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Os critérios da regra-matriz de incidência tributária

A regra-matriz de incidência tributária revela a estrutura de uma norma geral e abstrata. Significa dizer que seu comando obriga a todos que nele se enquadrem, daí sua generalidade. Trata-se de um modelo ou estrutura que traz os aspectos básicos, responsáveis por dar contorno a um determinado tributo. Por isso, abstrata. Incidirá toda as vezes que ocorrer o fato imponível. Já a aplicação, conforme explicamos linhas acima, dependerá de um ato do sujeito competente, denominado lançamento.

No campo do social, o sujeito competente para realizar o lançamento tributário averiguará a incidência de tais critérios ou aspectos da regra. Existindo o encaixe perfeito, denominado de subsunção, entre os fatos e os aspectos que compõem a regra-matriz de determinado tributo, aplicará o direito, fazendo surgir a norma individual e concreta. "Individual" porque veicula sujeito ativo e sujeito passivo, já determinados, assim como o valor devido. "Concreta" porque a situação passível de ser tributada já ocorreu, tornando-se fato jurídico ou fato imponível.

Portanto, a regra-matriz de incidência tributária é uma previsão, um modelo, também denominado de norma padrão ou hipótese de incidência, e não deve ser confundida com a situação concreta, tratada por fato imponível ou fato jurídico tributário.

Na Doutrina brasileira de tempos atrás, que deu origem ao Código Tributário Nacional, havia uma certa confusão terminológica com a expressão fato gerador, que ora se referia à norma geral e abstrata e ora ao fato imponível. Claro que o contexto em que o termo estaria sendo usado auxiliava na compreensão do comando. Porém, em termos científicos, devemos procurar eliminar o máximo possível a ambiguidade do discurso.

Relembremos a lição de Geraldo Ataliba106, ao criticar a doutrina tradicional no

Brasil, acostumada a designar por fato gerador, tanto a previsão legal, como o fato concreto: Não é possível desenvolver trabalho científico sem o emprego de um vocabulário técnico rigoroso, objetivo e unívoco. Por isso parece errado designar tanto a previsão legal de um fato, quanto ele próprio, pelo mesmo termo (fato gerador). Tal é a razão que sempre distinguimos estas duas coisas, denominando "hipótese de incidência" ao conceito legal (descrição legal, hipotética, de um fato, estado de fato ou conjunto de circunstâncias de fato) e "fato imponível" ao fato efetivamente acontecido, num determinado tempo e lugar, configurando rigorosamente a hipótese de incidência.

Observando a regra-matriz em sua composição interna, verificamos que, para derivar em fato imponível, situação tributada, concreta, própria e definida, o modelo teórico de que falamos visa responder às seguintes indagações:

(i) Qual ação praticada faria desencadear a incidência de determinado tributo? (ii ) Em qual tempo tal ação deve ocorrer?

(iii) Em qual local deve ser praticada?

(iv) Qual o ente pode instituir e cobrar o tributo? (v) Quem deve pagá-lo?

(vi) Qual o valor a ser pago?

Respondendo a tais indagações, teremos a norma padrão que retrata a incidência de determinado tributo. Para ser eficaz, a regra-matriz precisará do auxílio de outras normas, que em torno dela gravitam, como as que veiculam a espécie de lançamento, as obrigações

acessórias, data de pagamento e demais circunstâncias que tornarão possível a concreção do tributo. Porém, com ela, temos uma simplificação, uma espécie de esquema que torna mais segura a interpretação da extensa legislação tributária.

Em linhas gerais, a regra-matriz de incidência tributária é formada por uma hipótese que implica uma consequência. A hipótese versa sobre um comportamento ou situação de possível ocorrência, que denote sinal de capacidade contributiva.

Dito de outra forma, o legislador tributário valora determinada situação ou comportamento como capaz de transferir alguma riqueza do particular para os cofres públicos. Assim, por exemplo, a hipótese de ser proprietário de imóvel em território urbano revela alguma capacidade contributiva. Por isso, o legislador vincula a ela uma consequência: a de pagar ao município o correspondente a 3% sobre seu valor venal, a título de imposto.

Para fins didáticos, é possível separar os critérios que compõem a hipótese e, também, o consequente da regra-matriz. O procedimento é adotado apenas para fins de análise, o que confere maior precisão ao aplicador do direito tributário, ressalvando-se, contudo, que a implicação de ambos é que permite compreendermos a estrutura da norma que institui o tributo.

3.3.1 Os critérios da hipótese de incidência

A hipótese de incidência é formada por três aspectos ou critérios: material, temporal e espacial. O primeiro deles – critério material –, conota uma ação composta por um verbo transitivo acompanhado de um complemento. O fato de versar sobre uma ação implica na presença de um sujeito. Por isso, há autores que inserem o critério subjetivo na própria hipótese de incidência.

Geraldo Ataliba107, por exemplo, reunia na hipótese de incidência os aspectos

pessoal, material, temporal e espacial, por pensar da seguinte forma:

São, pois, aspectos da hipótese de incidência as qualidades que esta tem de determinar hipoteticamente os sujeitos da obrigação tributária, bem como se conteúdo substancial, local e momento do nascimento. Daí designarmos

os aspectos essenciais da hipótese de incidência tributária por: a) aspecto pessoal; b) aspecto material; c) aspecto temporal; e d) aspecto espacial. Em nossa opinião, ambas as possibilidades são igualmente válidas. O importante é que, para saber o mínimo necessário para a instituição de um tributo, precisaremos de um critério subjetivo, que tanto pode estar expressamente na hipótese ou, ainda, pressuposto – já que toda ação é feita por um sujeito –, estando categoricamente consignado no consequente.

