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Críticas ao conceito de indústria cultural

No documento UNIVERSIDADE PAULISTA (páginas 179-193)

penetra profundamente no reino do simbólico e o corpo libidinal é atrelado aos imperativos do lucro. (Eagleton, 1993: 269)

Muitas das características apontadas por Eagleton estão presentes na crítica postulada por Adorno e Horkheimer, e o que o autor inglês está descrevendo são os traços da pós-modernidade, ou da modernidade tardia, aspectos que, poderiam ser utilizados para referendar a vitalidade da crítica dos frankfurtianos. Mas, afinal, o que desta crítica permanece atual? Ou, posto de outra forma: Que aspectos da teoria cr ítica no que diz respeito à indústria cultural podem ser utilizados por nós, e quais deles devem ser refutados?

consumidores possuíam níveis distintos de repertório. Nada que sacrificasse a produção artística e literária, já que o mercado de forma funcional se segmentaria, reservando espaço para todo o tipo de produção. Aos membros das camadas populares que ingressavam no mercado de consumo de bens culturais facultava -se um possível desenvolvimento perceptivo, que poderia levar muitos deles, a no futuro, consumirem produtos mais elaborados. Desse modo, através de uma pedagogia dirigida pelo próprio mercado, com o tempo à qualidade dos bens culturais seria elevada, a partir da elevação cultural dos receptores.72

Uma segunda posição, neste caso menos identificada com ideologias de esquerda ou de direita, pressupunha que o grande problema da indústria cultural, admitindo os pressupostos básicos da crítica frankfurtiana, estava no conteúdo. Ou seja, quando os meios técnicos de reprodução passassem a distribuir conteúdo de qualidade, “naturalmente” as massas elevariam seu padrão de consumo. De certo modo é uma visão oposta à anterior: a primeira, coloca sob responsabilidade das massas a elevação dos conteúdos, a partir de um

“natural” desenvolvimento perceptivo; a segunda, coloca nas mãos do estado, ou da sociedade civil organizada, a tarefa de interferir junto à indústria, a fim de assegurar conteúdos de qualidade.73

Uma terceira crítica se dá a partir da semiótica. Esta pressupõe que todo o processo de produção de significados se dá a partir do signo, entendido como aquilo que representa

72 Este tipo de posição é encontrada com certa regularidade nos debates sobre livro e leitura e pode ser expresso através da seguinte pergunta: “Afinal, não é melhor que as pessoas leiam livros do Paulo Coelho, ao invés de não lerem nada? A partir destes livros pode ser despertado o interesse para outros livros, mais canônicos, por assim dizer.”

73 Umbero Eco, em seu livro “Apocalipícos e integrados”, irá discutir as matizes de duas posições extremas:

considerará apocalípticos os adeptos de críticas aparentadas com as desferidas por Adorno e Horkheimer e integradas aquelas ligadas ao funcionalismo e ao interacionismo simbólico, expressam aqui mais claramente pela primeira das críticas desferidas ao con ceito de indústria cultural.

algo, ou que está no lugar deste algo.74 O signo se dividiria em duas partes, o significante, formado por sua estrutura fonética e gráfica, segundo Ferdinand Saussure, sua imagem acústica; e o significado, aquilo que está ausente e representado pelo significante. Todo o signo se refere a alguma coisa que existe fora do campo lingüístico e esta é chamada de referente. Peirce em sua segunda tricotomia estabeleceu três níveis de classificação para o signo:

1) Ícone: quando o signo possui alguma semelhança ou analogia com aquilo que é representado, ou referente, como, por exemplo: uma fotografia, um desenho.

2) Índice, index ou indicador: quando mantém uma relação direta com o referente. Por exemplo: fumaça indicando fogo, o sol indicand o calor.

3) Símbolo: quando a relação com o referente é arbitrária, fruto de uma convenção.

Por exemplo: bandeiras, sinais de trânsito.

Segundo Teixeira Coelho, a estas três modalidades correspondem formas distintas de perceber. À categoria ícone corresponde ria uma consciência icônica, cujo modo de operar seria o mesmo do ícone, ou seja, por analogia e a partir da contemplação e do sentimento. Em sua constituição revela traços específicos do referente, podendo, entretanto, continuar a existir mesmo que o referente não mais exista. Por exemplo, quando a pessoa fotografada morrer, a foto ainda a representará, senão como alguém conhecido do receptor, ao menos como uma criatura do gênero humano de olhos castanhos e cabelos encaracolados. Não se trata de uma consciência lógica e, sim, de uma operação por semelhança que contenta-se em chegar a juízos provisórios, intuitivos e sensoriais.

