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O presente estudo pretendeu contribuir para clarificar o processo de reconhecimento de lesões musculoesqueléticas do membro superior, relacionadas com o trabalho.

Neste sentido, e para dar resposta à questão de investigação formulada se o trabalho repetitivo e

as posturas não ergonomicamente neutras no meio laboral, podem ser causa de doença musculoesquelética do membro superior?, foi definido como objetivo central verificar se existia

uma relação de nexo de causalidade entre as lesões musculoesqueléticas do membro superior e uma atividade laboral específica, através da aplicação de vários métodos de avaliação dos trabalhadores e de avaliação do posto de trabalho, bem como concluir sobre qual a estratégia mais adequada a implementar no local de trabalho.

Face aos resultados obtidos, pode afirmar-se neste momento que, a resposta à questão de investigação é uma resposta positiva, ou seja, o exercício das atividades que se desenvolvem no setor da empresa alvo do estudo, que envolvem trabalho repetitivo, aplicação de força e posturas corporais não neutras, são fatores de risco para o desenvolvimento de doença musculoesquelética, tendo sido encontrado um aumento da prevalência da lesão musculoesquelética, do membro superior, dentro do grupo específico de trabalhadores da atividade em questão quando comparada com a população em geral, representada neste estudo pelo grupo de controle.

Importa agora, concluir sobre os resultados obtidos, à luz do objetivo central da presente tese, e também testar as hipóteses formuladas.

Assim, tendo em conta todas os métodos de avaliação de trabalhadores, aplicados neste estudo, verificou-se uma prevalência de LME MS global situada entre 24% e 55%, em que o segmento mais atingido foi o punho/mão apresentando prevalências entre 18% e 45%, seguido do segmento ombro onde se verificaram prevalências entre 17% e 38%, e por fim o segmento cotovelo onde as prevalências encontradas se situaram entre 8% e 18%.

Testando a primeira hipótese, verificou-se efetivamente que a prevalência de lesão musculoesquelética do membro superior para a atividade laboral em questão é superior à da população em geral, representada pelo grupo de controle deste estudo, tanto no membro superior no global, como para as regiões anatómicas do ombro, cotovelo e punho/mão.

Foi também determinada uma incidência anual de lesões musculoesqueléticas do membro superior, que indiciou um aumento do desenvolvimento ou agravamento destas afeções, nomeadamente na região anatómica do punho/mão, onde se verificaram os valores mais elevados, entre 3% e 12%, seguida da zona do ombro que apresentou valores de incidência anuais entre 4% e 8% e por último a zona do cotovelo com valores entre 1% e 7%.

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Conclusões A segunda hipótese de estudo foi assim verificada, sugerindo que, para a atividade laboral em causa, as posturas e os movimentos exigidos na execução das tarefas, podem influir na génese ou agravamento de lesões musculoesqueléticas do membro superior.

Testando a terceira hipótese, de acordo com os resultados obtidos, observou-se convergência dos resultados obtidos no exame médico objetivo e no exame ecográfico, que se apresentaram ambos superiores aos da sintomatologia. Considerando as regiões anatómicas em particular, foram encontradas relações estatisticamente significativas entre os indicadores utilizados, à exceção da relação entre os sintomas apresentados no punho/mão e o exame médico, no segundo momento de avaliação. Verificou-se ainda que, o exame médico e a sintomatologia apresentaram ambos mais casos de LME na região do punho/mão, e menos casos na região do cotovelo, sendo concordantes em cerca de 72%, para as regiões do punho/mão e região do ombro, e em 47% no caso do cotovelo. Já a ecografia revelou mais alterações no segmento ombro, e menos casos no segmento cotovelo. Assim, não se pode concluir de forma cabal, que os indicadores sugestivos de doença/lesão musculoesquelética (métodos de avaliação dos trabalhadores) sejam totalmente concordantes entre si.

