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3.3. A PLATAFORMA EMERGENCIAL E PRIORITÁRIA PARA A CRIANÇA: O COMPROMISSO NACIONAL RUMO À ERRADICAÇÃO DAS PIORES FORMAS DE

3.3.2. CRIMINALIZAÇÃO DA EXPLORAÇÃO DAS PIORES FORMAS DE TRABALHO INFANTIL

Enquadram-se como crimes, no território nacional, as modalidades de exploração do trabalho infantil disciplinadas pela Convenção n. 182 (1989) e pela Lista TIP (2008). Essa convergência entre a indicação das piores formas de trabalho infantil e as tipificações penais não é mera coincidência.

As piores formas de trabalho infantil foram assim definidas por envolverem a violação da dignidade humana das crianças e dos adolescentes.

Segundo o art. 32 do Código Penal brasileiro e em redação contemplada no art. 5º, XLVII, da CF/88, “não haverá penas: de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; de caráter perpétuo; de trabalhos forçados; de banimento; cruéis”. Assim, é criminosa a exploração do trabalho forçado ou análogo ao escravo, com agravante quando as vítimas são crianças.

O art. 136 do Código Penal define o crime de maus-tratos; há agravante caso a vítima seja menor de 14 anos.

De acordo com a Seção I, do Capítulo VI, do Código Penal brasileiro, são crimes contra a liberdade individual o sequestro e o cárcere privado (art. 148) e a redução à condição análoga à de escravo (art. 149), havendo agravante nos casos que envolvam criança ou adolescente, conforme a Lei n. 10.803, de 11 de dezembro de 2003490.

Configuram-se crimes também o aliciamento e o tráfico doméstico e internacional de crianças e adolescentes, independentemente de sua finalidade e da forma em que se comete o delito – isto é, se cometido individualmente ou em quadrilha ou bando (art. 288). Em especial, o art. 239 do ECA indica a natureza delituosa do tráfico de crianças e

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Art. 149 do Código Penal: “Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.. § 1o Nas mesmas penas incorre quem: (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003). I - cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho; II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho. § 2o A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: I – contra criança ou adolescente; II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem" (Redação dada pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)”.

150 adolescentes, mas é no Código Penal que se encontra a tipificação penal dos delitos de aliciamento para o fim de emigração (art. 206), o aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional (art. 207), o tráfico internacional (art. 231) e interno (art. 231- A) de pessoas para fins de exploração sexual.

Indica-se como ponto crítico o fato de o art. 231 se aplicar apenas aos crimes de tráfico interno ou internacional de pessoas para fins de prostituição ou exploração sexual, mas não abordar o delito no caso de tráfico humano para outras finalidades491. Logo,

inexiste tipificação genérica para o tráfico humano, o que requer atualização, a fim de se estabelecer correspondência com o Protocolo Adicional ao Protocolo de Palermo para

Prevenir, Suprimir e Punir o Tráfico de Pessoas, em especial de Mulheres e Crianças

(2000)492.

No Código Penal está consagrado o agravamento das penas quando da frustração de direitos assegurados por lei trabalhista (art. 203) ou de aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional (art. 207). Em ambos os casos, a pena estabelecida é aumentada de 1/6 a 1/3 se a vítima for menor de 18 anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física.

Os Capítulos I e II do Título VI do Código Penal dispõem sobre os crimes contra a dignidade sexual. O Capítulo I refere-se aos crimes contra a liberdade sexual, a exemplo do estupro (art. 213), da violação sexual mediante fraude (art. 215) e do assédio sexual (art. 216-A). Em particular, o Capítulo II informa os crimes sexuais contra vulneráveis nos artigos 217-A e 218. O art. 218-A refere-se à satisfação de lascívia mediante presença de menor de 14 anos. O art. 218-B estipula o favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável como crime contra a dignidade sexual de vulneráveis.

O Capítulo V do Código Penal tipifica o lenocínio e o tráfico internacional de pessoas para fins de prostituição ou outra forma de exploração sexual. Nesse Capítulo, destacam-se o art. 227, sobre a mediação para servir à lascívia de outrem; os artigos 228, 229 e 244-A, que dispõem acerca do favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual. Por fim, destaca-se o art. 230, que dispõe sobre o rufianismo493. No parágrafo 1º do art. 230 consta que a pena é agravada quando a vítima for menor de 18 anos e maior de 14 anos ou se o crime for cometido por ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador.

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CARVALHO, Ella Wiecko de. A legislação penal brasileira sobre tráfico de pessoas e imigração ilegal/irregular frente aos Protocolos Adicionais à Convenção de Palermo.

