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3 DO PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO DA INCORPORAÇÃO

3.4 DA CONSTITUIÇÃO DO PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO DA

dos financiadores e demais credores do empreendimento afetado, especialmente o financiador da construção da edificação, uma vez que assegura que todas as receitas vinculadas ao empreendimento afetado sejam nele, exclusivamente, aplicadas e utilizadas no pagamento das respectivas obrigações, assim impedindo que haja indevidos desvios de recursos para outros empreendimentos do incorporador e assim delimitando os riscos ao âmbito do próprio empreendimento afetado.

Porém, ressalta-se novamente, tal proteção não é suficiente para evitar todo e qualquer prejuízo aos adquirentes, especialmente, aqueles atinentes à própria incapacidade econômico- financeiras do empreendimento afetado de autofinanciar-se ou de obter financiamento externo suficiente para conclusão da incorporação.

3.4 DA CONSTITUIÇÃO DO PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO DA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA

A despeito da relevante função social da atividade de incorporação imobiliária, a implantação do regime de patrimônio de afetação a cada empreendimento incorporativo ficou a critério do incorporador. Também ao alvedrio do incorporador ficou a opção de afetar parte ou todos os empreendimentos de incorporação da sua titularidade.

Se o incorporador é a parte da relação incorporativa que assume as restrições e os ônus decorrentes da referida afetação patrimonial, conforme ressaltado alhures, não se mostra razoável que este instrumento de proteção dos adquirentes seja adotado de acordo com a sua conveniência e interesse189. Aliás, ao assim estabelecer, o citado diploma legal concedeu exagerada prerrogativa ao incorporador, em detrimento da concessão de maiores garantias aos

188 O art. 43, III, da LCI, estabelece que, em caso de falência do incorporador, os adquirentes serão considerados

credores privilegiados da massa. Porém, na prática, esse privilégio não tem produzido qualquer efeito positivo para os adquirentes, porque, em razão das preferências especiais atribuída aos créditos trabalhistas, previdenciários e tributários, entre outros, os créditos dos adquirentes (de privilégio geral) são colocados nas últimas posições na ordem da preferência legal.

189 Essa mesma incongruência foi manifestada por Melhim Namem Chalhub, com os seguintes dizeres, in verbis:

“Ao deixar a afeta ão a crit rio do incorporador, a Lei nº 10.931/2004 concede vantagem exagerada ao incorporador, agravando ainda mais a vulnerabilidade dos adquirentes e contrapondo-se ao fundamento axiológico da norma, expresso na concepção original do anteprojeto do Instituto dos Advogados Brasileiros e em todos os Projetos de Lei da Câmara, que unissonamente, caracterizavam o acervo da incorporação imobiliária como um patrimônio afetado à destina ão espec fica de arantir os direitos patrimoniais dos ad uirentes ” (CHALHUB, Melhim Namem, op. cit., p. 95.)

adquirentes, sabidamente, a parte vulnerável da relação, assim contrariando o fundamento axiológico das normas que protegem os interesses dos adquirentes.

Essa evidente distorção recebeu duras críticas por parte da doutrina. Para Melhim Namem Chalhub, trata-se de “caso estranh ssimo em ue o devedor (incorporador) é quem decide se constituirá ou não arantia patrimonial ao seu credor (ad uirente) ”190 Enquanto que

Aldo D rea attos afirma ue “rele ar a adesão ao novo re ime ao livre arb trio do incorporador, a referida lei deixou um flanco aberto que pode enfraquecer seu poder de prote ão ao consumidor”191. Em outra passagem, o motivo para tal incongruência da norma

foi apontada por Aldo D rea attos ao asseverar ue a “razão para ue a adesão ao re ime de afetação seja voluntária se deve mais a lobby das empresas incorporadoras do que propriamente a incúria le iferante”192.

