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Temos agora uma visão clara da concepção de consequência lógica proposta pela lógica clássica. Consequência lógica é uma questão de forma: uma proposição é consequência lógica de outras proposições se toda proposição com a mesma forma que a primeira é consequência lógica de proposições com as mesmas formas dessas outras proposições; e uma fórmula é consequência de outras se não houver um domínio e uma interpretação das letras esquemáticas que torne estas verdadeiras e a primeira falsa.

Mesmo pondo de lado a incompletude que vimos na última seção, essa concepção de consequência lógica pode muito bem ser questionada, pois parece que ela displicentemente desconsi- dera um grupo inteiro de consequências válidas, a saber, aquelas que, embora válidas, não são válidas em virtude da sua forma. Tomemos o caso das verdades lógicas, em particular. Será real- mente o caso que todas as verdades lógicas são verdades lógicas meramente em virtude da forma? Considere, por exemplo, “Nada é redondo e quadrado (ao mesmo tempo)”. Nem “redondo” nem “quadrado” são expressões lógicas, logo a forma da proposição é “nada é simultaneamente F e G”, que pode ser claramente falsificada por uma interpretação adequada das letras F e G. Mas algo nos deve ter escapado, pois “Nada é redondo e quadrado” não pode ser falso, é uma verdade necessária.

O critério clássico de consequência lógica não faz qualquer menção à necessidade. Na verdade, isso é visto por seus defen- sores como uma virtude. Ela evita a noção de necessidade, falando acerca de interpretações ou substituições admissíveis. Um argumento é válido se instancia uma forma válida; e uma forma é válida se não houver interpretação (admissível) das letras esquemáticas (relativamente a um domínio) na qual as premissas sejam verdadeiras e a conclusão, falsa. Pode-se pensar que isso quer dizer o mesmo que: um argumento é válido se é impossível suas premissas serem verdadeiras e sua conclusão, falsa. Porque não significa o mesmo dizer “A poderia ser falsa”

e “existe uma interpretação na qual A é falsa”? Suponha que A seja “Edmundo é um alpinista”: o que fizemos anteriormente foi representar sua forma como Ga, e então interpretar a como “essa mariposa” e G como “é uma borboleta”. Assim interpre- tada, Ga é falsa. Efetivamente, o que nós fizemos foi substituir “Edmundo” por “essa mariposa” e “é um alpinista” por “é uma borboleta” e verificar se alguma substituição desse tipo torna a proposição falsa. Aparentemente, A poderia ser falsa se e somente se houvesse uma substituição das expressões não lógicas de A que a tornasse falsa.

Na verdade, já vimos que a questão não pode ser assim tão simples, pois variar a interpretação das expressões constituintes não pode representar uma variação no número de coisas exis- tentes, ainda que uma tal variação possa mostrar o insucesso de uma implicação. Portanto, o critério interpretacional, se é que podemos chamá-lo dessa forma, precisa ser modificado pela adição de diferentes domínios de interpretação. No entanto, vemos agora que o tratamento interpretacional também falha por não representar possibilidades que são relevantes. Simplesmente não é verdade que “nada é redondo e quadrado” pode ser falsa porque podemos substituir as palavras “quadrado” e “redondo” por expressões tais que o resultado seria uma proposição falsa.

O tratamento interpretacional, tal como representado pelo critério clássico, é uma tentativa de evitar uma certa metafísica modal. Isso será mais discutido no Capítulo 4. O problema é concebido da seguinte forma: um tratamento modal de propo- sições, proposições que dizem o que poderia ou o que deve ser o caso, sustenta que tais proposições se referem a situações possí- veis em que essas coisas realmente seriam o caso. Por exemplo, dizer que Edmundo poderia ser um alpinista é dizer que existe uma situação possível, ou como é frequentemente chamado, um mundo possível, no qual Edmundo é realmente um alpi- nista. Um mundo possível é uma determinação completa dos valores de verdade de todas as proposições relativamente a um certo domínio. Classicamente, exige-se que um mundo possível

seja consistente e completo – isto é, nenhuma proposição tem o mesmo valor de verdade da sua contraditória, pois uma ou outra deve ser verdadeira, e não ambas.

