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Da crise de efetividade do art 489 do CPC/2015, do livre convencimento motivado

O art. 489 do CPC/2015332, especialmente o seu parágrafo primeiro, constitui uma das mais destacadas inovações da nova legislação processual, além de ser uma das mais polêmicas,

328 TORRANO, Bruno. Democracia e respeito à lei: entre positivismo jurídico, pós-positivismo e pragmatismo. 2ª edição. Belo Horizonte: Fórum, 2019, p. 385.

329 TORRANO, Bruno. Democracia e respeito à lei: entre positivismo jurídico, pós-positivismo e pragmatismo. 2ª edição. Belo Horizonte: Fórum, 2019, p. 54.

330 O autor defende a primazia do Poder Legislativo, inclusive quando este, por questões políticas, atribui maior poder deliberativo ao Judiciário. P. 57.

331 TORRANO, Bruno. Democracia e respeito à lei: entre positivismo jurídico, pós-positivismo e pragmatismo. 2ª edição. Belo Horizonte: Fórum, 2019, p. 57.

332Art. 489. São elementos essenciais da sentença:

I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;

II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;

III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem.

§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;

IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

§ 2º No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.

§ 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé.

tendo provocado a insatisfação de setores representativos da magistratura nacional333, tais como a Associação dos Magistrados do Brasil – AMB, a Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE e a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho – ANAMATRA, que oficiaram à Presidência da República pleiteando o veto do artigo, alegando, principalmente, preocupação com o “congestionamento da Justiça”.334

Embora, em geral, haja concordância doutrinária no sentido de que a violação ao parágrafo primeiro do referido artigo gera nulidade da decisão, a partir do entendimento de que as disposições do CPC/15 pertinentes à fundamentação da decisão não inovam na ordem jurídica, dando apenas aplicabilidade à Constituição Federal de 1988, a jurisprudência do STJ não vem se manifestando no mesmo sentido.

Em verdade, a própria sistemática do CPC/15 afasta o reconhecimento da nulidade como consequência da ausência de fundamentação e isso se dá por duas razões principais: quando uma sentença omissa é proferida, o CPC vigente indica, em seu art. 1.022, p. único, II335, que é caso de oposição de embargos de declaração e, caso persista a omissão, o procedimento é alegar nulidade em preliminar de apelação.

Quando o Tribunal julga a apelação onde se alega fundamentação inadequada e insuficiente, há a possibilidade de o próprio Tribunal afastar a nulidade e proceder desde logo ao julgamento do mérito com fundamento na teoria da causa madura, conforme o art. 1.013, § 3º, IV do CPC.336 Isso implica afirmar que a nulidade pode ser simplesmente desconsiderada e

333 SOUSA, Diego Crevelin de Sousa. DELFINO, Lúcio. O levante contra o art. 489, § 1º, incisos I a VI, CPC/2015: o autoritarismo nosso de cada dia e a resistência à normatividade constitucional. Disponível em

http://www.luciodelfino.com.br/enviados/201652014457.pdf

334 Conferir https://www.conjur.com.br/2015-mar-04/juizes-pedem-veto-artigo-cpc-exige-fundamentacao acesso em 13/01/2020.

335 Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;

II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material.

Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que:

I - deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento;

II - incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º .(grifo nosso) 336 Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.

§ 1º Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado.

§ 2º Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais.

§ 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando:

I - reformar sentença fundada no art. 485;

II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir; III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo;

o mérito julgado. Essa sistemática do CPC – lembrando-se ainda do princípio da primazia do julgamento do mérito – esvaziou a força do art. 489, §1º, dispositivo considerado tão importante. Na verdade, a “grande alteração” do CPC/15 no sentido de promover decisões judiciais verdadeiramente fundamentadas caiu no vazio.

Isso se confirma pela pouquíssima aplicação que o art. 489, §1º tem recebido pela jurisprudência do STJ. Ao se proceder à busca pela jurisprudência através do filtro onde se escolhe o dispositivo legal, o art. 489 do CPC/2015 retorna 359 (trezentos e cinquenta e nove) acórdãos. Analisando-se os 162 (cento e sessenta e dois) acórdãos prolatados apenas no ano de 2019, somente 15 (quinze) julgados reconheceram defeito de fundamentação nas decisões recorridas, sendo que 4 (quatro) desses casos tratavam de não aplicação de entendimento firmado pelo próprio STJ, tendo esta corte reconhecido o defeito de fundamentação para preservar a autoridade dos próprios julgados, com fundamento no art. 489, §1º, VI. Isso significa que apenas 9,25% dos casos que alegaram defeito de fundamentação com base no art. 489 do CPC/15, no ano de 2019, tiveram procedência.

