que professores fizessem mais atividades em sala; distribuíssem a nota em trabalhos e atividades, não sendo somente vinculada a uma prova valendo 10; solicitaram que a disciplina FMC I fosse mais bem distribuída durante o semestre; entre outras sugestões. Tais sugestões nos revelam que esses alunos estão trazendo demandas que visam possibilitar a obtenção de boa nota através de expedientes outros que não apenas a prova, de modo que, apenas superficialmente, apontam os principais determinantes do processo que têm levado ao fracasso. Em decorrência de tal quadro se situa a presente pesquisa de mestrado, buscando ir mais à fundo na identificação e análise dos determinantes fundamentais deste quadro de mediação e de sua qualidade.

O fracasso escolar em matemática é um fenômeno que assola os diversos processos de aprendizagem, e refletir sobre esse fracasso, em qualquer que seja o nível de escolarização, requer a imersão nos processos de ensino em que tal área e disciplina são contempladas, seja no Ensino Básico ou no Superior. Kranz (2011) afirma que ―historicamente, o fracasso escolar em matemática é uma constante‖ (p. 29) e essa falta de bases matemáticas, que aparece na fala de professores e alunos, se apresenta como um sintoma recorrente, independente do nível escolar. Os determinantes para o fracasso escolar em matemática, ou seja, sua essência, acaba ficando oculta, de maneira que, como posto por Miguel (2010, p. 375) ―as tentativas de explicação do problema transitam pelas ideias de formação inadequada do professor, condições inadequadas de trabalho, dificuldades de aprendizagem dos alunos, desvalorização da escola, programas de ensino obsoletos, etc.[...]‖.

Na Universidade Federal do Rio Grande do Norte esse fenômeno se apresenta de forma contundente no curso de Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia, uma nova modalidade de Ensino Superior que no estado do Rio Grande do Norte (RN) possui a maior quantidade de vagas nos cursos da UFRN. O curso, que oferta em média 560 vagas por semestre, apresenta preocupantes índices de insucesso principalmente em suas disciplinas introdutórias. A partir dessa problemática, o presente estudo teve por objetivo de investigação responder à seguinte questão: quais são os principais determinantes do fracasso escolar no Ensino Superior tecnológico nas disciplinas de matemática do curso de Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia?

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Portanto, o objetivo geral do estudo foi de analisar determinantes do fracasso escolar no Ensino Superior tecnológico, nas disciplinas de matemática do curso de Bacharelado Interdisciplinar em Ciência & Tecnologia em Natal/RN. Os passos para responder ao objetivo geral se apresentam na forma de objetivos específicos, de maneira a caracterizar as ações desenvolvidas pela Instituição de Ensino Superior para promover a aprendizagem nas áreas tecnológicas; analisar o currículo do curso, as disciplinas e o conteúdo lecionado, assim como seu planejamento; investigar a relação entre as ações planejadas e efetivadas e os índices de retenção/reprovação; discutir as práticas pedagógicas com vistas ao enfrentamento do fracasso escolar; investigar a atuação do profissional psicólogo ou psicóloga do setor pedagógico diante do fracasso escolar.

Para responder à esses objetivos partiremos da concepção teórica do Materialismo Histórico-Dialético (MHD), compreendendo os processos da realidade concreta como expressões de sua essência através de seus diversos determinantes. No pensamento dialético, se tem a proposta de conhecer a coisa em si, em suas contradições e em seu movimento. O ato de conhecer pressupõe uma forma de conhecer para além da aparência e essa posição leva-nos a um pensamento crítico a respeito de como é possível conhecer. Para Kosik (1926/1976) atingir o real é destruir a pseudoconcreticidade que nos é aparente, e essa destruição ―não nega a existência ou a objetividade daqueles fenômenos, mas destrói sua pretensa independência, demonstrando o seu caráter mediato e apresentando, contra a sua pretensa independência, prova de seu caráter derivado‖ (p. 20).

Dessa forma, o pensamento dialético faz um movimento de compreender o que apresenta como: a unidade composta de suas partes e suas contradições, onde estas partes constituem e são constituídas umas pelas outras. O método pensado a partir da análise de unidades compreende que é possível decompor o fenômeno em partes que ainda trazem o todo, entendendo que ―a unidade é definida pelo fato de que é a parte de um todo que contém, mesmo que de forma embrionária, todas as características fundamentais próprias do todo‖ (Vigotski, 2018/2001, p. 40).

A perspectiva do MHD admite a complexidade da realidade objetiva, porém, cabe ao(a) pesquisador(a) elaborar estratégias para a melhor apreensão dessa totalidade. A realidade objetiva nos apresenta a aparência dos fenômenos em suas constantes contradições. Quanto maior a compreensão das partes componentes da realidade, maior a representação do fenômeno em sua essência e é a partir dessa compreensão que é possível conhecer. E para a

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análise desses componentes é necessária a compreensão de alguns caminhos, para que se possa apreender a dinâmica do fenômeno em si, de sua essência.

