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1. NOÇÕES SOBRE OS CRIMES ELEITORAIS:

Crimes eleitorais são aqueles que, em geral, maculam a lisura do pleito eleitoral ou algum dos procedimentos que o antecedem, estando eles previstos, em sua maioria, no próprio Código Eleitoral (arts. 289 e seguintes).

Há, porém, crimes eleitorais previstos em leis especiais, como a Lei 6.091/1974 (regula o transporte e a alimentação de eleitores), a Lei 6.996/1982 (crime de alteração de resultados das cédulas manuais processadas pela via eletrônica), a Lei 9.504/1997 (“Lei Eleitoral Geral”) e a própria Lei Complementar 64/1990 (“Lei das Inelegibilidades”)

Levando em consideração a distinção feita pela Constituição Federal, para efeito de distribuição da competência por prerrogativa de função, entre “crimes comuns” e “crimes de responsabilidade” (estes últimos também conhecidos mais tecnicamente como “infrações político-administrativas”), a jurisprudência já assentou o entendimento segundo o qual na expressão “crimes comuns” estão abrangidos tanto os “crimes comuns propriamente ditos”, como os “crimes especiais”, incluindo os crimes eleitorais.234

Em conclusão, os crimes eleitorais, em tal classificação constitucional, são considerados “crimes comuns”.

Para Joel José Cândido o crime eleitoral “é todo o comportamento voluntário de agente pessoa física que causa dano a bens jurídicos eleitorais ou a direitos políticos alheios, ou exponha esses bens ou direitos a perigo direto, concreto e iminente, contrariando comando expresso e previamente previsto em lei penal eleitoral”.235

Enfim, há quem subdivida os crimes eleitorais em (a) específicos ou puros, que são os tipicamente eleitorais e que não existem fora desse direito (exs.: arts. 309, 310 e 312 do Código Eleitoral) e em (b) crimes eleitorais acidentais, que são aqueles que têm figura típica similar em outros ordenamentos, mas que se tornam eleitorais quando praticados contra direitos e garantias postas na legislação eleitoral (exs.: arts. 324-326 e 348-350).

2. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CÓDIGO PENAL:

Ressalvadas as normas específicas previstas nos arts. 283 a 288, do Código Eleitoral, a parte geral do Código Penal é aplicável quase que integralmente ao sistema criminal eleitoral.

Desta forma, os regimes de cumprimento de pena, as agravantes, as atenuantes, o concurso de pessoas, as causas de exclusão de antijuridicidade, as causas de extinção de punibilidade, entre outras matérias constantes do Código Penal Brasileiro, incidem também nos crimes eleitorais (CE, art. 287).

234

TSE, BE 258/561, Reclamação n. 10/AM e RTJ 32/614. 235

Numa análise mais apurada, (a) quanto arts. 1º a 31 do Código Penal, a aplicação é total, (b) quanto aos arts. 32 a 76 do mesmo diploma, a aplicação é apenas parcial (especialmente porque a multa eleitoral tem uma regulamentação distinta daquela prevista no Código Penal), (c) quanto aos arts. 77 a 99, a aplicação é total, (d) em relação aos arts. 100 a 106, a aplicação é parcial e (e) no que pertine aos arts. 107 a 120, a aplicação é total.236

3. PENAS NOS CRIMES ELEITORAIS (regras gerais):

O Código Eleitoral e a legislação penal eleitoral prevêem como penas autônomas a privativa de liberdade (reclusão e detenção) e a de multa; contudo, apresentam regras próprias, diferentes das contidas no Código Penal tais como as relativas à pena mínima das infrações.

Passo, então, a fazer o exame individualizado dessas distinções em relação ao Direito Penal Comum.

3.1. PENA MÍNIMA – NORMA PENAL ELEITORAL OMISSA:

Em sendo omissa a lei penal eleitoral quanto à pena mínima em abstrato para determinado crime eleitoral, e não raro isso acontece (vejam-se, por exemplo, os crimes previstos nos arts. 289, 290, 293 e 295), a pena mínima para os referidos delitos eleitorais será de 15 (quinze) dias se a modalidade penal for de detenção, e de 1 (um) ano para reclusão.237

Vejamos o que dispõe expressamente o art. 284 do Código Eleitoral:

“Sempre que este Código não indicar o grau mínimo, entende-se que será ele de 15 (quinze) dias para a pena de detenção e de 1 (um) ano para a de reclusão”.

