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2 A FORMAÇÃO DAS PROFESSORAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL

3. O VERSO E O REVERSO DO PROJETO PEDAGOGIA CIDADÃ NO CONTEXTO DA FORMAÇÃO DE PROFESSORAS

3.2 Apresentando o projeto Pedagogia Cidadã

3.2.1 Dos convênios entre Unesp e prefeituras

Diferentemente do PEC, em que o projeto foi consolidado com a parceria entre universidades e Secretaria Estadual de Educação, o projeto Pedagogia Cidadã aconteceu devido ao convênio entre municípios do estado de São Paulo e Unesp. Para firmar esse convênio, as prefeituras tiveram que se comprometer a:

• Formar turmas de até 50 professoras/alunas;

• Disponibilizar salas de aula e ambientes de recepção de teleconferência e videoconferência;

• Disponibilizar salas para estudos on-line/off-line, com laboratório de informática, com no mínimo dez computadores interligados em rede de forma a permitir o acesso a todas as alunas matriculadas;

• O município deveria pagar mensalmente o valor de R$7337,00 por turma,

8 As informações técnicas apresentadas sobre os convênios entre Unesp e prefeituras, neste tópico,

foram extraídas do site oficial do projeto Pedagogia Cidadã (https://sol.unesp.br), no mês de janeiro de 2005.

somando-se a este, o valor de R$ 1850,00 referente ao Link-Intragov9.

Além desses convênios, a Unesp recebeu do governo do estado de São Paulo cerca de R$17 milhões para a compra de equipamentos e pagamento de pessoal. Até julho de 2005, 43 municípios firmaram convênio com a Unesp e 89 turmas foram formadas, totalizando 4105 alunas que freqüentaram o curso.

Em sua entrevista, o Prof. Dr. Palma Filho fala sobre a relação entre prefeituras e Unesp:

(...) É uma experiência nova para nós e, também, para as prefeituras, porque é aquela história: tem prefeitura que até hoje não cumpriu o convênio, até hoje não montou a sala para videoconferência, tem prefeitura que não está tendo tele [teleconferência], porque não providenciou os equipamentos, tem prefeitura que larga o curso, porque simplesmente fez o convênio e não acompanha nada, é como se não existisse, deixa lá solto (...).

Na realidade, nós tivemos, por iniciativa nossa, 2 reuniões com as prefeituras. Uma que foi aqui em São Paulo, logo no início, e outra que eu fiz percorrendo todos os Pólos, reunindo nos Pólos as prefeituras. Uma foi no início, e outra foi mais ou menos na metade do curso.

O que existe é uma relação que é diária, e é em função dos problemas que vão acontecendo. Então, surge alguma coisa, ou a professora liga para a gente e pede uma intervenção. Porque muita coisa se resolve com o Coordenador do Pólo, então, eu não tenho o controle aí. Eu sei que comigo quase toda semana eu tenho que interferir. Aliás, eu sou o mais solicitado pelas próprias prefeituras e não pelo pessoal do curso, porque o

9 O Link-Intragov corresponde a um site que as professoras/alunas utilizariam para tirarem dúvidas

pessoal do curso vai até o Coordenador. Também, tem o seguinte, geralmente, os coordenadores levam o problema para a Célia David, que funciona junto comigo como se fosse uma espécie de sub-coordenadora. A Célia tem a responsabilidade de coordenar os Pólos. A Célia, praticamente toda semana, faz inclusive as reuniões em videoconferência, porque ela está em Franca, onde eles têm um estúdio, então, ela faz as reuniões com os prefeitos por videoconferências. O acompanhamento existe, ele é um processo permanente, mas formais nós tivemos duas [reuniões].

Como se pode observar a relação com as prefeituras começou depois que o curso já estava delimitado, após a firmação dos convênios. A relação Unesp – prefeituras se deu, na maioria das vezes, no sentido de resolução de problemas para o andamento do curso.

Na prefeitura pesquisada, a assinatura do convênio com a Unesp aconteceu em uma cerimônia bem disputada. A manchete que noticiou a assinatura do convênio, publicada em um jornal local, foi a seguinte: “Unesp cria curso de Pedagogia no município”. A importância dada ao evento era devido ao interesse dos políticos locais de que a Unesp encampasse dois cursos da faculdade municipal. Na reportagem, a justificativa para a firmação do convênio era a necessidade do município se adequar às exigências da LDB (1996) para a formação de professoras.

Para detalhar esse momento inicial, vejamos alguns trechos das entrevistas com duas professoras/alunas do projeto:

Bem, um ano antes de vir o Pedagogia (2001) estava a maior conversa na cidade, no Departamento (de Educação), que eles trariam um curso para nós, educadoras que não tinham formação. Porque, de acordo com a lei (LDB), me parece que

quem não tivesse a formação até 2007 não poderia trabalhar na educação. (Maria, professora de creche).

Eu imaginava que seria igual na universidade mesmo, eu imaginava que teria troca de professores, que seriam as matérias iguais, mesmo sendo 2 anos e meio de curso. Eu imaginava que ia ser assim: que ia ter troca de professores, que não seria por módulos, que os textos seriam xérox. (Ana, professora de pré-

escola).

