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O dano é, atualmente, o elemento central da responsabilidade civil. Há muito se fala de responsabilidade sem culpa; já se defende a responsabilidade sem nexo causal (teoria do risco integral); até responsabilidade sem conduta específica se defende (teoria do risco social). No entanto ninguém ainda ousou defender a responsabilidade sem dano, uma vez que tal elemento participa, inclusive, do próprio conceito de responsabilidade civil. Não havendo dano, não há o que reparar, de modo que a responsabilidade sem dano implicaria em enriquecimento sem causa, vedado por princípio geral em nosso ordenamento.

Trabalha-se, isso sim, com a amplitude do conceito de dano, atualmente havendo quem pregue, para além dos clássicos danos material e moral, o dano à imagem e o dano estético. Na jurisprudência italiana, colhem-se exemplos de “dano à vida de relação”, “dano pela perda de concorrencialidade”, “dano por redução de capacidade laboral genérica”, “dano sexual”, “dano hedonístico” e “dano existencial de emissão de ruído”; a jurisprudência comunitária europeia já reconheceu “dano de férias arruinadas”; na Europa já se fala de “dano de mobbing”, “dano de mass media”, “dano de processo lento”, “dano de brincadeiras cruéis (bullying)”, gerando o temor de que a criatividade do intérprete e a flexibilidade da jurisprudência possam ir muito longe98.

Entretanto não é qualquer dano que será indenizável. Nem todas as pessoas que causam prejuízos a outrem estão obrigadas a indenizá-lo, nem tampouco todo dano deve ser ressarcido. Os danos são aspectos inerentes da vida em sociedade. É preciso, pois, ao lado de saber em que circunstâncias nasce a obrigação de reparar o dano causado, quais são os prejuízos indenizáveis99.

Ante a erosão do poder filtrante da culpa e do nexo causal, visto nas seções anteriores deste trabalho, resta o dano como último filtro à expansão ilimitada da responsabilidade – o que comprometeria sua dignidade como instituto jurídico tendente ao reequilíbrio patrimonial.

98 Para maiores referências a essas novas espécies de dano, que não constituem objeto do presente trabalho, v.

SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2011. p.91-95.

99

GOMES, Orlando. Responsabilidade civil. Texto revisado, atualizado e ampliado por Edvaldo Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 83.

Com isso, o dano passa a funcionar como uma cláusula geral, que permite averiguar, em cada caso concreto, “se o interesse alegadamente violado consiste, à luz do ordenamento jurídico vigente, em um interesse digno de proteção, não apenas em abstrato, mas, também e sobretudo, face ao interesse que se lhe contrapõe100”.

Portanto é necessário que tal elemento possua algumas características para ensejar a responsabilização estatal. Nesse sentido, tradicionalmente, o que se deve investigar por primeiro é se o dano constitui-se em uma efetiva violação a direito ou interesse juridicamente tutelado. Não é qualquer prejuízo que basta para acionar o cânone fundamental da responsabilidade101, é imperioso tratar-se da configuração de um dano jurídico: não é suficiente que haja uma mera repercussão econômica negativa, tal prejuízo deve corresponder a uma lesão a um direito102. Em outras palavras, há que se averiguar se “o interesse dito lesado corresponde a um interesse merecedor de tutela em abstrato, ou seja, se vem protegido por alguma norma do ordenamento jurídico103”.

Ademais, como decorrência do que se acabou de afirmar, deve ainda o dano ser qualificado como certo, isto é, efetivo, e não meramente eventual ou possível, a ser razoavelmente quantificado. O dano certo abrange tanto o dano emergente quanto o lucro cessante, além da perda de uma chance. Ressalta-se que o dano certo não precisa ser atual, podendo ser futuro, desde que seja consequência necessária, inevitável e previsível da conduta104, numa avaliação também permeada pela razoabilidade. Nesse sentido, cabe observar que o art. 402 do CC/02 foi claro ao prever que “salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar105”. O que efetivamente se perdeu corresponde aos danos emergentes: por já acontecidos, sua quantificação deve ser realizada, para fins de liquidação do dano. A seu turno, aquilo que se deixou de ganhar não implica em uma análise

100 SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à

diluição dos danos. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 140.

101 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Responsabilidade extracontratual do Estado por comportamentos

administrativos. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 70, n. 552, p. 11-20, out. 1981. p. 12.

102 Exemplos de danos evidentemente econômicos, mas não jurídicos, podem ser identificado com a

transferência da sede das Varas do Trabalho de Salvador, do bairro de Nazaré para o bairro do Comércio, ocorrida em outubro de 2005. Tal transferência significou a redução ou até o encerramento das atividades de diversas empresas que se instalaram na região, por conta do fluxo de pessoas que o órgão federal atraía, como restaurantes, estacionamentos, papelarias, mercados, dentre outros. É certo que todos eles sofreram prejuízos de ordem econômica, mas, como nenhum deles era titular de um direito à não mudança do Fórum, não lhes assistiu, juridicamente, nenhuma indenização.

