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Dados e indicadores das desigualdades raciais

No documento Diamantina 2022 (páginas 37-43)

Para contextualizar e exemplificar as desigualdades e as consequências das iniquidades sociais vividas pela população negra serão apresentados alguns dados que demonstram os indicadores da saúde dessa população.

Frequentemente o Ministério da Saúde (MS) desenvolve pesquisas junto a outros órgãos consolidados que analisam a realidade, registram e obtêm resultados e dados que revelam o quanto os resultados apontam a vulnerabilidade e a atenção que precisa ser realizada diante da população negra, como mostrado a seguir.

Um estudo desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (IPEA) em 2003, sobre a saúde no Brasil aponta que, nos atendimentos e internações no SUS, quando analisados os dados desagregados os itens de raça/cor, a proporção para negros foi 76% e 81%, revelando que a população negra é SUS-dependente. (BRASIL, 2008, p.6)

No Brasil, a probabilidade de um recém-nascido de baixo peso ou prematuro é maior entre mães pretas ou pardas, quando comparadas com as mães brancas, mesmo após anular o efeito de renda ou escolaridade.

Estudos e pesquisas realizados sobre as formas de nascimento ocorridos no Rio de Janeiro em 2017, que analisam a qualidade da assistência pré-natal e ao parto, mostrando que a proporção de mulheres sem assistência pré-natal foi significativamente mais alta em mulheres pardas (4,7%), e pretas (6,7%), quando comparadas às gestantes brancas. (2,5%).

(LEAL et al., 2017)

Nessa mesma pesquisa, encontraram diferenças significativas na probabilidade de receber anestesia durante o parto, para as gestantes brancas o resultado foi de (86,5%), enquanto que as negras foram de (78,2%). Esse estudo revela ainda que, foi menor a proporção de mulheres brancas (18,5%), tiveram que procurar mais de uma maternidade para ser atendida, quando comparadas às mulheres pardas o resultado mostra que (28,8%) para as pardas e (31,8%) para as mulheres brancas.

Pesquisas desenvolvidas sobre as temáticas das desigualdades sociais, sobre os impactos destas desigualdades na saúde da população negra até hoje comprovam que no Brasil existe um diferencial assustador nas condições de viver, adoecer e morrer, dependendo da raça/cor da população. Segundo López (2012), a pobreza no Brasil tem cor e atinge de forma visível e concreta a saúde da população afro-brasileira, existem experiências desiguais ao nascer, viver e morrer entre o negro e o branco no nosso país. A autora ilustra por meio dos dados da pesquisa nacional sobre a Discriminação Racial e Preconceitos de cor no Brasil (2003), que 3% da população brasileira já se percebeu discriminada nos serviços de saúde.

Entre as pessoas negras que se declararam, 68% informaram que sofreram discriminação em hospitais, 26% nos postos de saúde e 6% em outros serviços não especificados.

Outro estudo desenvolvido sobre a saúde da população negra verificou que 62%

das mães de nascidos vivos brancos tiveram sete ou mais consultas pré-natal, enquanto que as mães de nascidos vivos pardos tiveram 37%. Outro dado importante é que o risco de uma criança preta ou parda morrer antes de completar 5 anos por causas de doenças infecciosas ou parasitárias é 60% maior do que de uma criança branca. O risco de morte por fatores

associados à desnutrição apresenta índices alarmantes, sendo 90% maior entre crianças pretas e pardas comparadas às crianças brancas.

Dados de um estudo realizado nas maternidades do Rio de Janeiro e da Bahia revelaram que as mulheres negras grávidas, não conseguiram atendimento no primeiro estabelecimento procurado e, com isso, tinham que peregrinar mais para conseguir realizar o parto. Nessa mesma pesquisa revela que no parto vaginal, as mulheres negras recebem menos anestesia comparado com as mulheres brancas. (LEAL; GAMA; CUNHA, 2005)

Ainda nesse contexto, a Pesquisa Nacional de Demografia em Saúde revelou que existe desigualdade no acesso ao cuidado Pré-natal para as mulheres brasileiras, sendo que as gestantes negras fizeram menos consultas pré-natal do que as brancas. Em relação ao exame de colo de útero, encontrou-se também maior proporção de mulheres negras que nunca realizaram o exame. Além disso, outro estudo mostrou que a prevalência e a reincidência de miomas uterinos e a realização de histerectomia é maior entre as mulheres negras.

(DOMINGUES et al, 2015, p.286.).

Um dado importante sobre a mortalidade é registrada pelo Atlas da violência 2021 por meio do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) contaram com a parceria do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN). Como realizado nas últimas edições, buscou-se retratar a violência no Brasil principalmente a partir dos dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) do Ministério da Saúde.