No que diz respeito aos métodos de avaliação de risco no posto de trabalho, verificou-se alguma fragilidade nos métodos OCRA e RULA uma vez que podem ser considerados muito sensíveis e pouco específicos, ou seja não têm grande poder discriminativo. Ainda assim, foi encontrada uma relação significativa entre os dois métodos que identificaram, ambos, como postos de trabalho de maior risco, os postos pertencentes à seção de “Embalamento”, onde também foram encontradas maiores prevalências de lesão musculoesquelética do membro superior com os métodos de avaliação dos trabalhadores. Foi também observado que, em termos genéricos, considerando as várias regiões anatómicas do membro superior, se verificaram mais relações estatisticamente significativas entre o método OCRA e os métodos de avaliação de lesão musculoesquelética do membro superior nos trabalhadores, do que com o método RULA, apesar de que com este último se verificarem associações mais fortes e a percentagem de postos classificados como “Investigar e alterar” representar maior percentagem de sintomáticos, pelo que se pode inferir que embora o método OCRA tenha uma aplicação mais abrangente por integrar na sua análise um número superior de fatores de risco, o método RULA é o que melhor se aproxima da sintomatologia apresentada pelos trabalhadores. De referir ainda que na avaliação de risco do posto de trabalho, não foram encontrados neste estudo, postos de trabalho de risco elevado, com necessidade de implementação de ações imediatas, de forma a melhorar as condições de trabalho, o que resulta seguramente do trabalho desenvolvido na área de higiene e segurança pela empresa, no âmbito da ergonomia e otimização dos postos de trabalho.

Para tentar colmatar a fragilidade dos métodos RULA e OCRA e simultaneamente reforçar a sua classificação de postos de risco, foi feita uma breve análise biomecânica cinemática do movimento do trabalhador, em postos de trabalho considerados “críticos” pelos métodos OCRA e RULA, tendo- se verificado que, apesar das limitações, e para os postos de trabalho selecionados, houve muitas

179 alterações bruscas de posição, velocidade e aceleração linear e angular, em todos os segmentos, porém as oscilações de maior magnitude, referentes àquelas grandezas, corresponderam ao segmento punho/mão, o que é convergente com todos os métodos de avaliação de lesão/doença musculoesquelética utilizados no presente estudo.

Desta análise, pode concluir-se que se verifica a quarta hipótese do estudo, ou seja, a análise ergonómica dos postos de trabalho numa atividade laboral que envolva trabalho repetitivo está relacionada com a presença ou ausência de lesão musculoesquelética do membro superior. Para dar resposta à questão complementar - Quais as metodologias que devem ser utilizadas para a avaliação de doença musculoesquelética do membro superior associada à exposição profissional? reveste-se de grande importância rever o conceito de lesão musculoesquelética relacionada com o trabalho (LMERT). Para se estabelecer o nexo de causalidade da lesão musculoesquelética com o trabalho tem de existir um risco previamente avaliado e quantificado na atividade desempenhada pelo trabalhador. Na literatura, encontram-se inúmeros estudos que, não obstante abordarem a temática das lesões musculoesqueléticas do membro superior em trabalhadores de vários setores de atividade, a maioria utiliza apenas um método de avaliação, sendo o mais amplamente utilizado o questionário de autoavaliação. Um dos problemas associados a este método é a subjetividade de que está envolto, pois depende da perceção de cada trabalhador e em última instância até do nível de literacia do trabalhador para a compreensão e interpretação das questões que lhe são colocadas, o que pode levar a resultados imprecisos e que não refletem a realidade. Este estudo contribuiu para reforçar que apenas a interpretação da sintomatologia não é suficiente, verificando-se que, uma percentagem considerável de trabalhadores assintomáticos revelou sinais doença musculoesqueléticas (principalmente na zona do punho/mão) no exame médico e no exame ecográfico, mas também se observou que trabalhadores que apresentaram sintomas não revelaram sinais de doença musculoesquelética do membro superior no exame médico nem na ecografia.

