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3.1 Escolas Pedagógicas: abordagem histórica

3.1.1 Das comunidades primitivas até a escola tradicional

Desde os primórdios da história da humanidade, homens e mulheres das comunidades primitivas buscavam formas de registrar o seu cotidiano e,

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Esclarecemos que não faz parte de nossas pretensões aprofundar a pesquisa e a discussão sobre as abordagens educacionais ao longo do tempo. Para quem pretenda conhecer mais e melhor a temática, sugerimos a leitura de CAMBI, Franco. História da Pedagogia. São Paulo: Editora UNESP, 1999 e de SEBARROJA, Jaume Carbonell. Pedagogias do Século XX. Porto Alegre: Artmed, 2003.

conseqüentemente, formas de aprender e de ensinar estas formas de registro. É aí também que os jovens e, muitas vezes, as crianças passam por rituais de iniciação para ingressarem nas atividades do mundo adulto. No decorrer do desenvolvimento da sociedade da produção e das ciências, o ensino aparece como atividade planejada e intencional. Nas escolas sumérias32, os estudantes repetiam várias vezes textos escritos e lidos para memorizá-los. Os egípcios mantinham a mesma prática com os textos escolares. Na Grécia, copiar as tragédias e memorizá-las era o centro das tarefas escolares. A contraposição a essa metodologia que supervalorizava a cópia e a memorização que retratava uma determinada concepção de educação escolar foi percebida na Grécia, representada pela alternativa do método dialógico presente na escola de Platão.

Na Idade Média, o domínio da informação concentrava-se na Igreja e a cópia de textos religiosos passou a ser a principal técnica utilizada para ensinar e aprender. A freqüência à escola naquela época se restringia aos eclesiásticos. Foram práticas escolares, na Idade Média, o ensino intelectualista, verbalista e dogmático, a memorização e a repetição mecânica dos ensinamentos do professor. “Nessas escolas”, segundo LIBÂNEO (1994, p59), “não havia espaço para idéias próprias dos alunos, o ensino era separado da vida, mesmo porque ainda era grande o poder da religião na vida social”.

Os internatos do século XVII foram uma das causas do êxito das instituições administradas por jesuítas33. Essas instituições eram muito procuradas por membros da monarquia, inicialmente, e mais tarde, por membros da burguesia para se responsabilizar pela educação escolar de seus filhos, jovens estudantes de quem se esperava mais tarde que assumissem o poder econômico e político naquelas sociedades. Tendo como finalidade específica ofertar aos jovens estudantes uma vida metódica distanciada da agitação própria da idade, os jesuítas entendem a vida externa ao internato como perigosa e, portanto, temível como alimentadora de tensões. Para eles, os jovens estudantes são considerados débeis, inclinados à tentação e atraídos

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Os Sumérios foram o primeiro povo a habitar a região da Mesopotâmia, o atual Iraque, compreendida entre os rios Tigre e Eufrates. A escrita suméria está grafada em cuneiforme e é a mais antiga língua humana escrita conhecida. Os sumérios escreviam em tábuas de argila e

registravam suas questões com um estilete de madeira. http://www.historiadomundo.com.br

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Integrantes da Companhia de Jesus que atuaram no Brasil (1549-1759) e foram os principais educadores de todo o período colonial. Naquele período, a educação não era considerada um valor social importante e a tarefa educativa desses religiosos se voltava para a catequese e instrução dos indígenas. A educação da elite colonial voltava-se para um ensino de cultura geral, enciclopédico e pouco afeto à realidade da vida da colônia agro-exportadora.

pelo mal. Não basta, então, que se isole a vida do internato da vida do mundo. É necessário velar pelo estudante constantemente e com severidade para impedir que ele se permita sucumbir a seus desejos e instintos. Segundo PETITAT (1994),

A separação – que se torna absoluta nos internatos – entre o mundo dos adultos e o das crianças e adolescentes está na base da pedagogia moderna. O ‘pequeno homem’ da Idade Média, vivendo misturado com os grandes, participando de suas festas e de suas ocupações, passa a ser enviado para locais especializados, onde é socializado. (...) Mas, se no século XVI já existe a separação entre o adulto e o adolescente, ela está confinada aos colégios e concerne, pois, em primeiro lugar, às camadas sociais superiores. O aprendiz e o jovem trabalhador ainda compartilham da vida dos mais velhos. (p. 90-91)

Os objetivos dos jesuítas comungavam em perfeita harmonia com o conteúdo do ensino que transmitiam e na maneira como o faziam. Por exemplo, ensinavam o latim que era exigido para o desenvolvimento da aula e para a conversa entre os estudantes durante os intervalos. Faziam isso, pois se opunham às transformações sociais em curso e almejavam o retorno à antiguidade.

