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CAPÍTULO IV A Convergência Socialista e a Regulamentação do Direito de

4.3. Convergência Socialista, corrente do PT

Ao longo das próximas seções, uma de nossas preocupações será a de definir a natureza da relação entre a Convergência Socialista e o Partido dos Trabalhadores a partir de sua fundação, e em especial durante o período da regulamentação do direito de tendências. O primeiro aspecto a ser considerado resulta da adesão enquanto grupo do PST-MCS ao PT. Desde o princípio, a Convergência foi uma fração do PT: uma subunidade partidária precisamente delimitada, com elevado grau de

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autonomia em relação à unidade. Esta opção da maioria do MCS pela sua não-dissolução no partido, contudo, não foi compartilhada por quase um terço de sua direção, que optou por romper com a Convergência e aderir diretamente ao PT. Esse setor se dispersaria no partido (ARCARY Apud KAREPOVS; LEAL, 2007, pp. 172-173.); os dois terços restantes construiriam a CS enquanto tendência partidária. Mas assumir a condição de tendência interna petista não significava abrir mão de sua estrutura autônoma, de sua disciplina e hierarquia, e de seu perfil próprio, não apenas diante dos filiados mas também do movimento de massas e suas entidades.

A autonomia da CS em relação ao PT pode ser percebida através de uma descrição formulada por Valério Arcary, dirigente da corrente que seria membro do Diretório Nacional petista entre 1990 e 1992, do que seria a intervenção política do agrupamento morenista durante a década de 1980.

No dispositivo de intervenção da Convergência nos anos 80, digamos, a nossa luta política dentro do que era o PT organizado era um aspecto da nossa intervenção. Mas estava longe de ser o mais importante para a direção da Convergência de conjunto. Era uma intervenção de especialistas, era uma parcela da direção da corrente que fazia isso. Toda a direção da Convergência vivia intensamente experiências com as greves bancárias, as greves metalúrgicas, a disputa dos sindicatos, a conquista e a gestão de sindicatos, o tema da burocratização nos sindicatos, a disputa da CUT, a unificação das lutas, a resposta à situação nacional. A luta interna no PT era um tema para especialistas, alguns de nós. A maioria da direção da Convergência só ia no Encontro Nacional do PT. (ARCARY. Entrevista concedida ao autor. São Paulo, setembro/2014.)

É necessário ainda qualificar a condição fracional da CS quanto ao ambiente em que apresentava suas diferenças para com a política majoritária no PT. Nesse aspecto, a CS se constituía em uma fração pública, algo que, ainda segundo Arcary, foi sempre motivo de polêmicas intrapartidárias.

O tema mais atritivo [nas relações entre a CS e a maioria na direção petista] sempre foi a intervenção pública da Convergência, foi termos uma intervenção pública independente, expressa, por exemplo, no fato de que a Convergência organizava suas próprias colunas no 1º de Maio. Este elemento da intervenção pública, da independência política, o jornal, os panfletos. Essa intervenção abria uma discussão pública em alguns setores importantes dos batalhões pesados da classe trabalhadora – tem as posições do PT e tem as posições da Convergência, que também é do PT mas que tem um projeto diferente [do da maioria na direção]. (ARCARY. Entrevista concedida ao autor. São Paulo, setembro/2014.)

Apesar daquele lugar “secundário” que a intervenção no PT ocupava na vida política da CS, e a despeito de sua permanente condição de fração pública, alguns elementos fortaleciam a relação de “pertencimento” da CS ao PT nos primeiros anos do partido. Do ponto de vista do programa, o

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empenho no combate à Ditadura Civil-militar conferia ao PT um grau elevado de unidade. A tarefa de derrubar a ditadura configurava um objetivo de médio prazo consensual para o conjunto do partido, ao mesmo tempo em que permitia postergar definições de cunho estratégico ou ideológico, mantendo em segundo plano as diferenças entre os distintos setores da agremiação. É principalmente a partir do fraco desempenho eleitoral petista em 1982, e da organização formal da Articulação no ano seguinte, que as divergências intrapartidárias passam a aflorar com maior intensidade – embora, ainda, em nível bastante inferior ao que alcançariam na segunda metade daquela década.

Em março de 1983, a Convergência realiza um congresso no qual se unifica formalmente com a organização de juventude que já construía, o Alicerce da Juventude Socialista, adotando esse nome para expressar a prioridade que daria, naquele momento, à sua expansão no movimento estudantil. O jornal Convergência Socialista também adotaria, a partir de janeiro de 1984, o nome Alicerce da Juventude Socialista, mas já em abril daquele ano tanto a tendência quanto seu órgão de imprensa retomariam sua denominação anterior. No ano seguinte, a CS se jogou na luta pelas “Diretas Já!”, defendendo uma greve geral como resposta à emenda Dante de Oliveira e o boicote ao Colégio Eleitoral. Para a corrente, a campanha pelas diretas “deveria ser associada a um programa de reivindicações mínimas, como o aumento geral e imediato dos salários em 100%, reajustes trimestrais, o congelamento de preços de artigos de primeira necessidade, dos serviços públicos, aluguéis e transportes”, bem como à luta por uma Assembleia Constituinte. Aquela conjuntura era encarada pela tendência como uma verdadeira revolução democrática, expressão da agonia do regime militar acompanhado pelo ascenso de massas, pela radicalizçaão das greves e pelo desmantelamento da estrutura sindical vigente. (KAREPOVS; LEAL, 2007, pp. 185-187.)

O boicote do PT ao Colégio Eleitoral em janeiro de 1985 expressava, portanto, um acordo entre a maioria da direção petista e a CS. Também no que se refere aos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte era possível apontar consonâncias entre os distintos blocos petistas, que eram contrários ao perfil da nova constituição, como demonstrado pelos votos contrários ao texto por parte dos parlamentares do partido. No entanto, a bancada petista optou por assinar a Constituição, no que foi criticada pela CS, que identificava no gesto um temor pela ruptura da “institucionalidade burguesa, dentro do novo regime político” democrático. (KAREPOVS; LEAL, 2007, pp. 188-189.) Como veremos adiante, os desacordos cresceriam no período seguinte, e a temática da submissão do PT à institucionalidade estaria no cerne das novas polêmicas.

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