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Da Proteção do Apátrida e da Redução da Apatridia

No documento Lei de Migração Comentada (páginas 112-118)

O inciso IV por sua vez é interpretado como a possibilidade de perda da autorização por exercício de atividade não autorizada pelo documento do fronteiriço, ou seja, quando ele extrapola os direitos que lhes são conferidos por sua documentação (atinentes às ativida-des que poderão ser exercidas e a localidade).

Seção II

Da Proteção do Apátrida e da Redução

Apátridas, de 1954, promulgada pelo Decreto nº 4.246, de 22 de maio de 2002, bem como outros direitos e garantias reconhecidos pelo Brasil.

§ 5º O processo de reconhecimento da condição de apátrida tem como objetivo verificar se o solicitante é considerado nacional pela legislação de algum Estado e poderá considerar informações, documentos e declarações prestadas pelo próprio solicitante e por órgãos e organismos nacionais e internacionais.

§ 6º Reconhecida a condição de apátrida, nos termos do inciso VI do § 1º do art. 1º, o solicitante será consultado sobre o desejo de adquirir a nacionalidade brasileira.

§ 7º Caso o apátrida opte pela naturalização, a decisão sobre o reconhecimento será encaminhada ao órgão competente do Po-der Executivo para publicação dos atos necessários à efetivação da naturalização no prazo de 30 (trinta) dias, observado o art. 65.

§ 8º O apátrida reconhecido que não opte pela naturalização ime-diata terá a autorização de residência outorgada em caráter defi-nitivo.

§ 9º Caberá recurso contra decisão negativa de reconhecimento da condição de apátrida.

§ 10. Subsistindo a denegação do reconhecimento da condição de apátrida, é vedada a devolução do indivíduo para país onde sua vida, integridade pessoal ou liberdade estejam em risco.

§ 11. Será reconhecido o direito de reunião familiar a partir do reconhecimento da condição de apátrida.

§ 12. Implica perda da proteção conferida por esta Lei:

I - a renúncia;

II - a prova da falsidade dos fundamentos invocados para o reco-nhecimento da condição de apátrida; ou

III - a existência de fatos que, se fossem conhecidos por ocasião do reconhecimento, teriam ensejado decisão negativa.

Dispositivo correspondente na Lei n. 6.815, de 19 de agosto de 1980, que define a situação jurídica do estrangeiro no Brasil (“Estatu-to do Estrangeiro”):

Art. 55. Poderá ser concedido passaporte para estrangeiro: (Re-numerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

I - no Brasil:

a) ao apátrida e ao de nacionalidade indefinida;

A Lei 13.445/2017 visou a compatibilizar a lei de migração brasileira com o Estatuto dos Apátridas e o Estatuto dos Refugiados.

Neste sentido, prevê um instituto protetivo especial do apátrida que lhe garante um processo simplificado para que obtenha a naturali-zação, reconhecendo, assim, a vulnerabilidade a que estão sujeitas as pessoas que não possuem uma nacionalidade e, assim, são privadas de uma comunidade nacional que lhes garanta o gozo de direitos:

A calamidade que se vem abatendo sobre um nú-mero cada vez maior de pessoas não é a perda de direitos específicos, mas a perda de uma comunida-de disposta e capaz comunida-de garantir quaisquer direitos.

O homem pode perder todos os chamados Direitos do Homem sem perder a sua qualidade essencial de homem, sua dignidade humana. Só a perda da pró-pria comunidade é que o expulsa da humanidade (ARENDT, 1989, p. 339).

O processo de reconhecimento da condição de apátrida é ini-ciado por meio da solicitação do interessado apresentada ao Ministé-rio da Justiça e Segurança Pública ou às unidades da Polícia Federal37. Esse processo tem como objetivo verificar se a pessoa não é nacional de algum outro Estado, com base em documentação apre-sentada pelo solicitante e informações prestados por órgãos inter-nacionais, e durante sua tramitação o solicitante tem acesso aos mecanismos protetivos e de facilitação da inclusão social relativos à Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas, de 1954; Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados; e Lei no 9.474, de 1997. Neste sentido, já decidiram os Tribunais que:

PROCESSO CIVIL. REMESSA OFICIAL. CARTEI-RA DE IDENTIDADE DE ESTCARTEI-RANGEIRO. SITU-AÇÃO DE APÁTRIDA RECONHECIDA. REMES-SA OFICIAL DESPROVIDA. 1. A autora entrou legalmente no Brasil em 1973, casou-se com brasilei-ro em 1972 e teve seis filhos. Nunca deixou o Brasil nestes 30 anos e não consta que tenha transgredido as leis penais e fiscais brasileiras. É viúva e possui bens a partilhar. Deseja apenas regulamentar sua situação.