Dada a clareza da norma transcrita não há muito o que esclarecer ao leitor, pelo que me limito a sugerir a memorização, visto que a matéria tem sido muito cobrada em concursos públicos (conforme demonstra a questão inserida na nota de rodapé).238

236

Nesse sentido: Marcos Ramayana, Direito eleitoral, Telejur (Fita 2). 237

(Ministério Público-GO, 2010, questão 96) “Sempre que o Código Eleitoral não indicar o grau

mínimo, entende-se que será ele de 30 (trinta) dias para a pena de detenção e de 1 (um) ano para a de reclusão, considerando, ainda, que quanto a lei determina a agravação ou atenuação da mesma sem mencionar o quantum, deve o juiz fixá-lo entre 1/6 (um sexto) e 1/3 (um terço), guardados os limites da pena cominada ao crime” (a alternativa é incorreta na sua segunda parte, pois a agravação prevista na lei

eleitoral é de 1/5 a um 1/3 – CE, art. 285). 238

(Magistratura-GO, 2004) Caso o tipo penal, em matéria eleitoral, seja omisso no quantum, a pena

mínima aplicável será de: (a) 45 (quarenta e cinco) dias para os crimes punidos com detenção e 01 (um) ano

para os punidos com reclusão; (b) 15 (quinze) dias para os crimes punidos com detenção e 01 (um) ano para os punidos com reclusão; (c) 60 (sessenta) dias para os crimes punidos com detenção e 06 (seis) meses para os punidos com reclusão; (d) 30 (trinta) dias para os crimes punidos com detenção e 01 (um) ano para os punidos com reclusão (no gabarito oficial, a letra “b” é a correta; recomenda-se a releitura do art. 284

3.2. CAUSA DE AUMENTO E DE DIMINUIÇÃO DE PENA NA OMISSÃO DA NORMA PENAL ELEITORAL:

Quando a lei eleitoral determina “agravação” (leia-se: o aumento genérico ou específico de pena) ou “atenuação” (leia-se: a diminuição genérica ou específica da pena) da pena sem mencionar o quantum (exs.: arts. 340, par. único e 350, par. único), deverá o juiz fixá-lo entre 1/5 (um quinto) e 1/3 (um terço), guardados os limites da pena cominada ao crime (art. 285).

Convém aqui confrontar a regra supra com as existentes no Direito Penal Comum.

Nesse cotejo se chegará à conclusão de que no Direito Penal Eleitoral mesmo as causas de diminuição e aumento de pena não podem ultrapassar ao limite abstrato da pena cominada ao crime eleitoral (CE, art. 285); já na disciplina do Código Penal, diversamente, a incidência de causas de aumento e de diminuição de penal pode sim reduzir a pena a um patamar inferior ao mínimo, ou aumentá-la em grau superior ao da pena máxima em abstrato.239

Apenas no que tange às agravantes e atenuantes no sentido técnico (CP, arts. 61, 62, 65 e 66), há restrição no Direito Penal Comum, sendo vedado – ao menos de acordo com o posicionamento predominante – que essas levem a violação dos limites abstratos mínimos e máximos do preceito secundário do crime, conforme comumente se ensina na doutrina especializada tradicional.240

3.3. DESTINO E VALOR DA PENA DE MULTA:

Ao contrário do que ocorre no Direito Penal Comum, a pena de multa no Direito Penal Eleitoral será destinada ao Tesouro Nacional (e não ao Fundo Penitenciário, como prevê o art. 49, caput, do Código Penal),241 sendo fixada entre o mínimo de 01 (um) dia-multa e o máximo de 300 (trezentos) dias-multa (CE, art. 286,

caput).

De outro lado, o valor do dia-multa será fixado entre 1/30 (um trigésimo) e 01 (um) salário mínimo, inexistindo atualmente o salário mínimo por região de que trata o art. 286, § 1º do Código Eleitoral, só o nacional (Decreto-lei 2.284/1986).

