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Texto do Candidato ao Vestibular 03 (TCV-03)

2. Ficar é algo descompromissado e atraente (parágrafo 3°).

3.1.3 Texto do Candidato ao Vestibular 03 (TCV-03)

O CV-03 inicia os processos argumentativos do seu texto com um argumento que funda a estrutura do real: o argumento pelo exemplo. Apresenta uma prática de relacionamento bastante comum na sociedade tradicional: o casamento (Linhas 01 a 05), a fim de ativar a memória e estabelecer um acordo prévio com o auditório.(“Toca-se a musica. Entra a noiva. Vem

acompanhada de seu pai, cuja satisfação é percebida pelo largo sorriso que trás em seu rosto. O noivo aguarda, nervoso, no altar. A mãe da noiva chora, contida, enxugando as lágrimas discretamente com um lenço. Todos os convidados admiram-se com a beleza da noiva” - Linhas

01 a 04). Notamos que o CV-03 usa o discurso do outro (o discurso indireto livre) para dar

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Toca-se a musica. Entra a noiva. Vem acompanhada de seu pai, cuja satisfação é percebida pelo largo sorriso que trás em seu rosto. O noivo aguarda, nervoso, no altar. A mãe da noiva chora, contida, enxugando as lágrimas discretamente com um lenço. Todos os convidados admiram-se com a beleza da noiva. Que mulher não sonha ou já sonhou com um momento assim? Hoje em dia, nem todas.

O relacionamento homem-mulher mudou tanto no último século e tão rapidamente que chega a espantar. Há muito tempo, o pai escolhia o noivo e a filha casava-se

sem reclamar, muitas vezes sem nem mesmo conhecer o homem com quem passaria o resto da vida. Com o passar dos anos e dos movimentos feministas, as mulheres ganharam maior liberdade de escolha. Cabia ao homem cortejá-la, por algum tempo e com muito respeito, para, então, pedir permissão ao pai dela para que se casassem. A coisa foi evoluindo, e o pedido de permissão passou a comunicado. O casal apenas anunciava a família do casório. Todo esse processo demorava por meses até dar o primeiro beijo. O fato de terem assumido um compromisso um com o outro já era suficiente.

Chegando, agora, ao terceiro milênio, o tempo dos blocos carnavalescos, que não se limitam ao período tradicional em fevereiro, difunde-se uma nova forma de se

relacionar que eles, os blocos, ajudaram a reproduzir (se é que não o criaram): o “ficar”. Ele pode durar uma noite, uma festa, ou até mesmo pode ser apenas um

simples beijo sem nenhum compromisso. Esses namoros instantâneos logo se popularizaram nas festas e rapidamente se tornaram bastante freqüentes, talvez até mais que o namoro. È tão comum que hoje muitas pessoas sofrem por não encontrar um parceiro fixo. A decisão de até onde a relação pode chegar, agora, varia para cada pessoa ou relacionamento. Há pessoas que não conseguem assumir um compromisso e que “ficam” com várias pessoas diferentes num único dia. Assim como também ainda há as pessoas que só “ficam” se perceberem que existem chances de ser evoluir para um namoro ou que só namoram. A maioria dos adolescentes costumam “ficar” com pessoas de que gostam e variam entre “ficar” e namorar. Se se percebe que gostam- se reciproca- mente de verdade, namoram.

Dadas as opções, o jeito de se relacionar não importa. As pessoas podem escolher aquela com que se setem mais confortáveis no momento. O que é verdadeiramente importante é respeitar-se e respeitar os outros. Com isso, qualquer um vai, sem

autenticidade a sua argumentação. Em seguida, lança uma interrogação retórica: “Que mulher

não sonha ou não sonhou com um momento assim?” (Linha 05) e, ante a provável expectativa do

auditório, antecipa uma possível resposta: “Hoje em dia, nem todas” (Linha 05).