O trabalho que se segue está dividido em duas partes. A primeira é composta pelos capítulos teóricos e a segunda pelos procedimentos e análise dos dados da pesquisa em si. Na sessão dos capítulos teóricos, no primeiro capítulo, apresentamos uma discussão acerca da constituição das políticas educacionais no Ensino Superior no que tange ao Ensino Tecnológico, ressaltando o contexto de criação dos Bacharelados Interdisciplinares. No segundo capítulo discutimos a temática da Educação Matemática no Ensino Superior e o fracasso escolar nessa disciplina. No terceiro, trazemos uma discussão sobre a função social da escola, sua importância na apropriação dos conceitos científicos pelos alunos e como essa apropriação se relaciona com os Processos Psicológicos Superiores, e é aqui que dissertaremos sobre o conceito de mediação e sua relação como processo de ensino e aprendizagem. Esta pesquisa, visando contribuir para a redução dos altos índices de reprovação no Ensino Superior, e para o pleno aprendizado e desenvolvimento de seus alunos, problematiza os preocupantes índices de reprovação nesse nível de ensino, focando nos processos e práticas pedagógicas desenvolvidos na disciplina de Pré-Cálculo, introdutória ao Bacharelado de Ciência e Tecnologia (BCT) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e que apresenta os maiores índices de insucesso entre os alunos deste curso. A segunda parte será composta pela pesquisa em si, focalizando em seus objetivos e aspectos metodológicos, contextualização e caracterização do espaço e das pessoas envolvidas, análise e discussão acerca dos resultados.

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Capítulo I – As políticas educacionais no Ensino

Superior

―A desvalorização do mundo humano aumenta em proporção direta com a valorização do mundo das coisas.‖

Karl Marx

Neste capítulo, serão apresentados alguns aspectos imprescindíveis para a compreensão acerca das questões econômicas que envolvem as políticas públicas de educação superior no Brasil e no mundo, assim como as diversas modificações que permeiam sua história e que dão caminhos outros para o Ensino Superior. Em seguida, será discutido o fracasso escolar como um fenômeno que acompanha o processo de escolarização desde o seu nascimento, contextualizando-o historicamente e como este se expressa no contexto do Ensino Superior.

1.1 O ENSINO SUPERIOR NO MOVIMENTO DO CAPITAL MUNDIAL

O Ensino Superior (ES) vem sofrendo diversas modificações ao longo do tempo de maneira a responder demandas que são influenciadas pelas próprias questões relativas à academia, ao desenvolvimento tecnológico, além das questões econômicas (Juceviciene & Tautkeviciene, 2002). O acesso facilitado ao ES, quando da reestruturação desse formato de ensino e o aumento no número de vagas, gera um novo perfil de aluno, que traz consigo novas demandas para as Instituições de Ensino Superior (IES). Entretanto, tais mudanças nas políticas de acesso ao ES não surgem somente como forma de democratizar o acesso ao ensino para a população menos abastada. Essa é apenas uma das conseqüências dessas políticas, que surgem, principalmente, como forma de desenvolver o mercado com vistas ao crescimento da mão de obra qualificada, respondendo aos órgãos internacionais e objetivando a emergência dos países em desenvolvimento.

Outra problemática acerca da escolarização de nível superior é a do seu financiamento. O direcionamento das verbas e os financiadores são discussões que estão permeadas por interesses diversos, de maneira que, historicamente, por mais problematizações que possam ser feitas sobre as questões de acesso ao ensino, este ainda não se configura como sendo um

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direito de todos. Dessa forma, as discussões trazidas por Saviani (1944) são muito atuais, uma vez que falar sobre a democratização do acesso à educação superior é um assunto que perpassa gerações, principalmente quando se refere ao público que o acessa. De acordo com Saviani (1944)

O ensino de 1º e 2º graus público se articula com o ensino privado em nível superior e, em contrapartida, o ensino de 1º e 2º graus privado se articula com o ensino público de nível superior. Com efeito, os membros das elites são preparados, via de regra, em algumas poucas e caras escolas particulares para, com ou sem o auxílio de cursinhos, conquistarem as poucas e disputadas vagas das universidades oficiais. (Saviani, 1944, p. 14).

Sobre essas transformações e novas configurações acerca da educação, Carnoy (2002) se refere como ―Mundialização‖, que promove grandes mudanças na estrutura dos países, sejam econômicas ou sociais, principalmente quando nos referimos aos países em desenvolvimento, como no caso do Brasil. Esses países são orientados a partirem de regras internacionais para que possam acompanhar as modificações econômicas e essas modificações também alteram o seu papel na economia mundial, de maneira a se equipararem às economias das grandes potências.