Platonismo modal é a tese filosófica segundo a qual tais mundos possíveis são mais do que simplesmente uma especifi- cação dos valores de verdade de proposições: são mundos reais, tão elaborados e complexos quanto o mundo em que vivemos. Nosso mundo é especial apenas porque é real – o nosso mundo é o mundo real. Mas esses outros mundos existem e de certo modo são reais. A alegação é que a existência desses mundos é necessária para que proposições modais tenham o valor que têm. A “metáfora” de mundos possíveis deve ser tomada literalmente. “Edmundo poderia ser um alpinista” é verdadeira se e somente se existe um mundo possível em que Edmundo é “realmente” um alpinista. Esse mundo pode não ser real – ou seja, Edmundo pode não ser de fato (no nosso mundo) um alpinista –, mas a verdade da proposição modal (que certamente é verdadeira) exige que exista um tal mundo.

O platonismo modal é ontologicamente extravagante e epistemologicamente problemático. A Navalha de Occam recomenda que não devemos incluir em uma explicação mais do que é estritamente necessário. Mas o platonista modal certa- mente acredita que mundos possíveis, em sua plena realidade, sejam de fato necessários. O critério clássico de validade tenta mostrar que não o são. Além disso, o platonista modal produz problemas próprios, alguns deles epistemológicos, tais como: se o platonismo modal fosse verdadeiro, como poderíamos saber se uma dada proposição modal é verdadeira? Pois como poderíamos descobrir os valores de verdade de proposições em outros mundos? Somos habitantes deste mundo, o mundo real, portanto nossos processos sensoriais nos apresentam informações sobre como as coisas são de fato neste mundo. Suponhamos que Edmundo não seja um alpinista. De acordo com o platonismo modal, para descobrir se ele poderia sê-lo, precisamos saber se existe um mundo em que ele é um alpinista. De fato, parece que

colocamos o carro na frente dos bois. Certamente, para descobrir se existe um tal mundo, pensamos em Edmundo (o Edmundo real) e em montanhas (montanhas reais) e se ele poderia nelas subir. Mas isso não nos diz apenas se há um mundo possível no qual Edmundo escala montanhas, isso nos diz também, direta- mente, se ele poderia escalá-las. Em outras palavras, a realidade dos mundos possíveis é irrelevante para a descoberta da verdade de proposições modais.

Isso não mostra que o platonismo modal é falso. O platonista modal (como o platonista matemático) irá negar que o conhe- cimento depende sempre de uma relação causal. A realidade de mundos possíveis é uma exigência ontológica para assegurar os valores de verdade de proposições modais. Entretanto, se esse fosse o único tratamento plausível da modalidade (explorare- mos um outro no Capítulo 4), alguém poderia rapidamente ser levado a considerar maneiras de evitar modalidades em geral. O tratamento clássico substitui o discurso acerca das noções de necessidade e possibilidade, e sobre mundos e situações possí- veis, por um discurso acerca de substituições e interpretações admissíveis. Isso mantém nosso problema dentro do âmbito epistemológico. Somos nós que interpretamos expressões e fornecemos seus significados; somos nós que produzimos novas proposições, ao substituir expressões de proposições dadas; somos nós que verificamos se as proposições resultantes são de fato verdadeiras. O tratamento interpretacional promete redu- zir uma linguagem metafisicamente problemática a formas de expressão limpas e claras.

Entretanto, tal redução falha. Pois “nada é redondo e quadrado” é necessariamente verdadeira, mas seus componen- tes não lógicos podem ser interpretados de modo a torná-la falsa. Alguém poderia, baseado na solução anteriormente dada que considerou variações nos domínios, sustentar que alguma pequena revisão poderia resolver o problema, pois aquela pare- ceu ser uma boa estratégia para o problema inverso: “existem

