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3 DO PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO DA INCORPORAÇÃO

3.6 DA EXTINÇÃO DO PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO

A extinção do patrimônio de afetação da incorporação imobiliária ocorre em decorrência da consecução da sua finalidade, liquidação do acervo patrimonial afetado, revogação da incorporação por denúncia e outras hipóteses previstas em lei (LCI, art. 31-E).

A forma normal de extinção do patrimônio de afetação da incorporação imobiliária efetiva-se com averbação da construção210, registro dos títulos de domínio ou de direito de aquisição em nome dos respectivos adquirentes das unidades imobiliárias e, quando for o caso, extinção das obrigações do incorporador perante a instituição financiadora do empreendimento. Nesta hipótese, a extinção do patrimônio efetiva-se com o cumprimento da sua finalidade e se concretiza mediante atuação do próprio incorporador ou do condomínio dos adquirentes, representado pela Comissão de Representantes.

Na primeira hipótese, sob a liderança e a administração do incorporador, o empreendimento afetado cumpre o seu curso normal, desde o início até a conclusão da obra, averbação da construção e registro dos títulos de domínio ou de direito de aquisição em nome dos respectivos adquirentes das unidades imobiliárias. Na segunda hipótese, o empreendimento afetado não cumpre o seu curso normal. Neste caso, em razão da decretação da falência do incorporador ou da paralisação injustificada da obra, o incorporador é substituído durante a execução da obra pelo condomínio dos adquirentes, que representado

210 A averbação da construção do edifício é uma obrigação do incorporador, que, se não a requerer logo após a

expedição do habite-se, o construtor, se houver, deverá requerê-la sob pena de ficar solidariamente responsável com o incorporador perante os adquirentes. Na omissão dos dois, a averbação da construção poderá ser requerida por qualquer dos adquirentes de unidades imobiliárias (LCI, art. 44, §§ 1º e 2º).

pela Comissão de Representantes, é quem conclui a obra, averba a construção e registra os títulos de domínio ou de direito de aquisição em nome dos respectivos adquirentes das unidades imobiliárias.

Nessas duas hipóteses, a extinção da afetação ocorre mediante o cumprimento da sua função precípua, que consiste na consecução da incorporação e entrega das unidades aos adquirentes e, se for o caso, extinção das dívidas contraídas com o financiador da obra. A implementação dessa medida implica imediata desafetação dos demais bens, direitos e obrigações integrantes do acervo patrimonial afetado, especialmente, das unidades imobiliárias remanescentes “em esto ue” ue ainda não tenham sido vendidas pelo incorporador ou pela Comissão dos Representantes, assim como dos demais bens e direitos creditórios, vencidos ou vincendos, decorrentes da comercialização das respectivas unidades imobiliárias. Em suma, em consequência do ato de desafetação, todo o acervo patrimonial remanescente retorna ao patrimônio geral do incorporador, sem qualquer restrição de uso ou limitação de destinação.

No requerimento de desafetação, dirigido ao oficial do Registro de Imóveis, o incorporador ou a Comissão de Representantes, conforme o caso, deverá comprovar a averbação da construção e o registro dos títulos de domínio ou de direito de aquisição em nome dos respectivos adquirentes, o que poderá ser feito mediante a indicação, no requerimento, do ato da averbação da construção e dos números das matrículas e dos registros das unidades imobiliárias entregues aos adquirentes.

Além disso, caso tenha havido financiamento da construção, também deverá ser comprovada a extinção das obrigações perante a instituição financiadora. Essa medida visa proteger a instituição financiadora da construção, conferindo-lhe o direito de receber os créditos, prioritariamente, do acervo patrimonial afetado211, que, com a extinção da afetação, terão os suas demais obrigações, dívidas e encargos transferidas ao acervo patrimonial geral do incorporador ou, se for o caso, ao acervo patrimonial da massa concursal, sem qualquer privilégio. Na hipótese de transferência do referido financiamento aos adquirentes, para fim de pagamento do preço de aquisição das unidades, a desafetação deverá ser feita de forma

211 No mesmo sentido, leciona Pedro Guilherme Kreling Vanzella ue “as institui es financeiras passaram a ter

maior privilégio no recebimento de seus créditos em relação aos demais credores, pois o patrimônio de afetação não poderá deixar de existir enquanto as unidades autônomas não forem entregues aos respectivos adquirentes e ap s a uita ão ao financiamento ” (VANZELLA, Pedro Guilherme Kreling, op. cit., p. 72.)

individualizada, unidade por unidade, na medida em que for registrado o respectivo contrato no registro imobiliário212.

A extinção do patrimônio de afetação por revogação, ou resilição unilateral do contrato, ocorre nos casos em que há denúncia da incorporação por parte do incorporador, que só ocorre depois de restituídas aos adquirentes as quantias por eles pagas. A denúncia da incorporação consiste no ato de desistência da realização do empreendimento pelo incorporador, que deve ser formalizada perante o registro imobiliário, por escrito, dentro do prazo de validade de 180 (cento e oitenta) dias ou do igual prazo de revalidação do registro da incorporação, e comunicada, por escrito, a cada um dos adquirentes ou candidatos à aquisição das unidades imobiliárias, sob pena de responsabilidade civil e criminal do incorporador. Neste caso, o requerimento de desafetação deverá está acompanhado do termo de denúncia da incorporação e dos documentos comprobatórios da restituição das eventuais quantias pagas pelos adquirentes.

