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1. NOÇÕES:

Sufrágio em termos amplos significa “aprovação”, porém, em Direito Eleitoral representa um direito público, subjetivo, universal, de natureza política, que possui o cidadão (a) de eleger, (b) de ser eleito e (c) de participar da organização e da atividade do poder estatal (através do plebiscito, referendo, da iniciativa popular entre outros).83

O “sufrágio” não se confunde, absolutamente, com o “voto”, que consiste no seu exercício direto e secreto (voto é o instrumento através do qual o cidadão manifesta sua vontade para escolha de governantes em um regime representativo); o sufrágio é o direito propriamente dito e o voto é o exercício deste mesmo direito.

Com “escrutínio” também não se confunde o “sufrágio”. O escrutínio é o modo de exercício do voto em concreto (é a exteriorização do voto), envolvendo várias operações eleitorais, tais como a votação (depósito e recolhimento dos votos nas urnas) e a apuração dos votos (abertura das urnas, conferência dos votos).

Segundo Alexandre de Moraes, o voto se caracteriza principalmente:

(a) Pela personalidade (o voto é personalíssimo, não se admitindo o voto por procuração);

(b) pela liberdade (proíbe-se a coação, a compra e o constrangimento eleitoral, inclusive através da tutela penal, bem como é garantido o voto em branco ou nulo, devendo a urna eletrônica assegurar esse direito);

(c) pelo sigilo84 (cédulas oficiais, cabine indevassável, rubrica em cédulas e proibição de identificação na cédula, conforme o art. 103 do Código Eleitoral85);

(d) pela obrigatoriedade formal de comparecimento (salvo se o eleitor tiver idade entre 16 e 18 anos, ou for maior de 70 anos);

(e) por ser direto (salvo hipótese excepcional prevista no art. 81, § 1º da Constituição Federal);

83

(Magistratura-GO, 2009, prova A01, tipo 004, questão 72) Sufrágio é o: (a) Ato de assinalar na urna eletrônica o nome de um candidato, manifestando sua vontade para escolha de governantes em um regime representativo; (b) Comparecimento à seção de votação e assinatura da folha de votação, para a escolha de candidatos regularmente registrados em pleito eleitoral; (c) Instrumento através do qual o cidadão manifesta sua vontade para escolha de governantes em um regime representativo; (d) Direito público subjetivo de eleger, ser eleito e de participar da organização e da atividade do poder estatal; (e) Documento oficial onde o cidadão assinala o nome de um candidato, manifestando sua vontade para escolha de governantes em um regime representativo (a alternativa “d” é a correta).

84

As Constituições de 1824, 1934 e 1937 não previram em seu texto o voto secreto, o que somente veio a ocorrer a partir da Carta Magna de 1946 (Alexandre de Moraes, Direito constitucional, 2006, p. 211). 85

É bom registrar que o citado art. 103 do Código Eleitoral não foi revogado pela Lei 9.504/1997, estando em pleno vigor, mas é evidente que sua aplicação integral somente ocorre no caso de votação manual.

(f) por ser periódico, até porque a Constituição Federal consagra a garantia da temporariedade dos mandatos (CF, art. 60, § 4º, inciso II), e

(g) pela igualdade (CF, art. 14, caput).86

Aliás, convém também lembrar neste ponto que a Carta Magna enquadrou o voto direto, secreto, universal e periódico como cláusula pétrea, inadmitindo por isso que se elabore emenda constitucional modificadora acerca desses temas (CF, art. 60, § 4º, inciso II).

2. CLASSIFICAÇÕES DO SUFRÁGIO:

O sufrágio costuma ser classificado levando-se em conta a sua extensão (universal ou restrito), o seu valor (igual ou desigual), o modo de exercício (direto ou indireto), a sua forma (secreta ou aberta), a sua distribuição no espaço (distrital ou circunscricional) e quanto à representação (majoritário e proporcional).

Vejamos a seguir. 2.1. QUANTO À EXTENSÃO:

No que pertine à extensão, o sufrágio pode ser universal (irrestrito) ou restrito (qualificado).

2.1.1. SUFRÁGIO UNIVERSAL (sistema brasileiro):

É o sistema segundo o qual se outorga o direito de votar a todos os nacionais de um país, sem restrições derivadas de condições de nascimento, de fortuna ou de capacidade especial.

Trata-se do sistema adotado expressamente por nossa Constituição Federal (CF 14 caput),87 inclusive como cláusula pétrea (CF 14 § 4º II).

Este princípio, entretanto, admite a existência de restrições ao sufrágio, desde que impessoais e baseadas em critério de ordem pública (exs.: exigência de idade mínima de dezesseis anos para votar, vedação ao voto do estrangeiro e do conscrito etc.).