103

SCHREIBER, op. cit., p. 162.

104 SERRANO JÚNIOR, Odoné. Responsabilidade civil do Estado por atos judiciais. Curitiba: Juruá, 1996. p.

26.

105 BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Subchefia para Assuntos

Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República: Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 05 maio 2012.

fantasiosa na qual se incluiriam todos os possíveis ganhos que a vítima teria caso todas as circunstâncias lhe fossem favoráveis, mas numa avaliação razoável dos ganhos prováveis106.

Tal aferição é o pressuposto básico para a reparabilidade do dano. Como dito, se o ordenamento jurídico não proteger o interesse que se diz violado, ou se não houver certeza (ou, pelo menos, séria probabilidade) de que tal interesse tenha sido violado, não há que se falar em obrigação de indenizar, sob pena de enriquecimento sem causa. Do contrário, caso o interesse lesado seja tutelado pelo direito, poderá haver lugar para a imposição da obrigação de indenizar.

Caso a conduta ensejadora do dano seja ilícita, esses dois adjetivos (jurídico e certo) serão suficientes e bastantes para configurá-lo como indenizável. Neste ponto, relembra-se que, por dicção constitucional, tal responsabilidade é qualificada como objetiva, tornando irrelevante qualquer controvérsia acerca da existência de culpa: no particular, a responsabilidade civil do Estado se satisfaz com a ilicitude objetiva (antijuridicidade).

Tal ponto é de importante destaque, pois, como acima se expôs107, o elemento subjetivo (culpa) é essencial para a qualificação de um ato como ilícito stricto sensu. Mas, como também já afirmado108, a teoria que inspira a responsabilidade civil do Estado é a do risco, uma vez que sua atividade normalmente desenvolvida implica, por sua natureza, risco para os direitos dos cidadãos.

Certo é que o Estado, por ser um ente de existência ideal, é desprovido de vontade autônoma. Contudo, ao revés das pessoas jurídicas de direito privado, não se pode considerar que a vontade da pessoa jurídica é, simplesmente, aquela emitida pelos seus legítimos representantes, uma vez que o direito público é orientado, essencialmente, pelo princípio da legalidade. Desse modo, a “vontade” do Estado é aquela objetivamente prevista na Constituição e nas leis com ela compatíveis. Se algum de seus agentes operar contra essa “vontade”, poderá ocorrer em culpa, mas tal fato somente será relevante para assegurar o direito de regresso do Estado, eventualmente condenado, em face do seu agente culpado.

Com isso, vê-se que, nos atos ilícitos praticados pelo Estado, não se impede a existência da culpa, por conta de sua responsabilização objetiva constitucionalmente determinada: ela continuará a existir, podendo, se for o caso, qualificar o ato como ilícito em sentido estrito; mas sua relevância será deslocada para uma segunda fase de apuração, a saber,

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Os princípios da prevenção e precaução trazem enorme complexidade a essa aferição. As ideias referentes à certeza e atualidade do dano devem ser analisadas à luz do contexto das sociedades do risco, no bojo das quais os danos são avaliados segundo uma perspectiva de probabilidades a partir de interpretações, como será adiante exposto, na seção 6.4.3.

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V. seção 4.

o eventual exercício do direito de regresso contra o agente que houver laborado culposamente. Se não se lograr identificar um servidor que tenha laborado com dolo ou culpa, o Estado assumirá a obrigação de indenizar, por expressa determinação da Carta Maior.

Todavia, em cada vez mais numerosas situações, o ordenamento jurídico determina a obrigação de indenizar danos causados, não obstante a licitude da ação ou da atividade, a fim de evitar que a vítima fique irressarcida. Isso porque o individualismo que representou o norte teórico do liberalismo cedeu espaço a uma visão mais solidarista do direito e das próprias relações intersubjetivas109. Nesse caso enquadram-se, por exemplo, as diversas hipóteses de responsabilidade objetiva, hoje reguladas tanto através de cláusula geral110, quanto mediante dispositivos específicos, consubstanciando-se, pois, em figuras de danos ressarcíveis independentemente da prática de qualquer ilícito111.

