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O vocábulo responsabilidade, no campo do direito tributário, pode ter ao menos duas acepções. A primeira delas, em sentido lato, é inerente às relações jurídicas, independentemente da classificação que se atribua ao sujeito passivo. Corresponde à obrigação de saldar o crédito inadimplido, que pode ser tanto do contribuinte, como do responsável em sentido estrito, designado nos arts. 128 a 138 do Código Tributário Nacional. Dito de outro modo, aperfeiçoado no plano da realidade concreta, a obrigação tributária, com a plena identificação e preenchimento de todos os elementos da regra-matriz de incidência tributária, já se sabe o montante a ser pago e a pessoa que deve fazê-lo, em regra o contribuinte. Na eventualidade de não se extinguir o crédito tributário pelo pagamento, ou outra modalidade prevista no Código Tributário Nacional, nascerá a responsabilidade do contribuinte pelo crédito. Misabel Derzi120 leciona que

O sentido lato da expressão é comum às relações jurídicas em geral. É que existe dever jurídico ou obrigação sem responsabilidade. A responsabilidade é inerente ao dever jurídico, significando aptidão para suportar a sanção. Todo dever jurídico, quando descumprido, submete o seu titular às sanções, execução forçada e multas. Enfim, pode o titular do direito lesado, a Fazenda Pública, desencadear a aplicação de sanção, para haver, do patrimônio do devedor, os bens necessários à satisfação do crédito.

Portanto, a responsabilidade em sentido lato nos remete à ideia de inadimplência como sua causa, sendo a sanção uma consequência.

A responsabilidade em sentido estrito é aquela estabelecida no art. 121, II121, do

Código Tributário Nacional, que decorre de expressa disposição de Lei e tem como critério

120 DERZI, Misabel Abreu. Direito Tributário Brasileiro. 13. ed. Atualização da obra de Aliomar Baleeiro. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 1119.

121 "Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.

a vinculação indireta do responsável com o fato gerador. Observamos que, muito embora o art. 121, II, não exija do responsável a vinculação indireta com o fato gerador, temos que admitir a exigência desse elo, que é feita pelo legislador do CTN, mais adiante, no art. 128 do mesmo Diploma Legal122.

O critério prescritivo encontrado nos artigos 121 e 128 do Código Tributário Nacional, para a diferenciação entre responsável e contribuinte, isto é, participação direta ou indireta na realização da hipótese de incidência, nos permite tirar conclusão fundamental para este trabalho. As empresas do grupo econômico que colaboraram na realização da hipótese de incidência não são responsáveis, nos termos do art. 121, II, do CTN, mas devem receber o tratamento de contribuinte.

Retomemos nossa definição de grupo econômico para fins de responsabilidade tributária: Tem-se grupo econômico de empresas para fins de responsabilidade tributária, quando várias sociedades com personalidade jurídica própria, sob comando único, mediante acordo firmado entre elas, envidam esforços para a realização do mesmo fato gerador.

Portanto, tais empresas mantêm relação direta com a realização da hipótese de incidência, são contribuintes e se encontram no consequente da regra-matriz de incidência, ocupando a posição de sujeito passivo.

Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:

I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;

II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei."

122 "Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação."

4 A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA NO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL

No capítulo anterior, concluímos que empresas sob comando único e que possuam interesse comum na realização da hipótese de incidência, isto é, colaboram para sua ocorrência, não são terceiros na relação jurídica, mas se encontram no consequente da regra-matriz de incidência tributária, ocupando a posição de sujeito passivo.

A assertiva pode ser confirmada, mesmo levando-se em conta posições divergentes sobre os aspectos que compõem a regra-matriz de incidência tributária. Alguns autores, como Misabel Derzi123, distribuem os aspectos da regra-matriz de incidência de

forma a existir expressamente o aspecto subjetivo, tanto no antecedente como no consequente. Consideram que o responsável em sentido estrito, que não praticou a hipótese de incidência, ocupa o aspecto subjetivo da consequência, figurando na relação jurídica com o Fisco. O contribuinte, que realizou a hipótese de incidência, estaria no antecedente da regra.

Nessa visão doutrinária, muito embora pareça-nos não existir uma regra autônoma para a responsabilidade, as empresas sob comando único, que colaboraram na realização do fato imponível ocupariam o critério subjetivo do antecedente e também do consequente da norma padrão, como sujeito passivo da relação jurídica. Portanto, confirmada, também por essa via, a assertiva de que as empresas que compõem o conglomerado não são terceiros na relação jurídica.