Como nos ensina Alexandre de Moraes, “a existência de requisitos de forma (necessidade de alistamento eleitoral) e de fundo (nacionalidade, idade mínima, por exemplo), não retiram a universalidade do sufrágio”.88

2.1.2. SUFRÁGIO RESTRITO:

86

Direito constitucional, 2006, pp. 210-211. 87

(MP-MT, Promotor de Justiça) O regime de sufrágio adotado pela Constituição Brasileira é: (a) universal censitário; (b) universal inigualitário, (c) universal capacitário; (d) universal igualitário (a

alternativa “d” é a correta, nos termos do art. 14, caput, da Constituição Federal).

88

O sufrágio é considerado restrito quando só é conferido a indivíduos qualificados por condições econômicas (sufrágio censitário) ou por capacidades especiais (sufrágio capacitário).

O sufrágio restrito é censitário quando o indivíduo, para poder votar, deve preencher determinada qualificação econômica (exs.: posse de bens imóveis, de determinada renda ou pagamento de certa importância em forma de imposto direto).

Já o sufrágio restrito capacitário se baseia em capacitação especial, notadamente de natureza intelectual. Dá-se, assim, por esse sistema, o direito de voto apenas àqueles que possuem certo grau de instrução (ex.: analfabetos não teriam, hipoteticamente, direito a voto).

À propósito, no Brasil, até o advento da Emenda Constitucional 25/1985 poder-se-ia dizer que o sufrágio era restrito capacitário, já que os analfabetos não podiam votar; a partir de 1985, felizmente, adotou-se o sufrágio universal, com o que os analfabetos passaram a possuir a “capacidade política ativa” (direito de votar), mas não a “passiva” (direito de ser votado).

2.2. QUANTO AO VALOR:

Sob essa ótica, relativa ao seu valor, o sufrágio pode ser igual ou desigual.

2.2.1. SUFRÁGIO IGUAL (sistema brasileiro):

Significa que o voto, nos termos do princípio constitucional da isonomia, tem o mesmo peso para todos, independentemente da fortuna ou do grau de instrução do eleitor.

Trata-se do critério adotado pela Constituição Federal (art. 14, caput).

2.2.2. SUFRÁGIO DESIGUAL:

Por esse sistema, outorga-se a determinados eleitores, por circunstância especial, o direito de votar mais de uma vez ou de dispor de mais de um voto para prover um mesmo cargo. Admitem três subespécies, quais sejam, a do voto múltiplo, do voto plural e do voto familiar.

Pelo primeiro (voto múltiplo), o eleitor ficaria com o direito de votar mais de uma vez, ou seja, em mais de uma circunscrição eleitoral.

De acordo com o segundo (voto plural), o eleitor poderia emitir mais de um voto de uma vez, mas numa única circunscrição.

Pelo último (voto familiar), o eleitor “pai de família” exercita um ou mais votos em função do número dos membros do núcleo familiar.

2.3. QUANTO AO MODO:

Considerando-se o modo de exercício, o voto pode ser direto ou indireto.

2.3.1. VOTO DIRETO (sistema brasileiro):

O eleitor vota diretamente no candidato ao cargo a ser preenchido, conforme prevê o art. 14, caput, da Constituição Federal, sendo esta inclusive uma cláusula pétrea (CF, art. 60, § 4º, inciso II).

2.3.2. VOTO INDIRETO:

Neste sistema existem duas fases: na primeira, pelo voto direto do eleitor, são escolhidos os delegados (Deputados ou “Grandes Eleitores”) que formam o colégio eleitoral, os quais, numa segunda fase, elegem os ocupantes dos cargos públicos.

Era este o sistema adotado pelo Brasil como regra até a eleição do Presidente Tancredo Neves (de 1964 a 1984).89

Veja-se, porém, que o critério (da eleição indireta) em tela não foi banido do Direito Brasileiro, sendo utilizado atualmente pelo art. 81, § 1o, da Constituição Federal,90 que trata da eleição na hipótese de vacância dos cargos de presidente e vice- presidente da república na última metade do mandato.91

2.4. QUANTO À FORMA:

No que pertine à forma, o sufrágio pode ser secreto ou aberto.

2.4.1. VOTO SECRETO:

A Constituição Federal e também a legislação infraconstitucional asseguram o sigilo do voto, a fim de que o eleitor escolha livremente seu candidato, evitando-se, assim, pressões anteriores ou posteriores ao pleito.

O assunto figura também como cláusula pétrea à luz do art. 60, § 4º, inciso II, da Constituição Federal.

O sigilo do voto é princípio de ordem pública e não pode ser dispensado pelo eleitor (CE, art. 103), que (a) deverá votar na cabine indevassável, (b) não se identificar na cédula e (c) depositar o voto na urna, sem que ninguém veja em quem votou, sob pena de nulidade.

