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Antes que se inicie uma análise mais acurada do dano ambiental e seus consectários é preciso recordar que o objetivo fundamental desta tese é o de examinar

170 BENJAMIN, Antônio Herman. A função ambiental. In BENJAMIN, Antônio Herman (Org.). Dano Ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: RT, 1993, p.74.

171 REZEK, José Francisco. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 224.

172 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 91.

uma das modernas alternativas de reparação dos prejuízos ambientais, o seguro ambiental, em uma perspectiva obrigatória.

Com o mesmo propósito pretende-se analisar a responsabilidade civil, partindo-se como já dito, da hipótepartindo-se de que a forma tradicional de responsabilização não tem respondido a contento quando se trata de danos ambientais de grande porte, característicos do cenário atual.

Dentre as várias razões para tanto, pode-se destacar dois motivos: (i)os processos judiciais são dotados de vocação para a morosidade e discussões intermináveis; (ii) é um mecanismo puramente repressivo, que é incapaz de realizar a medida de proteção mais fundamental: a prevenção. 173

Para além dessa constatação, a compreensão do dano ambiental é permeada de grandes dificuldades. De acordo com tudo quanto já foi posto, constata-se que a legislação pátria, incluindo nesse rol a Constituição Federal vigente, não elaborou uma definição técnica-jurídica para meio ambiente, optando por uma abordagem aberta, a ser integrada em cada caso concreto174. Como era de se supor, a indefinição do legislador importou em obstáculos semelhantes na positivação de um significado para dano ambiental, que a legislação brasileira não conceituou expressamente.175

Em contrapartida não são poucos os conceitos que podem ser identificados na literatura jurídica, mas se deve ter em mente que, da mesma forma que o dano evoluiu ao longo da civilização, sua compreensão não pode ser estática, mas, ao revés, objeto

173 ANTUNES, Paulo de Bessa. Dano ambiental. Uma abordagem conceitual. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2015, p.163.

174 Neste sentido, acerca do engessamento legislativo de determinados conceitos, CATALÁS, Lucía Gomis. Responsabilidad por daños al médio ambiente. Elcano(Navarro): Arazandi, 1998, p. 63, analisa que uma previsão normativa expressa acerca do conceito de dano ambiental, além de correr o risco de delimitar o âmbito de incidência do direito, quando demasiadamente restritiva, também poderia ocasionar uma carga excessiva para o desenvolvimento socioeconômico, no caso de uma definição demasiadamente ampla.

175 FUENZALIDA, Rafael Valenzuela. Responsabilidad civil por daño ambiental em lá legislacion chilena. Revista de direito ambiental. Vol. 20. São Paulo: RT, 2000, p. 20-36. O autor elenca algumas definições de dano ambiental em países da América Latina, em diversos diplomas legislativos. O Decreto-Lei chileno n. 3.557/81 define dano ambiental como “toda pérdida, disminución, detrimento o menoscabo significativo inferido al médio ambiente ou a uno o más de sus componentes”. Na Argentina a Lei n. 25.675/02 considera dano ambiental “toda alteración relevante que modifique negativamente el ambiente, sus recursos, el equilíbrio de los ecossistemas, o los bienes os valores colectivos”. Na Itália o Código Ambiental em vigor define dano ambiental nos seguintes termos: “è danno ambientale qualsiasi deterioramento significativo e misurabile, direto o indireto, di uma risorsa naturale o dell’utilitá assicurata da quest’última”.

de constante reflexão, de forma a acompanhar a evolução do fato social. A magnitude com que o homem passou a intervir no equilíbrio dos ecossistemas engendrou novas formas de percepção do dano e, portanto, a necessidade de se conceber novos arranjos de controle e combate às formas cada vez mais sofisticadas de degradação da natureza.

Partindo-se dessa perspectiva atual, Milaré176 conceitua dano nos seguintes termos:

É dano ambiental toda interferência antrópica infligida ao patrimônio ambiental (natural, cultural, artificial), capaz de desencadear, imediata ou potencialmente, perturbações desfavoráveis (se) ao equilíbrio ecológico, à sadia qualidade de vida, ou a quaisquer outros valores da coletividade ou de pessoas determinadas.