Assim, os Governos dos países em desenvolvimento são obrigados a aumentar os gastos com a educação para se dotarem de uma população ativa mais instruída. Um sistema educacional bem estruturado e trabalhadores mais qualificados podem contribuir para atrair capitais de financiamento globalizados que desempenham um papel cada vez mais importante na economia mundial. No entanto, esses capitais têm, igualmente, interesses econômicos a curto prazo que incitam a restringir a função do setor público; além disso, tendem a favorecer o setor privado. O corpo desta ideologia estimulada pela circulação de capitais globais obriga os Governos não só a frear o aumento dos gastos públicos com a educação, mas também a procurar outras fontes de financiamento para garantirem o desenvolvimento de seu sistema educacional. Este projeto mais amplo de restrição dos gastos públicos com a educação corre o risco de impedir os Estados de escolher os meios mais eficazes de desenvolver e aprimorar o ensino no âmbito da nova economia mundial. Carnoy (2002. p. 25).

O caráter concorrencial entre os países em desenvolvimento os obriga a criar novas estratégias de financiamento, promovendo a economia dos recursos públicos, ao mesmo tempo em que abre possibilidades de investimento na educação por meios particulares de participação. A autonomia dos países de economias frágeis sofre certa modificação, pois poderão agir somente dentro dos limites dos acordos estabelecidos com os órgãos internacionais, cujo objetivo é o controle e a redução de gastos desses países para seu contínuo desenvolvimento econômico.

Na década de 1990, o Banco Mundial (BM) implementou mudanças no contexto de reestruturação dos países emergentes em vista da possível crise gerada a partir do endividamento dos mesmos. O BM passa de um banco que lidava apenas com investimentos, para um órgão que assume responsabilidades sobre economias de países emergentes.

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Uma das medidas adotadas pelo Banco Mundial para operacionalização dos seus novos objetivos foi impor uma série de condicionalidades para a concessão de novos empréstimos aos países devedores, usando como instrumental os programas de ajustes estruturais1, condicionando empréstimos à realização de imposições feitas pelo Banco. Silva & Castro (2014. p. 210)

No contexto brasileiro, esse formato da educação superior não foi diferente, obedecendo às demandas mercadológicas internacionais que orientam o formato de gestão para os países latino-americanos em desenvolvimento. O Fundo Monetário Internacional (FMI) na década de 1990 recomendou a implementação de diversas medidas para os países emergentes.

O discurso oficial propagava a necessidade de reforma do Estado com cortes nos gastos públicos sociais e a diminuição da sua dimensão para a superação da crise. Nesse sentido, a lógica do mercado deve-se sobrepor ao Estado para que esse possa ser eficiente e se inserir no processo de globalização, entendido como um fenômeno que exige novas configurações para os Estados nacionais. Silva e Castro (2014. p. 208)

As reformas pelas quais o ES brasileiro passou se apresentam de maneira mais profunda na década de 1990, quando o então presidente Fernando Henrique Cardoso propõe maior abertura nas formas de investimento para o Ensino Superior para ―um processo radical de desregulamentação que abriu o sistema para investimentos privados locais‖ (Santos & Filho, 2008, p. 140). Ainda, quando da aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), n. 9.394/1996 se tem maior flexibilização da organização do Ensino Superior, abrindo espaço para iniciativas privadas, em que, para aumentar a cobertura financeira no Ensino Superior, foi proposta uma diversificação institucional

[...] permitindo que as instituições universitárias se organizassem com diferentes formatos e a diversificação das fontes de financiamento institucional, aumentando cada vez mais o nível de participação das famílias e das empresas privadas no financiamento desse grau de ensino. Silva & Castro (2014. p. 207).

Seguindo as orientações econômicas de órgãos internacionais sobre a política de expansão do Ensino Superior, pode-se dizer que, independente da posição política do governo vigente, para o Brasil, enquanto país periférico ―permanece a limitação orçamentária, a subserviência diante das pressões dos organismos internacionais, [e] a vinculação das instituições públicas de ensino superior às decisões do Ministério do Planejamento, no caso das instituições federais‖. (Leda & Mancebo, 2009, p. 51).

1

Nota do original: denominados SAPs – os ajustes estruturais constituem-se em novas modalidades de empréstimos não vinculadas a projetos mas sujeitos a condicionalidades amplas e severas de cunho macroeconômico e setorial – que passaram a ser geridos pelo Banco Mundial a partir do início dos anos 1980.