Essa ação deve ocorrer em determinado intervalo de tempo (critério temporal) e em certo lugar (critério espacial). O critério temporal será previsto em lei, de acordo com técnicas arrecadatórias que permitam avaliar melhor o impacto tributário. É por isso, por exemplo, que o aspecto temporal da norma do imposto sobre a renda pessoa física é o último instante do dia 31 de dezembro de todo ano. Dessa forma, haverá tempo hábil para medir a variação patrimonial do sujeito passivo.

Quanto ao aspecto espacial, em regra, esse coincide com a competência territorial do ente tributante. Dessa maneira, é sujeito passivo de IPTU aquele proprietário de imóvel nos limites urbanos ou urbanizáveis de determinado Município. A exceção nos parece ser o Imposto sobre a Renda, que é regido pelo princípio da universalidade, abarcando a renda obtida fora do território nacional.

3.3.2 Os critérios do consequente

Não basta sabermos a ação (critério material), o local (critério espacial) e o momento em que a ação deva ser praticada (critério temporal) para que um tributo seja instituído. Faz-se necessária a previsão de uma consequência que nos dirá quem pode cobrar, quem deve pagar e a quantia da obrigação. Esses aspectos encontraremos no consequente ou tese da regra de incidência.

O consequente da regra-matriz de incidência tributária é composto pelos seguintes critérios: pessoal e quantitativo.

O aspecto pessoal é formado por um sujeito ativo que detém a competência constitucional para instituir o tributo, nos termos categoricamente dispostos na Constituição da República, além de um sujeito passivo.

O sujeito passivo da norma que institui o tributo é aquele que pratica o fato gerador previsto na hipótese de incidência, o nominado contribuinte. Tais sujeitos se vinculam em uma relação jurídica na qualidade de credor e devedor, tendo por objeto uma obrigação tributária, que é medida pela conjugação da base de cálculo e da alíquota.

O responsável tributário – enquanto um terceiro – configura outra espécie de sujeito passivo e não se encontra no consequente da regra-matriz de incidência, como trataremos em momento oportuno. Isso porque em virtude do disposto no Código Tributário Nacional, tendo em vista determinados fatos, haverá transferência da obrigação de pagar o tributo.

Como dissemos acima, a composição da estrutura normativa não é vista por todos da mesma forma. Há divergências de nomenclatura e de posição que os elementos ocupariam no antecedente e consequente da regra. Já demos um exemplo da assertiva com relação ao critério pessoal, que, para Geraldo Ataliba, encontrar-se-ia na hipótese da norma padrão. Alfredo Augusto Becker108, por exemplo, inseria a base de cálculo, na própria

hipótese de incidência, por considerá-la o elemento mais importante do tributo:

Na composição da hipótese de incidência o elemento mais importante é o núcleo. É a natureza do núcleo que permite distinguir as distintas naturezas jurídicas dos negócios jurídicos. [...] Nas regras jurídicas de tributação, o núcleo da hipótese de incidência é sempre a base de cálculo.

Independentemente da posição e da nomenclatura com que os autores tratam os aspectos mínimos da tributação, é necessário observar que a relação de implicação entre a hipótese e o consequente serve para identificar a espécie tributária e conferir a constitucionalidade de um tributo.109Assim, por exemplo, a base de cálculo de uma taxa de

108 Teoria Geral do Direito Tributário. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2007, p. 348-349, grifo do autor.

109 A título de exemplo da relação entre hipótese e consequente: "AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. TAXA FLORESTAL. LEI ESTADUAL 11.054/1995. BASE DE CÁLCULO. VALOR IN NATURA DA MATÉRIA-PRIMA FLORESTAL. REPRESENTAÇÃO ECONÔMICA DA QUANTIDADE DO PRODUTO FISCALIZADO. CORRESPONDÊNCIA COM A ATIVIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. FISCALIZAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE IDENTIDADE COM A BASE DE CÁLCULO DO ICMS. VALOR DA OPERAÇÃO. SÚMULA VINCULANTE 29. VERIFICAÇÃO DO EFETIVO PODER DE POLÍCIA. SÚMULA 279 DO STF. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – É constitucional a utilização da quantidade do produto a ser fiscalizado na definição da base de cálculo de taxa cobrada pela Administração Pública no exercício do poder de polícia. Parâmetro associado ao fato gerador, suficiente para quantificar o aspecto material da hipótese de incidência. II – Entendimento que deve ser adotado para a utilização do valor in natura da matéria-prima florestal. Representação econômica do produto fiscalizado. III – Ausência de identidade entre o valor in natura da matéria-prima fiscalizada e a base de cálculo do ICMS. Diferença de conceito econômico de valor da operação. Súmula Vinculante 29. IV – Verificação do efetivo poder de polícia. Exigência do reexame do conjunto fático-probatório. Impossibilidade. Súmula 279 do STF. V –

serviço deve medir a prestação realizada pelo Estado, confirmando sua hipótese de incidência.

Traçadas, ainda que a pinceladas largas, as principais características da regra- matriz de incidência tributária, passamos a analisar a diferença entre contribuinte e responsável, para, posteriormente, concluir sobre a posição ocupada pelos denominados grupos econômicos, quando o assunto é responsabilidade tributária.