O Superior Tribunal de Justiça compreende da maneira como expusemos a responsabilidade tributária dos grupos econômicos. O fator que caracterizaria a aplicação da responsabilidade solidária aos grupos econômicos seria, justamente, o interesse comum, compreendido como a colaboração para a ocorrência do fato imponível.

No acórdão que retrata julgamento emblemático, realizado pela Primeira Turma do STJ, Recurso Especial nº 884.845/SC, de relatoria do Ministro Luiz Fux, publicado no Diário de Justiça Eletrônico em 18/02/2009, encontramos a seguinte posição:

7. Conquanto a expressão "interesse comum" - encarte um conceito indeterminado, é mister proceder-se a uma interpretação sistemática das

123 Direito Tributário Brasileiro. 13. ed. Atualizado por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 1121.

normas tributárias, de modo a alcançar a 'ratio essendi' do referido dispositivo legal. Nesse diapasão, tem-se que o interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal implica que as pessoas solidariamente obrigadas sejam sujeitos da relação jurídica que deu azo à ocorrência do fato imponível. Isto porque feriria a lógica jurídico-tributária a integração, no pólo passivo da relação jurídica, de alguém que não tenha tido qualquer participação na ocorrência do fato gerador da obrigação.

[…]

10. "Para se caracterizar responsabilidade solidária em matéria tributária entre duas empresas pertencentes ao mesmo conglomerado financeiro, é imprescindível que ambas realizem conjuntamente a situação configuradora do fato gerador, sendo irrelevante a mera participação no resultado dos eventuais lucros auferidos pela outra empresa coligada ou do mesmo grupo econômico" (REsp 834044/RS, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/11/2008, DJe 15/12/2008).

Portanto, para a Corte Especial, a responsabilidade solidária das empresas que pertencem ao mesmo grupo econômico advém da realização conjunta do fato imponível, sendo este o significado que atribui à expressão interesse comum.

Outra é a visão de Juliana Furtado Costa Araújo e Leonardo Nuñez Campos124,

que defendem tese antagônica à atual posição do STJ. Segundo os autores, a posição do Tribunal foi formada a partir de casos antigos e que não levam em consideração fraudes. Propugnando pela aplicação do art. 124, I, combinado com o artigo 50 do Código Civil, os autores se manifestam no sentido de a fraude ser equiparada ao "interesse comum":

Pode-se observar em alguns obter dictum dos casos, que a jurisprudência

pode vir a ser superada nos casos de fraude, possibilitando-se a aplicação do artigo 124, inciso I do CTN em combinação com o artigo 50 do Código Civil, que permite a desconsideração da personalidade jurídica. Seguindo este raciocínio, seria possível aventar a tese de que, unicamente nestas hipóteses de fraude, poderia ser identificado o interesse comum entre as empresas de um grupo, mesmo que não tenham realizado formalmente o fato jurídico tributário. Dado o conluio ou a fraude, a realização conjunta do fato gerador estaria presente, afinal o que se teria era uma única pessoa jurídica englobando todas as demais. Necessário para isto, porém, que o fisco prove de forma contundente os atos ilícitos praticados.

Primeiramente, a ideia de que a posição do Tribunal advém de casos antigos e, por isso, não considera fraude é um tanto peculiar, já que não se trata de fenômeno recente.

124 Responsabilidade tributária de grupos econômicos gera incertezas. Consultor Jurídico, São Paulo, 9 jun. 2015. Disponível em: <http://conjur.com.br/2015-jun-09/responsabilidade-tributaria-grupos-economicos- gera-incertezas>. Acesso em: 14 jan. 2006.

Talvez, o que seja relativamente nova é a tese da Fazenda Nacional, que pretende salvar as execuções fiscais, evitando a prescrição intercorrente.

Caso esta posição seja abraçada pelo Poder Judiciário, teremos um outro tipo de responsabilidade tributária dos grupos econômicos. O antecedente desta norma seria uma fraude, o que não cabe na regra-matriz de incidência tributária. Portanto, faz-se necessário estudar os tipos de responsabilidade presentes no Código Tributário Nacional, para verificar se tal tese encontra amparo em alguma de suas espécies.