2.4.2. VOTO ABERTO:

89

Durante o período citado, o “Presidente e o Vice eram designados por um Colégio dito Eleitoral, que correspondia ao Congresso Nacional reforçado, uma vez que eram adicionados seis representantes provindos de cada Assembléia Legislativa Estadual, escolhidos pelos integrantes das bancadas partidárias majoritárias” (Michels, p. 28).

90

“Ocorrendo vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei”.

91

Voto aberto, ou a descoberto, de outro lado, é o exercido por meio destituído de qualquer sigilo.

O voto aberto seria o mais transparente, mas poderia gerar pressões extremamente prejudiciais à liberdade do eleitor, daí porque não foi adotado por nosso Direito Eleitoral como regra.

Em alguns casos constitucionais, todavia, a votação na Câmara de Deputados e no Senado é aberta.

2.5. QUANTO À DISTRIBUIÇÃO:

Quanto à distribuição, o sufrágio pode ser distrital ou circunscricional.

2.5.1. VOTO DISTRITAL:

Pelo sistema do voto distrital, o eleitor escolhe apenas um representante, cuja base é a sua região, de forma que, teoricamente, terá melhores chances de conhecer o candidato e votar com mais acerto.

2.5.2. VOTO CIRCUNSCRICIONAL:

Neste sistema, o país é dividido em circunscrições para efeito de exercício do voto.

Nas eleições presidenciais, a circunscrição seria o território nacional; nas estaduais e federais, o território de cada Estado e do Distrito Federal; nas municipais, corresponderia à extensão do respectivo município.92

Trata-se do critério utilizado pelo Direito Eleitoral Brasileiro (art. 86), mas existe discussão no Congresso Nacional para futura adoção de um sistema distrital puro ou pelo menos distrital misto.

2.6. QUANTO À REPRESENTAÇÃO:

Considerando a representação dos votantes, o sufrágio pode ser

majoritário ou proporcional, sendo certo que a doutrina especializada também reconhece

a existência daquilo que seria um sistema misto.93

2.6.1. SISTEMA MAJORITÁRIO:

Este sistema considera eleito o candidato que obtiver a maior soma de votos dentre os competidores. No Brasil, atualmente, são previstos dois tipos de maioria, a simples e a absoluta.

Adota-se o critério da maioria simples nas eleições para Prefeitos de municípios com até 200.000 (duzentos mil) eleitores e de Senadores (Lei 9.504/1997, art. 3o, caput).

92

Queiroz, Direito eleitoral, p. 45. 93

Adota-se, por outro lado, o sistema da maioria absoluta nas eleições para Prefeitos de municípios com mais de duzentos mil eleitores (Lei 9.504/1997, art. 3o, § 2o), para Governadores, e para Presidente da República (Lei 9.504/1997, art. 2o, caput). Nestes casos, se nenhum dos candidatos alcançar mais da metade dos votos válidos, entre

os quais não se consideram os brancos e nulos, será necessário um segundo turno, do

qual participarão os dois mais votados, sendo eleito o candidato que mais votos obtiver (art. 2o, § 1o, da Lei Eleitoral citada).

2.6.2. SISTEMA PROPORCIONAL:

A Constituição Federal acolheu o sistema proporcional ou da representação proporcional94 para as eleições de Deputados Federais (CF, art. 45), Deputados Estaduais, Deputados Distritais e Vereadores.

Para o conhecimento dos candidatos eleitos, portanto, será necessário (a) determinar o número de votos válidos, (b) estabelecer o quociente eleitoral e, após, (c) encontrar o quociente partidário, de forma que os diplomados nem sempre serão os candidatos mais votados.

Vejamos com mais detalhes as operações.

2.6.2.1. QUOCIENTE ELEITORAL:

O quociente eleitoral, em rápidas linhas, pode ser entendido como o número de votos necessários para que determinado partido ou coligação preencha uma vaga de Deputado Federal, Estadual, Distrital ou Vereador.

Determina-se, pois, o quociente eleitoral, dividindo o número de votos válidos – não mais se somando os votos em branco, nos termos do art. 5o da Lei n. 9.504/199795 – pelo número de vagas a preencher na Câmara dos Deputados, na Assembléia Legislativa (ou Câmara Legislativa), ou na Câmara Municipal, desprezando-se a fração igual ou inferior a meio, ou arredondando-se para 1 (um) a fração superior a meio (CE, art. 106).

2.6.2.2. QUOCIENTE PARTIDÁRIO:

O quociente partidário representa o número de vagas a que terá direito o partido ou coligação.

Encontra-se o quociente partidário de cada partido político ou coligação, dividindo-se o número de votos obtidos pela legenda ou coligação (incluindo-se os conferidos aos candidatos por ele registrados) pelo quociente eleitoral, desprezada a fração (CE, art. 107).

