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Contextos Para-legais: Novo Mercado e a Governança Corporativa

No documento Direito dos Acionistas Minoritários (páginas 132-136)

SEGUNDA PARTE – DIREITO DOS MINORITÁRIOS

4 PROTEÇÃO DOS MINORITÁRIOS

4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PROTEÇÃO ÀS MINORIAS

4.1.2 Contextos Para-legais: Novo Mercado e a Governança Corporativa

O mercado de capitais é o ambiente em que há transações entre valores, sejam eles em forma de moeda creditícios ou títulos mobiliários, como as ações, que podem ter conteúdo patrimonial e obrigacional, como já demonstrado. Este mercado é o meio mais eficiente para a captação de recursos para a implantação ou ampliação de uma planta produtiva, este processo de expansão do setor produtivo decorre diretamente dos investimentos em ações.

O mercado de capitais é composto pelas Bolsas de Valores, sociedades corretoras e pelas instituições financeiras autorizadas totalizando um sistema de distribuição de títulos mobiliários diversos, como debêntures, partes beneficiárias e commercial papers. Em regra, os títulos negociados representam uma fração do capital das empresas ou empréstimos tomados a empresas, em condições específicas do mercado. Em todo caso, esses títulos estão diretamente ligados à atividade produtiva das empresas respectivas, ingressando em uma sociedade ou mesmo adquirindo derivativos essas transações inevitavelmente custeiam o desenvolvimento econômico.

Quanto maior o nível de poupança interna de um país, maior é a capacidade de investimento neste mercado que propicia desenvolvimento econômico e, por conseqüência, distribuição de renda em um conhecido ciclo virtuoso. Dessa forma, nos parâmetros da

economia de mercado, para um país promover crescimento sustentável – em âmbito interno – é necessário o desenvolvimento do seu mercado de capitais.

No Brasil, o mercado de capitais ainda não cumpre de forma satisfatória sua missão. Dentre as causas desta deficiência pode-se enunciar, em primeiro lugar, a falta de segurança ao investidor particular, evidenciada recorrentemente pela alta concentração de investimentos em poucos agentes econômicos e por crises sazonais – problema que é diretamente combatido com a tutela dos minoritários.

De fato, como acentua Salomão Filho (2006, p. 52), não basta importar modelos bem sucedidos em contextos díspares – como o anglo-americano, mas, sim, adequar às regras societárias à realidade econômica do país. A compreensão dos problemas do mercado de capitais brasileiro, desta forma, depende do entendimento do seu desenvolvimento particular – nos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs) – especialmente no PND II, com a ênfase expressa na formação de conglomerados nacionais capazes de alcançar a concorrência internacional, com economia de escala86.

A questão da economia de escala resultou inclusive em uma argumentação, explicitada por Salomão Filho (2006, p. 52), fundamentando a idéia de que a filosofia antitruste americana não deveria nem poderia ser aplicada no Brasil, pois, durante a história do país a tendência sempre foi a de proliferação de empresas incapazes de competir, especificamente pela insuficiência de escala.

É, segundo esse ideário, exposto no PND II – acreditando que as pequenas e médias empresas tinham caráter meramente secundário e residual para o desenvolvimento nacional – que a LSA, em sua versão inicial, foi constituída. Dessa forma, a concentração na mão dos controladores não foi acompanhada de uma proteção efetiva dos demais sócios e interessados nas relações societárias.

O investidor, ao ingressar no mercado de capitais, como em qualquer espécie de empreendimento, visa a otimização de três fatores fundamentais: o retorno, o prazo e a proteção, projetando conseqüentemente a rentabilidade, a liquidez e o grau de risco. Em suma, parar tornar-se atrativo a investimentos, o mercado precisa oferecer níveis mínimos de equilíbrio entre esses fatores, sendo então mais barato o financiamento mais seguro.

Além dos problemas macroeconômicos, Salomão Filho (2006, p. 53) indica, como problemas estruturais básicos do sistema societário brasileiro – mas que podem ser aplicados no foco específico das sociedades abertas, dois fatores: a) a falta de compreensão do

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conceito de sociedade centrado na cooperação; e, b) a falta de garantias do minoritário externo.

Perin Junior (2004), ao analisar as principais causas da estagnação e retrocesso do mercado de capitais brasileiro, em toda sua história, elege cinco fatores principais: a) o baixo nível de crescimento e, por conseqüência, o baixo nível de necessidade de investimentos no setor produtivo, os quais, quando necessários, eram supridos com lucros retidos; b) em eventuais períodos de maiores investimentos, eram oferecidas às empresas inúmeras formas de financiamento, que trariam maiores facilidades e vantagens financeiras, pois advinham de recursos governamentais subsidiados; c) a estrutura do sistema tributário brasileiro, com taxas elevadas e pouca fiscalização, sempre incentivou a sonegação fiscal e trazia desvantagens às empresas abertas que possuem, por sua natureza, maior dificuldade de manter contabilidade paralela; d) o déficit fiscal forçava o governo a emitir grande oferta de papéis a fim de financiar sua dívida interna, o que gerava concorrência direta entre elas e debêntures de empresas privadas; e, por fim, e) a questão econômica cultural do conflito de interesses, que aliada à legislação ineficiente, sempre trouxe inúmeras desvantagens ao acionista minoritário, o que reprimia a demanda pelo investimento em ações de empresas privadas.