74 Por ser amplamente conhecida a teoria dos signos, cujos principais representantes são: Charles S. Peirce, e Ferdinand Saussure limitar-me-ei a apresentar resumidamente suas conseqüências para análise da indústria cultural. Para efeito de maior compreensão da mesma, ver na bibliografia: (Peirce, 1995)

A categoria índice corresponderia à consciência indicial. Diferentemente da consciência icônica que pode emitir juízos a partir da contemplação, a indicial está diretamente ligada ao referente necessitando do contato com este para significar. Ela é efêmera, pois depende da permanência do referente para ter sentido. Por exemplo, uma seta que indica um caminho, só passa a ter sentido, à medida que o interessado desloca-se nestes caminhos. A recepção deste tipo de signo mobiliza um certo ato físico ou mental por parte do receptor. Enquanto a consciência icônica é contemplativa, a indicial é operativa e necessita formar juízos conclusivos acerca de seus respectivos referentes. Enquanto a contemplação permite ao receptor chegar a conclusões novas, a operação é limitada, o grau de descoberta que ela propícia é limitado aos aspectos já revelados no signo.

A categoria símbolo corresponde à consciência simbólica, trata-se de uma consciência investigativa que mobiliza as convenções a que se vincula, a fim de procurar suas respectivas causas. Para além de sentir e constatar a existência do referente, a consciência simbólica procurará entender os porquês de sua existência. Para ser entendido, o símbolo não exige que seu receptor conheça o referente, sua arbitrariedade confere perenidade, e estas duas características são essenciais para o conhecimento de coisas novas, a ciência, por exemplo, seria basicamente simbólica.

Segundo Teixeira Coelho, quando confrontamos os problema da alienação e da revelação, próprios do conceito de indústria cultural, com a questão da significação a partir desta três modalidades de signo, chegamos à conclusão de que a indústria cultural é regida hegemonicamente pelo signo indicial, fato que estimula nos receptores o desenvolvimento de uma consciência indicial:

Aqui, então, vai ser possível dizer que o problema com a indústria cultural não é tanto o que ela diz ou não; não é tanto o fato de ser ela deste ou daquele modo, estruturalmente; nem o fato de ter surgido neste ou naquele sistema político-social – mas, sim, no modo como diz. É que a indústria cultural – na TV, no rádio, na imprensa, na música (particularmente a dita popular, nos fascículos, mas também nas escolas e nas universidades – é o paraíso do signo indicial, da consciência indicial.(...) Como o que ocorre com o índice, de certo modo o que é dado ao receptor é alguma coisa já conhecida.

(...) Não há revelação, apenas constatação, e ainda assim uma constatação superficial – o que funciona como mola para alienação. O que interessa não é sentir, intuir ou argumentar, propriedades da consciência icônica e simbólica; apenas, operar. (Coelho, 1989:70)

A inflação de signos indiciais seria o problema da indústria cultural, que processaria a comunicação de maneira fragmentada, acelerada e superficial. Estaríamos essencialmente diante de um problema de forma. Embora considere a abordagem semiótica a mais rica para tratar a questão da indústria cultural, Teixeira Coelho admite que outras modalidades de críticas podem a ela se juntar, fornecendo um quadro mais amplo.

Durante cerca de três décadas a crítica “apocalíptica” dos frankfurtianos foi o principal rio a irrigar as abordagens de esquerda acerca do fenômeno da cultura de massas.

Na década de 70, a retomada da polêmica mantida entre Adorno e os textos de Walter Benjamin concederá um novo rumo às questões relacionadas ao papel da indústria cultural em suas relações com conceitos como os de culturas de massa e popular. Jesus Martin-Barbero é um dos teóricos latino-americanos que retomará o conceito de indústria cultural a partir de uma nova leitura. Barbero reconhece a importância do conceito de unidade que demonstra que toda a cultura passa a funcionar dentro de uma lógica de consumo em que

produção em série e geração de necessidade se imbricam em um único sistema, porém, adverte para os riscos que a totalização deste conceito pode levar, colocando em um mesmo patamar o cinema de Orson Welles e Chaplin e os filmes mais estandardizados.