O seguinte entendimento é comumente replicado em vários dos julgamentos que versam sobre a temática:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE, ERRO MATERIAL. AUSÊNCIA. 1. Os embargos de declaração, conforme dispõe o art. 1.022 do CPC, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material existente no julgado, o que não ocorre na hipótese em apreço. 2. O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida. 3. No caso, entendeu-se pela ocorrência de litispendência entre o presente mandamus e a ação ordinária n. 0027812-80.2013.4.01.3400, com base em jurisprudência desta Corte Superior acerca da possibilidade de litispendência entre Mandado de Segurança e Ação Ordinária, na ocasião em que as ações intentadas objetivam, ao final, o mesmo resultado, ainda que o polo passivo seja constituído de pessoas distintas. 4. Percebe- se, pois, que o embargante maneja os presentes aclaratórios em virtude, tão somente, de seu inconformismo com a decisão ora atacada, não se divisando, na hipótese, quaisquer dos vícios previstos no art. 1.022 do Código de Processo Civil, a inquinar tal decisum. 5. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no MS 21.315/DF, Rel. Ministra DIVA MALERBI – DESEMBARGADORA CONVOCADA TRF 3ª REGIÃO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/06/2016, DJe 15/06/2016). (grifos nossos)

§ 4º Quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescrição, o tribunal, se possível, julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau. § 5º O capítulo da sentença que confirma, concede ou revoga a tutela provisória é impugnável na apelação.

O referido julgado, de 2016, vem sendo reiteradamente adotado nas novas decisões, as quais utilizam-no de forma que pode se chamar acrítica, uma vez que fazem remissão ao julgado sem, em momento algum, apontar qualquer fundamento concreto do caso que está sendo julgado, ou seja, sem proceder ao enfrentamento do fundamento alegado pelas partes para pleitear a nulidade por falta de fundamentação.

Os seguintes julgados, muito recentes, são ilustrativos acerca da forma como o STJ vem enfrentando a temática e, por vezes, aplicando entendimentos que foram prolatados anteriormente à vigência do CPC/2015:

PROCESSUAL CIVIL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3/STJ. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 1022, II, E 489, § 1º, AMBOS DO CPC/2015. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. SENTENÇA PROFERIDA NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. APLICAÇÃO DOS CRITÉRIOS PREVISTOS NO ART. 85 DO CPC/2015. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO ART. 20, §§ 3º E 4º, DO CPC/1973. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS. QUANTIA SUPOSTAMENTE IRRISÓRIA. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza omissão (cf. AgRg no AREsp 434.846/PB, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 19/03/2014), pois não há que se confundir entre decisão contrária aos interesses da parte e negativa de prestação jurisdicional (cf. AgRg no AREsp 315.629/RJ, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 21/03/2014; AgRg no AREsp 453.623/SP, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 21/03/2014). 2. A Corte Especial pacificou o entendimento segundo o qual, nas ações em que for vencida a Fazenda Pública, a fixação dos honorários não está adstrita aos limites percentuais máximos e mínimos, podendo ser adotado como base de cálculo o valor dado à causa ou à condenação, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC/1973, ou mesmo um valor fixo, segundo o critério de equidade. Precedentes. 3. A revisão dos valores fixados a título de verba de advogado pressupõe, via de regra, a verificação das provas produzidas nos autos e sua valoração, o que é vedado a este Superior Tribunal de Justiça a teor do verbete da Súmula nº 7/STJ: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial". 4. Somente em hipóteses excepcionais, quando salta aos olhos a inobservância das balizas legais para o arbitramento da verba - por ser ínfima ou por ser exagerada, é que se permite a intervenção desta Corte de Justiça, eis que para aferir se há exorbitância ou insignificância, em casos tais, haveria mero juízo de razoabilidade. Precedentes.