Tais fundamentos também se aplicam à responsabilidade civil do Estado, à vista da também cláusula geral do art. 37, § 6º, da CF/88, cuja dicção ampla abrange a responsabilidade tanto por atos lícitos, quanto por ilícitos. Mas, no que se refere aos danos causados por atos lícitos, os qualificativos “jurídico” e “certo” não serão suficientes, uma vez que seus fundamentos residem na ilicitude latu sensu da conduta. No conflito entre um interesse lesado, tutelado pelo direito, e um interesse na prática do ato lesivo que não possui a mesma proteção, o primeiro gozará ab inicio de primazia.

Situação diversa ocorre quando o dano é causado por atos lícitos. No caso, haverá, in

concreto, a colisão de dois interesses legítimos, ambos protegidos pelo direito: o interesse em

praticar a conduta causadora do dano e o interesse em não ser lesado em seu patrimônio (material ou moral). Assim, não havendo uma relação de prevalência a priori, será necessário buscar outros critérios para identificar, no caso, qual o interesse a prevalecer: se o interesse lesado, caberá indenização; se o interesse na prática do ato lesivo, não se falará em obrigação de indenizar.

Nesse caso, deve-se observar se o dano pode ser qualificado como específico, assim entendido como aquele que onera especificamente a situação particular de um ou mais

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PEDRO, Fábio Anderson de Freitas. A socialização da responsabilidade civil: a evolução do subjetivo-liberal ao objetivo-social. Revista da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, vol. 18, n. 32, p. 65-77, dez. 2011. p. 65.

110 V. o já citado art. 927, parágrafo único, do Código Civil (BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República: Brasília,

2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 05 maio 2012).

111 MORAES, Maria Celina Bodin de. A constitucionalização do Direito Civil e seus efeitos sobre a

responsabilidade civil. Direito, Estado e Sociedade, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 29, p. 233-258, jun./dez. 2006. p. 240.

indivíduos determinados112. Como dito alhures, a atividade estatal somente é legítima se visa a consecução do interesse público, ou seja, o atendimento das necessidades públicas tidas por prioritárias, com o que se beneficia toda a coletividade. Dessa forma, se algum ou alguns membros da sociedade sofrem um gravame específico, que não se comunica aos demais membros da sociedade, merecerão ver-se indenizados dos prejuízos113, em face da já citada teoria da repartição dos ônus e dos encargos sociais114.

Caso contrário, se o dano afetar indistintamente toda a coletividade, os ônus já estarão repartidos, respeitado, pois, o princípio da isonomia que lhe serve de base. Desse modo, não se falará em indenização – todos já estarão contribuindo com uma cota de sacrifício para o bem de todos. Não havendo ilícito a ser reparado, a atividade do Estado é juridicamente perfeita, representando forma regular de restrição administrativa ao direito do particular. Não poderá, destarte, se equiparar a causa determinante da indenização àquela que legitima a reparação do dano resultante do emprego anômalo, deficiente ou abusivo dos poderes da Administração115.

Ademais, para viabilizar o direito à indenização por ato estatal lícito, o dano deve ser qualificado como anormal, assim entendido como aquele que supera os meros agravos patrimoniais pequenos e inerentes às condições de convívio social116. Simples atividades cotidianas, derivadas da normal ação humana, com frequência causam prejuízos a terceiros. Tais comportamentos, ainda que causadores de danos, são autorizados pelo ordenamento jurídico, uma vez que aí se encontram as situações em que o interesse na prática do ato lesivo é valorado superiormente em relação ao interesse lesado. Os danos que se produzem são, portanto, legítimos, não acarretando a responsabilização daquele que, embora tenha dado causa a prejuízos, não se afastou dos limites impostos pelo ordenamento jurídico ao pautar sua atuação117.

A convivência em sociedade traz, em si, riscos intrínsecos. Certos aborrecimentos cotidianos, portanto, devem ser tidos por toleráveis, sob pena de inviabilizar a própria existência humana em coletividade. As condutas, lícitas ou ilícitas, do Estado, podem ensejar

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MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Responsabilidade extracontratual do Estado por comportamentos administrativos. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 70, n. 552, p. 11-20, out. 1981. p. 19.

113 LESSA, Pedro. Do Poder Judiciário. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1915. p. 165. 114 V. seção 4.1.

115

CAHALI, Yussef. Responsabilidade civil do Estado. 3ª ed. rev. atual. ampl. 3ª tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 69.

116 MELLO, loc. cit.

117 MORAES, Maria Celina Bodin de. A Constitucionalização do Direito Civil e Seus Efeitos sobre a

responsabilidade civil. Direito, Estado e Sociedade. Rio de Janeiro, PUC-RJ, vol. 9, n. 29, p. 233 a 258, jun./dez. 2006. p. 240.

a sua responsabilidade, mas apenas quando tais condutas gerarem um dano que o lesado não estava obrigado a suportar118.

