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De acordo com o censo de 2011 do Uruguai, 93.123 pessoas apresentavam alguma deficiência auditiva permanente, mesmo com o uso de aparelhos auditivos; 22.629 apresentavam deficiência severa; e 3.142 não ouviam nada (Instituto Nacional de Estatística do Uruguai [INE], 2011).

Ademais, 62% da população com algum nível de deficiência auditiva tinham 65 anos ou mais e, em média, apresentavam grau de instrução mais baixo do que a população em geral.

O sistema educacional formal para pessoas surdas, no Uruguai, apresenta variações. Com relação ao Ensino Primário, o país conta com quatro escolas bilíngues; a primeira fundada em Montevidéu, em 1910. O acesso ao Ensino Secundário, por pessoas com surdez, foi viabilizado somente em 1996, quando a Escola de Ensino Secundário No 32 incorporou a língua de sinais ao seu currículo educacional. O Ensino Superior público conta com intérpretes para alunos surdos desde 2003. No caso das universidades privadas, os próprios alunos devem contratar intérpretes para lhes acompanhar em seu desenvolvimento educacional (Peluso, 2010;

Peluso & Vallarino, 2014).

A falta de oferta de Ensino Secundário para pessoas com surdez coloca essa população em grave desvantagem socioeconômica, ainda mais entre faixas etárias compostas por pessoas mais velhas. Os autores acreditam na importância de enfatizar que, de acordo com o

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desenvolvimento da integração da língua de sinais ao sistema educacional no Uruguai, as pessoas com surdez nascidas antes dos anos 1980 não tinham acesso a caminhos institucionais para cursar mais de seis anos de ensino formal.

Este artigo tem como objetivo analisar os níveis de uso da Internet entre pessoas com deficiência auditiva no Uruguai à luz da literatura sobre a desigualdade digital. Como Dobransky e Hargittai (2006), os autores buscaram avaliar se existe uma exclusão digital adicional, relacionada à deficiência, mesmo ao levar em consideração os fatores socioeconômicos associados às desigualdades digitais.

ANÁLISE

MÉTODO

Vários modelos logísticos binários foram adaptados para estimar a probabilidade de uso da Internet. Os autores utilizaram dados coletados pela Pesquisa Longitudinal de Proteção Social (do espanhol, Encuesta Longitudinal de Protección Social – ELPS) no Uruguai, administrada a uma amostra representativa da população daquele país com 14 anos ou mais. O levantamento foi realizado entre outubro de 2012 e maio de 2013, com um total de 18.428 indivíduos.

Tanto por seu tamanho como pelos assuntos investigados (caracterização socioeconômica dos domicílios, módulos de deficiência e perguntas relacionadas ao acesso e uso das TIC), o ELPS é o único levantamento, no Uruguai, que viabiliza pesquisas sobre o uso das TIC entre pessoas com deficiência auditiva. A metodologia sugerida por Dobransky e Hargittai (2006) foi adotada pelos autores para atingir os objetivos do presente estudo.

MÉTRICAS

O ELPS identificou pessoas com deficiência auditiva por meio da pergunta: “Você tem alguma das seguintes limitações?”. As opções de resposta eram: Surdez e uso da língua de sinais; Surdez sem uso da língua de sinais; e (se não apresenta surdez) deficiência auditiva mesmo com o uso de aparelho auditivo. Usou-se uma combinação dessas respostas para criar a variável deficiência auditiva, que recebeu um escore de 1 na presença de surdez ou deficiência auditiva mesmo com o uso de aparelhos auditivos.

A análise também incluiu variáveis socioeconômicas como idade, etnia autorreferida, área, grau de instrução, situação de emprego e acesso a computadores e à Internet no domicílio.

A faixa etária foi definida como variável categórica dividida em quatro grupos: 14 a 29 anos, 30 a 49 anos, 50 a 64 anos e 65 anos ou mais. A região em que a pessoa reside tinha três opções possíveis: Montevidéu (capital), área urbana e rural. O grau de instrução foi definido como o nível de escolaridade mais alto completado pelo respondente: Educação Primária incompleta; Educação Primária completa; Ensino Secundário inferior; Ensino Secundário; e Ensino Superior. As variáveis a seguir são binárias: masculino, afrodescendente, assentamentos irregulares (slums), empregado, computador no domicílio, Internet no domicílio.

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RESULTADOS

PERFIL DA AMOSTRA

A Tabela 1 apresenta estatísticas descritivas para a população representada pela amostra.5 Conforme ilustrado, 70% da população tinham computadores no domicílio em 2013, 51%

tinham acesso à Internet, e somente 1% da população tinha deficiência auditiva.6

TABELA 1

VARIÁVEIS SOCIODEMOGRÁFICAS RELACIONADAS À INTERNET

Média Desvio padrão

Masculino 0,48 0,50

Faixa etária

30 a 49 anos 0,33 0,47

50 a 64 anos 0,20 0,40

65 anos ou mais 0,17 0,38

Afrodescendente 0,11 0,31

Área

Área urbana 0,51 0,50

Área rural 0,08 0,27

Assentamentos irregulares (Slum) 0,07 0,25 Grau de instrução

Educação Primária, incompleta 0,10 0,30

Educação Primária, completa 6 0,36 0,48

Ensino Secundário inferior 0,26 0,44

Ensino Secundário 0,18 0,39

Ensino Superior 0,11 0,31

Empregado 0,56 0,50

Computador no domicílio 0,70 0,46

Internet no domicílio 0,51 0,50

Surdez ou deficiência auditiva 0,01 0,11

Os valores de todas as variáveis apresentadas na Tabela 1 variam entre 0 e 1, no qual 1 representa resposta afirmativa para aquela variável (por exemplo,

“masculino” 1=sim; 0=não).