5. Na hipótese, além de os honorários não terem sido fixados em patamar excessivo ou irrisório, não foram abstraídos pela Corte de Origem os aspectos fáticos necessários para uma nova apreciação da verba honorária, motivo pela qual não cabe a pretendida revisão em sede de recurso especial. 6. Agravo interno não provido. (AgInt no AgInt no AREsp 1425331/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/11/2019, DJe 29/11/2019) (grifos nossos)

O afastamento da aplicação do art. 489, na maioria das vezes se dá de forma completamente genérica, veja-se o seguinte trecho do voto da Ministra Nancy Andrighi:

Da violação do art. 489, § 1º, IV, do CPC/15 - De outra parte, conforme consignado na decisão agravada, não há que se falar em ofensa ao art. 489, § 1º, IV, do CPC/15. Com efeito, a questão do dano moral foi devidamente fundamentada, de sorte que

restaram afastados os argumentos expostos pelo agravante mediante a análise das circunstâncias delineadas nos autos.337

Ou ainda:

Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e fundamentado corretamente o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há que se falar em violação do art. 489 do CPC/2015.338

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 489, § 1º, VI, E 1.022, II, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DO CPC/2015 NÃO CONFIGURADA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. INCIDÊNCIA DOS ADICIONAIS POR TEMPO DE SERVIÇO SOBRE OS VENCIMENTOS INTEGRAIS. DIREITO LOCAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 280/STF. 1. Não se configurou a ofensa aos arts. 489, § 1º, VI, e 1.022, II, parágrafo único, II, do CPC/2015, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada. 2. A solução da controvérsia envolve o exame do direito local, na medida em que seria necessária a análise da Constituição Estadual, prática vedada a esta Corte, na via especial, a teor da Súmula 280/STF. 3. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1324162/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/10/2019, DJe 30/10/2019) (grifos nossos)

Os termos mais utilizados são esses

Não ficou configurada a violação dos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015, uma vez que o Tribunal de origem se manifestou de forma fundamentada sobre todas as questões necessárias para o deslinde da controvérsia. O mero inconformismo da parte com o julgamento contrário à sua pretensão não caracteriza falta de prestação jurisdicional.339

As razões apresentadas nos julgados, em geral, seguem o padrão “a questão Q foi devidamente fundamentada”, “todos os argumentos foram analisados”, sem, repita-se, enfrentar o fundamento concreto objeto da irresignação.

Por outro lado, a doutrina refere que o sistema do livre convencimento teria sido retirado do CPC/2015, ao abolir a expressão “livremente” prevista no art. 131 do CPC/73. A valoração da prova pelo julgador não é mais considerada livre, havendo uma série de limitações, devendo o convencimento do juiz ser racionalmente motivado.

A exposição de motivos do CPC/2015 afirma:

Se, por um lado, o princípio do livre convencimento motivado é garantia de julgamentos independentes e justos, e neste sentido mereceu ser prestigiado pelo novo

337 AgInt no AREsp 1490812 / MS AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2019/0112959-9 EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL E REPARAÇÃO POR DANO MATERIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DO ART. 489, § 1º, IV, DO CPC/15. INOCORRÊNCIA. 1. Ação de compensação por dano moral e reparação por dano material. 2. Ausentes os vícios do art. 1.022 do CPC/15, rejeitam-se os embargos de declaração. 3. Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e fundamentado corretamente o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há que se falar em violação do art. 489, § 1º, IV, do CPC/15. 4. Agravo interno no agravo em recurso especial não provido. (AgInt no AREsp 1490812/MS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/10/2019, DJe 30/10/2019)

338 REsp 1703356 / MG RECURSO ESPECIAL 2017/0262768-1.

339 Cite-se, como exemplo, a utilização do excerto acima nos seguintes julgados: AgInt no AREsp 1473276 / DF AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2019/0081862-0;

Código, por outro, compreendido em seu mais estendido alcance, acaba por conduzir a distorções do princípio da legalidade e à própria idéia, antes mencionada, de Estado Democrático de Direito. A dispersão excessiva da jurisprudência produz intranqüilidade social e descrédito do Poder Judiciário.

Didier afirma que não é mais correta a referência ao “livre convencimento motivado” como princípio do processo civil brasileiro, não sendo mais dogmaticamente aceitável utilizar esse “jargão” para fundamentar as decisões judiciais.340

Porém, o STJ continua entendendo pela existência do livre convencimento. Em julgamento recente, realizado em 21 de novembro de 2019, o Ministro Mauro Campbell Marques, em seu voto vencedor, afirmou que

Ocorre que é firme o entendimento desta Corte de que cabe ao magistrado decidir a questão de acordo com o seu livre convencimento, não estando obrigado a rebater um a um os argumentos apresentados pela parte quando já encontrou fundamento suficiente para decidir a controvérsia.341

O entendimento de que o juiz aprecia as provas mediante seu livre convencimento encontra ampla aceitação no âmbito do STJ:

A jurisprudência desta Corte entende que, ‘no sistema da persuasão racional, adotado pela legislação processual civil (artigos 130 e 131, CPC/1973 e 371, CPC/2015), o magistrado é livre para examinar o conjunto fático-probatório produzido nos autos para formar sua convicção, desde que indique de forma fundamentada os elementos de seu convencimento’ (AgInt no AgRg no AREsp 717.723/SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 22/03/2018, DJe 02/04/2018)342

