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Os acampamentos, característica principal do Master, aconteceram tanto durante o Governo Brizola quanto durante o Governo Meneghetti, e alguns de seus aspectos são dignos de destaque:

• o número de acampamentos efetivado foi signifi cativo. Além disso, mesmo que muitas Associações de Sem-Terra não tivessem conseguido realizar acampamentos, pressionavam pela desapropriação de terras. • quanto à sua origem, as áreas podem ser classifi cadas da seguinte ma-

neira: as que pertenciam ao estado, ao município ou à União; as que eram privadas, em geral de situação jurídica confusa, ou privadas consi- deradas mal aproveitadas; as que eram áreas indígenas; e as que tinham as informações levantadas sem referências a respeito da sua origem. O Master imprimiu profundas mudanças nas relações políticas entre os diversos segmentos sociais, pois, de forma contínua, pelo menos de 1962 a 1964, impulsionou a participação política do campesinato e as reivindi- cações em favor de mudanças na estrutura fundiária do estado e do país, o que ameaçava os interesses das classes dominantes.

Quanto às posições defendidas pelo Master, observa-se uma evolução das propostas políticas, se comparadas às propostas iniciais contidas no Estatuto da Associação dos Agricultores Sem-Terra de Encruzilhada do Sul, lançado em 1960, com os resultados do congresso realizado em dezembro de 1962, ou mesmo com as declarações da diretoria nos anos de 1963 e 1964. De uma proposta de reforma agrária ainda bastante indefi nida, passaram a apoiar uma proposta de reforma agrária radical, contudo, contrária ao “na lei ou na marra”, conforme era defendido pelas Ligas Camponesas do Nordeste, ou seja, aparentemente baseada apenas na legislação vigente.

Todavia, os acampamentos, mesmo que baseados na legislação estadual e federal, rompiam com a legitimidade admitida pelos segmentos de classe no poder, sendo considerados uma ameaça. Apesar de serem formados nas estradas próximas às áreas pretendidas – ou seja, não se caracterizando como invasão de propriedade –, e apesar de as Constituições federal e estadual garantirem os processos de desapropriação, os acampamentos eram vistos, por entidades como a Farsul, como um atentado à propriedade privada e à ordem constituída, e por isso eram combatidos. Também essa era a posição da Igreja em relação ao Master e à luta pela reforma agrária.

Quanto à existência do Master, apesar de alguns autores o percebe- rem como um movimento ofi cialista, articulado pelo governador Brizola, observa-se uma forte presença do PCB,18 que optou por se integrar ao

mesmo, deixando de organizar, no estado, a ULTAB ou as Ligas. Com essa adesão do PCB, verifi cou-se um processo de disputa pela hegemonia na condução do Master entre o PTB e o PCB, com o paulatino fortalecimento do último durante o Governo Meneghetti. A trajetória do Master indica uma forte capacidade de mobilização e, em várias ocasiões, uma autonomia e um não-alinhamento do movimento em relação às diretrizes de Brizola, contrariando leituras que o colocam como um movimento ofi cialista.

O Master, a exemplo de outros movimentos que privilegiavam a luta pela terra, foi duramente reprimido a partir de 1964, sendo suas lideranças combatidas e presas, implicando profundo retrocesso para o movimento dos agricultores sem-terra no Rio Grande do Sul. Esse processo de repressão ao movimento sem-terra no estado teve seu início com a posse do governador Meneghetti, que passou a reprimir as ações dos agricultores sem-terra, transformando a luta pela terra, mais uma vez, em caso de polícia.

Finalizando, pode-se dizer que a importância do Master não está no con- teúdo da reforma agrária defendida por ele ou na maior ou menor infl uência do governador Brizola sobre o mesmo. A importância do Master está, sim, no fato de que, apoiando as aspirações e a organização dos agricultores sem-terra e a luta pela reforma agrária, signifi cou para a classe dominante uma ameaça real e concreta à continuidade de sua dominação e, para os setores excluídos do campo, um instrumento de luta e de organização.

Quanto ao destino das áreas desapropriadas durante o Governo Brizola, cabe um estudo específi co a respeito, mas destaca-se que, pelo menos uma dessas áreas foi palco de luta na década de 1980, quando os acampamentos de agricultores sem-terra ressurgiram no cenário estadual como forma de pressão pela reforma agrária. Trata-se das fazendas Macali e Brilhante, que integravam a Fazenda Sarandi – onde foi formado o primeiro acampamento do Master – e que foi desapropriada por Brizola em 1962. Em 1979, ela foi novamente ocupada, sendo reivindicada a sua distribuição aos agricultores sem-terra. Assim, após vinte anos, retoma-se a mesma estratégia de luta pela reforma agrária através da formação de acampamentos, ressurgindo a disputa por áreas que já haviam sido reivindicadas anteriormente. Alguns dos agricultores sem-terra envolvidos na luta pela terra de vinte anos antes reaparecem na década de 1980, agora aglutinados em torno do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) – entidade que, no cenário gaúcho e nacional, passa a representar os interesses desse segmento social.

18 Ainda é pouco estudada a presença do PCB na história política gaúcha e, especifi camente,

no campo, com vistas a compreender quanto dessa capacidade de articulação e organização apresentada pelo Master, a partir de 1961, nos mais diversos municípios gaúchos, se deve a essa presença mobilizadora do PCB, pelo menos, desde os anos de 1940-50.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ECKERT, C. Movimento dos Agricultores Sem-Terra – Master. 1960-1964. Rio de Ja- neiro, 1984. 353 p. Dissertação. (Mestrado em) – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

MORAES, Clodomir Santos de. Las ligas Campesinas de Brasil. In: PROGRAMA DE CAPACITACION CAMPESINA PARA LA REFORMA AGRARIA (PROC- CARA). Organizaciones en América Latina. Honduras, 1976. (Série Didáctica, 12). SCHILLING, P. Como se coloca a direita no poder: os protagonistas. São Paulo: Global,

1979. v. 1.

. Brasil de los latifundistas. Montevidéo: Diálogo SRL, 1967.

ZANFELIZ, M. A. As relações sociopolíticas no Rio Grande do Sul: governo, partidos e

sindicatos na conjuntura de 1958 a 1964. Porto Alegre: IFCH/UFRGS, 1980.

Documentos:

CONGRESSO DOS AGRICULTORES DO RIO GRANDE DO SUL, I, 1962. Porto Alegre.

CONGRESSO DO MASTER, I, 1962, Porto Alegre. Carta reivindicatória. ENCONTRO CAMPONÊS ESTADUAL, I, 1962. Porto Alegre.

Movimento dos Agricultores Sem-Terra. Manifesto lançado pelos promotores. Encruzilhada do Sul em junho de 1960.

RIO GRANDE DO SUL. Comissão Especial de Reforma Agrária do Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Bases e diretrizes para um programa estadual de

reforma agrária. Porto Alegre, 1963. p.IV-28

Entrevistas:

Ari Saldanha: entrevista, 1983/1983. Entrevistador: Córdula Eckert. Porto Alegre, 1982/1983.

Jornais consultados:

Novos Rumos O Camaquã O Nacional Panfl eto Terra Livre Última Hora

A GÊNESE

DO

SINDICALISMO