Para Barbero, existe um espaço dentro do campo da cultura para a produção de obras diferenciadas que não se adequam aos modelos estandardizados permitindo ao autor o exercício da crítica. Entre Horkheimer e Adorno, será este último que se dedicará mais intensamente a desenvolver as idéias ligadas à crítica da indústria cultural. Para Adorno a arte não deve subordinar-se a um princípio hedonista, ela não deve emocionar, mas em oposição à emoção a arte deve produzir comoção, ou seja, promover um abalo nas estruturas do receptor e, por conseqüência, no próprio sistema social que critica. A teoria estética de Adorno é completamente negativa, baseia -se na rejeição radical de qualquer possibilidade de conciliação entre a arte e os produtos da indústria cultural. Comentando estas idéias, Barbero promove uma síntese:

A função da arte é justamente o contrário da emoção: a comoção. No outro extremo de qualquer subjetividade, a comoção é um instante em que a negação do eu abre as portas à verdadeira experiência estética. Por isso nada entendem os críticos que ainda insistem na conversa mole de que a arte deve sair de sua torre de marfim. E o que não entendem estes críticos é que o estranhamento da arte é a condição básica de sua autonomia. (Barbero, 2003: 83)

Barbero confrontará as posições de Adorno, as investigações de Walter Benjamin.

Este último não parte de um ponto fixo, pois pensa a realidade social como algo descontínuo, um mosaico. Benjamim pensará as mudanças a partir do processo de recepção, o declínio da aura, longe de ser uma saudação à indústria cultural, é uma

interpretação radical das mudanças na sensibilidade perceptiva promovida pelas alterações estruturais que se processam no interior da sociedade e, em especial, entre os proletários:

Dentro de grandes espaços históricos de tempo se modificam, junto com toda a experiência das coletividades, o modo e a maneira de sua percepção sensorial; busca-se então manifestar as transformações sociais que acharam expressão nessas mudanças de sensibilidade. (Benjamin, “Discursos interrompidos ”, v. I, p.24 – apud Barbero,2003:87) A partir da abordagem benjaminiana, seria um erro considerar de antemão os processos de reprodutibilidade técnica aos quais as artes estavam submetidas como uma experiência de queda e degradação. Pois, se a nova época histórica havia transformado o processo de percepção, então, caberia aos verdadeiros artistas buscarem utilizar estas mudanças em suas práticas criativas. Essa posição, embora condenasse a estandardização promovida pela indústria, acolhia aqueles artistas que utilizassem as novas técnicas de forma independente e crítica, mesmo no interior da própria indústria.

Em seu texto sobre o declínio da narrativa, Benjamin identificara a cisão psicologizante promovida pelo romance burguês e verificara a emergência da informação no reino da ficção, ao mesmo tempo em que se promovia o declínio da oralidade. Edgar Morin, na obra “O Espírito do Tempo I”, ampliará esta refle xão, identificando nos folhetins um processo de osmose entre a narrativa folclórica e o campo da informação. No romance de folhetim, diferentemente do romance burguês, a oralidade das narrativas populares permanecerá, entretanto, a informação própria da imprensa, e de certa forma já presente nos romances burgueses, também estará presente.

O folhetim é considerado pelos teóricos da cultura de massas, o primeiro produto da indústria cultural. Mas isto pode ser questionado, já que desde o século XV, escritores de

aluguel vem produzindo textos, subordinados aos “gostos” do público, ou pelo menos aquilo que os editores consideravam o “gosto” do público. O que havia de novo no fenômeno do folhetim, era a amplitude de sua reprodução e a velocidade com que os receptores respondiam aos textos. O fato de serem publicados periodicamente e em partes facilitava este fato, é através do folhetim que pela primeira vez os autores estabelecem um contato intensivo com os autores e, será nesta mediação que uma nova identidade de autor irá emergir: “As classes populares só alcançaram a literatura mediante uma operação comercial que fende o próprio ato de escrever e desloca a figura do escritor na direção da figura do jornalista.” (Barbero, 2003: 183)

Este espaço de comunicação entre o imaginário e o real promovido pelo folhetim será a primeira manifestação em conjunto dos pressupostos básicos da indústria cultural, mas também a manifestação de um rico espaço de interação entre autor e leitor, o espaço da mediação. Ausente na quase totalidade das análises sobre o folhetim, o espaço da leitura é capital para a verificação da persistência do popular no massivo, e com este um processo de construção de uma nova percepção, no qual se pode verificar, não apenas o poder da indústria, mas também o poder das camadas populares.