No sentido de definir metodologias de validação de lesão musculoesquelética do membro superior relacionada com a atividade laboral, para avalizar a existência de uma relação de nexo de causalidade entre as lesões musculoesqueléticas do membro superior e a atividade laboral específica alvo deste estudo, foram considerados três grupos integrando um, dois ou três indicadores sugestivos de doença musculoesquelética (métodos de avaliação dos trabalhadores) e foram definidos critérios de diagnóstico considerando cada grupo e sua relação com as metodologias de avaliação de risco do posto de trabalho. Verificou-se que apesar de se ter encontrado relações estatisticamente significativas entre os indicadores sugestivos de doença musculoesquelética e os métodos OCRA e RULA, para a região anatómica do punho/mão, apenas quando se considera a metodologia de diagnóstico que integra os três indicadores, se encontra a maior percentagem de trabalhadores diagnosticados com lesão musculoesquelética fortemente associada com os postos de trabalho classificados como “Investigar e alterar” (risco médio), o que pode apontar para a possibilidade da tarefa desempenhada poder estar relacionada com a lesão musculoesquelética detetada no trabalhador.

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Conclusões Resumindo, para usar um critério com alto grau de sensibilidade, o que pode ser importante para a deteção de doença musculoesquelética em estágios iniciais de desenvolvimento, deve-se optar pelo diagnóstico considerando um indicador sugestivo de doença musculoesquelética complementado previamente por um método de avaliação de risco do posto de trabalho. Por outro lado, se o critério for um alto grau de especificidade, deve-se eleger o diagnóstico considerando um indicador sugestivo de doença musculoesquelética complementado previamente por um método de avaliação de risco do posto de trabalho. O ideal seria um diagnóstico com alta sensibilidade e alta especificidade, mas isso raramente ocorre, uma vez que estes conceitos estão relacionados de modo inverso.

Assim, a resposta à pergunta complementar formulada é que a metodologia a aplicar deve ser uma metodologia integrada, utilizando vários métodos de avaliação de lesão musculoesquelética no trabalhador coadjuvados por métodos de avaliação de risco do posto de trabalho, que se devem complementar entre si, para a validação de lesão musculoesquelética.

Destacam-se ainda algumas conclusões deste estudo que podem ser importantes para a compreensão da problemática das lesões musculoesqueléticas. Assim, no geral, os trabalhadores do sexo feminino, mais baixos e com mais idade apresentaram mais sintomas e sinais de doença musculoesquelética nos membros superiores. Também se verificou, de um modo geral, um aumento da prevalência destas lesões com a antiguidade na empresa. No que diz respeito ao tipo de doenças musculoesqueléticas diagnosticadas através do exame médico objetivo, verificou-se que a síndrome do túnel cárpico (STC), a tendinite, e a epicondilite foram as patologias mais frequentemente reconhecidas. O presente estudo revelou ainda, existirem fatores individuais como a realização de tarefas domésticas e trabalhos manuais, a utilização de computadores, a prática de atividade desportiva e a toma medicação regular, estatisticamente relacionados com a identificação de lesão musculoesquelética, o que confirma a multifatorialidade etiológica destas afeções, podendo estes fatores serem considerados simultaneamente como fatores de confundimento, dado não decorrerem da atividade laboral.

6.2 Medidas a implementar e Perspetivas Futuras

Atendendo aos resultados obtidos e à sua discussão, considera-se importante a implementação de algumas medidas gerais neste setor industrial específico, que é a indústria de produção de queijo, tais como:

− Dentro do possível, selecionar trabalhadores com menos riscos físicos para cada posto de trabalho, uma vez que foram detetados fatores de risco constitucionais e demográficos aparentemente relacionados com o desenvolvimento ou agravamento das afeções musculoesqueléticas num determinado posto de trabalho;