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Pensando em estratégias para modificar economia do país e propondo um novo formato de ensino, que pudesse flexibilizar o curso de graduação, em 2006, o então reitor da Universidade Federal da Bahia, professor Naomar Monteiro de Almeida Filho inicia ―uma campanha nas universidades contra o atual formato do ensino ministrado na maioria das universidades, com diagnósticos e análises variados, baseados em dados estatísticos, sobre vagas nas universidades públicas e as altas taxas evasão no ensino superior‖ (Leda & Macebo, 2009, p. 52), apresentando o modelo da ―Universidade Nova‖. Baseando-se em modelos Europeus de Educação Superior, como as orientações contidas na Declaração de Bolonha2 de 1999, foram formuladas novas políticas de reestruturação para as universidades brasileiras, apresentado novos formatos de graduação e tratados entre países emergentes, objetivando a cooperação entre esses países

O Processo de Bolonha serviu de inspiração para diversos tratados na América Latina e no Brasil. Pode-se citar o Tratado Brasil-Portugal, por meio do Decreto 3.927/2001 (BRASIL, 2001), com a criação da Universidade Federal Latino-Americana (UNILA), da Universidade de Integração Internacional da Lusofania Afro-Brasileira (UNILAB) e da Universidade Federal da Integração Amazônica (UNIAM), entre outros. Os tratados têm como objetivo cooperação entre os países para a formação no ensino superior, dando maior mobilidade aos acadêmicos entre os países, facilitando a empregabilidade. Campos (2017. p. 21)

Baseados ainda no mesmo tratado, foram formulados cursos a partir dos sistemas de créditos, dividindo-os em ciclos, como forma de flexibilizar a conclusão dos cursos escolhidos. Esse formato propunha uma formação generalista no primeiro ciclo, no segundo ciclo uma formação específica e no terceiro a formação na pós-graduação. No modelo então explicitado, a ―Universidade Nova‖ proposta pelo professor Naomar passa a ser a inspiração para a criação do REUNI (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais) e a aceitação desse modelo como forma de solução para os problemas vinculados ao Ensino Superior divide opiniões que se mostram preocupadas com as novas condições de trabalho para os professores e de aprendizagem para os estudantes.

É importante considerar que os programas criados como propostas de reforma no Ensino Superior no Brasil são antecedidos por medidas legais já aprovadas pelo governo federal, tais como:

2 Em 1999, os ministros de educação dos países membros da União Européia assinaram um tratado internacional, conhecido como Declaração de Bolonha, em que se comprometeram a implantar, até 2010, compatibilidade plena entre os sistemas universitários europeus. Esse acordo marcou o lançamento do chamado Processo de Bolonha, que tem desencadeado uma gigantesca e complexa reforma universitária em todos os países signatários e aderentes (já totalizando 46 nações) no sentido de adotar princípios e critérios comuns e compartilhados de creditação, avaliação, estruturas curriculares e mobilidade estudantil, na esfera da educação superior. Santos & Filho (2008, p. 127)

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Lei n°10.861, aprovada em 14 de abril de 2004, que instituiu o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES); Lei n°10.973, aprovada em 02 de dezembro de 2004, conhecida como Lei de Inovação Tecnológica; Lei n.º 11.079, de 30 de dezembro de 2004, que institui normas gerais para licitação e contratação de Parceria Público-Privada (PPP), no âmbito da administração pública; Lei n°11.096, sancionada em 13 de janeiro de 2005, que institui o Programa Universidade para Todos (PROUNI); Decreto nº 5.622, de 19 de dezembro de 2005, cuja aprovação deu as bases legais da modalidade da educação a distância (EAD) e, por fim, o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), delineado em 2007. Leda & Mancebo (2009, p. 50)

O REUNI, criado em 2007 e firmado a partir do decreto nº 6.096 de 24 de abril do mesmo ano, foi então uma das estratégias criadas pelo governo federal para responder às orientações de nível internacional como forma de modificar o sistema de ensino, ao mesmo tempo em que propõe nacionalmente a facilidade de acesso ao Ensino Superior. Objetivando ―prevenir a evasão e tornar possível a utilização mais eficiente de recursos materiais e humanos existentes nas universidades‖ (Campos, 2017. p. 22), este programa surgiu no Brasil como política de fomento à expansão do Ensino Superior. Silva & Castro (2014) compreendem tais políticas como formas de evidenciar três tendências distintas de expansão

[...] a expansão pela privatização do ensino, a expansão pelo uso da modalidade a distância e a expansão pela reestruturação das universidades públicas federais. No contexto das universidades públicas federais, o governo vem orientando a expansão do ensino em uma lógica racional dos recursos físicos e humanos existentes. Silva & Castro (2014. p. 213)

Tal programa ganha destaque nas políticas governamentais, apresentando como discurso central a expansão das vagas no ES e a democratização de seu acesso. Esse discurso promove apoio para o REUNI, obscurecendo os reais interesses mercadológicos propostos pela política em âmbito internacional, política esta que caminha diretamente para a ―proposta de diversificação dos cursos de graduação [que] encontra grandes semelhanças com as políticas elaboradas pelo Banco Mundial para os países da periferia do capitalismo‖. (Silva & Castro, 2014. p. 213).