Após essa operação, estarão naturalmente eleitos “tantos candidatos registrados por um partido ou coligação quantos o respectivo quociente partidário indicar, na ordem da votação nominal que cada um tenha recebido” (CE, art. 108), ou seja, “os

94

José Afonso da Silva, Curso de direito constitucional positivo, p. 372. 95

Ressalte-se que o art. 106, par. único, do Código Eleitoral foi expressamente revogado pelo art. 107 da Lei 9.504/1997.

candidatos mais votados, em cada legenda, serão os eleitos, para ocupar as cadeiras que lhes toquem”.96

2.6.2.3. DISTRIBUIÇÃO DOS RESTOS:

Restando vagas mesmo depois do empreendimento das operações anteriores, será mister a observância das regras do art. 109, do Código Eleitoral.

É que foi adotado o “sistema de maior média” no direito brasileiro para a distribuição das vagas não preenchidas.97

Nesta etapa de ocorrência eventual no processo eleitoral, segundo Ary Ferreira de Queiroz, exercita-se “um raciocínio hipotético, imaginando qual seria a média de votos por candidato em cada partido se lhe acrescentasse uma vaga a mais do que a obtida pela fórmula normal”.98

Segundo este sistema, efetivamente adiciona-se mais um lugar (uma vaga hipotética) aos que foram obtidos por cada um dos partidos; depois, toma-se o número de votos obtidos por cada um dos partidos e divide-se por aquela soma; o primeiro lugar a preencher caberá ao partido que obtiver a maior média.

Havendo, ainda, mais lugares a preencher, repete-se a mesma operação até preencher todas vagas.

Ocorrendo empate em qualquer das regras supra mencionadas, “haver-se-á por eleito o candidato mais idoso” (CE, art. 111)

2.6.2.4. QUOCIENTE ELEITORAL NÃO ATINGIDO:

Caso nenhum dos partidos ou coligações logre atingir o quociente eleitoral (ou, como se diz popularmente, se nenhum partido “fez candidatos”), considerar- se-ão eleitos, até serem preenchidos todos os lugares, os candidatos mais votados99 (CE, art. 111), seguindo-se, assim, em caráter de exceção, o sistema majoritário.

Segundo José Afonso da Silva esta norma eleitoral é inconstitucional, pois viola o Sistema Proporcional adotado pela Constituição Federal (art. 45, caput); a solução para tal impasse, em sua visão, “seria considerar nula a eleição e fazer outra”.100 Seu entendimento, todavia, aparenta ser isolado na doutrina especializada.

96

José Afonso da Silva, Curso de direito constitucional positivo, p. 376. 97

Na doutrina, José Afonso da Silva (Curso de direito constitucional positivo, p. 373) e, na jurisprudência, TRE-GO, Processo n. 178.012.004 (Rel. Dr. Eládio Augusto Amorim Mesquita, julgado em 28.02.2005). 98

Direito eleitoral, p. 67. 99

(Magistratura-GO, 1998) Assinale a alternativa correta: (a) No caso de nenhum partido ou coligação alcançar o quociente eleitoral, considerar-se-ão eleitos os candidatos mais votados, independentemente da legenda; (b) O suplente pode substituir o parlamentar em caso de impedimento, mas não pode assumir o mandato em caso de vaga; (c) A Lei permite celebrar coligações para a eleição majoritária e para a eleição proporcional, exceto para ambas as disputas: a majoritária e a proporcional; (d) Na constância do processo eleitoral, às coligações são atribuídos direitos e obrigações próprios, distintos daqueles atribuídos aos partidos políticos (no gabarito oficial, a alternativa “a” é a correta, recomendando-se a releitura do

texto principal e a consulta ao art. 111 do Código Eleitoral).

100

2.6.2.5. SUPLENTES:

Considerar-se-ão suplentes na representação partidária os mais votados sob a mesma legenda e não eleitos efetivos das listas dos respectivos partidos e, em caso de empate na votação, na ordem decrescente da idade (art. 112).

2.6.3. SISTEMA MISTO:

No sistema misto há a combinação de elementos do modelo majoritário e do modelo proporcional (comentados acima).

Existem duas espécies de sistema misto, um germânico e outro mexicano.

No modelo germânico (sistema de eleição proporcional personalizado), há a “eleição de metade do número de Deputados por listas de circunscrição de base estadual e a outra metade por circunscrições de dimensão distrital”.

Já o modelo mexicano “parte de duas unidades eleitorais diferentes: o distrito eleitoral uninominal, em número de trezentos distribuídos pelos Estados e Distrito Federal, servindo-se do sistema majoritário relativo; e a circunscrição plurinominal, em número de cinco, para organizar a eleição de duzentos Deputados pelo sistema proporcional”.101

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