Preenche requisitos até para se naturalizar, pois está no Brasil há mais de 15 anos, e não possui condena-ção criminal (art. 12, inc. II, alínea b da Constituicondena-ção Federal). 2. O Líbano se nega a fornecer o documento de nacionalidade. Não forneceu à época que imigrou para o Brasil, tendo que se utilizar de passaporte bra-sileiro, fornecido pela Embaixada. Também é difícil

37 Cf. art. 96, do Decreto 9.199, de 20 de novembro de 2017.

conseguir da Turquia a declaração de nacionalidade para ela identificar-se, a contento. A autora diz per-tencer a uma minoria étnica, que não são amparados pelas legislações destes países. 3. Devido o reconhe-cimento da autora como apátrida, pois nenhum país quer fornecer documento hábil para comprovar sua nacionalidade. 4. Remessa oficial desprovida. (TRF-3 - ReeNec: 0006595(TRF-38200040(TRF-36000 MS, Relator:

DESEMBARGADOR FEDERAL MAURICIO KATO, Data de Julgamento: 13/11/2017, QUIN-TA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/11/2017)

O mero protocolo de solicitação de reconhecimento de apa-tridia já garante uma série de direitos que permitem a inclusão social do solicitante até que tenha resposta à sua solicitação. O Decreto nº 9.199, de 21 de novembro de 2017, prevê em seu art. 96, §§4º e 5º, alguns desses direitos, essenciais à residência no país e ao exercício regular de atividade laboral:

§ 4o O solicitante de reconhecimento da condição de apátrida fará jus à autorização provisória de residên-cia, demonstrada por meio de protocolo, até a obten-ção de resposta ao seu pedido.

§ 5o O protocolo de que trata o § 4o permitirá o gozo de direitos no País, dentre os quais:

I - a expedição de carteira de trabalho provisória;

II - a inclusão no Cadastro de Pessoa Física; e III - a abertura de conta bancária em instituição fi-nanceira supervisionada pelo Banco Central do Brasil (BRASIL, 2017, n. p.).

Ao ser reconhecida a situação de apatridia, o apátrida caso não opte pela naturalização, obtendo, assim, a nacionalidade brasileira, terá autorização de residência concedida por prazo indeterminado.

A Portaria Interministerial nº 5, de 27 de fevereiro de 2018 é a norma que especifica os procedimentos a serem adotados em relação à tramitação dos requerimentos de reconhecimento da condição de apatridia e do procedimento facilitado de naturalização aos apátridas.

A Portaria delega ao Secretário Nacional de Justiça a decisão sobre o pedido de reconhecimento de apatridia, estabelece atribuições à Po-lícia Federal para o trâmite do requerimento e especifica a documen-tação que deve ser apresentada pelo solicitante.

Por fim, a Portaria Interministerial regulamenta o direito à reunião familiar a partir do reconhecimento da apatridia — previsto no §11 do art. 26, da Lei 13.445/2017, ora em comento — e fixa as condições para que seja concedida a naturalização àqueles que a re-quererem, vez que esta não ocorre de maneira automática conforme já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça:

18. É relevante ressaltar, ainda, que eventual expedi-ção de documentos pessoais por autoridade brasileira em favor da impetrante, após esgotado o prazo de validade do certificado provisório de naturalização, não tem o condão de firmar o caráter definitivo da nacionalidade brasileira. Conforme já mencionado, o art. 12, II, a da Constituição Federal reservou à lei ordinária o regramento para a aquisição da naciona-lidade brasileira, que, por sua vez, exige, para conso-lidação da naturalização, a manifestação expressa do interessado dentro do prazo. Inexiste, portanto, pre-visão legal para aquisição da nacionalidade de forma tácita, sem a expressa manifestação de vontade (STJ - MS: 23925 DF 2017/0318532-9, Relator: Minis-tro FRANCISCO FALCÃO, Data de Publicação: DJ 13/04/2018).

Além da naturalização facilitada, os solicitantes do reconhe-cimento da condição de apátridas têm os mesmos direitos e a mes-ma assistência básica a que faz jus qualquer outro estrangeiro que

resida regularmente facilitada, assim, esta proteção aos apátridas e a naturalização facilitada cumprem com o compromisso assumido pelo Brasil de prevenir e erradicar a apatridia, assumido pelo país por meio da Convenção da ONU sobre o Estatuto dos Apátridas (de 1954) e a Convenção da ONU para a Redução dos Casos de Apatridia (de 1961). Neste sentido registre-se que o dispositivo em comento da novel lei, embora recente, já serviu como instrumento para que fosse reconhecida administrativamente, pela primeira vez na história, pelo governo brasileiro a condição de apátridas de duas pessoas, o que ocorreu em 25 de junho de 2018 (AGÊNCIA BRASIL, 2018).

Seção III

No documento Lei de Migração Comentada (páginas 112-118)