A extinção do patrimônio de afetação também se efetiva com o término do procedimento de liquidação do acervo patrimonial afetado, em cumprimento à deliberação da Assembleia Geral dos adquirentes, em razão da falência do incorporador ou paralisação injustificada da obra, nos casos em que inviável a continuidade da construção da edificação pelo condomínio dos adquirentes. Nesta hipótese, o requerimento de desafetação, assinado pela Comissão de Representantes, deverá ser instruído com os comprovantes de pagamento das obrigações trabalhistas, previdenciárias e tributárias, vinculadas ao respectivo patrimônio de afetação, bem como dos comprovantes (i) de reembolso das quantias adiantadas pelos adquirentes e das entregues pela instituição financiadora, (ii) de entrega ao condomínio do valor que este tiver desembolsado para construção das acessões de responsabilidade do incorporador, (iii) de entrega ao proprietário do terreno do valor da fração ideal do terreno, nas hipóteses em que este seja pessoa distinta da pessoa do incorporador, e (iv) entrega à massa falida do acervo patrimonial remanescente (LCI, art. 31-F, § 18, I a VI).

Outra forma de extinção do patrimônio de afetação é por meio do distrato dos contratos preliminares de aquisição das unidades ou dos contratos de incorporação, o que se efetiva mediante acordo entre o incorporador e todos os adquirentes, com vistas a extinção dos efeitos dos contratos anteriormente celebrados. Trata-se de hipótese excepcionalíssima de

212 Para Melhim Namem Chalhub com o re istro do contrato de financiamento “estarão sendo atendidos todos

os requisitos do art. 31E, I, ou seja, estará sendo registrado a propriedade ou o direito real de aquisição em nome do adquirente e estará sendo resgatado o financiamento da incorporação, na proporção da unidade vendida, permanecendo afetadas as demais unidades, que serão sucessivamente desafetadas na medida em que, individualmente forem sendo atendidos esses re uisitos”. (CHALHUB, Melhim Namem, op. cit., p. 119.)

extinção do patrimônio de afetação213, haja vista as evidentes dificuldade de obtenção de consenso de todos os adquirentes das unidades. Neste caso, o requerimento de desafetação do incorporador deverá ser dirigido ao registro imobiliário instruído com as cópias de todos os instrumentos de distrato.

Enfim, cabe fazer algumas considerações acerca do modo de extinção do patrimônio de afetação considerado impróprio e, de forma uníssona, considerado pela doutrina nocivo aos interesses dos adquirentes, por contrariar o propósito da norma instituidora do regime de afetação e por violar os princípio da isonomia e da defesa da parte vulnerável da relação incorporativa. Trata-se da forma extintiva de natureza sancionatória, determinada no art. 9º da Lei nº 10.931, de 2004, anteriormente comentado, que se materializa com a perda da eficácia da decisão de continuidade da obra.

De acordo com o referido preceito legal, ocorrerá a desafetação automática e imediata do patrimônio afetação se expirado o prazo de um ano ou menos, se o habite-se for concedido em prazo inferior, sem o pagamento integral das dívidas tributárias, previdenciárias e trabalhistas, vinculadas ao patrimônio afetado, cujos fatos geradores tenham ocorrido até a data da decretação da falência, ou insolvência do incorporador.

A norma em apreço, na “tentativa” de for ar o imediato pa amento das referidas dívidas e pretender atribuir, por meio transverso, uma certa preferência aos citados créditos, poderá produzir efeito inverso ao pretendido, porque, na impossibilidade de realização dos citados pagamentos, tais débitos serão habilitados no processo de falência, passando a concorrer com os demais créditos já habilitados na massa concursal, tendo ainda o inconveniente de serem pagos somente após a realização do ativo da massa falida, se remanescente recursos financeiros suficientes, o que é muito difícil nesse tipo de processo.

Assim, além do efeito imediato de inviabilizar a conclusão do empreendimento incorporativo, acarretando prejuízos incalculáveis aos adquirentes, tal medida ainda prejudicará todos os demais credores do acervo patrimonial afetado, incluindo as administrações tributárias e os trabalhadores, especialmente estes últimos que sofrerão os efeitos negativos imediatos da paralisação da obra, com a perda dos postos de trabalho, e ainda terão de aguardar o demorado procedimento de realização do ativo da massa falida, sem ter a certeza (senão, só dúvida) de que, ao final, receberão os seus créditos.

213 No entendimento de Pedro Guilherme Kreling Vanzella se por consenso “hover o distrato dos contratos de

incorporação, não haverá motivo para que o patrimônio de afetação continue a existir. Entretanto, cumpre dizer que o distrato deverá obedecer ao princípio da boa-fé que rege os contratos, a fim de que neste pacto não sejam estipuladas cláusulas abusivas ue colo uem os ad uirentes em situa ão de inferioridade ” (VAN A Pedro Guilherme Kreling, op. cit., p. 74.)