• Nenhum resultado encontrado

Apêndice 3 – Extensão do modelo atualizado, com a inclusão de indicadores

5. A prestação de contas ao sistema social: este ponto é hoje talvez mais crítico do que há trinta anos, quando Luckesi elaborou originalmente o seu texto.

3.3 As avaliações em larga escala e a gestão democrática escolar

3.3.2 Os Conselhos Escolares

Como vimos, a LDBN estipula como um dos princípios para a gestão democrática da educação a participação das comunidades escolar e local em Conselhos Escolares ou equivalentes (BRASIL, 1996), o que os caracteriza como espaços de participação coletiva da comunidade escolar na gestão da escola. Esse definição implica na descentralização das decisões e a autonomia desse colegiado para fiscalizar e avaliar as ações executadas no âmbito escolar, mediante a continuidade de interação entre seus membros e os representantes do poder público:

Participação pode ser definida como interação permanente entre atores sociais em processos decisórios de caráter público, baseada no conhecimento e exercício de direitos e deveres (CISESKI, 1997). Para que essa interação seja equânime, com a igualdade entre os diferentes sujeitos no direito a ouvir e se fazer ouvido, renunciando-se às relações de poder e dominação em prol de um processo de comunicação aberto, plural e recíproco, ―o poder decisório necessita ser desenvolvido com base em colegiados consultivos e/ou deliberativos‖ (BORDIGNON; GRACINDO, 2013), caracterizando, assim, um processo de descentralização.

 Descentralização, segundo Abranches (1998, p. 34) implica46 em uma

transferência da autoridade legal e política de organismos governamentais

46 Ciseski (1997) traça uma importante diferenciação entre a desconcentração e descentralização: a

desconcentração não altera substancialmente as estruturas decisórias, pois limita-se a apenas redistribuir tarefas, reafirma a autoridade do poder centralizador e não conta com meios de controle social no processo decisório. Já a descentralização implica na transferência e redistribuição de responsabilidades, em mudanças estruturais tanto nos organismos que transferem como nos que recebem poderes e inclui mecanismos de controle das ações e resultados.

mais centralizados para outras unidades, governamentais ou não.

 Autonomia pode ser definida como ―a capacitação para gerir políticas públicas, avaliar e fiscalizar os serviços prestados à população no sentido de tornar público o caráter privado do Estado‖ (CISESKI, 1997, p. 23).

Segundo Abranches (1998), os conceitos de descentralização, participação e autonomia representam o reconhecimento e a aproximação, por parte do poder público, das demandas da sociedade e abrem a possibilidade de todas as vozes terem o mesmo direito de serem ouvidas. Portanto, para que os Conselhos Escolares correspondam a essa caracterização conceitual duas condições são necessárias:

1. Equanimidade dos participantes, isto é: que todos possuam o mesmo direito de participar das decisões e debates, independentemente de sexo, idade, formação e outras características pessoais (excluindo-se, evidentemente, situações que impeçam, por força de lei, a manifestação de conselheiros menores de idade). 2. Representatividade de todos os segmentos da comunidade escolar no conselho.

O conselho deve incluir entre seus membros alunos, pais e responsáveis, funcionários, docentes, gestores escolares e membros da comunidade, que possuam legitimidade para se manifestar em nome do segmento que representam. Se esta condição não estiver satisfeita, seja porque não há segmentos representados no conselho, seja porque não possuam legitimidade para falar em nome do segmento que representam, não se pode falar em participação.

Como a comunidade escolar é constituída por diferentes segmentos, que não necessariamente terão interesses totalmente convergentes, então os Conselhos Escolares se constituem em espaços privilegiados para a formação de uma cultura política de participação e exercício da democracia através da troca de opiniões e o confronto de ideias (CISESKI, 1997). Se considerarmos que a definição de cidadania democrática se dá em termos do conhecimento e exercício de direitos e deveres (BENEVIDES, 1998), isso significa caracterizar os Conselhos Escolares, também, como espaços para o exercício da cidadania. Segundo Soares, Gomes e Santos (2013, p. 55), os Conselhos Escolares constituem espaços democráticos ―para a construção do diálogo, do respeito às diferenças, da gestão de conflitos e do reconhecimento das ações dos sujeitos‖. Não pode haver lugar para ―donos da verdade‖ nesses espaços, pois isso configura claramente uma relação de poder e dominação, especialmente quando a parte dominada se compõe dos segmentos que não possuem atuação profissional dentro da escola.

Essa caracterização do Conselho Escolar como espaço plural e participativo se conecta com as dimensões fundadoras do reconhecimento destacadas por Honneth (SOARES; GOMES; SANTOS, 2013, p. 47): a autoconfiança, o autorrespeito e a valorização social: a ausência de uma dessas dimensões nas relações entre os atores enfraquece o Conselho Escolar como espaço para o exercício da democracia, acaba por legá-lo a uma função decorativa que, para todos os efeitos burocráticos, tão somente cumpre o que estipula a legislação.

Portanto, cabe à direção escolar, em seu papel mediador, identificar as dimensões do reconhecimento nas relações entre os conselheiros e fomentar seu desenvolvimento, em prol de uma efetiva representação da comunidade escolar nos processos decisórios do colegiado, agindo no sentido de garantir que os conselheiros não só tenham direito a, mas que também

queiram ser ouvidos.