As mudanças no âmbito das IES não se dão somente em nível de ampliação do acesso. Elas também movimentam o formato de gerenciamento dos recursos e controle administrativo seguindo a lógica gerencial, de maneira que ―no que concerne ao Ensino Superior público, o REUNI passa a ser a grande política do governo federal, representado em um programa de ampla dimensão nos campos acadêmico, político e estratégico‖ (Silva & Castro, 2014. p. 214), respondendo também em diversos aspectos às demandas internacionais por ―estabelecimentos escolares que funcionem de maneira satisfatória‖. (Carnoy, 2002, p. 32)

Entretanto, quando são pensadas políticas educacionais a partir de um viés principalmente mercadológico, os aspectos pedagógicos e educacionais podem ficar em segundo plano, o que pode levar a uma expansão do número de vagas sem se associar ―a

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melhor qualidade de ensino‖, (Santos & Filho, 2008, p. 140), prejudicando os processos de ensino e aprendizagem necessários para uma formação qualificada no Ensino Superior. Alunos, professores e instituições de maneira geral acabam sendo negligenciados em detrimento de respostas ao mercado internacional e aspectos tão importantes para a formação humana são sobrepostos pelo cumprimento de metas econômicas, sendo algumas áreas visualizadas como de maior importância para o desenvolvimento do país, principalmente vinculadas ao desenvolvimento científico e tecnológico, como explicitado por Carnoy (2002)

A segmentação que supera as fronteiras de um país significa, na prática, que a mundialização dos capitais e do investimento cria uma demanda globalizada que incide sobre determinados tipos de saberes, em particular, inglês, raciocínio matemático, lógica científica e programação computadorizada, associados aos graus superiores do ensino. Carno (2002, p. 39)

O decreto Nº 6.096, que institui o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, (Brasil, 2007), em seu primeiro parágrafo, apresenta como um objetivo do REUNI criar condições para ampliação das universidades de maneira a melhor aproveitar a estrutura física e dos recursos humanos das instituições. Entretanto, a expansão no número de vagas se mostra uma política que permite o acesso desses estudantes às IES quando nos referimos à sala de aula, enquanto os outros aspectos da vida universitária podem acabar negligenciados. Tal expansão prevê o número de estudantes por professor em sala, o que pode negligenciar as características de ensino e extensão que compõe o Ensino Superior, levando a sobrecarga do trabalho docente, o que ―pode reduzir a pesquisa e a extensão, tendo em vista que o professor terá que se dedicar mais ao ensino em função da quantidade de alunos‖. (Rocha, 2018).

Estudos realizados como os de Guimarães e Jacob Chaves (2005); Ribeiro, Leda e Silva (2015); Leda e Mancebo (2009) sobre a implementação do REUNI nas IES do Brasil trazem dados sobre alguns problemas que já surgem desde a criação do programa, uma vez que as modificações realizadas nas IES levam mais em consideração a atuação do professor em sala de aula. Porém, a atuação do professor está para além dessa ação pontual ao passo que o mesmo acaba por exercer ―atividades registradas, mas nem sempre consideradas oficiais, sendo elas: a participação em órgãos colegiados; as demandas oriundas de órgãos reguladores e avaliadores; a busca de recursos para projetos‖, entre outras. Guimarães e Jacob Chaves (2005, p. 569). Além disso, ―é importante notar que toda esta atividade tem que caber nas horas oficiais trabalhadas pelo docente, que normalmente tem jornada de 40 horas semanais em dedicação exclusiva‖ (Rocha, 2018, p. 200) e ainda que essas políticas atinjam tanto professores quanto alunos, que estão à disposição de uma formação precarizada ―pela massiva

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quantidade de discentes por turma, não dando espaço razoável para o atendimento individualizado‖ (Rocha, 2018, p, 201).

A necessidade de mão-de-obra qualificada para esse novo momento do mercado internacional, de grande desenvolvimento tecnológico, faz com que países emergentes invistam na formação de capital humano, promovendo ―uma nova forma de cooperação intersticial na inovação globalizada‖ (Carnoy, 2002, p. 40), e essa pressão por formação ―exerce uma forte pressão sobre os resultados dos diplomados do Ensino Superior‖ (Carnoy, 2002, p. 41), que é ―capaz de gerar, ao mesmo tempo, o aprimoramento na qualificação profissional e tecnológica, bem como promover mudanças significativas nos outros níveis de ensino‖ (Genghini, 2006, p. 19).

O Ensino Superior, em especial, deve responder pela formação de profissionais cada vez mais especializados e mais flexíveis. As ações direcionadas a esta modernização na Europa, nos Estados Unidos, no Japão e em outros países do primeiro mundo ocorre por iniciativa tanto das universidades quanto dos governos. No Brasil, quase que exclusivamente, as universidades . referenciando: a menor parte delas - , desenvolvem formas de ação que apontam para uma maior adequação a esta nova realidade (idem)

Dessa forma, vale salientar que ―antes mesmo do REUNI, a intensificação do trabalho docente já se mostrava ativo pelas políticas neoliberais dos governos de Fernando Henrique Cardoso (FHC) e Luís Inácio da Silva (Lula)‖. (Rocha, 2018, p, 202).