Após a assinatura dos convênios, as prefeituras ficaram responsáveis pelas inscrições das candidatas no processo seletivo do Vestibular. A prova do Vestibular foi realizada pela Fundação para o Vestibular da Unesp (VUNESP).

Pela inscrição no processo seletivo, as candidatas tiveram que pagar uma taxa de R$ 50,00 e apresentar documentos que comprovassem a conclusão do ensino médio.

A resolução Unesp no. 29/2002 estabeleceu as normas para esse processo seletivo e, em seu artigo 7º, descreveu o formato da prova:

O Processo Seletivo será realizado em uma única fase, constando das seguintes provas:

I – Conhecimentos Gerais (Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História e Geografia);

II – Redação.

§ 1º - A prova de Conhecimentos Gerais, sob a forma de teste de múltipla escolha, constará de 60 questões, assim distribuídas: Língua Portuguesa (15), Matemática (15), Geografia (10), História (10), Ciências (10), com valor máximo de 60 pontos.

§ 2º - Prova de Redação constituída de uma redação em gênero dissertativo, com valor máximo de 40 pontos. (Art. 7º da Res. Unesp 29/2002).

As professoras/alunas comentaram esse momento do vestibular em suas entrevistas:

(...) Então foi falado: “Você tem que fazer Pedagogia” e, como a gente que trabalha na prefeitura não ganha muito, no dia eu nem tinha o dinheiro para pagar a inscrição. Aí, a minha diretora disse: “Não, você vai fazer esse curso”, e eu disse que não ia fazer, porque eu tinha Magistério, mas ela falou: “Não, você tem que fazer, porque eles estão falando que quem não fizer, mesmo as professoras do fundamental, vão passar para o Serviço Diversos. É o comentário”. Então eu disse que não ia fazer porque não tinha dinheiro para pagar a inscrição, que era R$ 50. Ela falou, então, que tinha o dinheiro e me emprestava e me deu. Então eu fui no Departamento com a Beatriz (Coordenadora Pedagógica Geral), e pedi para ela se não dava para descontar a inscrição do meu pagamento no começo do mês, e ela fez isso e eu devolvi o dinheiro para a minha diretora. Aí, a Beatriz falou: “Quem passar nas 100 vagas vai conseguir o curso de graça!”. Aí eu passei dentro das 100 vagas, e estou aqui no Pedagogia Cidadã. (Sônia, professora de creche).

Eu e todo mundo que eu tinha contato, a gente achou que não teria o Vestibular. Por ser um curso especial e próprio para os professores, a gente achou que não teria mas, quando surgiu, foi-nos falado que a gente teria que fazer o Vestibular. Houve inscrição, e a gente teve que fazer esse Vestibular em (cidade maior, distante aproximadamente 200 km. do município estudado). O Vestibular foi um dia só, mas o nível do Vestibular foi nível Unesp mesmo, bem difícil. (Eduarda, professora de pré-

escola).

No município estudado, o Departamento de Educação permitiu a inscrição apenas de educadoras que estavam trabalhando na educação infantil e/ou no ensino

fundamental. Foram aceitas as inscrições tanto das professoras efetivas como das professoras contratadas por tempo determinado. Como formação anterior, exigiu-se apenas o nível médio (não foi exigida formação em curso de Magistério). Ao final do processo seletivo, foram formadas duas turmas do projeto.

Uma situação problemática que se configurou nos convênios firmados com a Unesp foi a cobrança de mensalidades das professoras/alunas que freqüentavam o curso. A Unesp, mesmo sendo uma universidade pública e gratuita, possuía turmas do Pedagogia Cidadã em que eram cobradas mensalidades. Essas cobranças foram feitas por algumas prefeituras, como forma de ressarcimento dos valores que pagavam à Unesp pela manutenção do projeto.

No município, onde foi realizada esta pesquisa, essa cobrança aconteceu no início do curso às professoras que não eram efetivas em seus cargos, ou seja, às professoras/alunas que eram contratadas por tempo determinado pela prefeitura. As alunas cessaram o pagamento das mensalidades quando tomaram conhecimento de que esse pagamento era ilegítimo.

O início das aulas do projeto se deu em outubro de 2002, com uma cerimônia de abertura que contou com a presença do prefeito, do secretário da educação, da coordenadora pedagógica geral da educação municipal, das professoras/tutoras10 e das professoras/alunas. Houve a apresentação de um vídeo institucional da Unesp que apresentou o projeto. O prefeito e o secretário discursaram e fizeram a entrega do primeiro caderno de formação, o módulo Introdutório. Após a cerimônia, aconteceu um coquetel.

10 Apesar de oficialmente se utilizar o termo professora para designar a responsável pela turma no município, o

termo professora/tutora era o mais empregado nas falas das professoras/alunas e coordenadores do curso e, por isso, o utilizarei neste texto.

No dia seguinte à cerimônia de abertura, as aulas foram iniciadas sob a coordenação das professoras/tutoras das turmas.