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Declínio da auto-estima, segregação e exclusão social

3. METODOLOGIA

4.3. Desenvolvimento e sustentabilidade nos Lençóis Maranhenses

4.3.2. Sustentabilidade espacial e o desenvolvimento

4.3.4.5. Declínio da auto-estima, segregação e exclusão social

Comunidades que se caracterizam pela inexistência de um processo de planejamento envolvendo a população, onde os seus membros são cada vez mais afastados das suas áreas originais de lazer e trabalho para dar lugar aos empreendimentos turísticos e onde o acesso dos seus membros aos locais turísticos é limitado, deveriam apresentar de baixíssima auto-estima por parte dos nativos. Não é o que se percebe em Barreirinhas e outros municípios da área de influência dos Lençóis Maranhenses. De fato, o que se percebe é uma enorme motivação dos nativos para o turismo. Eles acreditam que está aí a grande oportunidade de melhorar as suas vidas, de ascender e integrar-se à sociedade, em sua plenitude. Acreditam piamente que a inclusão social vai acontecer por meio da ascensão econômica.

A despeito da falta de acesso aos meios disponíveis para agir em sua defesa, o habitante dos Lençóis Maranhenses resiste ao desânimo. “O poder público não existe”, diz Alfredo (dono de pousada). No entanto, eles mesmos agradecem a omissão das instituições. “Graças a Deus, até hoje não. A única

coisa que nos apoiou por aqui foi a Marinha quando passou aqui que nos apóia. Mas de prefeitura, de secretaria de meio ambiente, de vigilância sanitária, nada. Tudo o que fazemos por limpeza aqui, tudo vem da consciência da gente”.

Entretanto, esse ânimo só pode ser verificado naqueles locais onde existem possibilidades turísticas. Quando nos afastamos da sede dos municípios e adentramos no interior, onde não existem ainda perspectivas turísticas, a queda na auto-estima é mais evidente. Fernando Azevedo, do Banco do Brasil em Barreirinhas e com jurisdição de atendimento nos Lençóis Maranhenses, trabalha na carteira de empréstimos e acompanha de perto as carências da população, em especial no meio rural. Ele enxerga a situação nos seguintes termos.

Tem que se fazer um trabalho urgente ali para se atender ao lado social. [...] Na cidade, a sede, nós percebemos que o povo não necessita tanto, mas quando você se afasta da sede, quando você vai para os interiores, você vê a necessidade, a carência do povo daquela região. Então, tem que se fazer um trabalho focado na saúde, na educação. Eu creio que o prefeito, a nova administração, esteja fazendo isso. Espero que ele tenha êxito nisso, que ele vá [...] com bastante intensidade na área social, na educação, na saúde, que o povo é muito carente

O ânimo dos residentes quanto ao turismo pode ser explicado de duas formas. A primeira delas, pela própria oportunidade de negócios que o turismo está trazendo para a região. Pessoas estão sendo empregadas como guias turísticas, motoristas de veículos, pilotos de lancha, garçons, atendentes, arrumadeiras etc. Ocupações paralelas, como o artesanato, oficinas de manutenção de veículos e embarcações, pequenos comércios (formais e informais), enfim, um sem-número de atividades que, bem ou mal, ocupam as pessoas. Todos anseiam pelas oportunidades decorrentes do turismo. Por conta disso, a população de Barreirinhas praticamente dobrou em dez anos e deverá continuar crescendo nos próximos anos, tal é a profusão de novos negócios que estão se deslocando para lá e, em menor escala, para os demais municípios.

A segunda explicação se dá pela especulação imobiliária, já comentada anteriormente. O sentimento dos nativos é de aproveitar o momento e fazer o

melhor negócio possível, ganhar algum dinheiro e investir no turismo. É óbvio que esse processo afasta o nativo dos seus locais de origem, acarretando outro problema social, com o surgimento das favelas. No entanto, eles não vêem essa prática como um problema de afastamento ou exclusão social, mas como oportunidade de negócio. “Na verdade ele se afasta porque vende a parte dele que fica bem próxima da estrutura, da estrada, ganhando um dinheiro muito bom”, informa Franchesco (pousada Boa Vista).

Sob a ótica mais abalizada dos pesquisadores, o problema é mais grave. Puppim de Oliveira (FGV) resume a sua opinião nos seguintes termos.