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015 (ART. 535 DO CPC/73). INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO. PRETENSÃO DE REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA DO STJ. I - Trata-se, na origem, de ação popular objetivando o reconhecimento e condenação de atos de improbidade administrativa praticados por deputado estadual. Na sentença, julgou-se parcialmente procedente o pedido para declarar nulos pagamentos feitos ao réu pela Assembleia Legislativa de Santa Catarina e condená-lo a devolver a importância recebida, devidamente atualizada, condenando- o, ainda, ao pagamento das verbas sucumbenciais. No Tribunal de origem, a sentença foi mantida. II - Alegou o recorrente, em seu recurso especial, ofensa aos arts. 131 e 333, I, do CPC/1973, arts. 370 e parágrafo único, e 373, I, 489, § 1°, II, III e IV, e 1.022, I e II, do CPC/2015, art. 3º da Lei n. 8.935/1994 e art. 214 do Código Civil. III 340 DIDIER JR, Fredie. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedente, coisa julgada e tutela provisória. 14.ª edição. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2019, vol. 2, p. 124.

341 AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.464.192 - SP (2019/0065308-1). EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO SUBMETIDO AO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. EMBARGOS À EXECUÇÃO. MULTA POR INFRAÇÃO AMBIENTAL. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS ARTS. 489, § 1º, E 1.022 DO CPC/2015. 1. Não há falar em aos arts. 11, 489, § 1º, e 1.022, do CPC/2015, tendo vista que a Corte de origem, ainda que de modo conciso, decidiu a controvérsia de modo integral e suficiente ao consignar no julgamento da apelação que a queima da palha da cana-de-açúcar não havia sido autorizada pelo órgão competente, conclusão essa reiterada no julgamento dos embargos de declaração, quando afirmado que todas as provas dos autos foram devidamente apreciadas. 2. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1464192/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/11/2019, DJe 27/11/2019)

- No que tange à violação do art. 131 do CPC/73 e dos arts. 489, § 1°, II, III e IV, 370, parágrafo único e 1.022, I e II, do CPC/2015, a sua irresignação não merece acolhida. O acórdão recorrido não se ressente de omissão ou contradição. O Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia de maneira completa e fundamentada, como lhe foi apresentada, não obstante tenha decidido contrariamente à pretensão do recorrente. É possível perceber que todos os argumentos e provas capazes de - em tese - influir na conclusão do julgador foram expressamente apreciados, na medida em que, embora de forma sucinta, a decisão apreendeu os elementos de fato deduzidos na petição de apelação, considerou as provas e as alegações de defesa e concluiu que efetivamente se achava configurado o ato ímprobo. IV - Com efeito, consignaram-se no acórdão recorrido os subsídios para reconhecer a simulação da negociação, dentre eles a contemporaneidade do contrato de locação com o período de início do ressarcimento, a posterior lavratura do contrato de compra e venda dos imóveis, revelando a cronologia dos fatos que os imóveis jamais deixaram a esfera jurídica do recorrente, aliado, ainda, à recente maioridade do comprador, o qual não possuía renda própria. (...) VI - Ressalte-se, ademais, que cabe ao julgador decidir a lide de acordo com o seu livre convencimento, utilizando-se dos fatos, provas, jurisprudência, aspectos pertinentes ao tema e da legislação que entender aplicável ao caso concreto. Nessa linha de raciocínio, dispõe o art. 371 do CPC: "O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento". VII - Assim, reexaminar os critérios de valoração das provas adotados pela instância de origem esbarra no óbice da Súmula n. 7 do Superior Tribunal de Justiça. Afinal de contas, não é função desta Corte atuar como uma terceira instância na análise dos fatos e das provas. Cabe a ela dar interpretação uniforme à legislação federal a partir do desenho de fato já traçado pela instância recorrida. VIII - Da mesma forma, implica revolvimento fático-probatório, hipótese inadmitida pelo referido verbete sumular, a apreciação de descumprimento do art. 131 do CPC/73, correspondente ao art. 370, caput e parágrafo único, do CPC/15, porquanto mencionado dispositivo legal consagra o princípio da persuasão racional, autorizando o juiz a valer-se do seu livre convencimento motivado, à luz das provas constantes dos autos. IX – (...) XII - Portanto, ilidida a presunção iuris tantum de veracidade e autenticidade do documento público pelas demais provas coligidas aos