492

AGÊNCIA BRASIL. CPI do Tráfico de Pessoas deve propor mudanças na legislação, diz deputado (21/03/2013). Por: Elaine Patricia Cruz. Acesso em: 15 de janeiro de 2014.

493 O rufianismo configura-se nas situações em que se tira proveito da prostituição alheia,

participando o criminoso diretamente dos lucros da prostituição ou fazendo-se sustentar no todo ou em parte, por quem a exerça (art. 230, CP).

151 A Lei n. 12.015, de 7 de agosto de 2009, estipulou situações que conduzem ao aumento das penas referentes a crimes sexuais ou hediondos494. Essa lei tem manifesto viés de proteção à dignidade humana.

As mudanças trazidas pela Lei n. 12.015/2009 iniciam-se com a alteração da denominação do Título VI do Código Penal brasileiro, abandonando-se a designação “Dos crimes contra os costumes” e adotando-se o título “Dos crimes contra a dignidade sexual”. Percebe-se que não se trata de mero ajuste de nomenclatura destituído de relevância prática, pois a alteração traduz, antes de tudo, a preocupação do legislador com a dignidade sexual, como projeção da própria dignidade da pessoa humana, erigida a epicentro de todo o ordenamento jurídico (...) Dessa forma, o princípio da dignidade da pessoa humana é condicionante da interpretação de qualquer norma integrante do ordenamento jurídico, inclusive as normas de caráter penal495. A Lei n. 12.015/2009 estabeleceu hipótese de elevação das penas em relação aos crimes cometidos contra a dignidade sexual quando a vítima for menor de 18 anos; há hipótese de agregar multa à pena se o crime for cometido com vistas à obtenção de vantagem econômica. Nos casos de assédio sexual, a pena prevista poderá ser aumentada em até 1/3 e, no caso de tráfico internacional ou interno de pessoas para fins de exploração sexual, a pena poderá ser aumentada da metade quando a vítima for menor de 18 anos.

De acordo com a Lei 11.577, de 2007, tornou-se obrigatória a divulgação de mensagem relativa à exploração sexual e tráfico de crianças e adolescentes, o que aponta formas para se efetivar denúncias. De acordo com o § 2o, o texto contido no letreiro a ser fixado em estabelecimentos como bares, restaurantes, motéis, hotéis, casas de dança, casas de massagem, sauna, entre outros, será “exploração sexual e tráfico de crianças e adolescentes são crimes: denuncie já!”. No Brasil, uma das formas mais acessíveis às

494 Enfatiza-se que a Lei n. 12.0145/2009 teve por finalidade alterar o título VI da Parte Especial do

Decreto-Lei n. 2.848/1940 (Código Penal), e o art. 1 da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos nos termos do inciso XLIII do art. 5 da CF/88. Revoga ainda a Lei n. 2.252, de 1 de julho de 1954, que trata de corrupção de menores.

495 “A expressa alusão a um dos aspectos da dignidade humana (dignidade sexual) na abertura do

Título VI do Estatuto Repressivo brasileiro tem o condão de condicionar a interpretação das alterações trazidas pela novel lei à observância da dignidade humana como valor ético irredutível, merecedor de adequada e efetiva tutela estatal. O valor da dignidade da pessoa humana impõe-se como núcleo básico e informador de todo o ordenamento jurídico e, em sua projeção na seara da liberdade sexual (faculdade de livre eleição do(a) parceiro(a) sexual), como critério e parâmetro de valoração a orientar a interpretação e compreensão do sistema normativo penal. (...) Pode-se afirmar que a ideia de dignidade humana traz em si a noção de respeitabilidade condicionada apenas e tão- somente à qualidade de pessoa, rejeitando qualquer outro condicionamento, razão pela qual a norma penal deve ser interpretada à luz deste vetor axiológico, para tutelar efetivamente o bem jurídico dignidade sexual.” CAVICHIOLI, Anderson. Lei. n. 12015/2009: as consequências jurídicas da nova redação do art. 213 do Código Penal Brasileiro. Boletim Científico da Escola superior do Ministério Público da União, n. 28 e 29, dez 2008.

152 vítimas ou às testemunhas dos crimes relacionados ao trabalho infantil consiste no Disque

100.

Ambas as inovações ao Código Penal indicam a preocupação do legislador em garantir a dignidade humana da criança e de pessoas vulneráveis. Percebe-se que as Leis

n. 12.015, de 2009, e n. 11.577, de 2007, alinham-se à Doutrina da Proteção Integral e

reiteram-no em matéria penal no ordenamento jurídico brasileiro.

3.3.3. POLÍTICAS, PLANOS E PROGRAMAS NACIONAIS DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS

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