Dados do Relatório do Atlas da violência realizado no ano de 2019 revelam que 66% das mulheres assassinadas no Brasil eram negras. Em termos relativos, enquanto a taxa de homicídios de mulheres não negras foi de 2,5, a mesma taxa para as mulheres negras foi de 4,1. Isso quer dizer que o risco relativo de uma mulher negra ser vítima de homicídio é 1,7 vezes maior do que o de uma mulher não negra, ou seja, para cada mulher não negra morta, morrem 1,7 mulheres negras. Essa tendência vem sendo verificada há vários anos, mas o que a análise dos últimos onze anos indica é que a redução da violência letal não se traduziu na redução da desigualdade racial.

Os números deste Atlas, mais uma vez, comprovam essa realidade. Em 2019, os negros (soma dos pretos e pardos da classificação do IBGE) representaram 77% das vítimas de homicídios, com uma taxa de homicídios por 100 mil habitantes de 29,2.

Comparativamente, entre os não negros (soma dos amarelos, brancos e indígenas) a taxa foi de 11,2 para cada 100 mil, o que significa que a chance de um negro ser assassinado é 2,6 vezes superior àquela de uma pessoa não negra. Em outras palavras, no último ano, a taxa de

violência letal contra pessoas negras foi 162% maior que entre não negras. Da mesma forma, as mulheres negras representaram 66,0% do total de mulheres assassinadas no Brasil, com uma taxa de mortalidade por 100 mil habitantes de 4,1, em comparação a taxa de 2,5 para mulheres não negras. (BRASIL, 2021)

A evolução da taxa de homicídios femininos por raça/cor da pele mostra que, em 2009, a taxa de mortalidade entre mulheres negras era de 4,9 por 100 mil, ao passo que entre não negras a taxa era de 3,3 por 100 mil. Pouco mais de uma década depois, em 2019, a taxa de mortalidade de mulheres negras caiu para 4,1 por 100 mil, redução de 15,7%, e entre não negras para 2,5 por 100 mil, redução de 24,5%. Ao considerar a diferença entre as duas taxas, verificou-se que, em 2009, a taxa de mortalidade de mulheres negras era 48,5% superior a de mulheres não negras, e onze anos depois a taxa de mortalidade de mulheres negras é 65,8%

superior a de não negras. (PAIXÃO; CARVANO, 2008)

Prevalecem ainda diferenças de raça e cor e etnia, quando analisados na questão da proporção. Ou seja, essas questões de diferenças prevalecem mesmo quando a análise é realizada na proporção do número de óbitos por causas externas (BRASIL, 2006).

O Atlas Racial Brasileiro registra que a população negra tem maior dificuldade de acesso aos serviços de saúde. O maior percentual de pessoas que conseguiu atendimento é de (83,7%) para os declarados brancos e (69,7%) entre negros. Em relação ao atendimento ambulatorial, homens brancos atendidos são de (82%) e apenas 66% de homens negros atendidos. Em relação às mulheres 85% de mulheres brancas e 72% de mulheres negras atendidas. (PNUD, 2004).

Dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade, do Ministério da Saúde (SIM/MS), apresentados no ano de 2017, demonstram que ocorreram 65.602 homicídios no Brasil, o que equivale a uma taxa de aproximadamente 31,6 mortes para cada cem mil habitantes. Trata-se do maior nível histórico de letalidade violenta intencional no país.

Há desigualdade racial a partir da comparação entre mulheres negras e não negras vítimas de homicídio. Enquanto a taxa de homicídios de mulheres não negras teve crescimento de 4,5% entre 2007 e 2017, a taxa de homicídios de mulheres negras cresceu 29,9%. Em números absolutos a diferença é ainda mais brutal, já que entre não negras o crescimento é de 1,7% e entre mulheres negras é de 60,5%. Considerando apenas o último ano disponível, a taxa de homicídios de mulheres não negras foi de 3,2 a cada 100 mil mulheres não negras, ao passo que entre as mulheres negras a taxa foi de 5,6 para cada 100 mil mulheres neste grupo. (BRASIL, 2019)

O Conselho Nacional de Saúde tem ampliado a participação das mulheres negras nas políticas e firmado compromissos nas lutas contra o racismo. Relatando a centralidade histórica e política de luta das mulheres negras na saúde pública e coletiva, as contribuições das mulheres para a formulação e aprovação na PNSIPN, por meio dos seus representantes impulsionaram o debate sobre raça, racismo e saúde da população negra no Conselho de Saúde.

Vários resultados de pesquisas demonstram que o racismo impacta nos processos de formação da identidade e nas subjetividades da população negra. Gerando, assim, sentimentos de inferioridade, inadequação, incapacidade, baixa estima etc. Essas ações manifestam-se pelo exercício de suas capacidades mentais, pelo bem-estar subjetivo e pela qualidade das relações.

Outro ponto de desafio urgente está relacionado à questão da Saúde Mental.