pelo menos duas coisas” não é necessariamente verdadeira, e, portanto, não é logicamente verdadeira. Mas podemos agora ver que admitir variações de domínios foi um desastre para o tratamento clássico. Ao mudarmos a interpretação, ou fazermos uma substituição, verificávamos se a proposição assim obtida era de fato verdadeira ou falsa. Ao variar o domínio, temos de verificar se a proposição seria verdadeira ou falsa – voltamos às noções modais. Podemos mudar a interpretação dos termos, podemos efetuar a substituição de uma expressão por outra. Mas não podemos de fato variar o domínio. Alguém poderia replicar que podemos fazê-lo considerando que as variáveis percorrem um subconjunto de nosso universo – por exemplo, para demonstrar que “existem pelo menos duas coisas” poderia ser falsa. Mas supor que isso é sempre possível exige que deixemos de lado a questão do tamanho do universo real. Não importa quão grande ele seja, podemos encontrar inferências cuja invalidade é demonstrada somente pela consideração de um universo com um domínio maior. Podemos somente especular, ou calcular, ou adivinhar, se uma proposição seria verdadeira em uma tal situa- ção. E se podemos fazer isso, então podemos também especular, ou calcular, ou adivinhar, o que seria o caso se Edmundo e todos os alpinistas fossem corajosos. Em particular, podemos ver que Edmundo não seria necessariamente um alpinista.

Consequência lógica é realmente uma questão do que seria o caso se as premissas fossem verdadeiras. Uma proposição é consequência lógica de outras se ela fosse verdadeira caso as outras fossem verdadeiras, isto é, quando é impossível estas últi- mas serem verdadeiras e a primeira falsa. A consequência lógica fornece uma garantia de que as conclusões são verdadeiras se as premissas forem verdadeiras, isto é, as conclusões não podem ser falsas sendo as premissas verdadeiras. A lógica clássica tenta substituir esse discurso em termos de necessidade e possibilidade por interpretações e substituições, mas isso é inadequado. Em particular, ao insistir que todo caso de consequência lógica é

uma questão de forma, a lógica clássica falha ao considerar válidas inferências cuja correção depende das conexões entre termos não lógicos. Dado que um objeto é redondo, se segue daí que ele não é quadrado; mas essa inferência não é válida em virtude da sua forma, mas sim em virtude de seu conteúdo, do que significa ser redondo. Podemos dizer que a inferência é materialmente válida, isto é, válida em virtude do seu conteúdo, não da sua forma.

Tais conexões entre termos são frequentemente denominadas analíticas. Ao insistir na natureza formal da consequência, a natureza das conexões analíticas sofreu ataques de vários lógi- cos clássicos durante o século 20. Uma maneira de defender a lógica clássica e a tese de que todas as consequências válidas são válidas em virtude da forma é rejeitar conexões analíticas e verdades analíticas, sustentando que elas não possuem a firmeza e imutabilidade da lógica.

Outra maneira de defender a natureza formal da validade é rejeitar que exemplos como “nada é simultaneamente redondo e quadrado” sejam verdades lógicas, mas sim verdades acerca do significado. Compare com “todo mapa plano pode ser colorido com no máximo quatro cores” (o Teorema das Quatro Cores); embora verdadeiro, e necessariamente verdadeiro, não se trata de uma verdade lógica, mas sim de uma verdade matemática. Sua prova exige pressupostos matemáticos substanciais que acre- ditamos serem necessariamente verdadeiros. Logo, nem todas as verdades necessárias são verdades lógicas. Da mesma forma, poderíamos dizer que “isso não é quadrado” não se segue logi- camente de “isso é redondo”, mas somente pela adição de mais uma premissa, dessa vez um fato acerca do significado, a saber, “nada é simultaneamente redondo e quadrado”. Na verdade, o caso da matemática é difícil: em particular, uma explicação de nossa habilidade em apreender a verdade de proposições mate- máticas é que elas podem ser reduzidas à lógica. Uma grande parte da matemática pode ser elaborada em lógica de segunda

ordem, que antes já argumentei que é lógica – e inversamente, aqueles que acreditam que a matemática vai além da lógica usam esse fato para argumentar que a lógica clássica está correta ao excluir a lógica de segunda ordem. A regra-w é vista então como uma inferência que não é logicamente válida, mas que é substancialmente matemática.

O que nós deveríamos reconhecer é que a lógica clássica de primeira ordem é inadequada para descrever todas as consequências válidas, isto é, todos os casos nos quais é impossível as premis- sas serem verdadeiras e a conclusão, falsa. Se as teorias que complementam a lógica clássica de primeira ordem devem ser consideradas lógicas ou não – se elas são teorias matemáticas, ou do significado – é um ponto a ser discutido.

