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Nesta pesquisa de caráter documental, verificamos a relevância de se trabalhar a argumentação na produção escrita no contexto do vestibular, visto que, nesse evento de comunicação, encontramos, também, um reflexo do ensino-aprendizagem de língua portuguesa.

De acordo com o referencial teórico adotado, constatamos o uso de algumas técnicas argumentativas no texto dos candidatos ao vestibular, em razão da defesa da tese e do gênero do discurso solicitado. Observamos o uso: a) de comparações, com a finalidade de confrontar duas formas de relacionamento da atualidade (“ficar” e namorar) por meio de seus graus de superioridade ou inferioridade; b) de definições, com o intuito de caracterizar o ato de namorar e o ato de ficar; c) do contexto pragmático, que avaliou os dois atos através de suas causas e conseqüências; d) da divisão, que arrolou os argumentos em parágrafos distintos, explicitando- os com clareza e objetividade; e) do modelo, que aproximou a forma de relacionamento defendida com a forma de relacionamento tida como “ideal” por um grupo de prestígio social; f) do exemplo, cuja finalidade era chegar a uma generalização; e g) da autoridade, que buscou ancorar o discurso do candidato no discurso do outro a fim de garantir autenticidade junto ao auditório.

Outrossim, verificamos a recorrência a voz do outro que aparece, demarcada ou não, revelando um dos fenômenos dialógicos do discurso dos vestibulandos: a polifonia e, de igual modo, observamos a multiplicidade de ethos e de efeitos de sentido gerados no texto, a partir de certos usos de elementos gramaticais e/ ou da construção do discurso dos candidatos ao vestibular.

Considerando a importância da argumentação para o ensino da produção escrita no contexto escolar e partindo do pressuposto de que os processos argumentativos do texto exigem o conhecimento de técnicas ou estratégias argumentativas, podemos afirmar que há necessidade de se rever, no processo de ensino e aprendizagem de língua portuguesa, o estudo sistematizado das técnicas de argumentação, seja no ensino fundamental, seja no ensino médio, a fim de dotar o aluno do conhecimento explícito sobre as múltiplas possibilidades de uso das estratégias de escrita, na produção do texto argumentativo, nos gêneros que se utilizam deste tipo textual.

Além disso, há necessidade de se rever o estudo de alguns aspectos gramaticais (concordância, pontuação, uso de conectivos, entre outros) e textuais (construção de parágrafos,

organização lógica das idéias...) e, sobretudo, o incentivo à leitura de gêneros que circulam socialmente, nas mais diferentes esferas discursivas, para que os aprendizes da língua tenham maior domínio das estratégias de escrita.

Entre outros aspectos possíveis de serem abordados acerca deste estudo, podemos destacar ainda , de um modo geral, algumas questões que julgamos pertinentes.

Em primeiro lugar, precisamos considerar a situação de produção dos candidatos ao vestibular, ou seja, os candidatos ao vestibular produziram o texto num clima de competitividade, tensão, num tempo limitado, e conscientes de que poderiam ser desclassificados do processo seletivo, caso não atendessem as exigências do Concurso Vestibular, fato que, de uma forma ou de outra, interferiu no ato da produção da redação.

Depois, como podemos perceber a partir da análise dos textos dessa Dissertação, a produção escrita requer o uso das competências (lingüística, enciclopédica, genérica) do candidato para fazer a leitura e a interpretação do enunciado da prova de redação de forma coerente, além do conhecimento de mundo sobre o gênero do discurso/ textual, particularmente sobre o artigo de opinião: sua composição, seu conteúdo temático e seu estilo, e também o conhecimento explícito dos vestibulandos sobre as estratégias de escrita do texto argumentativo.

Desse nodo, olhando pelo prisma dos Parâmetros Curriculares Nacionais, propostos para o ensino médio, o candidato ao vestibular precisa mobilizar várias competências e habilidades, a saber: a) de representação e comunicação, para confrontar pontos de vistas, utilizar a linguagem numa situação que exigia um grau de distanciamento e reflexão para reorganizar o mundo a partir de suas vivências; b) de investigação e compreensão, para analisar, interpretar e aplicar os recursos expressivos da linguagem para relacionar texto ao contexto e recuperar o imaginário e a visão da cultura da qual faz parte sobre a temática abordada; e c) de contextualização sociocultural, para considerar a linguagem como fonte de comportamentos sociais e produção de sentidos diversificados, organizar cognitivamente a realidade social e construir sua visão de mundo de forma a produzir sentido.

Daí, cremos que os alunos podem adquirir competências e habilidades para produzirem textos escritos com proficiência, desde que sejam mediados pelo professor e estimulados, através de práticas educativas interativas de escrita em sala de aula, as quais lhes permitam refletir sobre as possibilidades de uso da língua e sua adequação às mais variadas situações de comunicação escrita, proporcionando, dessa forma, o desenvolvimento da competência lingüística e textual, e

ajudando o aluno a se sentirem mais seguros no ato da produção escrita, no contexto escolar ou até mesmo no Concurso Vestibular. Isso, é claro, traz algumas implicações para a prática do professor de língua materna, a saber: a necessidade de uma formação lingüística continuada; a sistematização do conteúdo de língua portuguesa no que tange a leitura e produção de texto, que focalize os modos de produção do texto argumentativo; a busca de uma metodologia capaz de articular a teoria às práticas discursivas dos alunos, a fim de facilitar a aprendizagem e promover a interação professor- aluno numa perspectiva interdisciplinar.

Assim, nossa contribuição deve ser no sentido de proporcionar a futuros candidatos ao vestibular, e aos alunos de um modo geral, condições de exporem explicitamente seus pontos de vista, utilizarem as técnicas argumentativas adequadas para a sustentação de suas teses, produzirem textos com clareza, objetividade e proficiência, não só em situações formais de produção (vestibular/ sala de aula/ concursos públicos), mas, sobretudo, nas diversas práticas de interação social, garantindo-lhes, desse modo, a eficácia da argumentação escrita.

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