Dados apontam que no Brasil, o suicídio é a terceira principal causa externa de mortes. Uma pesquisa desenvolvida pelo Ministério da Saúde em 2018 revelou que jovens negros do sexo masculino com idades entre 10 a 29 anos, são os que têm o maior risco de morrer por suicídio.

A probabilidade é 45% maior do que entre jovens brancos na mesma faixa etária. Esse risco está diretamente relacionado ao sofrimento psíquico provocado pelo racismo estrutural.

Segundo a OMS, o Brasil é o país com maior prevalência de Ansiedade no mundo e o segundo país nas Américas quando o tema abordado é a Depressão. O racismo e a discriminação sejam elas sutis ou explícitos, produzem estresses e traumas. O que pode desencadear em transtornos psicológicos. Daí a necessidade de se discutir os efeitos do racismo na saúde mental da população negra.

Dados do Ministério da saúde mostram que é maior o número de suicídios entre adolescentes negros e é maior, também, o consumo abusivo de álcool entre pessoas negras. As pesquisas em saúde pública passaram a avaliar tratamentos discriminatórios atribuídos a estados de saúde da mente, como a esquizofrenia e a orientação sexual, especialmente a homossexualidade (BASTOS et al., 2012, p. 28).

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) evidenciou no último Censo realizado em 2010 que mais da metade (50,7%) da população brasileira se autodeclara preta ou parda. Apesar de ser a maioria da população, os negros e pardos no Brasil não possuem a mesma igualdade nas condições e acessos aos serviços públicos e aos espaços institucionais. Estudos revelam índices alarmantes de desigualdade no Brasil. (IBGE, 2010)

Os pesquisadores Batista, Escuder e Pereira (2004), do Instituto de Saúde, elaboraram uma pesquisa em 2004 com o objetivo de mostrar diferenças no perfil da

mortalidade entre brancos, pretos e pardos. Os resultados de pesquisa na área da saúde revelaram disparidades de acesso à saúde de brancos e negros no Brasil. Foram comprovadas as diferenças no modo de nascer, de viver, no adoecimento e nas causas de morte entre brancos e negros. Enquanto que a morte do branco é analisada sob a perspectiva de fatores naturais, já a morte do negro tem suas causas como sendo mal definidas e ligadas, principalmente, a fatores externos, como problemas relacionados à saúde mental, violências, complicações no parto ou desnutrição infantil. Esses índices são revelados pelas publicações e relatórios dos órgãos: Atlas da Violência e o Mapa da Violência que, em seus dados anuais, comprovam que os jovens negros no Brasil, com idade entre 15 e 29 anos morrem 23% a mais em relação aos jovens brancos.

Estudos do Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (IPEA) revelam que a cada 100 pessoas mortas no Brasil atualmente, 70% são de pretos e pardos. Este mesmo órgão mostra que estes índices afetam, principalmente, as mulheres negras, pois dentre 100 vítimas de feminicídio no Brasil 65% são de mulheres negras. (BRASIL, 2019)

Um estudo da Secretaria de Ações Afirmativas aponta que a população negra tem desvantagem em praticamente todos os indicadores de saúde. Apresentando que 41,5% das mulheres negras com mais de 40 anos nunca fizeram o exame de mamografia, contra 26,7%

das mulheres brancas com a mesma idade. E essa desigualdade se estende a outros exames.

Além disso, atualmente estudos científicos consolidados comprovam que algumas doenças são consideradas mais recorrentes na população negra, essas doenças prevalentes são condicionadas a fatores genéticos que atuam em conjunto com outros fatores ambientais e que impactam direta e indiretamente nas condições de saúde e mortalidade da população negra.

Algumas dessas doenças são: anemia falciforme, hipertensão arterial, diabetes mellitus.

Segundo dados da extinta Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial da Presidente da República (SEPPIR), 70% dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), são negros, o que comprovam a necessidade da formação destes profissionais para lidar com essa população que de fato são dependentes do SUS. (MENEZES, 2020)

Borret et al. (2020) analisa que por meio do silenciamento ou do não reconhecimento das influências do racismo tanto no processo de saúde e no adoecimento da população negra como forma de oferta de cuidado em saúde a esta população, a hierarquização racial é mantida e reproduzida.

Já os autores Maio e Monteiro (2005) apontam que a formação do campo da saúde da população negra ocorre no momento em que o debate sobre o racismo e a formulação de programas de ações afirmativas assume visibilidade no cenário brasileiro. Os autores

descrevem que a política apresenta dados que evidenciam que homens e mulheres negras morrem precocemente, por causas evitáveis, e que as taxas de mortalidade são mais altas quando comparadas aos brancos, em razão das desvantagens psicológicas, sociais, econômicas geradas pelo racismo a que são expostos.

No documento Diamantina 2022 (páginas 37-43)