Apesar dessa deficiência, a afetação do patrimônio das incorporações imobiliárias representa um instrumento positivo em prol da garantia, transparência e segurança do negócio incorporativo, beneficiando de forma direta e imediata os adquirentes das unidades autônomas em construção, na medida em que confere maior proteção à preservação dos seus aportes financeiros e, na eventual decretação da falência ou insolvência civil do incorporador, outorga-lhes o direito de assumir a administração do empreendimento e prosseguir na execução da obra; ou, se inviável a continuidade da execução da obra, proceder a liquidação do acervo patrimonial do empreendimento.

No entanto, por ser opcional a adesão do incorporador, a eficácia do regime de afetação ficou dependente de exclusiva decisão do incorporador, colocando em segundo plano os direitos dos adquirentes, a parte hipossuficiente e principal destinatária e beneficiária do regime de afetação em apreço, contrariando evidente fundamento axiológico de proteção do patrimônio dos adquirentes de unidades imobiliárias sob regime de incorporação imobiliária.

Em decorrência dessa distorção, a adoção do regime de afetação em comento passou a depender da concessão de estímulos e incentivos econômico-financeiros ao incorporador (instrumento de extrafiscalidade). Essa função indutora, certamente, caberá ao regime especial de tributação, a seguir analisado.

No âmbito da atividade incorporação imobiliária, a constituição do regime de patrimônio de afetação efetiva-se com o ato de averbação do termo de afetação no registro imobiliário. Embora prescinda de formalidade especial, o referido termo deve ser escrito e

190

CHALHUB, Melhim Namem, op. cit., p. 95.

191 MATTOS, Aldo Dórea, op. cit., p. 44. 192 Ibid, p. 56.

firmado pelo incorporador e, quando for o caso193, também pelos titulares de direitos reais de aquisição sobre o terreno.

Com efeito, a lei não estabelece nenhuma formalidade especial para o termo de afetação, deixando a critério do incorporador a forma e o conteúdo do referido documento. Assim, segundo Melhim Namem Chalhub, incoporador poderá formular uma declaração numa folha à parte contendo por exemplo “nos se uintes termos: ‘declara o incorporador ue a presente incorporação está submetida o regime da afetação, nos termos e para os efeitos dos arts. 31A e seguintes da Lei nº 4.591/1964, com a redação dada pelo art. 53 da Lei nº 10 931/2004”194.

Porém, por se tratar de regime de afetação que repercute sobre direito real de propriedade imobiliária, o regime de patrimônio de afetação somente se considera formalmente constituído a partir do momento em que o referido termo for averbado no Cartório de Registro de Imóveis, onde arquivado e registrado o correspondente memorial de incorporação do empreendimento.

O normal é que a averbação do termo de afetação seja feita por ocasião do arquivamento e registro do memorial de incorporação. No entanto, como a lei permite que o referido termo possa ser averbado a qualquer tempo, em tese, as incorporações já registradas poderão ser submetidas ao regime de afetação até a data da extinção da incorporação imobiliária, que ocorre, formalmente, com a averbação da construção da edificação, individualização e discriminação das respectivas unidades imobiliárias e a expedição de matrícula, pelo registro imobiliário, para cada uma das unidades.

Neste passo, é oportuno ressaltar que, embora a lei permita a averbação da afetação a qualquer tempo, sob o aspecto procedimental, tendo em conta, principalmente, os registros contábeis, realizar a afetação patrimonial de um empreendimento já iniciado e em fase de execução é muito trabalhoso e complicado, senão impossível, principalmente, se o empreendimento já estiver em estágio avançado de desenvolvimento195. Dada essa circunstância, o recomendável é que a opção pela afetação seja formalizada, senão juntamente

193 Os titulares de direitos aquisitivos sobre o terreno firmarão o termo de afetação com o incorporador somente

na modalidade de incorporação indireta, hipótese em que, por força do disposto no art. 30 da LCI, os titulares de direitos aquisitivos sobre o terreno são equiparados a incorporador se iniciarem as alienações das respectivas unidades imobiliárias antes da conclusão das obras.