Nesse contexto de mudanças relativas ao Ensino Superior em nível internacional e nacional, foram criados novos formatos de cursos de graduação, com a proposta de formar profissionais ―com foco na interdisciplinaridade e no diálogo entre as áreas do conhecimento‖, (Brasil, 2010). A modalidade dos Bacharelados Interdisciplinares (BIs) surge nesse novo momento de uma economia globalizada, trazendo um formato de curso que tem como proposta a interdisciplinaridade nas diferentes áreas de ensino superior.

Os cursos de Bacharelado Interdisciplinar (BI) são modalidades de curso que oferecem diplomas em grandes áreas do conhecimento (Artes, Humanidades, Ciência e Tecnologia, Saúde) e têm como proposta a mudança no caráter tradicional do ensino das Instituições de Ensino Superior, de maneira que o egresso do Ensino Médio tenha liberdade para cursar uma graduação no seu tempo, sem a necessidade de uma profissionalização imediata. Dessa forma, o documento de orientação para a criação dos Bacharelados Interdisciplinares propõe que:

[...] tal estrutura demandará processos seletivos para ingresso na universidade mais voltados para o desenvolvimento cognitivo dos alunos do Ensino Médio, com base em avaliações do desempenho acadêmico de caráter processual em todos os ciclos de formação universitária. Assim, com mais flexibilidade curricular, mais possibilidade de diálogo entre as disciplinas e mais liberdade para os estudantes escolherem os seus itinerários de formação, a universidade brasileira poderá reunir as

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condições fundamentais para responder aos desafios do mundo do trabalho, das novas dinâmicas de desenvolvimento do conhecimento e da cidadania do século XXI. BRASIL (2010. p. 04).

O primeiro ciclo dos cursos é constituído por uma etapa inicial de formação caracterizado por uma grade curricular interdisciplinar. Tais cursos podem ainda ser vinculados a campos de saberes específicos, no formato de ênfases e áreas de concentração ou vinculados à carreiras acadêmicas e profissionais no segundo ciclo. Esse formato de curso é fruto das mudanças ocorridas no Ensino Superior brasileiro, com um grande contingente de ingressantes por semestre e com uma proposta de formação de mão-de-obra qualificada para o mercado de trabalho. Entretanto, nessa nova modalidade se tem uma mudança qualitativa no perfil desse profissional e em sua formação, assim como mudanças estruturais na instituição.

O foco da pequisa aqui realizada foi o Bacharelado em Ciência e Tecnologia, curso que faz parte da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e possui o formado de bacharelado interdisciplinar. De acordo com informações da página eletrônica da instituição, a Escola de Ciência e Tecnologia (ECT) foi criada pela resolução 012/2008-CONSUNI, de 1º de dezembro de 2008, como uma unidade acadêmica especializada. Entre os objetivos da Escola, destaca-se o de dar suporte ao desenvolvimento das atividades acadêmicas de ensino, pesquisa e extensão referidas ao Curso de Bacharelado em Ciências e Tecnologia (BCT), provendo, para tanto, as condições para a implantação na UFRN da formação acadêmico-profissional em ciclos sucessivos, em engenharias (Ambiental, Biomédica, Computação, Materiais, Mecânica, Mecatrônica, Petróleo, e Telecomunicação), cursos nas áreas de Ciências Exatas (Matemática, Física, Ciências Atuariais e Estatística), além da possibilidade de manter-se em uma formação chamada ―Generalista‖, onde não há a escolha de uma ―ênfase‖ específica.

É importante ressaltar que em documentos de criação do curso de Bacharelado em Ciência e Tecnologia, como o Projeto Pedagógico do Curso (PPC) ou a própria legislação que rege sua abertura, em consonância com os Referenciais Orientadores para os Bacharelados Interdisciplinares e Similares (2010), são apontados os índices de reprovação e evasão nas IES e a preocupação com sua redução. Entretanto, o fracasso escolar no Ensino Superior é apenas uma das expressões do fracasso escolar enquanto fenômeno, fenômeno este que perpassa os diversos níveis de ensino. Como os demais fatos sociais, o fracasso escolar atrela-se a outros inúmeros acontecimentos, atrela-se constituindo historicamente como uma das possíveis manifestações de uma sociedade dividida em classes. Mas, como se dá a sua constituição?

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1.2 O FRACASSO ESCOLAR – UMA CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

Quando falamos sobre Fracasso Escolar, podemos ter a ligeira impressão de estarmos adentrando em uma seara de insucessos de alunos, professores, familiares, dentre outros aspectos que, por diversos motivos, fracassaram em sua função. Do professor tem-se um ideal daquele que possui o saber e neste lugar deve ―passar‖ para os alunos os conhecimentos necessários. Do aluno, espera-se que, em sua função de aprendiz, busque suas motivações e desejos de aprender. Da família espera-se total compreensão dos processos de aprendizagem; espera-se ainda da escola que ―a mesma não somente instrumentalize os pupilos para as suas necessidades intramuros, mas igualmente para agir no mundo extra-escolar‖, como trazido por Da Rocha Falcão (2009, p. 641). O Fracasso Escolar parece estar sempre apontando para um ―culpado‖, e esperando que esse culpado seja responsabilizado de alguma forma.