As altas taxas de concentração do mercado brasileiro contrapostas a um modelo jurídico que pressupõe regras de informação completa dos acionistas, exigem das instâncias capazes de impor regras e normas que reduzam as imperfeições deste mercado – como a concentração ultracitada – através de normas, como as que tutelam os interesses das minorias.

O mercado de capitais brasileiro está sofrendo severas mudanças que podem atenuar os problemas históricos citados aumentando a oferta e a demanda por papéis comercializados em Bolsas de Valores. A eliminação da hiperinflação, com o advento do Plano Real, e a criação de novas empresas, em especial as concessionárias de serviços públicos privatizados e as relacionadas como novas tecnologias, melhoraram as perspectivas de investimentos de longo prazo no mercado de capitais – aumentando a oferta de papéis.

No outro fator condicionador do mercado, a demanda, também ocorrem fatores contribuintes como a redução do déficit público – diminuindo a emissão de títulos do governo; a melhora, mesmo que gradativa e errática, das avaliações de risco do país no mercado internacional – elevando a atratividade do capital estrangeiro interessado em investimentos produtivos em vez daquele visando mera especulação.

Os maiores avanços no mercado de capitais do Brasil, na atualidade, não dependeram de fatores estruturais como os pontos anteriormente mencionados, mas, sim, de

políticas privadas de conduta que resultaram na governança corporativa e no Novo Mercado como indicado no Apêndice B.

Os novos modelos de bolsas de valores surgiram da necessidade de incrementar os mercados de capitais, concedendo novos direitos aos acionistas minoritários e adotando critérios mínimos de transparência como incentivo ao investimento. Este modelo foi inicialmente denominado de Neumarkt na Alemanha e, no Brasil, é denominado de Novo Mercado.

Estes novos mercados, inspirados no modelo alemão e no sucesso da Nasdaq norte-americana, aboliram exigências tradicionais para a abertura de capital das empresas e o ingresso em listagens das Bolsas, substituindo os requisitos tradicionais pelas exigências de transparência e maior proteção explícita aos acionistas minoritários. Como ilustra Perin Junior (2004, p. 89-90):

E o que era este mercado? Nada mais que um pregão separado do pregão principal, no qual somente seriam negociadas as ações de empresas que aceitassem certas regras. Essas regras buscavam proteger o acionista minoritário, envolvendo itens como possuir apenas ações ordinárias, atender a certas regras de divulgação de informações mais detalhadas e freqüentes que previstas em lei e, acima de tudo, possuir no estatuto social algumas regras de proteção ao acionista minoritário com relação a sua participação no conselho da empresa e ao seu direito de venda tag along com o controlador, caso esse transferisse o controle a terceiros.

Graças às simples regra da oferta e demanda, a melhora das condições de oferta das ações do produto aumenta sua demanda. E, segundo esta lição, diversos países desenvolveram mercados diferenciados com grande sucesso.

Como ilustra Lautenschleger Júnior (2005, p. 162), o mercado acionário alemão – antes do Neumarkt – tinha grandes semelhanças de caracteres ao que se observa no Brasil: pequeno em relação à economia nacional, com grande concentração reforçada por participações cruzadas e empresas sob controle familiar; e conseqüentemente, com pouca transparência nas decisões, pouca importância dada aos minoritários, baixa capacidade de atrair novos investimentos e, finalmente, baixa probabilidade de financiar novos empreendimentos.

Salomão Filho (2006, p. 57-58) indica o novo mercado como um movimento contrário a uma tendência histórica e natural, já que era uma solução institucional para a contratual87 que se baseia em três fundamentos principais: a) a informação completa, já que os requisitos de informação vão muito além dos previstos em lei (ANEXO B - seção VI); b) o

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Mesmo este argumento é discutível, porque segundo a Resolução CMN n. 2.690/2000, a Bovespa não tem poder para regulamentar as sociedades anônimas, embora ocorra na prática a instituição de um regulamento ao qual se adere através de contrato para ingressar na Bovespa.

reforço das garantias patrimoniais dos minoritários no momento da saída da sociedade; e, c) as proteções estruturais, que modificam a própria conformação interna das sociedades – como a vedação de emissão de ações preferenciais e na previsão da resolução de todos os conflitos oriundos do novo mercado por arbitragem. Estes dois elementos não são suficientes para garantir a aplicação de um princípio cooperativo nas sociedades anônimas brasileiras, mas é um importante passo nesse sentido ao facilitar a resolução de conflitos.

As ressalvas usualmente apresentadas aos mercados diferenciados, como os inaugurados no Brasil em 2000 (ANEXOS A e B), são a sua grande volatilidade, devido ao perfil de menor porte dos participantes; e, o incremento de custo de ingresso neste mercado, com o maior desconto sobre os investidores. Mas, em sentido inverso, os entusiastas preferem acreditar na possibilidade de que as regras propostas para mercados diferenciados no presente sejam comuns a todos os mercados no futuro, ou mesmo que o Novo Mercado suplante o tradicional (PERIN JUNIOR, 2004).

No documento Direito dos Acionistas Minoritários (páginas 132-136)