A ação pedagógica dos jesuítas privilegiava o exercício da memória e o desenvolvimento do raciocínio. MESNARD (1992) define o papel que o professor cumpre naquele momento como sendo o de

quem organiza a vida e as atividades, que assegura o cumprimento das regras e formas, quem resolve os problemas que aparecem; reina de maneira exclusiva neste universo puramente pedagógico, procurando garantir, por meio da vigilância integral, a transformação dos desejos do aluno. (p.69- 70)

A didática, ou melhor, a metodologia de ensino, como os jesuítas chamavam ao conjunto de regras e normas prescritivas, visando a orientação do ensino e do estudo precisava ser seguida à risca. Essa definição consta do Código Pedagógico dos Jesuítas e, como afirma PAIVA (1987, p. 11) “um conjunto de normas metodológicas referentes à aula, ou seja, na ordem das questões, no ritmo, do desenvolvimento e seja, ainda, no próprio processo de ensino”.

Por acreditar que a concepção educacional traduz e é traduzida pela concepção de mundo, entendemos que, ao se falar de Escola, seja necessário se falar de Educação, de Educação Escolar, dos sujeitos envolvidos, dos

momentos históricos e de Didática. Além disso, quando este tema se colocou para nós como inquietação já há alguns anos, uma das possibilidades com que trabalhávamos era a de que uma didática adequada fosse suficiente para resolver o problema da relação entre estudantes e conteúdos curriculares.

Até o Renascimento, podemos falar em ação pedagógica. Entretanto, segundo LIBÂNEO (1994, p. 58) “... não podemos falar de Didática como teoria do ensino, que sistematize o pensamento didático e o estudo científico das formas de ensinar.” Somente a partir da intervenção de adultos na atividade de aprendizagem das crianças e dos jovens, por meio da direção deliberada e planejada do ensino, é que o termo “Didática” aparece.

Neste ponto, consideramos de fundamental necessidade para o estudo que realizamos nesta construção de tese destacar a questão da importância da Didática para esta pesquisa. O termo “Didática” é conhecido desde a Grécia antiga, com sentido muito semelhante ao que usamos atualmente, ou seja, para indicar que o objeto ou a ação qualificada se relaciona com ensino. Segundo a professora universitária da USP Amélia Domingues de CASTRO (1991),

A situação didática, pois, foi vivida e pensada antes de ser objeto de sistematização e de constituir referencial do discurso ordenado de uma das disciplinas do campo pedagógico, a Didática. Na longa fase que se poderia chamar de didática difusa, ensinava-se intuitivamente e/ou seguindo-se a prática vigente. (...) podendo-se dizer que havia uma didática implícita em Sócrates quando perguntava aos discípulos: "pode-se ensinar a virtude?" ou na lectio e na disputatio medievais. Mas o traçado de uma linha imaginária em torno de eventos que caracterizam o ensino é fato do início dos tempos modernos, e revela uma tentativa de distinguir um campo de estudos autônomo. (p.15) É ainda essa pesquisadora que nos diz que

A inauguração de um campo de estudos com esse nome tem uma característica que vai ser reencontrada na vida histórica da Didática: surge de uma crise e constitui um marco revolucionário e doutrinário no campo da Educação. Da nova disciplina espera- se reformas da Humanidade, já que deveria orientar educadores e destes, por sua vez, dependeria a formação das novas gerações. Justifica-se, assim, as muitas esperanças nela depositadas,acompanhadas, infelizmente, de outras tantas frustrações. (p.16)