Depreende-se desse conceito uma concepção alargada do que vem a ser patrimônio ambiental. É prudente que assim se faça, pois, torna-se, inconcebível no ideário corrente que se adote uma perspectiva reducionista, quando se sabe que, as políticas e legislações acerca da matéria precisam tutelar bem mais que os ecossistemas naturais. Nesse mesmo viés os danos ambientais devem compor uma categoria mais ampla, a qual compreende a lesão dos bens ecológicos que compõem o patrimônio natural, mas, além desses, de outros bens ambientais juridicamente protegidos, a exemplo da paisagem artificial, que atualmente dá os contornos da existência humana.

É essa existência humana, permeada de intensa atividade produtiva, que acarreta por si só, impactos ambientais negativos e de uma forma ou de outra, riscos, conhecidos ou não. No caso da intervenção do ser humano no ambiente, o risco de se provocar danos, reparáveis ou não, sugere uma atenção especial dos juristas, dos políticos e dos legisladores.177

De fato, é o que vem acontecendo. Os custos ambientais das variadas atividades humanas continuam crescendo e o Direito vem ampliando, sem cessar, seu interesse pelo tema. A devastação continua e hoje as ameaças são maiores que ontem. Paralelamente, as formas de evitar que tais ameaças se concretizem, ou

176 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 11. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 323.

177 ALEMAR, Aguinaldo. Dano ao ambiente e responsabilização no século XXI. Revista do Centro de Estudos de Direito do Ordenamento, do Urbanismo e do Ambiente, n°27, ano XIV, 1.11, p. 4. Disponível em: impactum.uc.pt.digitalis.uc.pt.

mesmo, uma vez acontecidas, minimizá-las, necessitam crescer na mesma proporção.

Averiguar todo esse processo evolutivo de causas e efeitos demanda um cotejo analítico do dano ambiental, bem como das alternativas previstas no ordenamento jurídico brasileiro. Acredita-se que novos problemas exigem novas soluções. Nesse viés, deve-se pensar o seguro ambiental não mais como uma simples possibilidade facultada aos empreendedores em geral, porém, como obrigação que se impõe a tantos quantos desenvolvam atividades que possam causar prejuízos ambientais consideráveis.

Nesse ponto, a questão que envolve o dano ambiental e sua crescente sofisticação tem como pano de fundo o debate que se trava acerca da conduta humana no que diz respeito às suas necessidades e, até onde deve o homem seguir para obter sua satisfação. Trata-se de analisar a forma como o ser humano se relaciona com o seu habitat, a lógica que rege a apropriação dos recursos naturais e, principalmente, a forma de atuação do Estado em suas diferentes ideologias.

A capacidade tecnológica de apropriação desses recursos, cada vez mais desenvolvida pelo ser humano, está umbilicalmente ligada à capacidade de o planeta absorver as consequências danosas desta intervenção, sendo que a ideia de dano decorre exatamente da comprovada impossibilidade de autorregeneração da natureza.

Além disso, pontue-se que o âmbito do dano ambiental está, logicamente, circunscrito e determinado pelo significado que se outorgue ao meio ambiente. Por outro lado, o dano ambiental constitui uma expressão ambivalente178, que designa, certas vezes, alterações nocivas ao meio ambiente e outras, ainda, os efeitos que tal alteração provoca na saúde das pessoas e em seus interesses.179

178 SANCHEZ, Antonio Cabanillas. La reparacion de los daños al medio ambiente. Pamplona: Aranzadi, 1996, p.142.

179 ALSINA, Jorge Bustamante. Derecho ambiental: fundamentacion y normativa. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1995, p. 45, ratifica essa mesma percepção da ambivalência dos danos esclarecendo que a expressão dano ambiental designa não somente o dano que recai em um patrimônio ambiental coletivo, mas se refere também ao dano que o meio ambiente ocasiona por rebote (ricochete) aos interesses legítimos de uma pessoa determinada, configurando um dano particular.