Barbero segue as pistas deixadas por Benjamin e encontra na leitura (recepção) um dos pólos de uma relação dialética com a escritura, em geral menosprezada pela crítica de esquerda e de direita, a indústria cultural. O fenômeno editorial do folhetim gerará um novo tipo de escritor, que manipulará em sua tarefa tanto a informação quanto a ficção. De maneira geral, os profissionais que participarão do mundo das letras a partir desta época serão autores que contribuirão com periódicos ao mesmo tempo em que constroem seus textos de ficção. O estudo das relações entre o jornalismo e a escrita de ficção realizado por Cristiane Henriques Costa, intitulado “Pena de aluguel”, comparou escritores

brasileiros das primeiras décadas do século XX, com escritores do século XXI e constatou que o número de jornalistas era expressivo e continua sendo nos dias atuais. A idéia do escritor independente do público e que vive exclusivamente de sua arte, é uma utopia. Mas afinal, poderíamos perguntar: Independente de quem? Pois, caso o autor trabalhe em jornal e escreva ficção ele estará subordinado a dois pólos de força. Por um lado os editores (do jornal e dos livros) e por outro dos leitores. Caso obtenha sucesso, poderá até livrar-se do poder dos editores, mas aí, caíra sobre o poder dos leitores.

Ao invés de pensarmos este processo como de subordinação do autor às forças do mercado, podemos imaginá-lo como um espaço de permanente conflito, no qual o autor postula uma certa autonomia, ao mesmo tempo em que a negocia com o editor que objetiva essencialmente manter seu negócio e obter lucros e com o leitor que possui interesses variados. O espaço de mediação é também, como todo ambiente de negociação competitiva, um espaço de tensão.

Mas o fa to de considerar o folhetim um exemplo da participação do popular no massivo, não significa que Barbero admita, como os críticos americanos da indústria cultural, que o cultural separou-se das relações de poder, ao contrário, este autor percebe que o espaço da mediação é um campo no qual as relações de poder irão se manifestar.

A passagem de uma era de produção para uma sociedade de consumo promoverá mudanças nas relações entre as classes, que pela primeira vez na história humana estarão em contato através da cultura de massas. Porém, este fenômeno, longe de produzir a igualdade, será hegemonizado pelas classes dominantes, servindo a seus interesses culturais e ideológicos. Isso não significa que nas entranhas desta cultura de massas não se promova uma resistência , uma contra-hegemonia, e esta se verificará tanto na cultura popular, quanto

na cultura erudita de vanguarda, duas formas de produção simbólica, na qual o próprios produtores são os consumidores. E poderá estar presente, inclusive, em produtos da cultura de massas, nos quais alguns folhetins são os primeiros exemplos.

Dois fatores se destacam na crítica de Barbero ao conceito frankfurtiano da indústria cultural:

1. Que a totalização do conceito, incorporando todos os produtos que de alguma maneira participam da indústria, constitui-se em uma arbitrariedade que coloca na mesma cesta produtos da estandardizados e outros, que possuem uma dimensão crítica importante;

2. Que a esfera da recepção é ativa e introduz suas demandas no espaço da cultura de massas, influenciando parte dos produtos da indústria.

Não obstante sua crítica, Barbero concorda com um dos aspectos essenciais da concepção original de indústria cultural, qual seja, seu caráter sistêmico e unitário, com todas as ressalvas representadas pelos do is fatores anteriormente expostos.

Podemos também questionar o conceito original de indústria cultural a partir das idéias de pós-estruturalistas como Michel Foucault, em especial o sentido unitário e sistêmico desta, preservado pelas críticas de Barbero e pelo confronto com a visão semiótica.

A contribuição central de Michel Foucault para a teoria social encontra-se em sua concepção das relações de poder. Para o filósofo, a introdução da modernidade se dá com um profunda diferenciação das diversas dimensões da vida social, porém, identifica em cada uma destas dimensões a presença de micro-poderes que se estendem através de

uma teia ou rede de relações, na qual os indivíduos exercem e sofrem os efeitos do poder, de tal forma que, como pontos desta rede, o poder transpassa os indivíduos, a partir da posição em que estes se encontram na sua rede de circulação.