194 CHALHUB, Melhim Namem, op. cit., p. 101.

195 Essa limitação de natureza procedimental também foi manifestada porAldo Dórea Mattos, com os termos a

seguir transcritos: “A flexibilidade de se optar pelo re ime de PA a ual uer tempo fica limitada na prática pela dificuldade de se converter em PA uma construção já em curso e até então gerida com eventual comunicação de valores e bens entre os negócios da empresa e com a contabilidade do empreendimento mesclada com a da empresa como um todo ”(MATTOS, Aldo Dórea, op. cit., p. 59.)

com o arquivamento e registro da incorporação, pelo menos na fase de comercialização das unidades, mas antes do início da execução da obra.

De fato, uma vez formalizada a opção pela afetação, obrigatoriamente, o acervo patrimonial do empreendimento afetado deverá ser segregado do patrimônio geral do incorporador, passando a constituir um núcleo patrimonial formado apenas pelos bens, direitos e obrigações vinculados à incorporação afetada. Se tal providência for adotada no início, é de fácil segregação o acervo patrimonial inicial, constituído previamente ao procedimento de afetação, haja vista que formado, basicamente, apenas das frações ideais do terreno, onde será construído o edifício, e das dívidas decorrentes da legalização da incorporação, da elaboração dos projetos de construção, da preparação do terreno, do canteiro de obra etc.

Diferentemente acontecerá se a opção for exercida em estágio avançado de execução do empreendimento, pois, além do referido acervo patrimonial inicial, deverá ser isolado do patrimônio geral do incorporador os bens, direitos e obrigações que foram acrescidos durante a execução da construção da edificação e a comercialização das unidades imobiliárias, principalmente as acessões construídas, os equipamentos adquiridos, os estoques de materiais de construção, os direitos de crédito provenientes das vendas das unidades imobiliárias, as dívidas decorrentes da compra de material e da folha de pagamento da mão de obra, os encargos trabalhistas, previdenciários e tributários etc., o que implica grande dificuldade de ordem procedimental.

Além disso, para cumprimento da exigência de segragação patrimonial, a escrituração contábil do incorporador deverá proceder os registros contábeis dos fatos relativos a cada patrimônio afetado de forma destacada da contabilidade geral do incorporador, de modo que possa ser identificado, com precisão, o acervo patrimonial afetado, bem como as receitas obtidas com a alienação das unidades e as despesas realizadas com a construção do empreendimento196. Para atender a essa exigência, o incorporador deve manter escrituração contábil completa, ainda que esteja desobrigada perante a legislação tributária. E se houver opção pelo regime especial de tributação, o incorporador ainda fica obrigado a manter escrituração contábil segregada para cada incorporação submetida a este regime especial de tributação, conforme determina o art. 7º da Lei nº 10.931, de 2004.

196 amb m para Aldo D rea attos o patrimônio de afeta ão “não possui personalidade ur dica distinta da

personalidade do incorporador. O fato de a contabilidade da incorporação afetada ser feita em separado não significa que o patrimônio do incorporador tenha sido desmembrado ou cindido. Não obstante a segregação, o Patrimônio de Afetação continua constando dos balanços patrimoniais da empresa incorporadora, porém, numa conta pr pria ” (MATTOS, Aldo Dórea, op. cit., p. 56.)

Entretanto, ressalta-se que, embora momentaneamente isolado e escriturado destacadamente na contabilidade do incorporador, o acervo patrimonial afetado continua integrado ao patrimônio geral do incorporador, mantendo apenas a sua autonomia funcional até que seja concluída da obra, averbada a contrução e discriminadas e entregue as unidades aos adquirentes, ou ainda, se houver financiamento da obra, resgatada a dívida com a instituição financeira financiadora.

3.5 DOS EFEITOS DA DECRETAÇÃO DA FALÊNCIA OU DA PARALISAÇÃO DAS