Ao analisarmos historicamente o papel da escola, podemos perceber inúmeros entrelaçamentos com a efervescência das modificações políticas e econômico-sociais, principalmente no período em que Hobsbawn (1982) chamará de ―era das revoluções‖, que vai de 1789, quando da revolução francesa,a 1848, período em que ocorreu a revolução industrial (inglesa). Hobsbawn (1982) apresenta tal período como sendo constituinte da ―maior transformação da história humana desde os tempos remotos quando o homem inventou a agricultura e a metalurgia, a escrita, a cidade e o Estado‖ (p. 09)

Dessa forma,à medida que as relações sociais e de trabalho da sociedade feudal, vinculadas quase que exclusivamente a economia agrária, vão se transformando em relações de trabalho industriais, a partir da revolução industrial, e que os ideais burgueses propagados pela revolução francesa transformam a ideia de cidadania, temos uma dupla mudança de organização social. Para Miguel et.al. (2004) essas transformações incluem ainda a Revolução Americana de 1976 e nesse momento o ensino da matemática ganha maior visibilidade, de maneira que ―é somente a partir das três grandes revoluções da modernidade – a Revolução Industrial (1767), a Revolução Americana (1776) e a Revolução Francesa (1789) – que as preocupações com a educação matemática da juventude começaram a tomar corpo‖ (p. 71). Como apresentado por Santos & Filho (2008) ―O desenvolvimento tecnológico que se seguiu à Revolução Industrial exigiu um novo paradigma acadêmico que podemos chamar de universidade científico-tecnológica‖ (p. 123).

É importante atentarmos que a filosofia regente das posições sociais muda de lócus. O cidadão que na sociedade feudal era destinado por deus a permanecer na classe social a qual fazia parte, agora era ―livre‖ para ascender socialmente. A pré-destinação embasada

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religiosamente pregada pela sociedade feudal dá lugar ao mérito pessoal, onde, nas palavras de Hobsbawn, têm-se ―o self-made-man racional e ativo‖.

A construção do conhecimento na história da humanidade acompanha as modificações da sociedade, sejam políticas, econômicas ou culturais, e essas modificações propõem novas formas de funcionamento. Nesse movimento envolvido por contradições, ciência e sociedade se transformam conjuntamente, o que pode nos levar a caminhos inimagináveis, negando ou afirmando fenômenos sociais ou ainda justificando determinados atos em prol de suposta neutralidade científica.

O movimento realizado pela ciência psicológica não poderia ser diferente. Em uma sociedade que pregava um ideal de igualdade, não poderia estar em seu seio a problemática da desigualdade, assim, os critérios de insucesso passaram a ser vinculados aos indivíduos. Seguindo a ideologia da igualdade de oportunidades pregada, os indivíduos que ―não faziam uso das oportunidades dadas socialmente‖ eram apontados como tendo déficit ou a total ausência de determinadas características em diversos âmbitos, seja de cunho biológico ou mesmo cultural, como afirma Patto (1999) ―no nível das ideias, a passagem sem traumas da igualdade formal para a desigualdade social real inerente ao modo de produção capitalista dá-se pela tradução das desigualdades sociais em desigualdades raciais, pessoais ou culturais‖ (p. 50).

Dessa forma, o grande crescimento de teorias que endossavam as diferenças individuais – inclusive ao que se refere à escola – correspondia às demandas da época e consequentemente, corroboravam para o desenvolvimento de uma sociedade que começava a se estabelecer. Ao mesmo tempo em que temos o desenvolvimento significativo na ciência ao que se refere às teorias de origem das espécies, com a publicação de Origem das Espécies, de Charles Darwin em 1859, temos também o uso dessa mesma teoria para justificar o que os intelectuais burgueses vão chamar de ―Darwinismo Social‖.

Patto (1999) ao afirmar que a psicologia teve lugar de destaque nessa sociedade que escondia as desigualdades sociais por meio das ―desigualdades pessoais‖, afirma também que muitas das práticas desenvolvidas à época, nas mais diferentes áreas, justificavam-se por responder a um determinado seguimento social. Dessa forma, o critério de cientificidade foi álibi suficiente para práticas racistas e segregadoras.

Justificando-se biologicamente a partir de diferenças genéticas, através da medicina, ou por meio das influências ambientais, a psicologia buscava adaptar esses indivíduos

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anormais à sociedade, tendo a instituição escolar como lócus de ação. Os diagnósticos respondiam às questões da não-aprendizagem, antes incompreendidas pelas instituições de ensino. Os laboratórios, ao mesmo tempo em que diagnosticavam, buscavam tratamento para os que não aprendiam, separando em ―classes fracas‖ aqueles que possuíam grandes dificuldades para aprender. Patto (1999, p. 67) traz que são ―as crianças provenientes de segmentos das classes trabalhadoras dos grandes centros urbanos, que tradicionalmente integram em maior número o contingente de fracassados na escola‖.