Se estivéssemos tratando do Direito Penal Comum, (a) os limites da multa seriam de 10 a 360 dias-multa (CP, art. 49), (b) o valor do dia-multa variaria entre 1/30 (um trigésimo) até 5 (cinco) vezes o salário mínimo (CP, art. 49, § 1º).

Registre-se, enfim, que a multa penal eleitoral “pode ser aumentada até o triplo, embora não possa exceder o máximo genérico (caput), se o juiz considerar que, em virtude da situação econômica do condenado, é ineficaz a cominada, ainda que no máximo, ao crime de que se trate” (CE, art. 286, § 2º).

239

Julio Fabbrini Mirabete, Manual de direito penal, v. 1, pp. 294-297. 240

Damásio Evangelista de Jesus, Direito penal, v. 1, pp. 508-512. 241

Há quem sustente (Michels, Direito eleitoral, p. 164) que a multa criminal deve ser revertida atualmente para o Fundo Partidário, e não ao Tesouro Nacional, raciocínio que se baseia no art. 38, inciso I, da Lei 9.096/1995.

4. INFRAÇÕES PENAIS ELEITORAIS:

Os crimes eleitorais, como se adiantou, estão previstos no próprio Código Eleitoral (arts. 289-354, entre outros preceitos), na Lei Complementar 64/1990, na Lei 6.091/1974, na Lei 6.996/1982 e na Lei 7.021/1982.242

Todos eles são tipos de ação penal pública incondicionada (CE 355) e buscam, em geral, resguardar diretamente a ordem política e, eventualmente, de modo secundário, interesses particulares, como nos casos da calúnia, difamação e injúria eleitorais (CE, arts 324 a 326).

Sob essa ótica pode-se dizer que “nos crimes eleitorais o sujeito passivo é sempre o Estado”, nada impedindo que exista simultaneamente outro sujeito passivo, “ou seja, outro cidadão lesado ou ameaçado no exercício de seu direito”.243

Seguindo a tradicional classificação criada por Joel José Cândido,244 temos que os crimes eleitorais podem se subdividir da seguinte forma:

a) Crimes contra a Organização Administrativa da Justiça Eleitoral (arts. 305, 306, 310, 311, 318 e 340, do Código Eleitoral);

b) Crimes Contra os Serviços da Justiça Eleitoral (arts. 289 a 293, 296, 303, 304, 341 a 347, do Código Eleitoral e outros previstos na legislação especial);

c) Crimes Contra a Fé Pública Eleitoral (arts. 313 a 316, 348 a 354 e outros);

d) Crimes Contra a Propaganda Eleitoral (arts. 323 a 327; 330 a 332 e 334 a 337 do Código Eleitoral);

e) Crimes Contra o Sigilo e o Exercício do Voto (arts. 295, 297 a 302, 307 a 309, 312, 317, 339 e outros insculpidos na lei esparsa);

f) Crimes Contra os Partidos Políticos (arts. 319 a 321 e 338, do Código Eleitoral).

5. ANALISE PONTUAL:

Fiel aos objetivos deste limitado trabalho destinado ao estudo para concursos públicos, não comentarei artigo a artigo os crimes eleitorais, por entender que a simples analise dos mesmos “a seco” – e a eventual consulta à doutrina especializada245 – pode levar a bons resultados práticos.

242

(Ministério Público-GO, 2010, questão 92) Não constitui crime eleitoral: (a) Fazer propaganda, qualquer que seja a sua forma, em língua estrangeira; (b) Não apresentar o órgão do Ministério Público, no prazo legal, denúncia ou deixar de promover a execução de sentença condenatória; (c) Colher assinatura do eleitor em mais de uma ficha de registro de partido; (d) Colocar cartazes, para fins de propaganda eleitoral, em muros, fachadas ou qualquer logradouro público (a alternativa “d” é a correta; ver os arts. 335, 342 e 321 do

Código Eleitoral).