As considerações precedentes trataram os Conselhos Escolares do ponto de vista conceitual, com as inferências lógicas decorrentes das definições e categorias estabelecidas ao longo desta seção. A partir desses conceitos, podemos fazer uma conexão com a realidade escolar através das funções e atribuições do Conselho Escolar, de modo a dar maior especificidade ao seu papel. Essas funções e atribuições podem ser divididas em

a) Deliberativas: quando decidem sobre o projeto político-pedagógico e outros assuntos da escola, aprovam encaminhamentos de problemas, garantem a elaboração de normas internas e o cumprimento das normas dos sistemas de ensino e decidem sobre a organização e o funcionamento geral das escolas, propondo à direção as ações a serem desenvolvidas. Elaboram normas internas da escola sobre questões referentes ao seu funcionamento nos aspectos pedagógico, administrativo ou financeiro

b) Consultivas: quando têm um caráter de assessoramento, analisando as questões encaminhadas pelos diversos segmentos da escola e apresentando sugestões ou soluções, que poderão ou não ser acatadas pelas direções das unidades escolares. c) Fiscais (acompanhamento e avaliação): quando acompanham a execução das ações pedagógicas, administrativas e financeiras, avaliando e garantindo o cumprimento das normas das escolas e a qualidade social do cotidiano escolar. d) Mobilizadoras: quando promovem a participação, de forma integrada, dos segmentos representativos da escola e da comunidade local em diversas atividades, contribuindo assim para a efetivação da democracia participativa e para a melhoria da qualidade social da educação (NAVARRO et al., 2004, p. 41)

Essas funções, no entanto, encontram pequenas variações segundo as visões das secretarias de educação nas várias esferas administrativas.

Algumas Unidades da Federação incluem funções que ampliam a atribuição fiscal. Outras incluem uma função executora, para efeito de recebimento e movimentação dos recursos públicos financeiros destinados ao estabelecimento de ensino. Aliás, segundo Taborda (2009), a ideia de que as escolas públicas criassem suas unidades executoras (UEx) foi apresentada pelo Ministério da Educação, no discurso, como forma de lhes possibilitar

maior autonomia financeira, pedagógica e administrativa. Para a autora, porém, trata-se apenas de uma estratégia de otimização do orçamento:

(...) pode-se perceber que a intencionalidade, na criação dessas unidades, era a de promover o desenvolvimento de uma gestão baseada na diminuição de gastos, principalmente, mediante empenho da comunidade local, na superação dos problemas vivenciados pela escola. A participação valorizada é, sem dúvida, a de caráter funcionalista, voltando-se para o emprego adequado dos recursos repassados, alegando que se forem bem administrados pela UEx, esses recursos podem fazer ―verdadeiros milagres‖ (TABORDA, 2009, p. 45).

A criação de unidades executoras serve, portanto, à descentralização da gestão de recursos públicos, delegando-a às escolas. Com isso, porém, corre-se o risco de que o foco de atuação dos Conselhos Escolares migre para a gestão financeira da escola, em detrimento do seu Projeto Pedagógico. A compatibilidade de um processo autêntico de gestão democrática com a concepção dos Conselhos Escolares como unidades executoras é um tema controverso que ainda enseja muitas discussões e estudos.

Não há, também, uma definição por parte do Ministério da Educação sobre a periodicidade das reuniões do Conselho Escolar, da sua composição ou da forma como são escolhidos seus membros. As definições mais detalhadas sobre tais parâmetros acabam recaindo sobre as secretarias de educação dos estados e municípios. Há, porém, algumas recomendações:

(...) os Conselhos Escolares sejam constituídos por um número ímpar de integrantes, procurando-se observar as diretrizes do sistema de ensino e a proporcionalidade entre os segmentos já citados, ficando os diretores das escolas como ―membros natos‖, isto é, os diretores no exercício da função têm a sua participação assegurada no Conselho Escolar. (...) A seleção dos integrantes desses Conselhos deve observar as diretrizes do sistema de ensino. As experiências indicam várias possibilidades para escolha dos membros dos Conselhos Escolares. Nesse sentido, seria importante definir alguns dos aspectos que envolvem esse processo: mandatos dos conselheiros, forma de escolha (eleições, por exemplo), existência de uma Comissão Eleitoral, convocação de assembleias-gerais para deliberações, existência de membros efetivos e suplentes (NAVARRO et al., 2004, p. 44)

Enfim, cabe à comunidade escolar avaliar suas escolhas de forma crítica, pois o exercício da democracia passa, também, pela aprendizagem com a experiência e pela mediação com vistas à formação de sujeitos e pessoas autônomas, com o constante exame das práticas vigentes. Assegurar a todos os atores o direito de serem ouvidos, sem nenhum tipo de discriminação, e reafirmar a autonomia e o cumprimento pleno das funções deliberativa, consultiva, fiscal e mobilizadora de forma transparente e participativa, significa converter o Conselho Escolar em um poderoso meio de integração dos esforços de gestores, docentes, alunos, pais e a comunidade.