RELEVâNCIA

Por fim, vamos deixar os casos nos quais a lógica clássica produz menos inferências válidas do que deveria, isto é, não reconhece como válidas consequências que intuitivamente são válidas, e considerar os casos em que a lógica clássica produz mais inferências válidas do que deveria, isto é, casos em que inferências intuitivamente inválidas tornam-se válidas segundo o critério clássico. O mais notório é o chamado ex falso quodli-

bet (EFQ), que já foi mencionado. Ele permite a inferência de

qualquer proposição a partir de uma contradição. Sua forma é “A e não-A, logo B”. Quaisquer que sejam as proposições colocadas nos lugares de A e B, não há uma circunstância em que a premissa seja verdadeira e a conclusão, falsa, simples- mente porque nenhuma proposição da forma “A e não-A” é verdadeira. (Alguns lógicos, in extremis, negaram esse ponto – ver o Capítulo 6. Mas, por ora, vamos deixar isso de lado.) Logo, de acordo com o critério clássico, a inferência é válida. Isso significa, por exemplo, que deveríamos aceitar como válida a seguinte inferência:

Ernesto é corajoso e Ernesto não é corajoso. Logo, Ernesto é um alpinista.

Ou ainda pior:

Ernesto é corajoso e Ernesto não é corajoso. Logo, este fósforo não vai acender.

Mas o que a coragem, ou covardia, de Ernesto tem a ver com o fósforo acender ou não? As afirmações contraditórias acerca da sua coragem não fornecem apoio algum para a conclusão – alguém poderia dizer que elas nem mesmo são relevantes para a conclusão. A objeção, portanto, é a de que o critério de preser- vação da verdade da concepção clássica legitima inferências nas quais as premissas não são relevantes para a conclusão. Mas um tratamento da consequência lógica deveria reconhecer não apenas que inferências válidas preservam verdade mas também que as premissas devem ser relevantes para a conclusão.

Um caso similar de irrelevância surge quando a conclusão é uma verdade lógica, pois verdades lógicas não podem ser falsas – independentemente do modo pelo qual as letras esquemáti- cas são interpretadas, obtemos uma proposição verdadeira; ou quaisquer que sejam as substituições feitas nos termos não lógicos, o resultado é verdadeiro. Sendo assim, quaisquer que sejam as premissas da inferência, se a conclusão é uma verdade lógica, nenhuma interpretação irá tornar as premissas verdadei- ras e a conclusão falsa. Por conseguinte, uma verdade lógica é consequência lógica de qualquer conjunto de proposições. Isso significa que as seguintes inferências são válidas:

Este fósforo vai acender. Logo, Ernesto é corajoso ou não é corajoso.

E:

Todos os alpinistas são corajosos. Ernesto é um alpinista. Logo, uma mariposa é uma mariposa.

Novamente, as premissas não parecem ser relevantes para a conclusão e, portanto, não deveriam implicar a conclusão.

O problema não afeta apenas a versão do tratamento clássico da noção de consequência lógica baseada em interpretações. Ele também ocorre no tratamento baseado nas noções modais, pois se uma proposição é consequência lógica de outras, se for impossível ela ser falsa enquanto essas outras são verdadeiras, então qualquer proposição é consequência de um conjunto de proposições que não podem ser todas verdadeiras, e qualquer proposição que não pode ser falsa é consequência de quaisquer outras proposições. Daí se segue que a consequência lógica também legitima as seguintes inferências:

Todos os quadrados são redondos. Logo, Ernesto é corajoso.

E:

Alguns atletas são alpinistas. Alguns alpinistas são cora- josos. Logo, todo efeito tem uma causa.

Como poderíamos incorporar a demanda por relevância no critério de consequência lógica? Um método poderia consistir em oferecer um tratamento da relevância em termos do conteúdo que seria combinado com o critério de preservação da verdade de modo a fornecer um tratamento mais preciso no qual relevância fosse um componente necessário. Mas é improvável que essa opção seja bem-sucedida. Considere a inferência:

Todos os quadrados são redondos. Logo, todas as coisas redondas são quadradas.