As relações de poder não se encontram em relação de exterioridade com respeito a outros tipos de relações (processos econômicos, relações de conhecimento, relações sexuais), mas lhes são imanentes; são os efeitos imediatos das partilhas, desigualdades e desequilíbrios que se produzem nas mesmas e, reciprocamente, são as condições internas destas diferenciações; as relações de poder não estão em condição de superestrutura; com um simples papel de proibição ou de recondução; possuem, lá onde atuam, um papel diretamente produtor.(Foucalt, 1977:90)

Para Foucault não existe uma estrutura externa centralizadora deste poder, pois todas as dimensões da vida social estão imersas nestas redes de transmissão de forças que são instáveis e móveis, deslocando-se o tempo todo e promovendo novas configurações que impedem um articulação interna em direção a um centro. Esta concepção é contrária a idéia de unidade sistêmica presente no conceito de indústria cultural. Caso apliquemos a categoria de poder foucaultiana para o modelo da indústria cultural, estas perderiam seu papel de unidade e se transformariam em um mosaico de configurações que se modificariam constantemente, em um sentido racionalizante, sem qualquer estabilidade:

(...) é o suporte móvel das correlações de forças que, devido à sua desigualdade, induzem continuamente a estados de poder, mas sempre localizados e instáveis.”(Foucault, 1977: 89) As idéias de Foucault não nos permitem identificar as as articulações promovidas entre as instâncias de poder de um campo a fim de conformar sistemas eficazes de dominação nos quais prospera uma racionalidade instrumental.

Entretanto, a caracterização da sociedade como que formada por uma rede pela qual circula o poder, rede esta que mantém a sociedade disciplinada e obediente, atuando em todas as dimensões da vida social, pode nos ajudar a compreender o grau de penetração da indústria cultural no conjunto das práticas sociais, e pode elucidar de certa forma a independência relativa que certos setores mantém por certos períodos de tempo.75

Em nossa pesquisa sobre a atuação da indústria cultural encontramos inúmeras evidências de uma atuação centralizada e racional. Enumeramos algumas delas a seguir:

1. Os grupos que atuam na indústria estão cada vez mais articulados e existe uma lógica no meio pela concentração, grupos que atuam na área de comunicação de massas buscam adquirir outros grupos, em especial aqueles que possuem conteúdos de arquivo (filmes, livros, personagens etc). O exemplo emblemático deste movimento foi a aquisição no ano de 2000, da Time Warner, maior grupo de entretenimento e conteúdos editoriais do mundo, pela empresa AOL, uma das maiores companhias de co municação digital.

2. Os “bons” produtos culturais lançados no mercado editorial são, muitas vezes adaptados para outros formatos como TV, cinema, jogos, e para o crescente mercado de licenciamento de personagens.

3. Produtos lançados na TV, no cinema e nos games se transformam em livros.

Possuímos um exemplo no mercado brasileiro, a Editora Globo, que tem lançado no formato livro, boa parte de seus programas televisivos. Não

75 É o caso das pequenas editoras ligadas a setores da vanguarda erudita, que enquanto não conseguem emplacar sucessos editoriais se mantém relativamente distantes da lógica estan dardizada da indústria.

apenas os óbvios como mini-séries, mas também programas de humor como o “Casseta e Planeta”, ou os mini-contos do programa “Retrato Falado”, passando por livros com dicas de investimento dos comentaristas da rádio CBN.

4. O mercado infanto-juvenil é, sem dúvida, um dos mais promissores, um filme como Star Wars, episódio III, de George Lucas, é um típico exemplo desta integração racional: antes do filme estrear, foi lançada uma série de desenhos animados em 25 capítulos, para TV. Nas bancas de jornal foi lançada uma série de HQs paralelas, cuja temática tratava cronologicamente dos acontecimentos que separavam os episódios II do III. Na área de games, foi lançado um novo jogo. Nas lojas de brinquedos era possível adquirir bonecos dos personagens da série, enquanto nos fast-foods e supermercados muitos produtos estampavam cenas e personagens do episódio em questão.

Mesmo após o final da saga, uma série de livros vem sendo lançada com o desenvolvimento de linhas alternativas com a temática e os personagens da série. O lançamento do DVD e da trilha sonora são outros eventos que fecham a cadeia de produtos da “franquia.”

Os exemplos acima demonstram a presença de uma unidade impecável nessa indústria, bem como sua atuação sistêmica. E acreditamos ser esta a contribuição essencial do conceito de indústria cultural dos frankfurtianos que permanece atual, não obstante as diversas críticas desfechadas contra este conceito, e a própria localização histórica de sua emergência. Isso posto, é necessário que relativizemos sua extensão totalizante, porque no fenômeno da cultura de massas existe uma resistência contra-hegemônica, desfechada por

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