243

Michels, pp. 159-160. 244

Direito eleitoral brasileiro, pp. 277-278. 245

Em que pese isso e a par de recomendar a leitura insistente dos tipos penais previstos nos arts. 289 a 354 do Código Eleitoral (e demais leis especiais citadas) à luz dos conhecimentos já obtidos no Direito Penal Geral, faço questão de frisar alguns pontos específicos e que podem passar despercebidos pelo leitor.

Primeiramente relembro que todos os crimes eleitorais são de ação pública incondicionada (CE, art. 355), inexistindo previsão de crimes eleitorais de ação penal pública condicionada e de ação penal privada. Nem mesmo os crimes eleitorais contra a honra (CE, arts. 324-326) são de ação penal privada, no que se verifica nítida distinção de regime jurídico em relação aos tipos penais similares regulados nos arts. 138 a 140 do Código Penal.

Assim sendo, em todas infrações penais eleitorais a autoridade policial e o Ministério Público Eleitoral devem agir de ofício, sendo dispensável qualquer provocação formal de quem quer que seja.

Passo adiante.

Do cotejo entre os crimes previstos nos arts 289 (“Inscrever-se fraudulentamente o eleitor”) e 290 (“Induzir alguém a se inscrever eleitor com infração de qualquer dispositivo deste Código”) do Código Eleitoral, depreende-se clara exceção à “Teoria Monista” do concurso de agentes. Cada um dos autores (o que induz e o que, induzido, se inscreve fraudulentamente) em tal caso responderá por um crime diverso, ao contrário do que prevê o art. 29, do Código Penal, que estabelece responsabilidade penal dos co-autores e dos partícipes pelo mesmo crime, na medida de sua culpabilidade.

Aliás, há até um “crime próprio”, específico para a punição do juiz eleitoral que efetua a inscrição fraudulenta do alistando, encontrando-se no art. 291 do Código Eleitoral.246

No art. 309 do Código Eleitoral há importante previsão de crime “de atentado” ou “de empreendimento”, no qual a tentativa é punida com a mesma pena do crime consumado (“Votar ou tentar votar mais de uma vez, ou em lugar de outrem”).247

Caso haja desobediência à ordens ou instruções emanadas da Justiça Eleitoral não estará configurado o crime previsto no art. 330, do Código Penal (“crime de desobediência”), mas aquele regulado no art. 347 do Código Eleitoral (“crime de desobediência eleitoral”), infração similar que prevalece no conflito aparente de normas em face da incidência do tradicional princípio da especialidade.

O crime apelidado de “boca de urna”, ao contrário do que se poderia pensar, não se encontra previsto no Código Eleitoral, mas sim no art. 39, § 5º, incisos II e III, da Lei 9.504/1997,248 com nova redação outorgada pela Lei 11.300/2006.

246

“Efetuar o juiz, fraudulentamente, a inscrição de alistando”. 247

(Magistratura-GO, 2009, prova A01, tipo 004, questão 79) Não constitui crime eleitoral: (a) Fazer propaganda, no horário eleitoral gratuito, em língua estrangeira; (b) Intervir o Juiz eleitoral no funcionamento da Mesa Receptora; (c) Perturbar ou impedir de qualquer forma o alistamento; (d) Reter título eleitoral contra a vontade do eleitor; (e) Votar ou tentar votar em lugar de outrem (a alternativa “b” é a única que não

constitui crime eleitoral).

248

“Constituem crimes, no dia da eleição, puníveis com detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa no valor de 5.000 (cinco mil)

Enfim, os crimes previstos nos arts. 348 a 353 do Código Eleitoral praticamente cópias dos arts. 298 a 305 do Código Penal, mas prevalecerão sobre estes também por força do princípio da especialidade.

Será muito comum, aliás, utilizarmos o princípio da especialidade para resolvermos diversos conflitos aparente de normas que surgirão no estudo do Direito Penal Eleitoral (exs.: CE, art. 298 com a Lei 4.898/1965; CE, art. 347 com o CP, art. 330; CE, art. 349 com CP, art. 298 etc.).

a 15.000 (quinze mil) UFIR: (...)II – a arregimentação de eleitor ou a propaganda de boca de urna; III – a divulgação de qualquer espécie de propaganda de partidos políticos ou de seus candidatos”.