As teorias de nível biológico ou ambiental dão lugar às teorias de carência cultural a partir de alguns antropólogos culturalistas. Uma vez que determinados segmentos populacionais não possuíam acesso à cultura burguesa; as famílias se constituíam de maneira diferente da esperada, a partir do modelo de família instituído; as práticas educativas das crianças se davam de maneiras diferentes das práticas vistas na sociedade burguesa, mudou-se a compreensão das teorias das ―raças inferiores‖, para a teoria das ―culturas inferiores‖.

Em levantamento bibliográfico realizado por Angelucci, Kalmus, Paparelli & Patto (2004) é possível perceber que muitos desses resquícios históricos ainda permeiam os processos de ensino na rede pública de ensino brasileira. A pesquisa teve por objetivo fazer varredura do estado da arte de teses e dissertações defendidas no período de 1991 a 2002, na Faculdade de Educação e no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Das 71 (setenta e uma) pesquisas encontradas e categorizadas, 13 (treze) foram analisadas em profundidade com o objetivo de analisar como o tema do fracasso escolar foi abordado; suas concepções teóricas e metodológicas; teoria e método; concepções sobre escola e fracasso escolar; relação com o conhecimento já produzido e novos aspectos trazidos pelos estudos.

De acordo com as autoras, o levantamento possibilitou já na análise dos resumos uma categorização baseada nos temas, o que já se mostrava preocupante

Chamou a atenção a presença significativa de pesquisas que concebem o fracasso escolar como fenômeno estritamente individual, o que pode ser observado pelo grande número de obras que constam das categorias ―Distúrbios de desenvolvimento e problemas de aprendizagem‖,―Remediação do fracasso escolar‖ e ―Papel do professor na eliminação do fracasso escolar‖. A primeira centra no aluno a responsabilidade pelo fracasso, atribuindo-lhe, predominantemente, problemas cognitivos, psicomotores ou neurológicos. Já as duas outras categorias responsabilizam ora o aluno ora o professor e propõem soluções predominantemente técnicas, de base teórica comportamental ou cognitivista, para eliminar o fracasso. (Angelucci; et al, 2004, p.60).

Tal levantamento somente mostra que a compreensão acerca do fenômeno do fracasso escolar não sofreu grandes modificações ao longo do tempo. No levantamento aparecem

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também outras causas além das individuais, como categorizadas pelas autoras nos seguintes tópicos:

a) fracasso escolar como problema psíquico: a culpabilização das crianças e de seus pais; b) fracasso escolar como um problema técnico: a culpabilização do professor;

c) fracasso escolar como questão institucional: a lógica excludente da educação escolar d) fracasso escolar como questão política: cultura escolar, cultura popular e relações de poder

Porém, esses tópicos ainda são apresentados de maneira desarticulada, como sendo, segundo as autoras, ―concepções inconciliáveis que caminham em paralelo‖. (Angelucci; et al, 2004, p.64).

Por fim, as autoras apontam para ―a deficiência de formação teórica revelada por pesquisadores da educação escolar‖ (p. 64) e para ―as grandezas e misérias dos currículos de graduação e de pós-graduação‖ (p. 65) que produzem pesquisas que contribuem pouco ou não contribuem para a construção de processos de escolarização de qualidade.

No caso em que se desconsidera a dinâmica dos processos de reprovação na educação básica o fenômeno do fracasso escolar continua surgindo como ―fracasso dos indivíduos‖, ―fracasso de uma classe social‖ ou ainda como ―fracasso de um sistema social, econômico e político‖, processo que parece se repetir no contexto do Ensino Superior (Carraher, Carraher & Schliemann, 1982). Então, levando em consideração a atual conformação do capital, que a cada dia promove mais desigualdades sociais e econômicas, percebemos que os países periféricos, com economias frágeis, sofrem ainda mais suas consequências, o que compromete seus sistemas de ensino.

Ao nos referirmos especificamente ao fracasso escolar no Brasil, dados de pesquisas recentes, como nas duas últimas avaliações internacionais realizadas pelo PISA (Programme

for International Student Assessment), nos anos de 2015 e 2018 a educação brasileira está em

uma colocação bem inferior aos demais países que participam da avaliação. O Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa)é um estudo comparativo internacional, realizado a cada três anos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O Pisa avalia três domínios – leitura, matemática e ciências – em todos os ciclos ou edições.

Na última avaliação, o Brasil ficou entre os 20 últimos colocados, dos 79 países e territórios avaliados, o que pode indicar uma possível associação entre a baixa qualidade do Ensino Básico e os índices de insucesso no Ensino Superior brasileiro. Ainda com relação à

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