Depois de estabelecer o acordo prévio com o auditório, de imediato, o CV-03 apresenta a sua tese ou idéia principal: “O relacionamento entre homem- mulher mudou tanto no último

século e tão rapidamente que chega a espantar” (Linhas 06-07). Em seguida, faz uma

retrospectiva sobre as formas sociais de relacionamentos do século passado para situar o auditório sobre todo um comportamento ritualístico que envolvia o relacionamento homem-mulher, com vistas a reforçar a tese apresentada, através do uso de argumentos pelo exemplo:

Ex. 1: “Há muito tempo, o pai escolhia o noivo e a filha casava-se sem reclamar” (Linhas 07-08);

Ex. 2: “Com o passar dos anos e do movimento feminista, as mulheres ganharam maior liberdade de escolha” (Linhas 09-10);

Ex. 3: “A coisa foi evoluindo e o casal apenas anunciava o casório” (Linha 12); Ex. 4: “Todo esse processo demorava por meses até dar o primeiro beijo” (Linha.14).

Dessa forma, o CV-03 apresenta o namoro como um comportamento comum nos relacionamentos do século passado e aceito socialmente porque está envolto numa atmosfera familiar de respeito e compromisso entre o casal e associa o ato de “ficar” a um comportamento deste século, relacionando-o a um evento social bastante popular no qual a alegria da festa se mistura à superficialidade dos relacionamentos: o carnaval: “Chegando agora, ao terceiro

milênio, o tempo dos blocos carnavalescos, que não se limitam ao período tradicional em fevereiro, difunde-se uma nova forma de se relacionar que eles, os blocos, ajudaram a reproduzir (se é que não o criaram): o ficar” (Linhas 16-19). O autor novamente fortalece a sua

argumentação recorrendo a outros argumentos pelo exemplo, apresentando uma caracterização quanto à variação nas formas atuais de relacionamento:

Ex. 1: “Há pessoas que não conseguem assumir um compromisso e ‘ficam’ com várias pessoas diferentes num único dia” (Linhas 24-25);

Ex. 2: “Há as pessoas que só ficam se perceberem que existem chances de se evoluir para um namoro”( L.25-26);

Ex. 3: “Há pessoas que só namoram” (Linha 27);

Ex. 4: “A maioria dos adolescentes costumam ficar com pessoas que gostam de variam entre ficar e namorar” (Linhas 27-28).

Como podemos perceber, o CV-03 mostra a complexidade em que os relacionamentos humanos se transformaram neste século (ficar, namorar, alternar entre ficar e namorar), que eles surgem a partir de motivações intrínsecas diversas, relativiza o ato de ficar “Pode ser apenas um

simples beijo sem nenhum compromisso” (Linhas 19 e 20), ratifica a superficialidade desse tipo

de relacionamento (Linha 24) e comprova a versatilidade nas formas de relacionamento assumidas pela juventude na atualidade (“[...] Há pessoas que não conseguem assumir um

compromisso e que ficam com várias pessoas diferentes num único dia- Linhas 24 e 25).

Por último, ele conclui: o mundo mudou e as formas de relacionamento também mudaram (“As pessoas podem escolher aquelas com quem se sentem mais confortáveis no

momento” -Linhas 30-31), mas modaliza o discurso com uma ressalva: (“O que é verdadeiramente importante é respeitar-se e respeitar os outros”- Linhas 31-32). Em outras

palavras, o CV-03 quer deixar claro que a melhor forma de relacionamento é aquela em que a pessoa é livre para decidir e sente-se à vontade com o outro (Linhas 30 a 33). Por trás do discurso do CV-03, aparece o ethos de uma pessoa consciente, aberta, que defende o respeito e a capacidade do ser humano de tomar decisões com liberdade e justiça.

Desse modo, o CV-03 parece circunscrever o pensamento no gênero do discurso solicitado (o artigo de opinião), apresentando o problema desde o título (“Ficar ou namorar?”),

analisando-o criticamente numa linguagem impessoal (Basta observar o uso da 3ª pessoa verbal no texto, em “Toca-se”- Linha 01; “mudou”- Linha 06; “pode”- Linha 19; “é”- Linha 31).

Apesar de cometer algumas inadequações quanto ao uso da concordância (Linhas 27 e 28) e da ortografia (Linhas 02 e 31), observamos que a técnica argumentativa utilizada no texto (a argumentação pelo exemplo) tem a função de ampliar e sustentar a tese, através de dados extraídos da realidade e do conhecimento de mundo e que facilmente podem ser identificados pelo auditório, uma vez que o CV- 03 parece ter certa habilidade para selecionar e codificar os exemplos e, a partir da articulação deles, alcançar o efeito de sentido desejado: a eficácia da argumentação.