Primeiro que acaba havendo uma expulsão das pessoas dos locais mais valorizados na cidade para estabelecimento de pousadas, bares, restaurantes etc. segundo, há também uma forte migração, que se torna um foco de migração, das pessoas da região em busca de trabalho. Primeiro vem as pessoas de fora, de mais longe, por questões de negócios e das cidades e lugarejos da região com a intenção de trabalhar nos negócios turísticos. Surge exatamente a necessidade básica dessas pessoas de educação, saúde etc. Muitas vezes o município não está preparado. Barreirinhas eu vi exatamente um crescimento de forma desordenada, casas e casebres sem nenhum planejamento e isso deveria ser uma responsabilidade que acontece, pela Constituição brasileira, o planejamento do solo é responsabilidade do município. Boa parte dos municípios no Brasil não tem essa capacidade. Acho que urgentemente se precisa fazer um plano diretor da cidade.

Gilson Oliveira, Secretário de Turismo de Barreirinhas procura minimizar o problema informando a respeito das ações municipais para dotar as favelas e assentamentos populares de infra-estrutura. Ele acredita que o fenômeno é inevitável e cabe ao poder público reordenar as pessoas que estão sendo deslocadas. Ele diz que “a primeira invasão já recebeu a luz, Luz para Todos (programa do governo). Tem a segunda invasão, que está em questão e não sabe se vai ficar ainda”.

Todavia, na medida em que o turismo chega com força total a um município desprovido das mínimas condições de infra-estrutura, como é generalizado na região dos Lençóis Maranhenses, quase sempre vem acompanhado do aumento do custo de vida em geral. Barreirinhas apresentava um padrão de consumo típicos das pequenas cidades do interior, tal qual o padrão das demais cidades dos Lençóis Maranhenses ainda não contempladas como o dinamismo do turismo. Na medida em que a cidade dobrou a sua

população residente e passou a receber um fluxo de turistas ávido em consumir aquilo que lá não existia em oferta suficiente para atender à demanda, houve a elevação geral dos preços. Fernando Azevedo (Banco do Brasil) expõe fielmente o problema.

Nós percebemos quanto se torna caro para o turista se alimentar, ter um local para ficar, um dormitório, uma casa, uma pousada, tudo é muito caro. A gente percebe isso [...] porque a maioria dos donos de pousada são clientes do banco, a gente vê, são nossos amigos [...]. Com relação ao custo de vida, é alto para quem chega, no primeiro momento, você tem aquele abalo. Realmente é caro, a alimentação. [...] A gente percebe os turistas reclamando do artesanato, das viagens para conhecer os Lençóis. Então, tudo isso tem que pensar porque a meu ver é uma exploração ao turista. Com relação à própria população, com certeza nós vemos que essa atividade gera lucros, com certeza, e nós sabemos disso. Mas só que a gente percebe também que fica restrito nas mãos de poucos. Com certeza a gente percebe que as pessoas, quando ganham mais, começam a fazer compras em São Luís e trazem para cá e começa a inflar os preços, inclusive [...] você vai aumentando a demanda, os preços. Com certeza, aumenta o custo de vida para a população local.

Nota-se que o turismo, na medida em que traz o desenvolvimento econômico, gera emprego e renda para a comunidade local, também infla os preços da região de forma generalizada. O nativo, que antes ganhava muito pouco com a sua exploração de subsistência, passou agora a ganhar um pouco mais empregado no turismo. Até que ponto esse ganho adicional realmente é um benefício quando o preço de todos os bens que ele precisa consumir sofreu elevação? Teria realmente o turismo proporcionado algum tipo de vantagem para o nativo?

Do ponto de vista social, é possível antecipar que poucos são os nativos que se beneficiam do turismo porque, além do custo de vida em geral ter ficado muito alto, a maioria só tem conseguido emprego de baixa qualificação e, conseqüentemente, baixo salário, além de temporário e de acordo com o aspecto sazonal do turismo. Além disso, passaram a morar nos subúrbios ou favelas, onde florescem a marginalidade e a prostituição.

Longe de se transformar num processo que valoriza as pessoas, a implantação do turismo nos Lençóis Maranhense peca pela falta de políticas que tenham o objetivo de viabilizar os sagrados direitos de inclusão social,

tornando os benefícios concretos para todas as pessoas, especialmente para as mais pobres.

4.3.5. Sustentabilidade ambiental

Já ficou patente que os nativos são condescendentes com uma série de desvios, desde que o turismo não interrompa o seu fluxo normal de atividades e lhes proporcione a oportunidade de ascender econômica e socialmente. No entanto, no quesito da sustentabilidade ambiental, os problemas identificados nos Lençóis Maranhenses parecem estar relacionados com os demais atores. Os habitantes locais demonstram maior cuidado com o meio ambiente.