Como afirmou Cahali, enquanto a juridicidade e a certeza do dano podem ser deduzidas de circunstâncias mais ou menos objetivas, a especialidade e a anormalidade não o podem, pois se faz presente certa carga de sensibilidade do julgador na aferição valorativa dos incômodos e prejuízos causados a certos particulares119. Contudo, é necessário observar que, considerando a cada vez maior utilização de conceitos indeterminados para a consagração jurídica de direitos – sobretudo os de índole constitucional –, é indisfarçável a tendência de abertura à subjetividade da própria juridicidade, o que leva à necessidade da adoção de parâmetros mais consentâneos com essa característica da atualidade, para assegurar a legitimidade das decisões judiciais.

Sob esta ótica, será necessário indicar os critérios para a identificação da qualidade do direito ou interesse, para definir se e quando será considerado digno da tutela jurídica. O critério mais consistente, como se verá120, sustenta que indenizável será o dano relevante segundo uma ponderação dos interesses em jogo à luz dos princípios constitucionais121. Tal ponderação, nesse sentido, “consiste, essencialmente, em analisar de forma comparativa o grau de concreta realização do interesse lesivo e o grau de concreta afetação do interesse lesado, extraindo-se do dado normativo uma regra de prevalência válida para as circunstâncias particulares em exame122”.

Caberá, pois, indagar se o grau de realização do interesse lesivo justifica o sacrifício do interesse afetado pelo dano, a fim de definir a existência da obrigação de indenizar. Porém, a fim de que tal aferição não seja feita de forma irracional e aleatória pelo magistrado, é que se deve buscar um padrão de legitimação da atuação estatal, que deverá ser utilizado tanto para a aferição da conduta imputada como lesiva, como para o estabelecimento de padrões de atuação do órgão de controle dessa conduta, que decidirá, em concreto, pelo surgimento ou não do dever de indenizar.

118 ARAGÃO, Alexandre dos Santos. Os fundamentos da responsabilidade civil do Estado. Revista Brasileira de Direito Público, Belo Horizonte, ano 1, n. 3, out./dez. 2003. Biblioteca Digital Fórum. Disponível em:

<http://www.bidforum.com.br/bid/PDIexibepdf.aspx?tipoConteudo=Normal&vw=S&pdiCntd=12535>. Acesso em: 01 jun. 2012. p. 4.

119 CAHALI, Yussef. Responsabilidade civil do Estado. 3ª ed. rev. atual. ampl. 3ª tir. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2007. p. 70.

120

V. seção 6.4 e subseções, infra.

121 MORAES, Maria Celina Bodin de. A constitucionalização do Direito Civil e seus efeitos sobre a

responsabilidade civil. Direito, Estado e Sociedade, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 29, p. 233-258, jun./dez. 2006. p. 241.

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SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 166.

Em face do objeto específico deste trabalho, tal discussão é especialmente relevante, considerando que a atuação jurisdicional do Estado é, potencialmente, causadora de danos, e, também, aquela por meio da qual se decidirá pela ocorrência ou não do consequente dever de indenizar. Assim, mister se faz, a este momento, analisar a natureza da atividade jurisdicional, para, a partir de sua definição, propor-se parâmetros para a legitimidade da atuação jurisdicional e o seu controle.

5 O ATO JURISDICIONAL NO CONTEXTO DO ESTADO E DO PODER ESTATAL

Mister se faz salientar, a este momento, que, por ato jurisdicional, aqui se entende aquele praticado especificamente pelo magistrado, no bojo do exercício da jurisdição. Trata-se dos atos praticados no âmbito da função típica do Poder Judiciário, a exemplo de sentenças, acórdãos, despachos e decisões interlocutórias.

Em um conceito mais geral, denominam-se atos judiciais ou judiciários todos aqueles praticados no exercício das funções incumbidas ao Judiciário. Incluem, além dos referidos no parágrafo anterior, os atos praticados por juízes sem cariz jurisdicional, a exemplo do poder de polícia em audiências, providências para composição do júri e alistamento eleitoral, bem como os atos praticados por servidores e auxiliares da justiça.

Sob certo aspecto, mesmo os atos especificamente jurisdicionais não podem ser considerados meros atos do magistrado. Num processo, os atos praticados pelo juiz, pelas partes, pelos servidores ou pelos auxiliares da justiça, convergem, influenciando-se, reciprocamente, para a solução final de mérito, formalizada na sentença – ato culminante de toda atividade judicial. Portanto, embora o corte metodológico deste trabalho enfoque os atos jurisdicionais, não se perderá de vista que os mesmos estão inseridos em um contexto. É nessa toada que, para a devida compreensão de sua natureza, necessário se faz remontar, ainda que ligeiramente, à origem do tema: a teoria da separação das funções estatais.