Fonte: ELPS 2011, elaborado pelo autor.

5 Ao ser ponderada, a amostra de 18.428 casos representa uma população estimada de 2.757.288.

6 O grau de instrução representa o nível acadêmico mais alto completado pelo respondente.

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A Tabela 2 elenca dados estatísticos descritivos comparando a população com e sem deficiência auditiva. As pessoas com deficiência auditiva eram mais velhas e tinham menor grau de instrução do que aquelas sem deficiência auditiva, o que está de acordo com o desenvolvimento da educação formal para ambos os grupos. Enquanto 11% da população sem deficiência auditiva havia completado o Ensino Superior, esse valor foi de somente 5% para a população com deficiência auditiva. Ademais, 65% das pessoas com deficiência auditiva tinham 65 anos ou mais, dado comparado a apenas 17% dos indivíduos sem deficiência auditiva. Isso pode indicar que uma porcentagem da população com deficiência auditiva adquiriu a condição com o avanço da idade.

TABELA 2

VARIÁVEIS SOCIODEMOGRÁFICAS POR PRESENÇA OU AUSÊNCIA DE DEFICIÊNCIA AUDITIVA

Sem deficiência auditiva* Com deficiência auditiva**

Média Desvio padrão Média Desvio padrão

Masculino 0,48 0,50 0,39 0,49

Faixa etária

30 a 49 anos 0,33 0,47 0,16 0,36

50 a 64 anos 0,20 0,40 0,14 0,35

65 anos ou mais 0,17 0,37 0,65 0,48

Área

Urbana 0,51 0,50 0,51 0,50

Rural 0,08 0,27 0,03 0,16

Assentamentos irregulares (Slum) 0,07 0,25 0,06 0,24

Empregado 0,56 0,50 0,22 0,41

Grau de instrução

Educação Primária, incompleta 0,10 0,30 0,28 0,45

Educação Primária, completa 0,35 0,48 0,45 0,50

Ensino Secundário inferior 0,26 0,44 0,13 0,34

Ensino Secundário 0,18 0,39 0,10 0,29

Ensino Superior 0,11 0,31 0,05 0,21

* 2.721.205 pessoas sem deficiência auditiva.

** 36.083 pessoas com deficiência auditiva.

Fonte: ELPS 2011, elaborado pelo autor.

Na Tabela 3, destaca-se o grau de exclusão digital, mostrando, de um lado, a porcentagem de pessoas que residiam em domicílios com computador; e, do outro, com acesso à Internet. Os números indicam que, entre pessoas com deficiência auditiva, o acesso ao computador, no domicílio, foi 20 pontos percentuais e o acesso à Internet foi 16 pontos percentuais menor do que entre aquelas sem deficiência.

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TABELA 3

PORCENTAGEM DE PESSOAS EM DOMICÍLIOS COM COMPUTADOR/INTERNET

Computador (%) Internet (%) N

Amostra total 69,8 50,9 2.757.288

Sem deficiência auditiva 70,0 51,1 2.721.205

Surdez ou deficiência auditiva 49,7 35,3 36.083

Fonte: ELPS 2011, elaborado pelo autor.

Finalmente, a Tabela 4 resume a porcentagem de indivíduos que usaram a Internet de acordo com algumas características sociodemográficas. Essa tabela aponta que 57% dos uruguaios acima de 14 anos de idade disseram usar a Internet em 2013. Essa porcentagem sobe para 86% entre jovens de 14 a 29 anos e diminui com o aumento da idade, conforme previsto na literatura. De forma similar, o uso aumentou com o avanço do grau de instrução. No caso da população com surdez ou deficiência auditiva, somente 21% referiram usar a Internet, quase um terço do nível da população em geral.

TABELA 4

USO DA INTERNET, POR CLASSE SOCIAL E DEFICIÊNCIA AUDITIVA

% Frequência N

Amostra total 57 1.569.864 2.757.288

Masculino 58 760.078 1.314.259

Faixa etária

14 a 29 anos 86 713.758 825.243

30 a 49 anos 61 556.154 904.571

50 a 64 anos 41 226.207 549.639

65 anos ou mais 15 73.745 477.835

Afrodescendente 55 164.778 297.735

Área

Montevidéu 66 749.788 1.131.844

Urbana 52 734.416 1.414.429

Rural 41 85.660 211.015

Assentamentos irregulares (Slum) 49 90.580 186.498

Grau de instrução

Educação Primária, incompleta 9 26.262 280.695

Educação Primária, completa 37 365.706 980.412

Ensino Secundário inferior 71 505.679 708.325

Ensino Secundário 82 412.626 503.239

Ensino Superior 90 260.752 289.778

Empregado 66 1.026.186 1.543.584

Computador no domicílio 72 1.381.762 1.923.144

Internet no domicílio 81 1.136.827 1.403.752

Surdez ou deficiência auditiva 21 7.538 36.083

N se refere à população total da categoria, enquanto Frequência se refere ao número de pessoas que usam a Internet dentro daquela categoria. Por exemplo, da população masculina de 1.314.259 indivíduos, 760.078 usam a Internet.

Fonte: ELPS 2011, elaborado pelo autor.

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