Segundo o critério de conteúdo, premissa e conclusão parecem ser tão intimamente relacionadas quanto seria possível para duas proposições. Mas, ainda assim, a única coisa que torna a inferên- cia válida – se é que ela é válida – é a impossibilidade lógica da premissa. Isto é, a inferência poderia satisfazer os princípios de relevância e preservação da verdade separadamente. Mas, mesmo

assim, considerar o exemplo acima uma inferência válida parece ser tão aberto a objeções quanto os outros exemplos.

Um caminho melhor para superar essa dificuldade é diag- nosticar o real problema com o tratamento da consequência lógica em termos de preservação da verdade e então revisá-lo à luz de tal diagnóstico. A concepção clássica tem a forma de “é impossível que A e não-B” – ou “sob nenhuma interpreta- ção temos A e não-B” –, onde A significa que as premissas são verdadeiras e B que a conclusão é verdadeira. Isso aparente- mente captura nossas intuições até que percebemos que, se é impossível que A (ou necessário que B), então é impossível que tenhamos simultaneamente A e não-B. De início, pensamos que essa impossibilidade consistiria de algum modo em uma relação entre A e não-B – que B é uma consequência lógica de A. Esse pensamento é então subvertido pela impossibilidade isolada de

A ou necessidade de B.

Como já foi mencionado, o que um argumento válido deve fazer é fornecer uma garantia de que a conclusão é verdadeira sempre que as premissas forem verdadeiras, isto é, que é neces- sário que se as premissas forem verdadeiras a conclusão também seja verdadeira. Poderíamos pensar que a condição “se as premis- sas são verdadeiras, então a conclusão também é verdadeira” (se A, então B) é o mesmo que “não é o caso que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão, falsa” (não ambos A e não-B). Posto que “é necessário que não…” é o mesmo que “é impossí- vel que…”, achamos que poderíamos expressar com segurança o critério de preservação da verdade como sendo “é impossível que ambos A e não-B”, isto é, “é impossível que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão, falsa”. Mas agora vemos que houve um engano. Pois ainda que, se é impossível que A, então é impossível que ambos A e não-B (e similarmente, se é necessário que B, então é impossível que ambos A e não-B) e não é óbvio que da afirmação de que A é impossível (ou que B é necessário) se siga que é necessário que se A, então B. Essas inferências serão examinadas mais detalhadamente no Capítulo 3, quando

discutiremos condicionais. Tais inferências são tão implausíveis quanto o próprio ex falso quodlibet, por exemplo, em:

É impossível que todos os quadrados sejam redondos. Logo, se todos os quadrados são redondos, então todas as coisas redondas são quadradas.

(Note que isso não é um caso de EFQ: “é impossível que todos os quadrados sejam redondos” não é uma proposição impossível – na verdade, ela é necessariamente verdadeira.) Daí se segue que o critério de preservação da verdade é de fato correto – o que estava errado é o modo pelo qual ele foi expresso e a crença de que ele tornava válidas inferências do tipo EFQ. Não precisamos adicionar a relevância como uma condição necessária a mais para a consequência lógica, além da condição de preservação da verdade. Se esta última for corretamente expressa, ela já exclui essas inferências implausíveis e irrelevantes. Uma proposição é consequência lógica de outras proposições se for necessário que, sendo estas últimas verdadeiras, então a primeira também seja verdadeira.

Não é dessa forma que o lógico clássico compreende o critério, no entanto, e ele pode contra-argumentar. Um modo de compre- ender a resposta clássica é o de que talvez tenhamos sido muito apressados em nosso julgamento do que seja relevante em relação a quê. Afinal, se uma proposição é realmente uma consequência lógica de outras, então estas últimas devem ser pelo menos logi- camente relevantes para aquela – o que mais poderia querer um lógico para caracterizar relevância? Uma inferência sabidamente válida, portanto, não pode ser atacada com base na relevância, pois se há razões para endossar a inferência, essas mesmas razões mostram igualmente que uma conexão relevante existe. O resul- tado é que tanto o lógico clássico quanto seu oponente mantêm suas posições, um usando o critério de preservação da verdade (interpretado ao seu modo – “é impossível simultaneamente A e