Trabalhamos com a concepção de didática nos apropriando daquilo que a professora universitária Pura Lúcia Oliver MARTINS em trabalhos desde os anos 80 e 90 define como sendo as iniciativas tomadas por professores “para fazer frente às contradições próprias da organização da escola capitalista” (1998, p.16). Quando discute a prática pedagógica vivida pelos professores no interior da instituição escolar, observando suas iniciativas, seus avanços e seus recuos, MARTINS (1989) denomina esse processo como Didática Prática e investiga como ele se dá, o que ele expressa, como ele contribui com o campo da Didática. Para aquela pesquisadora, a Didática que encontramos na literatura da área manifesta uma prática que é decorrente do sistema capitalista num dado momento histórico e, por isso, segundo ela,

As formas como as classes sociais se relacionam vão se materializar em técnicas, processos, tecnologias, inclusive os processos pedagógicos que se realizam através de uma dada relação pedagógica. Assim, a reconstrução do conhecimento da área não se faz por meio de reflexões exclusivamente teóricas, mas emerge das contradições presentes na prática de nossas escolas, expressando a prática de seus agentes ao vivenciarem essas contradições. (p. 177)

Nessa perspectiva, entendemos que uma pedagogia da juventude ou uma didática para trabalhar com a juventude não demanda a criação de uma nova pedagogia ou de uma nova didática, mas sim que se capte dos movimentos juvenis, de seus processos práticos de inserção, de busca de reconhecimento e de construção da visibilidade os elementos necessários para o sucesso da partilha de saberes que envolve os sujeitos da vivência escolar. Assim, uma pedagogia da juventude expressa um processo educacional voltado para a lógica, para a necessidade, para a demanda e para o olhar da juventude. E, para nós, o processo que envolve essa partilha é o objeto da Didática.

Neste trabalho, uma de nossas preocupações centrais tem sido o estudo de contribuições significativas na formação de professores para o trabalho com as juventudes em sala de aula. Desse modo, buscamos recolocar a importância do papel ativo dos sujeitos envolvidos.

João Amós COMÊNIO (1592-1670), um pastor protestante, escreveu a primeira obra clássica sobre Didática, que recebeu o nome de Didática Magna ou Tratado da Arte Universal de Ensinar Tudo a Todos, onde criava princípios e regras do ensino. Os princípios eram: a Educação é um direito natural de todos;

a tarefa principal da Didática é estudar a idade e a capacidade para o conhecimento dos estudantes e os métodos de ensino correspondentes; os conhecimentos devem ser adquiridos a partir da observação das coisas e dos fenômenos, usando e desenvolvendo sistematicamente os órgãos dos sentidos; o planejamento de ensino deve observar o curso da natureza dos estudantes, ensinando uma coisa de cada vez e partindo do conhecido para o desconhecido.

A influência considerável exercida por Comênio não pode ser contestada e se deveu, principalmente, a seu desejo que as pessoas mais pobres recebessem instrução, pois isso era fundamental para a reforma religiosa. A busca de procedimentos que propiciassem rendimento ao ensino tornou-se importante para que pudessem usufruir os benefícios do conhecimento.

Aqui se faz necessário a contextualização histórica, uma vez que nesse momento histórico ocorriam intensas mudanças que alcançavam desde as formas de produção até o desenvolvimento da ciência e da cultura e a organização religiosa. O lugar social da burguesia foi se alargando em detrimento do poder da nobreza e do clero. Segundo FRIGOTTO (2004:195), uma leitura histórica da origem da escola e da centralidade dessa instituição no projeto de sociedade da burguesia nascente, evidencia a concepção de escola como “instituição social e cultural, de produção do conhecimento e de valores e como espaço para o desenvolvimento” de crianças e de jovens. Ainda segundo este autor,

A origem etimológica da palavra escola vem do grego, significa lugar de ócio. Um espaço, portanto, onde as crianças e os jovens vivem um longo tempo incorporando valores, conhecimentos e amadurecendo para a vida futura. Mas o mesmo retrospecto histórico nos evidencia que esta não era e nunca foi a escola para todos. (...), a escola para a classe trabalhadora sempre foi outra – uma escola para a disciplina do trabalho precoce e precário.

Dessa forma, enquanto a burguesia crescia como classe social, crescia também a necessidade de uma educação que respondesse ás exigências da nova ordem econômica contemplando o livre desenvolvimento das capacidades e dos interesses individuais.

3.1.2 Escola Tradicional