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Contexto de produção do conteúdo empírico, participantes e procedimentos

4. Método

4.1 Contexto de produção do conteúdo empírico, participantes e procedimentos

Como vimos, a atividade da venda do varejo é uma das mais afetadas pelas oscilações econômicas de um país, funcionando como um termômetro dessas flutuações. Além disso, é caracterizada pela sazonalidade, uma vez que há períodos de aquecimento provocados por datas comemorativas, por exemplo, em que o consumo é aumentado ou vice-versa. Assim, para além dessas características, é crucial considerar o contexto de crise político-econômica que vem atingindo o mercado do varejo brasileiro desde 2016. Houve grandes repercussões no cenário das montadoras de veículos e concessionárias – como foi veiculado amplamente nos canais de comunicação – com impacto negativo significativo no setor de autopeças e serviços no país e, especificamente, na cidade de Natal - RN.

Pressupostos Metodológicos - Operadores da Clínica da Atividade; - Dialética; - Linguagem – desenvolvimento (histórico- cultural). Método - Caracterização da atividade; - Biografia socioprofissional; - Representações e análise da atividade;

- Reflexões sobre processo de análise da atividade.

Recursos interventivos

- Narrativas autobiográficas; - Captura de Imagens da atividade para autorreflexão; - Técnica da Instrução ao Sósia (coanálise).

Assim, o contexto de produção empírica da presente pesquisa se relaciona à realidade de trabalho desses vendedores, que tem sido afetada por essas questões e interferem direta ou indiretamente em sua atividade de trabalho, a qual pretendemos analisar e compreender.

Esses vendedores de automóveis, peças e serviços costumam trabalhar em concessionárias de veículos, seguindo padrões de processos de trabalho implementados pelas fábricas de veículos de sua respectiva concessão – Volkswagen, Ford e Renault, por exemplo. Com isso, ficam lotados em determinados departamentos, sendo responsáveis pela venda de veículos novos, veículos seminovos, peças, seguros veiculares, serviços de assistência técnica (manutenção veicular) e cartas de crédito (consórcio), só para citar alguns exemplos de produtos. Trabalham em horário comercial, de segunda-feira ao sábado, além de serem escalados, periodicamente, para o trabalho aos domingos em plantões de vendas – ações comerciais específicas, realizadas nas dependências das lojas ou em pontos comerciais externos (shoppings, supermercados, feirões).

O horário comercial supracitado compreende uma disponibilidade que vai além do habitual horário estabelecido, uma vez que horas-extras podem ocorrer, caso haja a necessidade de atendimento ao cliente. Não se pode interromper a venda porque é hora do almoço, por exemplo. Certamente por isso, compreende-se que os vendedores são comissionados, ou seja, sua produção depende diretamente da comissão recebida pela venda realizada. Isso significa que tempo é realmente dinheiro, principalmente se for convertido em vendas. Essa remuneração comissionada foi estabelecida pelo Sindicato responsável, que realiza anualmente uma revisão de medidas e cláusulas que compõem a Convenção Coletiva de Trabalho que rege essa categoria profissional.

O fato de serem funcionários comissionados e trabalharem num sistema em que o tempo é literalmente valioso faz com que o acesso aos vendedores em seus locais próprios de trabalho seja difícil, uma vez que eles precisariam se ausentar de seus postos de trabalho –

deixariam de utilizar o tempo produtivamente em disponibilidade para vendas – para estarem colaborando com essa pesquisa, o que seria improvável. Além disso, o acesso consentido das empresas como locais de realização da pesquisa também foi pensado como dificuldade, uma vez que, comumente, a posição dessas organizações é de negação com relação a iniciativas que possam levar à reflexão da atividade profissional e seus possíveis impedimentos, contrariedades, condições de trabalho, dentre outras possibilidades.

Em adição a isso, a característica de serem funcionários comissionados, aliada à busca constante pelo alcance de metas de produção individuais, pode produzir um cenário de intensa competitividade e promover a atividade da venda como individualizante, o que foi discorrido anteriormente. Com isso, tornou-se inviável a articulação de coletivos de trabalho para analisar e compreender a atividade da venda, mobilizando o poder de agir desses vendedores de autopeças e serviços, devido à indisponibilidade dos participantes da pesquisa para tal. Por isso, foi tomada a decisão de realizar essa pesquisa de análise e compreensão da atividade do vendedor individualmente.

Por fim, foi levantada a possibilidade de realização dessa pesquisa em parceria com o Sindicato dos empregados – Sindautopeças – RN – que funcionaria como um lugar neutro, que poderia receber vendedores de diversas empresas do segmento. A proposta de pesquisa foi aceita pelo presidente dessa instituição, que assinou a carta de anuência para realização da pesquisa, autorizando a execução da mesma. Foi interessante o estabelecimento da parceria mencionada, pois assim, tivemos acesso a vendedores de empresas distintas, o que possibilitou a análise da atividade a partir de experiências desenvolvidas em contextos diferentes e enriqueceu a pesquisa.

Considerando a necessidade de imersão na atividade que essa pesquisa sugere e tendo em vista seu caráter clínico-qualitativo, os critérios de desejo e disponibilidade de participação foram os mais relevantes. Além disso, buscou-se participantes com tempos de

experiência distintos, ou seja, vendedores mais experientes e outros com menos tempo na atividade, a fim de buscar compreender possíveis diferenças entre eles e abarcar uma maior pluralidade de características e fenômenos. Para isso, a pesquisadora desenvolveu o seu trabalho numa sala reservada e apropriada para a realização das entrevistas, localizada no próprio Sindicato.

Os convites para a participação na pesquisa foram realizados por determinados funcionários do Sindicato, que comunicaram a vendedores sobre o trabalho que estava sendo desenvolvido pela pesquisadora, que buscava compreender a atividade desses profissionais, criando um espaço de escuta e análise a partir da fala deles, com objetivos relacionados à saúde do trabalhador.

Alguns desses profissionais compareceram ao sindicato, participando da pesquisa. Outros, agendaram e faltaram sem justificativa. Houve também os que iniciaram sua participação e interromperam-na, ao saber que necessitariam retornar para um outro encontro. Por isso, é importante destacar a dificuldade que existiu em relação à adesão desses profissionais para participarem da pesquisa. Houve uma indisponibilidade marcante, provavelmente relacionada ao tempo dispendido na realização das entrevistas e processos de análise da atividade que eram propostos, pois era necessário mais de um encontro com cada vendedor, o que necessitaria de pelo menos um retorno com a pesquisadora, demandando mais tempo desses profissionais, que afirmaram estar muito ocupados – especialmente àqueles que terminaram se negando a dar continuidade à participação na pesquisa, interrompendo sua realização no primeiro encontro.

Um aspecto que certamente influenciou nessa desistência foi a forma como alguns vendedores reagiram ao saber que suas falas seriam registradas através do recurso de gravação de voz. Embora a autorização para a gravação de voz tenha sido informada a todos, fazendo parte do protocolo ético da pesquisa, houve certo desconforto por parte de alguns

profissionais, que mencionaram não se sentir bem com essa questão. Aos que aceitaram, os protocolos éticos foram assinados e compreendidos como parte do processo da pesquisa. Sobre eles, detalharemos mais adiante.